A teologia crítica de Kant: da fé racional à fé reflexionante
Kant´s critical theology: from rational faith to reflective faith

Francisco das Chagas de Oliveira Freire
Doutor em Filosofia pela Universidade de Coimbra. https://orcid.org/0000-0002-8000-5447. Contato: 
freirefranz@gmail.com


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RESUMO

O rigor com que Kant nega a possibilidade de demonstração teórica da existência de Deus, aliada a uma hermenêutica que focaliza o sistema kantiano a partir da teoria do conhecimento, induziu numerosos intérpretes a considerar a expressão “teologia kantiana” como um oximoro. Intérpretes prestigiados o veem como agnóstico ou, na melhor das hipóteses, deísta. Em todo caso, Kant não admitiria um fundamento racional para a religião e a teologia. O presente artigo tem a intenção de examinar os princípios e condições de legitimidade que viabilizam a teologia kantiana. A teologia encontra fundamento numa necessidade subjetiva da razão. Trata-se de uma necessidade moral de representação teleológica, sem a qual a vontade não pode ser determinada. Embora esteja fundamentada na moral, a teologia se constitui em uma disciplina autônoma. A fé está enraizada na racionalidade e não pode ser ignorada sem que a razão entre em contradição consigo mesma. A fé racional pura deve ser a bússola e o parâmetro seguro para a fé reflexionante, ou seja, para o pensamento sobre o incomensurável e obscuro espaço do suprassensível. Kant legitima o pensamento – por oposição a conhecimento – como alargamento do puro conceito do entendimento. 

PALAVRAS-CHAVE: Teologia. Moral. Fé racional. Fé reflexionante. Pensamento. 

ABSTRACT

The rigor with which Kant denies the possibility of theoretical demonstration of the existence of God, combined with a hermeneutics that focuses the Kantian system from the theory of knowledge, has induced numerous interpreters to consider the expression "Kantian theology" as an oxymoron. Prestigious interpreters see him as agnostic or, at best, deist. In any case, Kant would not admit a rational foundation for religion and theology. The present article is intended to examine the principles and conditions of legitimacy that make theology viable in Kant. Theology finds its foundation in a subjective necessity of reason. It is a moral necessity of teleological representation without which the will cannot be determined. Although it is grounded in morality, theology is constituted as an autonomous discipline. Faith is rooted in rationality and cannot be ignored without reason contradicting itself. The subjective necessity of reason imposes the task of a teleological representation. Rational faith must be the compass and the sure parameter for reflexive faith, that is, for thinking about the immeasurable and obscure space of the suprasensible. Kant legitimises the thought - as opposed to knowledge - as an extension of the pure concept of the understanding. 

KEYWORDS: Theology. Morality. Rational faith. Reflexive faith. Thought.


A filosofia crítico-transcendental implica restrições epistêmicas, que vetam a metafísica – e seus objetos: Deus, a liberdade e a imortalidade – no âmbito da razão teórica (KrV, A 337/B 395, nota). Na dialética transcendental, a racionalidade teórica vê em Deus uma ideia da razão, meramente regulativa, situada no mundo inteligível. Kant rechaça as demonstrações tradicionais pró ou contra a existência de Deus e critica os argumentos ontológicos, cosmológicos e físicos-teológicos. Na primeira crítica, combinam-se duas interpretações sobre o significado de mundus intelligibilis, que tornam ambíguo o conceito de Deus. Numa abordagem ontológica, na medida em que não comporta a possibilidade de intuição sensível, Deus é um ens rationalis, isto é, um de nada de fenomenalidade (KrV, A 290-291 /B 347-348. KrV, B 307-309)[1]. Nesse caso, Deus é uma ideia, algo pensável e possível como fundamento numênico, pois não contém contradição, mas cuja realidade e efetividade não se podem demonstrar. Numa abordagem metodológica ou semântica, o mundus intelligibilis não é mais que o conceito universal de um mundo em geral, “em que se abstrai de todas as condições da intuição do mesmo e em relação ao qual não é possível, portanto, nenhuma proposição sintética, nem afirmativa nem negativa” (KrV, A 433/B 461)[2]. Haveria uma única realidade ontológica, da qual o númeno e o fenômeno são apenas “pontos de vista” [Standpunkt] (KrV, A 536/B 564; B XXVI-XXVII; A 38/B 55; A 808/B 836; A433/B 461). Nesse caso, o conceito de Deus pode ser interpretado como uma categoria meramente regulativa, útil para fins heurísticos, destituído de qualquer referência ontológica (KrV, B XXVII). Na esfera teórica, embora pensável e possível, Deus tem um sentido estritamente negativo e problemático.

O rigor com que Kant nega a possibilidade de demonstração teórica da existência de Deus, aliada a uma hermenêutica que focaliza o sistema kantiano a partir da teoria do conhecimento, induz os intérpretes a considerar a expressão “teologia kantiana” como um oximoro (PALMQUIST, 2008, p.17). Intérpretes prestigiados o veem como agnóstico ou, na melhor das hipóteses, deísta (WOOD, 1991). Gerold Prauss (1989, p. 39) e Henry Allison (2004, p. 16-19), defenderam que, ao invés de pensar dois mundos ontologicamente distintos – o mundo sensível e o mundo inteligível, no qual Deus é representado como criador e legislador moral do mundo – Kant distinguiu duas perspectivas hermenêuticas – a sensível e a inteligível – num mesmo mundo. Esses autores rechaçam a concepção que reifica a coisa em si mesma e o mundo numênico. Antes da “coisa em si” ser a condição do fenômeno, o fenômeno é a condição da “coisa em si”. Em todo caso, a filosofia de Kant não admitiria um fundamento racional para a religião e a teologia. 

