A urgência da ortopráxis: condição para resgatar o humano
The urgency of orthopraxis: condition to rescue the human

Tiago Cosmo da Silva Dias
Mestre em Teologia pelo Programa de Estudos de Pós-Graduação em Teologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Contato: pe.tiagocosmo@gmail.com

Ney de Souza
Doutor em História Eclesiástica pela Universidade Gregoriana de Roma (PUG). Docente do Programa de Estudos Pós-Graduação em Teologia Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Contato: nsouza@pucsp.br


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Resumo: O artigo objetiva trazer à discussão a urgência de se resgatar a fé cristã mais como um modo de vida [ortopráxis] do que, propriamente, um conjunto de verdades de fé que precisa ser preservado [ortodoxia]. Parte-se do pressuposto de que a falta de humanidade, que hoje se assiste em tantas instâncias, inclusive na própria Igreja, brota de uma vivência da religião apenas como submissão a Deus, que impõe, para o ser humano, um conjunto de regras e costumes que precisam ser cumpridos como condição sine qua non para “ser feliz e chegar ao céu”. Esta relação, por sua vez, faz com que a “vida religiosa” aconteça quase que em separado da realidade, aumentando o tão agudo dilema entre fé e vida e comprometendo diretamente a fé cristológica do Deus que se fez homem para a todas e todos salvar. Como um exemplo concreto deste tipo de vivência, menciona-se o movimento Devolvam-nos a missa!, que emanou no auge da pandemia da Covid-19. 

Palavras-Chave: Ortopráxis; Humanidade; Religião; Cristianismo

Abstract: The article aims to bring to the discussion the urgency of rescuing the Christian faith more as a way of life [orthopraxis] than, properly, a set of truths of faith that needs to be preserved [orthodoxy]. It starts from the assumption that the lack of humanity, which is seen today in so many instances, including the Church itself, stems from an experience of religion only as submission to God, who imposes a set of rules and regulations on human beings. customs that need to be fulfilled as a sine qua non condition to “be happy and get to heaven”. This relationship, in turn, makes “religious life” happen almost separately from reality, increasing the acute dilemma between faith and life and directly compromising the Christological faith of the God who became man for all. and all save. As a concrete example of this type of experience, the movement Give us back the mass!, which emanated at the height of the Covid-19 pandemic, is mentioned.

Keywords: Orthopraxis; Humanity. Religion; Christianity

Introdução

O ponto de partida, ao menos a priori, para a análise aqui proposta é a perspectiva de José M. Castillo, desenvolvida na obra A humanidade de Jesus, uma continuidade do texto Jesus: a humanização de Deus, de 2015A premissa fundamental de Castillo é a de que só é possível alcançar a plenitude do divino na medida em que há um empenho para atingir a plenitude do humano; ou seja, só se pode chegar a ser mais divino fazendo-se mais humano. Para ele, essa proposta precisa invadir e impregnar toda a vida e a atividade da Igreja: a teologia, o sistema organizativo, a moral, as leis, a presença na sociedade e sobretudo e a vida e a espiritualidade dos cristãos. Trata-se, portanto, de uma proposta que brota do próprio centro da fé cristã: o Deus do cristianismo é o “Deus encarnado”, ou seja, o “Deus humanizado”, que se deu a conhecer em um ser humano, Jesus de Nazaré (CASTILLO, 2017, p. 10-11).

No entanto, segundo Castillo (2017, p. 34-36), hoje se vive o cristianismo numa ideia segundo a qual Deus não é encontrado na relação com o humano, mas na submissão ao divino, mediante a dominação e até a mortificação de tudo aquilo que expressa a “desastrada humanidade”. Essa ideia, por sua vez, expressa e contagia um critério organizativo da vida, da convivência e da sociedade, visto que afirma que o humano está viciado pelo pecado, causa maior de seu enfrentamento com Deus. Dessa forma, será somente à medida em que o ser humano se submeter, limitar-se e renunciar-se que poderá encontrar a Deus, relacionar-se com Ele e receber Seus benefícios, que finalmente levarão à salvação. 

Os cristãos, porém, deveriam partir de outros pressupostos. Como seguidores de Jesus de Nazaré, deveriam compreender que:

[...] a divindade de Jesus não é algo diferente de sua humanidade: a divindade de Jesus é justamente a profundeza transcendente de sua humanidade. Jesus era infinitamente mais humano que os outros homens, e é isso que valorizamos acima de tudo quando reconhecemos que é divino; quando o reconhecemos como nosso Senhor e nosso Deus (NOLAN, 1988, p. 199). 

