COGNITIO-ESTUDOS

Revista Eletrônica de Filosofia
Philosophy Eletronic Journal
ISSN 1809-8428

São Paulo: Centro de Estudos de Pragmatismo
Programa de Estudos Pós-Graduados em Filosofia
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Disponível em http://www.pucsp.br/pragmatismo

Vol. 8, nº.2, julho-dezembro, 2011

Pag.I

EDITORIAL

No ano em que o Centro de Estudos do Pragmatismo (CEP) da PUC-SP já inicia a organização do 14º Encontro Internacional sobre Pragmatismo (EIP), que ocorrerá entre 5 e 8 de novembro de 2012, reunindo conferencistas seniores convidados e os membros do International Organization Committee (IOC) para a importante missão de iniciar as preparações do Charles Sanders Peirce International Centennial Congress, que ocorrerá em 2014, na University of Massachusetts Lowell, cidade de Lowell, MA, nos Estados Unidos, evidenciando a importância capital que o CEP de São Paulo adquiriu, através de seu contínuo e sério trabalho, entre os principais centros especializados no Pragmatismo do mundo inteiro, apresentamos, com muito orgulho, este volume 8, número 2 da COGNITIO-ESTUDOS: Revista Eletrônica de Filosofia.

Como não poderia deixar de ser, essa publicação eletrônica do CEP/PUC-SP caracteriza-se pela diversidade de temas e qualidade dos artigos reunidos, evidenciando a preocupação dos seus idealizadores em manter um diálogo intenso e enriquecido com várias áreas de pesquisa científica e filosófica em pontos que tangenciam, explícita ou implicitamente, o Pragmatismo. Assim, a presente edição conta com oito artigos, cujos temas variam do Pragmatismo Clássico ao Contemporâneo, passando pela Hermenêutica, Semiótica, Economia, Direito e Política.

Haroldo de Arruda Junior em seu artigo "Análise Pragmática da Teoria do Mercado Livre sob o ponto de vista da Ética em Milton Friedman", nos brinda com uma brilhante análise da Teoria do Mercado Livre, de Milton Friedman, à luz do pragmatismo de Charles Sanders Peirce. As principais características dessa teoria são identificadas e elucidadas pelo autor com grande riqueza de detalhes, levando-nos a uma reflexão extremamente contemporânea acerca de como "a prática da ética empresarial age diretamente na formação de valores e ainda como este conjunto de novos valores forma um sistema social". A partir da reflexão desenvolvida no artigo, o autor, pragmaticamente, nos traz para uma participação ativa, no seio da comunidade, apontando, numa fórmula peirciana, para a forma como estamos preparados para agir no futuro, diante da resposta à pergunta "se este é o conjunto de valores que desejamos para todos nós."

Agemir Bavaresco, em seu artigo "Pragmatismo Semântico: modelo, estratégias e história do projeto filosófico de Robert Brandom", apresenta o modelo normativo semântico de Robert Brandom, refletindo sobre a estratégia desenvolvida pelo filósofo na construção de seu modelo inferencialista. A tal apresentação, que prima pelos detalhes, acresce-se uma introdução ao método de reconstrução de Brandom em seu mais recente trabalho "Perspectives on Pragmatism: Classical, Recent, and Contemporary", dedicado à história do pragmatismo americano.

O artigo "A despolitização moderna à luz do pensamento de Hannah Arendt", de autoria de Cacilda Silva Bonfim, traz à tona uma abordagem teórico-conceitual do fenômeno da despolitização a partir da crítica à modernidade levada a cabo por Hannah Arendt. O ponto de tangência com o pragmatismo permanece implícito na abordagem das implicações que o projeto de desconstrução metafísica sugere a partir da análise das atividades fundamentais da condição humana.

Hélio Rebello Cardoso Jr e Thien Spinelli Ferraz, no artigo "Philosophical problem of relations according to Peirce: Alliances towards an ontology of relations regarding two aspects of synechism", apresentam uma instigante reflexão sobre como a filosofia de Peirce pode ser pensada como uma alternativa para a filosofia do ser. Argumentam que Peirce teria construído uma ontologia cuja fundação se encontra na semiótica, onde os modos de ser da realidade são definidos em termos de relações (monádicas, diádicas e triádicas), em detrimento de discursos sobre a realidade do ser (Aristóteles) ou uma metafísica científica regrada por condições transcendentais (Kant), afastando-se, assim, de ambas as tradições. Defendem que tal contribuição peirciana acerca da ontologia pode ser observada em dois aspectos do seu Sinequismo, a saber, "a primazia das relações sobre os indivíduos em multiplicidades contínuas e o modo de ser das relações de acordo com relações triádicas na categoria de Terceiridade."