O presente artigo tem a intenção de examinar os princípios e condições de legitimidade que viabilizam a teologia em Kant. Constata-se que somente pela racionalidade prática, estética e teleológica Deus adquire estatuto de realidade efetiva e a teologia, viabilidade. A filosofia crítico-transcendental encerra uma profunda transformação no conceito de racionalidade. Institui-se a racionalidade complexa e procedural como crítica à noção tradicional – eminentemente substancial – de racionalidade. A razão kantiana é pluridimensional – teórica, prática, estética e teleológica – e apresenta princípios diversos e condições de legitimidade diferentes para cada dimensão discursiva. Importa, pois, descrever o modo como a teologia crítica está radicada na racionalidade, assim como seu estatuto e pretensões. 

A teologia e a religião são temas recorrentes nas três críticas e especialmente nas obras da década de 90: Sobre o fracasso de toda tentativa filosófica na Teodiceia (1791), A religião nos limites da simples razão (1793), O fim de todas as coisas (1794), e O conflito das faculdades (1798). As Lições de Metafísica, Lições de Lógica e Lições sobre a doutrina filosófica da religião testemunham a presença do tema também no magistério kantiano. Kant encontra lugar para a fé, abordando inclusive conteúdos típicos da teologia confessional: a trindade, o pecado original, a graça, a encarnação, a expiação vicária e a eternidade. Mais importante que o interesse recorrente pela teologia e a religião, é a posição que elas ocupam no sistema kantiano. No prefácio da Crítica da Razão Pura, Kant esclarece que o objetivo central do projeto crítico é estabelecer os limites do conhecimento como método para a afirmação da realidade e efetividade dos conteúdos da fé racional (KrV, B XXX). 

1 A escatologia como teologia fundamental

Kant classifica a teologia de dois modos similares. Na sétima seção da Crítica da Razão Pura (1781), intitulada “Crítica de toda a teologia fundada em princípios especulativos da razão”, Kant distingue a teologia em theologia revelata e a theologia rationalis. A teologia revelada apela à fé numa tradição religiosa e, eventualmente, se apoia na autoridade de escritos sagrados. A teologia racional, por sua vez, concebe de dois modos o seu objeto: a teologia transcendental, através da razão pura, mediante conceitos transcendentais (ens originarium, ens realissimum, ens entium) e a teologia natural, mediante um conceito que deriva da natureza da nossa alma. Enquanto a teologia transcendental concebe Deus como causa do mundo, sem qualificar tal causa como necessária ou livre; a teologia natural define Deus como autor do mundo (KrV, A 631\B 659). A teologia natural deduz a existência e os atributos de Deus a partir da constituição, ordem e unidade do mundo. Há, pois, nesse mundo duas espécies de causalidade: a natureza e a liberdade. A teologia natural “ascende deste mundo até à inteligência suprema como ao princípio de toda a ordem e perfeição, seja na natureza seja no domínio moral. No primeiro caso denomina-se teologia física, no último, teologia moral” (KrV, A 632\B 660). Na Lições sobre a doutrina filosófica da religião, ministradas provavelmente no semestre de inverno de 1783/1784, Kant afirma que há dois tipos de teologia: a empírica e a racional. A teologia empírica só é possível através de uma revelação divina, pois Deus não pode ser objeto de uma experiência. A teologia racional pode ser: a) transcendental, na qual Deus é pensado como ens originarium [causa do mundo]b) natural, na qual Deus é concebido como summa intelligentia [criador livre do mundo]e c) moral, na qual Deus é representado como summum bonum [legislador do mundo em relação às leis morais] (V-Phil-Th, AA 28:1001-1002).

A teologia revelada é absolutamente problemática. Kant a considera indiscernível. “Se Deus falar realmente ao homem, este nunca consegue saber se é Deus que lhe fala. Com efeito, é absolutamente impossível que, por meio dos sentidos, o homem tenha de apreender o infinito, distingui-lo dos seres sensíveis e reconhecê-lo em qualquer coisa” (SF, AA 07: 63)[3]. Ainda que a consideremos discernível, a autorevelação de Deus seria um fato sintético e a posteriori. A “revelação como experiência” tem validade particular, isto é, para aqueles a quem chegou. Ademais, é contingente, pois não implica que “o objeto crido tenha de ser assim e não de outro modo”. Não há um critério de verdade empírica, por isso “é possível haver várias” revelações e “sobre doutrinas de fé históricas jamais se pode evitar a disputa” (RGV, AA 06: 115). Kant ataca a fé feiticista – que inventa meios da graça como substitutivo para o empenho moral – considerando-a ilusão religiosa [Religionswahn]. Kant nota uma “antinomia da razão humana consigo própria” [Antinomie der menschlichen Vernunft mit ihr selbst] no tocante à relação entre a fé racional pura e a fé histórica: a “fé religiosa pura” [reinen Religionsglauben] deve ser acrescentada por uma fé histórica ou deve a fé histórica transformar-se em “fé religiosa pura”? (RGV, AA 6:116). Kant vislumbra o fim da religião histórica pela gradual libertação da pura religião racional de todos os fundamentos empíricos de determinação e de todos os estatutos que reúnem provisoriamente os homens para o fomento do bem (RGV, AA 06: 121).