A questão que se levanta, aqui, e o porquê da relação com Deus ainda se estabelecer numa espécie de submissão, quase que precisando anular a humanidade que, em si, parece não trazer nada de bom consigo, mas apenas a realidade do pecado. O questionamento é crucial porque compromete diretamente a fé cristológica e, além do mais, na medida em que acentua uma relação puramente vertical – homem e Deus -, “fecha os olhos” do ser humano para o chão da história, gerando um verdadeiro descomprometimento com os irmãos e as irmãs e promovendo a vivência do cristianismo como uma mera religião, ou seja, um simples cumprimento de ritos e normas. 

Neste ponto, uma outra questão ainda mais emergente se levanta: isso é o cristianismo?

A premissa fundamental: o distanciamento entre fé e vida

Historicamente, o Concílio de Trento (1545-1563) é “conhecido” sobretudo por ter sistematizado a doutrina católica. Não que, até então, nada houvesse de modo ordenado, no que diz respeito às verdades de fé, mas, pontualmente, no século XVI havia uma tentativa, quase que desesperada, diante dos questionamentos da Reforma Protestante (1517), de evitar deixar “brechas” para que a autoridade da Igreja e a fé não mais fossem contestadas. Esta postura de autoafirmação e, ao mesmo tempo, de “medo” diante dos possíveis percalços que pudessem aparecer a partir de então, fez nascer, na Igreja, uma sobreposição e uma exacerbada preocupação no que diz respeito ao zelo pela ortodoxia, compreendida nas suas mais diversas variantes como depositum fidei, tradição etc., e um distanciamento cada vez maior da ortopráxis, ou seja, do cristianismo como, efetivamente, um modo de vida.

Por ortodoxia, aqui, compreenda-se, partindo da própria etimologia (orthe doxa, ortho-doxia), a opinião reta; “designa a conformidade às doutrinas da Igreja e se aplica fundamentalmente à profissão de fé cristã, por oposição à heterodoxia ou à heresia” (LOSSKY, 2004, p. 1299). Ora, se ortodoxia é a opinião reta, a ortopráxis (ortho-praxis) poderia ser traduzida, igualmente, como a conduta correta. A ortodoxia precisa levar, necessariamente, o conjunto dos crentes à ortopráxis, embora, o que se assista, seja sempre um distanciamento entre a fé que se professa e aquela que se vive – o velho dilema entre “fé e vida”.

No fundo, as dificuldades e incoerências nesta relação sempre existiram no cristianismo. Já nos próprios escritos de Paulo, por exemplo, percebe-se que havia um certo distanciamento entre o que se havia recebido enquanto ensinamento e o que se vivia: o apóstolo precisou intervir, na comunidade de Corinto, em virtude das celebrações da Ceia do Senhor, das quais os mais pobres, na hora do banquete, eram excluídos (1Cor 11,20-21). Dali emana a célebre afirmação do apóstolo, de ter transmitido aquilo que ele mesmo havia recebido do Senhor (1Cor 11,23). No fundo, já se nota que, desde o início da era cristã, havia uma distância entre o que se recebia como ensinamento e o que se vivia, concretamente, como se o ambiente religioso fosse um “anexo” da vida, sem nenhuma implicância com a história.

Esta concepção é perigosa porque não só a religião se vive numa esfera quase que em separada do humano, como também o próprio Deus é encarado como o “todo-poderoso”, o “onipotente”, o “totalmente Outro”. Não que Deus não tenha, em si, esses atributos, mas exacerbá-los e olhá-Lo apenas sob esta ótica faz com que Deus permaneça distante, quase que inatingível, o que é perigoso, haja vista que “anunciar um Deus sem o mundo faz fatalmente nascer um mundo sem Deus” (BOFF, 2009, p. 52). De fato: 

[...] Permanece ainda na consciência e na inconsciência de muitos cristãos o Deus autoritário, intervencionista no campo das leis naturais, da liberdade, do psiquismo e da ética. [...] Ainda persiste, em relação ao humano, o medo da liberdade e a contínua desconfiança em relação ao corpo, à afetividade, à sexualidade e aos projetos científicos, como se a religião devesse sempre exercer um controle sobre tudo e sobre todos (GOMES, 2007, p. 64).