No artigo "A regra-matriz de incidência das normas jurídicas como diagrama Semiótico", Rodrigo Medeiros Guardia mostra como a estrutura lógica a que se podem reduzir as normas jurídicas encontra abrigo nas lições de Charles Sanders Peirce sobre os diagramas semióticos. A forma lógica das normas jurídicas, depois de destituídas de todo conteúdo semântico, recebem o nome de 'regra-matriz' ou 'norma padrão de incidência'. Essa forma lógica será, então, analisada de acordo com a semiótica peirciana, particularmente através da noção icônica de diagramas, onde será traçado "um paralelo entre as propriedades heurísticas do diagrama e da regra-matriz ressaltando, assim, a importância de ambas no processo de raciocínio e descoberta."

Isabel Jungk em "A relevância da estrutura sígnica das palavras para o pensamento", presenteia-nos com uma abordagem ímpar sobre a contribuição peirciana acerca dos processos sígnicos. O ponto de partida é a análise das três categorias fenomenológicas como origem das diversas classes de signos no interior da filosofia de Peirce. Após analisar as bases da semiótica filosófica peirciana, a autora evidencia como as palavras devem ser pensadas como tipos linguísticos fundamentais utilizados pelo pensamento e cuja análise detalhada possibilita a revelação de nuances de significação dos signos linguísticos que podem auxiliar a clareza do pensamento, tendo como horizonte a máxima pragmática.

O Pragmatismo em sua vertente jamesiana encontra-se muito bem representado nesta edição no artigo "O rigor na noção de Verdade do Pragmatismo de William James", de autoria de Marcelo da Silva Alves Pires. O autor explora algumas críticas ao pragmatismo jamesiano que tornaram-se comuns entre comentadores contemporâneos do próprio James bem como nossos, tais como a de promover "uma concepção de verdade que implica[va] na aversão a qualquer tipo de rigor, associando a justificação de crenças, mesmos as científicas, ao relativismo e subjetivismo de mais baixo nível, onde tudo é permitido, desde que traga a quem quer que proponha uma crença, algum tipo de satisfação, ou desde que possamos dar àquela crença algum tipo de utilidade", argumentando contra aspectos pontuais comuns à essas críticas. O artigo analisa detidamente a "Sexta Conferência sobre o Pragmatismo", de James, explorando os principais pontos de sua concepção de 'Verdade' no Pragmatismo, caracterizado por implicar "uma epistemologia rigorosa e comprometida com o controle objetivo e com o desenvolvimento responsável das ciências."

Completando a sequência de artigos desta edição, Mario Ariel González Porta, em "Filosofia e História da Filosofia", oferece-nos uma interessante reflexão acerca das noções de texto e contexto, bem como de sua inter-relação, a partir da ideia de que é falsa a oposição entre filosofia e história da filosofia. Diante deste horizonte, texto e contexto não devem ser pensados como um agregado, mas sim como uma estrutura, uma indissolúvel unidade hermenêutica. Assim, uma vez que historicidade e hermenêutica exigem-se reciprocamente, chega-se à instigante conclusão de que a filosofia é essencialmente histórica e a história da filosofia é essencialmente filosófica.

Por fim, essa edição inclui também uma tradução inédita do texto "A Imortalidade à Luz do Sinequismo", de Charles Sanders Peirce. Esse texto, embora curto, é de uma contundência exemplar no corpo de escritos peircianos. Trata-se de um texto inacabado, submetido por Peirce em 4 de maio de 1893 ao The Open Court e, um pouco depois, considerado favoravelmente para o The Monist. No entanto, esse texto não foi publicado devido a um desentendimento entre Peirce e o editor Paul Carus. Neste texto, Peirce aplica a sua doutrina do "sinequismo" à questão da imortalidade, assumindo que é imprudente afirmar que apenas possuímos uma vida carnal, descontínua. O sentido em que a continuidade da vida após a morte pode ser pensada à luz de sua metafísica científica é sugerido, ao mesmo tempo em que também o é uma possível reconciliação entre ciência e religião mediada pelo "sinequismo".

Assim, convidamos os nossos leitores, brasileiros e estrangeiros, a explorar esta edição da Cognitio-Estudos e tomar parte na diversidade e riqueza do diálogo filosófico-científico por ela proporcionado. Desejamos a todos uma excelente leitura!


Rodrigo Vieira de Almeida
Editor Assistente/Cognitio-Estudos
Centro de Estudos do Pragmatismo, PUC-SP, Brasil