Kant erige a fé racional pura, cuja marca é o caráter apriorístico e universal, como critério que distingue a verdadeira da falsa religião. O conceito de “fé racional pura” significa oposição à tese de que a irracionalidade é inerente à fé. Representa também contestação à noção, cara à escolástica, de que fé e razão, ainda que harmoniosas, sejam magnitudes distintas e independentes. Se a fé está radicada na razão, a razão não pode ignorá-la sem entrar em contradição consigo mesma. A fé histórica ou estatutária, inclusive a religião cristã, está em função da fé racional pura, entendida como fé moral (RGV, AA 6: 152). A fé eclesial estatutária se acrescenta à fé religiosa pura como veículo e meio de união pública dos homens para o fomento da última” (RGV, AA 6: 106). No ensaio Sobre o fracasso de toda tentativa filosófica na Teodiceia (1791), Kant afirma que Deus se torna intérprete de sua vontade manifesta na criação através de nossa própria razão. A razão invocada não é a teórica, mas a prática. A legislação moral oferece um sentido à letra de sua criação. A fé racional é autodisciplina e representa um princípio negativo no uso da faculdade de conhecer, “a compreensão dos limites necessários das nossas pretensões com respeito àquela sabedoria que para nós é demasiado alta” (MpVT, AA 08: 263). Kant encontra em Jó, que se manteve fiel apesar dos insondáveis desígnios de Deus, o exemplo mais claro de fé racional, pois “ele demonstra que não funda a sua moralidade sobre a crença, mas que funda a sua crença sobre a moralidade [...] não funda uma religião de súplica, mas uma religião de bons costumes” (MpVT, AA 08:267)[4].

Uma teologia física corresponderia a uma teologia especulativa, para o que não haveria fundamento em Kant. No uso meramente especulativo da razão, Deus se mantém como um simples ideal, um conceito que remata todo o conhecimento humano. A realidade desse conceito não pode ser provada, tampouco refutada por via teorética. Kant admite que somente uma teologia moral poderia superar a problematicidade da teologia transcendental no âmbito teorético (KrV, A 641\B 669). Na Lições, a teodiceia é inserida numa teologia moral, elaborada a partir de um conceito mínimo e prático de Deus. Kant defende uma theologia ectypa por oposição a uma theologia archetypa. A theologia ectypa é o sistema de cognição sobre Deus a partir do que é encontrado na natureza humana. Embora possa afirmar-se como sistema, uma vez que os conteúdos oferecidos pela razão podem ser estruturados numa unidade, trata-se de um conhecimento precário. O interesse especulativo é pequeno em comparação com o prático. Ademais, a especulação sobre um objeto tão sublime pode induzir a erro. A rigor, a theologia archetypa, enquanto soma total de todas as possíveis cognições sobre Deus, não é possível para a razão humana, nem mesmo através de revelação (V-Phil-Th, AA 28: 995). A cognição da theologia ectypa tem interesse prático, isto é, não nos torna mais instruídos, mas melhores, mais honestos e mais sábios. A existência do ser supremo, que pode e nos fará felizes, fortalece nossas disposições morais.

Tanto na Crítica da Razão Pura quanto na Lições sobre a doutrina filosófica da religião, Kant se define teísta. O ateu não admite nenhuma teologia; o deísta só reconhece a teologia transcendental e o teísta é aquele que adota a teologia natural e/ou a moral. O problema do mal só faz sentido à luz da premissa teológica da existência de Deus como criador sábio e bom. Para Kant, somente um teísta pode admitir, de alguma forma, que Deus seja um criador sábio e bom. Deus e a teologia são apresentados como decorrência necessária da moralidade (V-Phil-Th, AA 28: 995). A teologia moral, embora não tenha pretensão teorética, é a única que oferece um conceito determinado de Deus (V-Phil-Th, AA 28: 1073). A conclusão sobre Deus e sua relação com o mundo é similar as de Leibniz e Agostinho. Deus, ente originário que contém em si o fundamento da possibilidade de todas as coisas, produziu o mundo através do conhecimento e por meio de uma vontade livre (V-Phil-Th, AA 28: 1001). O mundo é o melhor dentre os mundos possíveis, pois “se fosse possível um mundo ainda melhor que aquele que Deus quis, então deveria também ser possível uma vontade ainda melhor que a divina” (V-Phil-Th, AA 28: 1097). O mundus optimus de Kant não é uma concessão à metafísica. A cisão entre ontologia e ética implica a desconexão entre a perfeição metafísica e a perfeição axiológica. Da perfeição metafísica não se pode inferir a suma bondade. As perfeições tornam-se boas na medida em que o homem se serve delas com a Gesinnung para realizar um fim compatível com a ideia de sumo bem (V-Met, AA 28: 211-212)[5].

A teodiceia que emerge das Lições sobre a doutrina filosófica da religião refere-se a predicados morais de Deus, o ser que dá realidade objetiva aos deveres morais: santidade (Heiligkeit), bondade (Gütigkeit) e justiça (Gerechtigkeit). Tais atributos são dedutíveis da ideia de vontade divina, na medida em que coincidem com a representação moral de todo ser racional. Pela lei moral conhecemos a Deus como legislador santo, provedor bondoso e juiz justo (V-Phil-Th, AA 28: 1073). A teodiceia impõe-se como confutação à hipótese de uma contradição entre o curso da natureza e da moralidade.                              