Na atualidade, este é o “deus” que está em voga. Diante Dele, é preciso que o homem apenas se curve, porque em nada se identifica com ele. A raiz deste “mal”, segundo Castillo (2017, p. 39), é a descontinuidade que existe entre a mensagem de Jesus e os ensinamentos do cristianismo primitivo. Neste sentido, para o autor (CASTILLO, 2017, p. 40), o apóstolo Paulo teve uma participação significativa, visto que os primeiros escritos que começaram a se difundir na Igreja nascente não foram os Evangelhos, mas sim suas cartas. Logo, as primeiras comunidades cristãs aprenderam suas crenças e esperaram vivê-las segundo os ensinamentos de Paulo e as práticas que ele mesmo foi impondo nas comunidades que fundava e dirigia.

O que isso diz, escreve Castillo (2017, p. 42), é que ao longo de seus primeiros anos o cristianismo se espalhou pelo império romano sem ter, na grande maioria de suas comunidades, nem ideia de Jesus, de sua vida ou de sua história. No máximo, seguramente se conheciam ditos soltos e muitas vezes fragmentados dos relatos que mais tarde foram redigidos e ordenados nos Evangelhos. Este dado é, no mínimo, “chocante”, porque significa que a maioria dos primeiros cristãos se formou e se organizou como tal sem poder conhecer a humanidade de JesusA conclusão, neste sentido, é óbvia: o cristianismo pôde sobreviver e se difundir mais como uma religião; e uma religião de redenção, centrada “na outra vida”, e não como uma forma de viver centrada ‘nesta vida’ (a forma de vida vivida e explicada por Jesus), com a esperança, claro, na plenitude da ressurreição futura, mas sempre começando pela humanização deste mundo. Todavia,

O homem e a mulher de fé não devem ser aqueles que desconfiam das realidades terrestres, ou que se concentram apenas no negativo, mas aqueles que, usando a racionalidade instrumental e compreendendo a autonomia do criado, são capazes de, com discernimento e profetismo, alargar e humanizar tais realidades fazendo uso dos critérios de responsabilidade e compaixão solidária. [...] A fé cristã, como qualquer tradição religiosa, não quer absorver-nos e anular-nos, senão afirmar-nos e potencializar-nos para agir (GOMES, 2007, p. 65-66).

No fundo, a própria Sagrada Escritura testemunha o quanto o olhar puramente verticalizado, sem implicâncias com a horizontalidade, pode ser “fatal”. No tempo de Jesus, os religiosos de seu tempo, apegados à letra, foram incapazes de enxergar o Deus que se une às dores e aos dramas da humanidade. É aqui que, de alguma forma, repousa a grandiosidade do cristianismo: se Deus se faz homem, significa que Ele se interessa por esta história, apesar de todas as suas tramas. Ao mesmo tempo, na medida em que homens e mulheres se dispõem a seguir este Deus encarnado, passam também a se comprometer com esta história. Em contrapartida, a religião, numa ótica puramente legalista e moralista, pode afastar essa perspectiva, pois “as instituições religiosas podem tornar-se, com seus dogmas, ritos e morais, o túmulo de Deus vivo” (BOFF 2006, p. 20). 

Reconhecer, como os apóstolos e os primeiros discípulos, no Cristo histórico o Filho de Deus é ver sua realidade divina por meio dos sinais que ele deu de si mesmo. E sabemos, pelos próprios relatos evangélicos, que, entre seus contemporâneos, muitos homens profundamente religiosos não apenas não acreditaram no que ele disse de si mesmo, mas o consideraram como blasfemador. A fé é certamente um engajamento, mas é também uma visão: é um engajamento que faz ver e uma visão que já é, por si mesma, uma atitude de engajamento (LADRIÈRE, 2007, p. 208).