A primeira objeção é contra a santidade de Deus. Se Deus é santo e odeia o mal (Böse), então de onde vem este mal, que é objeto de aversão para todo ser racional e fundamento de toda aversão intelectual? A segunda objeção é contra sua benevolência. Se Deus é benevolente e quer que o ser humano seja feliz, então de onde vem o mal físico (Uebel) no mundo, que é objeto de aversão para todos os que se encontram com ele e se constitui fundamento de aversão física? A terceira objeção é contra a justiça de Deus. Se Deus é justo, de onde vem a distribuição desigual do bem e do mal no mundo, a qual não se adequa, de fato, com a moralidade? (V-Phil-Th, AA 28: 1076)                                         

O problema sobre a origem do mal moral (Böse) e do mal físico (Uebel) é respondido com grande acuidade e em variadas perspectivas em diversas obras. As Lições sobre a doutrina filosófica da religião (1775/1776), Lições de antropologia (1775/1776), Ideia de uma História Universal com o Propósito Cosmopolita (1784), Início Conjectural da História Humana (1786), As anotações nas observações sobre o sentimento do belo e do sublime (1764) e A religião nos limites da simples razão (1793) testemunham a ampla e profunda abordagem sobre variadas e importantes perspectivas do problema da liberdade. No entanto, a teologia kantiana – assim como a teodiceia – encontra seu fundamento numa necessidade moral. A terceira objeção – contra a justiça de Deus – trata de uma exigência intrínseca da lei moral: a realização do sumo bem (felicidade proporcional à moralidade). A melhor resposta no âmbito da teodiceia não satisfaz a necessidade moral. A lei exige que a questão encontre solução numa escatologia, do contrário é ameaçada de reductio ad absurdum. Se o sumo bem não é possível, então a lei moral que ordena sua promoção dirige-se a fins vazios e imaginários e deve, portanto, ser pensada como intrinsecamente falsa. A teoria da liberdade deteriorar-se-ia numa moral do escravo, manifestada por uma razão que institui regularmente sua própria impotência. A deontologia kantiana seria esvaziada teologicamente, pois o empenho moral resulta insuficiente para produzir o sumo bem prefigurado na lei. A atividade generativa da razão que constrói a lei moral como impossibilidade permanente e submete o homem a uma autossujeição inevitável deveria ser considerada uma ilusória e perigosa ficção. Se a lei moral for reduzida ao absurdo, a teologia é destituída de fundamento e uma teodiceia torna-se desnecessária.

 A teologia fundamental, elaborada desde a racionalidade prático-teleológica, tem conteúdo escatológico e fundamento na necessidade moral. A denominação kantiana “teologia moral” pode induzir a equívoco. A rigor, a teologia moral clássica trata das condições de legitimidade, exequibilidade e imputabilidade das normas e princípios morais. Quando invocado no âmbito da teologia moral, Deus é o fundamento da veracidade da lei natural e o revelador da lei divina positiva. A moral cristã não dispensa a graça divina como condição de possibilidade para a realização moral. A autonomia moral kantiana, por sua vez, exclui qualquer dado extrínseco à vontade humana como arbitrário. As leis morais são assumidas como mandamentos divinos, se entendidas como leis essenciais de cada vontade livre em si. Kant afirma de modo contundente que a moral, enquanto fundamentada na liberdade e na lei, não necessita de Deus, nem de qualquer fim, pois a razão pura prática é suficiente para determinar a vontade (RGV, AA 6: 3-4). No entanto, admite que, sem uma representação do fim, não há nenhuma determinação da vontade. A pedra fundamental da teologia é o juízo teleológico-prático a priori. A representação teleológica não é posta como fundamento do arbítrio ou como condição prévia ao propósito, mas como consequência necessária das máximas adotadas em conformidade com a lei moral em ordem a um fim [finis in consequentiam veniens] (RGV, AA 6: 4). Embora o fim não seja fundamento (jamais poderia ser o motivo de uma ação conforme a lei), sua representação é condição de possibilidade para a determinação da vontade. Um arbítrio que não tenha uma representação teleológica “sabe porventura como, mas não para onde tem de agir, não pode bastar-se a si mesmo” (RGV, AA 6: 4)[6]. Trata-se de uma representação teleológica necessária, o “para onde” construído pela ação conforme o dever.

A representação teleológica, exigida como condição de possibilidade para a determinação da vontade, é escatológica. Deus é apresentado como objeto da esperança, pois somente uma vontade moralmente perfeita e onipotente pode assegurar o sumo bem como efeito do que a lei impõe como dever. A lei que remete à moralidade tem de remeter, desinteressadamente e a partir de uma simples razão imparcial, à felicidade adequada àquela moralidade. A lei se refere diretamente à moralidade, que depende da liberdade humana; e indiretamente à máxima beatitude, que demanda a existência de Deus como “ser superior, moral, santíssimo e onipotente, o único que pode unir os dois elementos desse bem supremo” (RGV, AA 6: 5). A legislação da razão pura conduz à pressuposição da existência de uma causa adequada ao efeito exigido pela moralidade, isto é, a postular a existência de Deus como necessariamente pertencente à possibilidade do sumo bem (KpV, A 223-224). Deus é, sob essa perspectiva, a “ideia de um objeto que contém em si a condição formal de todos os fins [...] o fim que contém a condição iniludível e, ao mesmo tempo, suficiente de todos os outros é o fim último” (RGV, 6: 5-6). Deus não é o motivo moral, mas causa da realidade objetiva do conceito de bem supremo (WDO, AA 8: 139). A ideia de Deus que na esfera teorética é meramente regulativa, na esfera prático-teleológica “não é vazia porque alivia a nossa natural necessidade de pensar um fim último qualquer que possa ser justificado pela razão para todo o nosso fazer e deixar tomado no seu todo, necessidade que seria, aliás, um obstáculo para a decisão moral” (RGV, AA 6: 5). Se é verdade que a afirmação prática desse fim não acrescenta nenhum dever, é certo, porém, que a moral não pode ser indiferente “à combinação da finalidade pela liberdade com a finalidade da natureza, combinação de que não podemos prescindir” (RGV, AA 6: 5).