A fé, portanto, comporta um engajamento existencial. Isso é o que Jesus procurou ensinar. Nele, não se vê mais o Deus do impossível, mas sim o Deus do possível: sendo plenamente humano, lhe foi possível realizar todas as maravilhas que realizou. Em outras palavras, para se apropriar de uma imagem do Antigo Testamento, a partir da encarnação do Filho de Deus o mar não mais vai se abrir, como no Êxodo, para que Seus seguidores o atravessem a pé enxuto. Quem O segue de verdade é capaz de atravessá-lo tal qual ele é[1]

O comprometimento da fé cristológica

A religião é o meio que o ser humano tem para se relacionar com Deus e encontrá-lo. A religiosidade, porém, pode ser vivida de duas maneiras: como observação de rituais ou como comportamento humanoLendo os Evangelhos, é evidente que, para Jesus, a religião consiste essencialmente em viver um comportamento tão autenticamente humano que leve o humano a ser integralmente humanoSomente assim se pode encontrar a Deus e manter com Ele a melhor relação possível (CASTILLO, 2017, pp. 46-47). No entanto, ainda hoje, o cristianismo é vivido mais sob a ótica da submissão, o que traz consequências bastante sérias:

[...] O olhar vigilante de Deus levou não poucas pessoas à conclusão de que a vida sem Ele deveria ser muito mais rica e sem as cicatrizes que encobrem a alegria de ser livre. [...] Esse Deus que foi expulso de muitos corações humanos na realidade não passava de um fantasma, um ser cruel, capaz de castigar eternamente, ser caprichoso e arbitrário, ajudando a uns e não a outros, conforme sua vontade, e disposto a condenar aqueles que não cumpriam alguns ritos e mandamentos formais. [...] O Deus que deve ser buscado e encontrado não deve ser melhor e mais justo que o ser humano, e não pior? (GOMES, 2007, p. 67).

No fundo, esta perspectiva comprometeu diretamente a fé cristológica, cuja essência pode ser expressa em termos joaninos: “A Palavra se fez carne e veio habitar em nós” (Jo 1,14); uma carne que, como ensina o próprio Paulo, é em tudo semelhante à nossa, exceto no pecado (Rm 8,3). Essa verdade profunda é o motor do cristianismo. Ora, se este é o cerne do cristianismo, logo:

[...] a fé [cristã] não é modo de falar ou de pensar, mas sim modo de viver, e só em uma práxis viva é que podemos ser adequadamente articulados. Reconhecer Jesus como nosso Senhor e Salvador só tem sentido se procurarmos viver como Ele viveu, e organizar nossa vida de acordo com os seus valores. Não precisamos teorizar a respeito de Jesus, precisamos é ‘reproduzi-lo’ em nossa época e em nossas circunstâncias. Ele mesmo não considerava a verdade como algo que nós ‘defendemos’ ou ‘afirmamos’, mas como algo que decidimos viver e experimentar. De modo que nossa busca, como a sua, é em primeiro lugar busca de uma ortopraxis (prática verdadeira), mais do que uma ortodoxia (doutrina verdadeira). Somente uma prática verdadeira da fé pode verificar a veracidade daquilo em que acreditamos (NOLAN, 1988, pp. 201-202).

Neste sentido, parece claro que a fé cristológica não pode e nem deve ser vivida como submissãoEsse tipo de mentalidade confirma a teologia de Paulo, cujo centro das preocupações não foi o sofrimento humano, como o foi a de Jesus, mas sim o pecado. Aos poucos, escreve Castillo (2017, p. 107), o projeto de Jesus foi deixando de ser um relato na história e passando a ser um dogma para a eternidade

De fato, o Deus que Paulo apresenta é um Deus que nos salva sacrificando a vítima, ao passo que o Deus de Jesus é um Deus que salva curando o que sofre. O Deus apresentado por Paulo sacrifica porque exige violência, sofrimento, sacrifício e morte para perdoar, redimir e salvar. Já o Deus apresentado por Jesus cura, porque se trata de um Deus que dá a vida, saúde e felicidade (CASTILLO, 2017, p. 70). Além disso, o Deus de Paulo odeia o pecado, ao passo que o de Jesus ama o pecador. Por isso, é possível afirmar que o centro das preocupações do Deus de Paulo é o pecado, que rompe a relação com o “divino”, enquanto o centro das preocupações do Deus de Jesus é o “sofrimento”, que rompe a relação (gratificante e positiva) com o “humano”. A conclusão desse raciocínio, na visão de Castillo, é simples: deve-se a Paulo o fato de, hoje, a religião tomar a dianteira do Evangelho. “E hoje estamos vendo (e vivendo) que a Igreja está organizada e é administrada de tal forma que as exigências sobre o cumprimento da religião são mais fortes e melhor gerenciadas do que as exigências sobre o cumprimento do Evangelho de Jesus” (CASTILLO, 2017, p. 118). Com isso, a fé cristológica permanece radicalmente incompleta (CASTILLO, 2017, p. 119), já que:

A busca da dignidade humana é a própria busca da dignidade de Deus, pois o acesso a Deus só é possível mediante o ser humano, compreendido em sua profunda dignidade. A dignidade de Deus está na sua glorificação, já realizada no evento da vida, paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo, cuja efetividade histórica ocorre à medida que é elevada a dignidade humana, concebida a partir da concepção teológica de que o ser humano é imagem e semelhança de Deus. Nesse sentido, a dignidade de Deus é resgatada à medida que se resgata a imagem de um Deus misericordioso que é compassivo, capaz de sofrer com os sofredores e de sentir suas dores assumindo o pathos do humanum inserido neste mundo. Esse Deus compassivo pode ser denominado também de um “Deus crucificado”, em que na cruz, o Filho de Deus emitiu um grito de abandono pelo Pai Deus, aprofundando a sua humanidade e, consequentemente se compadecendo dos crucificados deste mundo. Nessa compaixão está a irrupção do Reino de Deus, em que Deus se revela em seu senhorio e soberania, afirmando-se a partir dos crucificados, dos que estão no mais profundo pesar da história (GONÇALVES, 2021, p. 116).

Nesse sentido, a cristologia, de acordo com Castillo (2017, p. 120), “só pode ser aprendida seguindo a Jesusou seja, compartilhando sua forma de viver, vivendo com Jesus e levando a vida como Jesus levou a sua”. Logo, “a fé em Jesus sem o respeito e a compaixão pelo homem é mentira. Identificar-se com Jesus é identificar-se com todos os homens” (NOLAN, 1988, p. 202). 

Seremos herdeiros se tentarmos continuamente refazer a experiência de Jesus, se entrarmos no movimento de Jesus, nos sentirmos filhos e filhas de Deus e, ao mesmo tempo, olharmos os outros também como filhos e filhas, tratando-os com sumo respeito, como quem contempla, reverente, Deus nascendo dentro de cada um e fazendo de cada mulher, de cada homem, seus filhos e filhas, nossos irmãos e irmãs (BOFF, 2006, p. 26).

Se, de um lado, a verdade de que Deus nasceu de uma mulher movimenta o cristianismo e deveria fazer andar a humanidade, já que, como expressou Irineu de Lião, “o Verbo de Deus habitou no homem e fez-se filho do homem para acostumar o homem a Deus e acostumar Deus a habitar no homem” (IRINEU DE LIÃO, 1995, III, 20, 2), de outro, sublimar o mistério da encarnação reduz o cristianismo a nada. Por isso, hoje:

[...] É indispensável que se faça uma Teologia humanizadora, que torne as pessoas mais humanas e menos desumanas, diante de uma realidade que tem causado tanta dor e tanto sofrimento por toda a parte, em toda a humanidade. Um fazer teológico que proponha uma sociedade mais humanizada, sintonizada com o projeto do Reino de Deus para os seres humanos e o meio ambiente. Dentro desse aspecto, indispensável o acento em valores como a solidariedade e o serviço, na busca do atendimento das necessidades básicas das pessoas que perderam seus postos de trabalho, que se tornaram vulneráveis com a doença, que perderam seus entes queridos, que atuam na linha de frente ao combate da pandemia (STEPHANINI; BROTTO, 2021, p. 35).

No fundo, o que se quer dizer é que a preocupação com a ortodoxia faz esquecer, às vezes, o que é efetivamente substancial no cristianismo: o compromisso com os irmãos e as irmãs.

Mais religião do que cristianismo: o exemplo do Devolvam-nos a missa!

Para que a análise aqui proposta não se estabeleça apenas em ideias ou conceitos, vale citar um fato, a título de exemplo. Em 2020, o mundo se viu atravessado pela terrível pandemia da Covid-19, que ainda perdura. As infecções pelo novo coronavírus começaram a crescer e, como primeira medida, as nações se viram obrigadas a pensar num sistema de saúde que fosse capaz de atender os casos graves, aos quais, inclusive, nem mesmo a própria medicina sabia como proceder, visto que a enfermidade era nova e o vírus agia de forma diferente em cada pessoa; ou seja, não havia um “padrão” para os sintomas. Houve desde casos fatais até aqueles em que muitos se contaminaram e sequer ficaram sabendo, porque não houve manifestação de sintoma algum.

Como, porém, o caos começara a se instalar, visto a facilidade de transmissão do vírus, como medida de contenção foi proposto o distanciamento social e, em algumas nações, promoveram-se verdadeiros lockdowns, com fechamento dos próprios aeroportos. Naturalmente que, neste contexto, também as igrejas – independentemente da religião – precisaram ser fechadas, visto que aglomeram para a realização de seus cultos. O processo foi gradativo, mas quando a decisão foi tomada, ao menos aqui no Brasil, a Igreja precisou “relativizar” até o “mandamento” que prevê a participação dominical na celebração das missas, haja vista que, a partir de então, estas deveriam acontecer apenas de forma privada. Os cristãos foram convidados a, literalmente, descobrir um novo modo de participação, através das redes sociais ou das emissoras de TV.

O momento, porém, era delicado. Apesar do primeiro caso de Covid-19 ter sido registrado ainda em 2019, foi em fevereiro de 2020 que a doença “se espalhou”. Liturgicamente falando, era época da quaresma e a Páscoa estava próxima. 

Por mais incrível que possa parecer, apesar das notícias, dia após dia, do número de infecções e de casos fatais crescendo, ainda havia – e há! – muitos e muitas chamados “negacionistas”, porque não só negam a gravidade da enfermidade como também os dados apresentados diariamente pela imprensa. As consequências desta postura foram sérias, porque muitos destes se diziam cristãos católicos. O qualificativo “católico”, aqui, deve ser entendido sob duas perspectivas: primeiro, para delimitar a própria crítica da pesquisa ao âmbito da Igreja Católica; depois, para sinalizar que, estes, surgem como um exemplo claro de pessoas que vivem o cristianismo como religião, e não como modo de vida. Para estes, tudo precisava caminhar perfeitamente, como se nada estivesse acontecendo, e a Igreja, por sua vez, fazendo uso da sua “voz profética”, deveria continuar com as suas celebrações normalmente, para demonstrar que o vírus não apresentava riscos e que a fé poderia salvar a todos. Aliás, até se chegou a dizer que, os que morreram, chegaram à óbito por falta de fé; ou, ainda, que se tratava de uma “purificação” da parte de Deus, que começara a castigar a humanidade pelo indiferentismo e relativismo.

Se este tipo de posicionamento se reservasse à esfera pessoal, talvez não trouxesse tantos prejuízos. Mas não foi assim que aconteceu. Já no mês de abril de 2020, grupos na Espanha, na Argentina e no Brasil começaram uma campanha, dirigida a seus bispos, intitulada Devolvam-nos a missa ou Devolvam-nos a Santa Missa. O berço desta empreitada foi na Áustria, quando um grupo composto por jovens enviou um vídeo aos bispos do país pedindo a volta das celebrações. Não se pode negar que, sim, às vezes esses grupos acabaram agregando pessoas bem-intencionadas, que estavam sofrendo por não receber a Eucaristia no auge da pandemia – algo que, nos últimos anos, jamais acontecera.

No entanto, a situação acabou sendo manipulada por grupos que se sentem os “cristãos cruzados” do século XXI, que precisavam reconquistar a Igreja que, àquela altura, havia se submetido a uma decisão do Estado. No fundo, havia um prisma puramente ideológico, que via uma situação séria e grave de pandemia como uma verdadeira guerra, que precisava angariar militantes a seu favor. Mais do que isso: esse tipo de manifestação demonstrou claramente o quanto boa parte dos cristãos reduzem a vida cristã apenas à celebração da Eucaristia, ou seja, ao mero culto, o que também é revelador de, como expressou o Papa Francisco, uma outra “doença” que assola a Igreja na contemporaneidade: o clericalismo. Sem padres, não há Eucaristia. Sem Eucaristia, não há Igreja. Que a Eucaristia é, sim, o ápice da vida cristã, não se há dúvidas, mas na pandemia outras “instâncias”, igualmente importantes e que poderiam ser realmente vividas, acabaram por ficar em segundo plano, tais como a Sagrada Escritura e o valor da família, como igreja doméstica.