A imortalidade da alma também é defendida em chave escatológica no cânone da Crítica da Razão Pura. É preciso admitir, como ideia da razão praticamente necessária, um “reino da graça, onde nos aguarda toda a felicidade, a menos que nós próprios nos limitemos na nossa parte de felicidade, ao tornarmo-nos indignos de ser felizes” (KrV, A 812/B 840). A argumentação kantiana se apoia ora na inadequação entre “os excelentes dons da natureza humana e a brevidade da vida” (KrV, A 827/ B 855), ora na necessidade de “unidade dos fins sob a lei moral”, para que os justos possam ter a proporção de felicidade compatível à dignidade de sua moralidade (KrV, A 828/ B 856). “Deus e uma vida futura são, portanto, segundo os princípios da razão pura, pressupostos inseparáveis da obrigação que nos impõe essa mesma razão” (KrV, A 811/ B 839). O vacilo sobre essas matérias de fé derruba os princípios morais e nos tornaria dignos de desprezo (KrV, A 828/ B 856).

Na carta de Kant a Stäudlin, de 4 de maio de 1793, Kant associa a teologia e a religião a seu programa filosófico, como resposta à questão da esperança. A escatologia é a teologia fundamental, base para toda reflexão teológica possível. A relação entre a razão pura prática e o cristianismo é apresentada como parte do problema crítico-transcendental. 

O meu plano, já feito há algum tempo, para o tratamento do campo da filosofia pura que me compete baseava-se na resolução das três tarefas: 1) O que posso eu saber? (metafísica) 2) O que devo fazer? (moralidade) 3) O que posso esperar? (religião); que deveria ser seguido finalmente pelo quarto: O que é o homem? (antropologia; sobre a qual já ensinei anualmente na universidade por mais de 20 anos). Com o escrito seguinte, A religião nos limites da simples razão, tentei completar a terceira parte do meu plano. Neste trabalho procedi conscientemente e com genuíno respeito pela religião cristã, mas também pelo princípio de uma adequada franqueza, nada escondendo, antes apresentando abertamente como creio que seja possível a unificação do cristianismo com a mais pura razão prática. (Br AA 11: 429)

A lei moral conduz à ideia do sumo bem. No entanto, a teologia não é redutível à moralidade, pois o conceito de Deus como condição de possibilidade do bem supremo vai além do conceito de dever. “Se a proposição ‘Há um Deus’, por conseguinte ‘Há um bem supremo no mundo’, tiver (como proposição de fé) de provir somente da moral, é uma proposição sintética a priori” (RGV, 6: 6). A proposição "faz do sumo bem possível no mundo o teu fim último" é uma proposição sintética a priori, que é introduzida pela própria lei moral e pela qual, no entanto, a razão prática se estende para lá da lei. O conceito de dever não pressupõe nenhuma matéria do arbítrio, mas somente leis formais do próprio arbítrio. A proposição “há um Deus”, logo há um bem supremo no mundo” acrescenta um efeito que não está contido na lei moral. Embora a teologia se fundamente na moral, ela não pode desenvolver-se analiticamente a partir da moral. O imperativo categórico exige a aceitação da existência de Deus, o que vai efetivamente além da admissão da mera possibilidade, prevista na dialética transcendental. Dessa forma, a moral conduz pelo conceito de sumo bem à religião e à teologia (KpV, A 233). 

2 Da fé racional à fé reflexionante

No ensaio Que significa orientar-se no pensamento?, Kant fundamenta a legitimidade do pensamento sobre matérias incognoscíveis. Orientar-se no pensamento significa determinar-se no assentimento segundo um princípio subjetivo da mesma razão, em virtude da insuficiência dos princípios objetivos da razão. Trata-se do alargamento do puro conceito do entendimento sob regras do pensamento em geral. Neste caso, dá-se uma omissão da ação concreta do entendimento e até mesmo da pura intuição sensível. Kant ilustra o pensamento como um orientar-se “às escuras num quarto que me é conhecido, quando consigo agarrar um único objeto, cujo lugar tenho na memória” (WDO, AA 8: 135)[7]. Nesse caso, faço desse objeto a referência a partir da qual aplico meu senso de direção para determinar a posição das outras coisas. A orientação então só é possível “segundo um princípio de diferenciação subjetiva [nach einem subjectiven Unterscheidungsgrunde]”. Enquanto o conhecimento implica a aplicação de um conceito a uma intuição sensível (princípio objetivo de diferenciação), o pensamento implica objetos que não são passíveis de uma intuição. Então o princípio de diferenciação subjetiva que lhe resta é o sentimento de necessidade [Bedürfnis] da própria razão. A necessidade, embora chamada de subjetiva, se refere à universalidade da espécie e não pode ser aplicada apenas de modo casuístico a um determinado contexto pessoal ou sociocultural. A necessidade da ligação sistemática entre a natureza e a liberdade deve representar a possibilidade lógica e transcendental de realização da liberdade na natureza.

Kant pretende depurar o exercício da faculdade do pensamento para evitar que sirva ao entusiasmo fantasista, ao pretenso e misterioso sentido da verdade que conduza ao total destronamento da razão devido a seus próprios ataques sofísticos. Somente a “autêntica e pura razão humana” (bloß die eigentliche reine) serve como princípio de diferenciação subjetiva, somente ela é referência e parâmetro para o exercício do pensamento. A revelação e a tradição religiosas obtêm sua legitimidade na medida em que estão em consonância com a razão (WDO, AA 8: 134). A atividade designada pensamento distingue-se da especulação arbitrária pelo fato de resultar de uma necessidade de juízo inerente à razão. A mera especulação, por sua vez, caracteriza-se pela arbitrariedade da razão sobre o querer julgar sobre algo. A atividade do pensamento não visa, portanto, ao suprassensível em geral e não se estende até onde a razão não discerne necessidade alguma de ampliar-se ou de assumir algo como existente. O pensamento deve atuar quando somos compelidos a julgar e realizamos o assentimento em virtude de motivos subjetivos do uso da razão, pois nos faltam os objetivos (WDO, AA 8: 139). O conceito objeto do pensamento deve ser isento de contradições e útil para o uso empírico de nossa razão. Se o objeto não atende a esses dois requisitos, não é pensável. Isto é, em vez de pensar cederíamos ao devaneio no incomensurável e obscuro espaço do suprassensível (WDO, AA 8: 137).

A necessidade da razão pode considerar-se de duas maneiras: no uso teórico e no uso prático. No uso teórico, o conceito de Deus é um objeto necessário da razão. A razão tem a necessidade de pôr o conceito do ilimitado como fundamento do limitado e sem a admissão de um criador inteligente a razão se encontra em dificuldades para aduzir um fundamento inteligente da ordem, beleza e harmonia do universo. Kant considera a necessidade no uso prático muito mais importante, porque é incondicionada e somos constrangidos a pressupor a existência de Deus. A lei moral demanda a conciliação da liberdade com a natureza. A licença semântica para o suprassensível encontra seu fundamento na Crítica da Razão Pura, cuja contribuição positiva é, segundo Kant, a permissão para que a filosofia prática se estenda “para além dos limites da sensibilidade”, sem que, por isso, a razão entre em contradição consigo mesma (KrV, B XXV).

Kant rejeita as expressões “pretensão da sã razão”, “discernimento racional” e “juízo de inspiração racional” como inapropriadas para definir a atividade do pensamento. Para Kant, nenhuma designação é mais conveniente que “fé racional”. Qualquer fé, mesmo a histórica (expressa numa instituição religiosa), deve ser racional, pois a razão é o critério da verdade. No entanto, toda a fé é, pois, um assentimento subjetivamente suficiente, mas no plano objetivo, com consciência de sua insuficiência; portanto, contrapõe-se ao saber. A fé racional nunca será um saber, pois seus fundamentos não são objetivamente válidos (WDO, AA 8: 140). O pensamento não dá azo ao entusiasmo delirante da razão dogmática, que ultrapassa os limites da experiência e afirma conhecer. Deus é assumido como um postulado. Na ordem teórica, o postulado é uma proposição indemonstrável que oferece uma regra para a construção de um objeto. Na ordem prática, o postulado é suposto a partir da lei moral, uma decorrência indemonstrável da ética. Os postulados têm a significação de evidências e não de imperativos morais. Porque está submetido à lei moral, o homem se vê coagido à crença na imortalidade da alma e na existência de Deus. 

Na Crítica da Faculdade do Juízo, Kant afirma que “as coisas conhecíveis são de três espécies: coisas da opinião [opinabile], fatos [scibile] e coisas de fé [mere credibile]” (KU, AA 5: 467)[8]. As coisas de opinião são aquelas de modo algum cognoscível, qualquer pretensão de conhecimento a respeito delas é mera fantasia. Os fatos são os objetos para os conceitos, cuja realidade objetiva pode ser demonstrada. As coisas de fé são os objetos que têm de ser pensados a priori, em relação ao uso conforme ao dever da razão pura prática, seja como consequências, seja como fundamentos, mas que são transcendentes para o uso teórico da mesma. A liberdade “é a única dentre as ideias da razão para cujo objeto é um fato <Tatsache> e que tem de ser contada entre os scibilia” (KU, AA 5: 468). O bem supremo deve ser considerado coisa de fé, ancorada na liberdade como fato que exige a realização de um fim.

Desta espécie é o bem supremo no mundo, atuando mediante a liberdade, cujo conceito não nos pode ser demonstrado de modo suficiente, segundo a sua realidade objetiva, em nenhuma experiência possível, por conseguinte no uso racional teórico. Porém o uso daquele conceito é-nos ordenado no sentido da melhor realização possível daquele fim, mediante a razão prática pura e, em consequência, tem de ser admitido como possível. Este efeito que nos é ordenado em conjunto com as únicas condições da sua possibilidade por nós pensáveis, nomeadamente a da existência de um Deus e da imortalidade da alma, são coisas de fé (res fidei) e na verdade as únicas dentre todos os objetos que assim podem ser chamadas. (KU, 5: 469)

A incredulidade racional, entendida como a máxima indiferença da razão em relação à sua própria necessidade, ou seja, a renúncia à fé racional, priva as leis morais de toda a força de móbil e toda a autoridade, o que redunda no não reconhecimento de nenhum dever. A experiência moral não nos permite acesso conceitual a Deus, mas a tensão teleológica demanda algum tipo de pensamento representacional animado pela fé racional que impulsione o agente moral na direção do Deus vivo. A fé racional, base de qualquer outra fé e até de toda revelação, é a bússola ou o poste indicador que orienta o pensador especulativo em suas incursões ao suprassensível tanto do ponto de vista teórico quanto prático (WDO, AA 8: 142).

Em várias obras, especialmente em A religião nos limites da simples razão, Kant exercita o pensamento sobre matérias transcendentes à razão teórica: Deus, a liberdade, a imortalidade, o mal, a graça, a salvação. Kant chama de fé reflexionante o discurso prático-teleológico constituído de ideias hiperbólicas e feito por necessidade racional. Trata-se ideias moralmente transcendentes, isto é, que extrapolam o conteúdo deduzido a priori e qualificável como “ideia religiosa praticamente necessária” [„praktisch nothwendige Religionsidee“] (RGV AA 6: 145). São ideias elaboradas pela razão para suprir a incapacidade de satisfazer a sua necessidade moral, mas sem delas se apropriar como conhecimento ou postulado necessário. Pode-se reconhecer, portanto, distintas abordagens discursivas com diferentes condições de legitimidade:   conhecimento (razão teórica), fé racional (razão prática) e pensamento/fé reflexionante (razão teleológica).

A razão, na consciência da sua incapacidade de satisfazer a sua necessidade moral, estende-se até ideias hiperbólicas [überschwenglichen Ideen] que poderiam suprir tal deficiência, mas sem delas se apropriar como de uma posse ampliada. Não contesta a possibilidade ou a realidade efetiva dos objetos dessas ideias, mas não pode acolhê-las nas suas máximas de pensar e de agir. Espera até que, se no campo insondável do sobrenatural existe ainda algo mais do que o que ela para si consegue tornar compreensível, algo que todavia seria necessário para suplemento da sua impotência moral, este, embora incógnito, virá em ajuda da sua boa vontade, com uma fé que se poderia denominar (acerca da sua possibilidade) fé reflexionante, já que a fé dogmática, que se proclama como um saber, lhe parece dissimulada ou temerária; pois arrojar com as dificuldades contra o que por si mesmo (praticamente) se mantém firme, quando elas concernem a questões transcendentes, é só um afazer acidental (parergon). (RGV, AA 6: 52) 

A atenção a essa diferença de perspectiva discursiva, assim como a seus distintos estatutos, evitaria os caminhos sem saída de uma interpretação monolítica da razão kantiana. Grande parte das polêmicas, enigmas e contradições em torno das doutrinas expostas em A religião nos limites da simples razão deve-se à insistência em interpretar os textos sobre temas teológicos e religiosos à luz das condições de legitimidade da razão teórica. Na verdade, não conseguiríamos reduzir a razão pluridimensional a um único estatuto procedimental. Por exemplo, o conceito de filosofia transcendental, apresentado no prefácio à segunda edição da primeira crítica, é tão estreito que não comporta os princípios e conceitos fundamentais da moralidade. No âmbito da Crítica da Razão Pura, o componente empírico da moralidade é considerado bastardo e jamais assimilado pela filosofia transcendental. É esse o sentido da afirmação de que a questão da liberdade também diz respeito à psicologia, embora deva ser resolvida pela filosofia transcendental (KrV, A 15/B 29. A 535/B 563). Somente no âmbito da racionalidade prática é possível uma espécie de sensação (Art von Empfindung) produzida unicamente pela legislação da razão prática, o sentimento de respeito pela epifania da lei moral (KpV A 56). A razão teórica, prática, estética e teleológica possuem princípios diversos e condições de legitimidade diferentes.  

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A preocupação teológica sempre esteve no cerne do objetivo kantiano desde o início do projeto crítico. É errôneo considerar que Kant seja ateu, agnóstico ou deísta com base na recepção de seu sistema ou em presumidas consequências de sua doutrina sobre a cultura. Kant definiu-se como teísta, no sentido em que a experiência moral envolve a relação com um Deus vivo. Privar a ação moral da representação teleológica necessária à representação da vontade conduz a frustração do fim preconizado na lei. A teologia que emerge do fato moral pode ser entendida como uma teleologia da liberdade, tendo, portanto, caráter eminentemente moral.

Embora a teologia se fundamente no fato moral, ela não é redutível à moralidade. Antes, a teologia fundamental de Kant é radicada num juízo teleológico-prático a priori e seu conteúdo é escatológico. A escatologia serve como o núcleo de irradiação do pensamento teológico, que mantém como critério imprescindível a fé racional. A teologia parte dos conteúdos da fé racional para projetar uma imagem moral do mundo pelo pensamento. O pensar é uma atividade consciente de sua insuficiência objetiva, mas realizada por necessidade [Bedürfnis] racional. Isso justifica o fato de Kant ter abordado temas peculiares à teologia, embora não sejam passíveis de conhecimento. A teologia crítica tem estatuto no sistema kantiano, não se trata de uma reflexão ocasional e espúria. Pensamento e conhecimento representam instâncias que não se completam, pois representam perspectivas distintas da racionalidade, tampouco se contradizem; antes, complementam-se sistematicamente.  

BIBLIOGRAFIA

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HENRICH, D. The moral image of the world. In: ______. Aesthtic judgment and the moral image of the world. Standford: Standford University Press, 1992. pp. 3-28.

KANT, Immanuel. Kants Gesammelte Schriften. Herausgegeben von der Deutschen Akademie der Wissenschaften, 29v. Berlin: Walter de Gruyter, 1902.

_____. Crítica da Razão Prática. Tradução, introdução e notas de Valério Rohden. Edição bilíngue. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

_____. Crítica da Razão Pura. Tradução de Manuela Pinto dos Santos e Alexandre Fradique Morujão. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001.

_____. Crítica da Faculdade do Juízo. Tradução de Valério Rohden e António Marques. Rio de Janeiro: Gen e Forense Universitária, 2012.

_____. Lectures on Metaphysics. Translated and edited by Karl Ameriks and Steve Naragon. Cambridge: Cambridge University Press, 1997.

_____. Lectures on Religion. In: Religion and Rational Theology. Translated and edited by Allen Wood and George di Giovanni. New York: Cambridge University Press, 1996, pp. 335-452.

_____. Que significa orientar-se no pensamento? Tradução de Artur Morão. Covilhã: LusoSofia: Press, 2008.

_____. A Religião nos limites da simples razão. Tradução de Artur Morão. Edições 70, Lisboa, 2008.

KANT, Sobre o fracasso de toda tentativa filosófica na teodiceia. Tradução e notas de Joel Thiago Klein. In: Studia Kantiana. 19 (dez. 2015): pp. 153-176.

PALMQUIST, Stephen. Kant’s Critical Religion. Aldershot, UK: Ashgate Publishing, 2000.

PRAUSS, Gerold. Kant und das Problem der Dinge an sich. Bonn: Bouvier Verlag, 1989.

WOOD, Allen. Kant´s Deism. In: ROSSI, Philip. Kant’s Philosophy of Religion reconsidered.  

Bloomington: Indiana University Press, 1991, pp. 1-21.

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Notas

[1] As obras de Kant serão citadas segundo as normas da Akademie-Ausgabe, seguindo o que foi estabelecido pela Sociedade Kant Brasileira, disponível em Normas para citações : Sociedade Kant Brasileira. A Crítica da Razão Pura será citada segundo as edições A (1781) e B (1789). A Crítica da Razão Prática será citada de acordo com o texto original da primeira edição (1788). A citação será feita na seguinte ordem: abreviatura da obra, número do tomo e número da página. As traduções utilizadas estão referidas na bibliografia, assim como na primeira citação da obra, nas notas do texto. As traduções das demais obras são de minha responsabilidade As siglas usadas no artigo são as seguintes: Br – Correspondências, KpV - Crítica da Razão Prática, KrV - Crítica da Razão Pura, KU - Crítica da Faculdade do Juízo, MpVT - Sobre o fracasso de toda tentativa filosófica na teodiceia, RGV - Religião nos limites da simples razão, SF - O Conflito das faculdades, V-Met - Lições de Metafísica, V-Phil-Th - Lições sobre a doutrina filosófica da religião e WDO - Que significa orientar-se no pensamento?

[2] Crítica da Razão Pura. Tradução de Manuela Pinto dos Santos e Alexandre Fradique Morujão. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001.

[3] KANT, O Conflito das faculdades. Tradução de Artur Morão. Lisboa: Edições 70, 1993.

[4] KANT, Sobre o fracasso de toda tentativa filosófica na teodiceia. Tradução e notas de Joel Thiago Klein. In: Studia Kantiana. 19 (dez. 2015): pp. 153-176.

[5] O termo Gesinnung é traduzido por Artur Morão, cuja tradução da Die Religion innerhalb der Grenzen der bloßen Vernunft utilizamos nesta pesquisa, como “disposição”. Também Mary Gregor traduz por “disposition” em sua tradução da Doutrina da Virtude. José Lamego e Alain Renaut traduzem Gesinnung como intenção. Guido de Almeida traduz Gesinnung como “atitude” em sua tradução da Fundamentação da Metafísica dos Costumes.Os dicionários apresentam como alternativas de tradução os termos “convicção”, “mentalidade”, “opinião” e “modo de pensar”. Parece-me que as alternativas não esgotam o significado de Gesinnung na filosofia prática kantiana, especialmente no âmbito da Religion, onde o termo é utilizado no contexto do mal radical (que remete à doutrina do pecado original e suas consequências para a natureza do arbítrio humano). Enquanto “disposição” remete à noção de hábito (Gewohnheit) adquirido ou exercitado como se fosse uma aptidão natural, disposição biológica da espécie, o que poderia representar uma base empírica nitidamente rechaçada por Kant para a caracterização da Gesinnung; “intenção” ou “postura” não parece denotar o caráter permanente da postura prática do sujeito. Por outro lado, os termos “convicção”, “mentalidade” e opinião” podem remeter a um processo intelectual antecedente à consolidação da Gesinnung, o que não cabe no voluntarismo kantiano, sobretudo na aplicação à doutrina do mal radical, onde a Gesinnung é constituída por ato realizado fora do tempo, antes de qualquer uso da liberdade na experiência e caracterizada como natureza do arbítrio (RGV, AA 6: 22). Visando conservar a riqueza semântica do termo, manteremos no artigo o termo alemão Gesinnung.

[6] KANT, A Religião nos limites da simples razão. Tradução de Artur Morão. Edições 70, Lisboa, 2008.

[7] KANT, Que significa orientar-se no pensamento? Tradução de Artur Morão. Covilhã: LusoSofia: Press, 2008.

[8] KANT, Crítica da Faculdade do Juízo. Tradução de Valério Rohden e António Marques. Rio de Janeiro: Gen e Forense Universitária, 2012.