O que se percebe é que, no fundo, a preocupação não era com a Eucaristia, mas com o cumprimento dos ritos e das regras. Havia, inclusive, até uma pregação de um certo temor que, sem a Comunhão Eucarística, os fiéis estavam fadados à condenação eterna. 

O mais assustador, se assim se pode dizer, é que em sua maioria, quem expunha o rosto nestes tipos de manifestações eram jovens. Em junho de 2020, um pequeno grupo de aproximadamente 20 pessoas, das mais diversas idades, rezou um terço em frente à residência episcopal do arcebispo de Belo Horizonte, Dom Walmor Oliveira de Azevedo, que também é o presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). As intenções, pelas quais a oração estava sendo realizada, eram: pedindo a misericórdia de Deus, pelo retorno das missas presenciais e pela conversão do arcebispo. À época, na internet se argumentava: se a Igreja ensina que todos devem buscar os sacramentos com frequência, pois ninguém sabe quando serão o dia e a hora da morte, por que quando todos correm risco de perder a vida o acesso está sendo negado? O curioso é que, entre estes, ninguém se perguntou: se a enfermidade é tão grave e o contágio é tão fácil, como estabelecer novas formas de relacionamento com Deus, neste momento em que não se pode participar das celebrações dominicais?

O pior é que diante destes apelos e de tantas outras pressões também os presbíteros acabaram por “ceder” a algumas práticas, até então, impensáveis, como a comunhão drive thru, delivery, ou a passagem de enormes ostensórios abertos, pelas ruas, com a Eucaristia – com direito a um “tchauzinho” do padre, que seguia logo atrás do ostensório. Em alguns lugares, a passagem foi realizada até de helicóptero.

Associa-se a este tipo de conduta o colocar em evidência a figura do sacerdote incitando, de certo modo, o nefasto veneno do clericalismo que, a um só passo, prescinde de outras formas metodológicas de evangelização e coloca o laicato como mero receptor do Evangelho, nunca como sujeito da evangelização (FERREIRA, 2022, p. 7).

No fundo, portanto, são muitos os elementos “mascarados” por detrás deste tipo de movimento. Não é correto e nem seria justo generalizar, dizer que todos que participavam deste e de outros grupos menores tinham um viés ideológico ou uma má intenção, mas as reinvindicações surgiram como um exemplo claro de quem pensa o cristianismo numa pura relação de verticalidade, esquecendo-se que, ao assumir em tudo o humano, estava também no projeto de Deus a urgência de valores como a fraternidade, a solidariedade, a partilha e outros. No auge da pandemia, o pedido do distanciamento social, o fechamento das igrejas e as celebrações apenas em privado tinham um só objetivo: preservar a vida, o valor inalienável.

Aliás, neste sentido, pensando no fim da pandemia, na Encíclica Fratelli Tutti o Papa Francisco foi incisivo ao dizer:

[...] Passada a crise sanitária, a pior reação seria cair ainda mais em um consumismo febril e em novas formas de autoproteção egoísta. No fim, oxalá, já não existam “os outros”, mas apenas um “nós”. Oxalá não seja mais um grave episódio da história cuja lição não fomos capazes de aprender. Oxalá não nos esqueçamos dos idosos que morreram por falta de respiradores, em parte como resultado de sistemas de saúde que foram sendo desmantelados ano após anos. Oxalá não seja inútil tanto sofrimento, mas tenhamos dado um salto para uma nova forma de viver e descubramos, enfim, que precisamos e somos devedores uns dos outros, para que a humanidade renasça com todos os rostos, todas as mãos e todas as vozes, livre das fronteiras que criamos (FT 35, grifo nosso).

O sonho do Papa Francisco é concreto: passa sempre pelo outro. Para isso, é preciso mais humanidade; mais cristianismo e, talvez, menos religião – ao menos nestes moldes de servidão a partir do qual boa parte do imaginário coletivo se construiu. Nesse sentido:

 Os conventos, as paróquias, as cúrias episcopais e tantos outros centros eclesiásticos estão repletos de pessoas de boa vontade que, sem ser conscientes do que fazem na vida, na verdade acabam sendo tão ‘religiosas’ quanto ‘cúmplices’ da delinquência de tantos senhores, de tantas pessoas desordeiras, de tantas instituições de todo tipo que, na realidade, são os colaboradores imprescindíveis de que hoje necessita a mais inadvertida delinquência no mundo e na sociedade. Tão inadvertida quanto criminosa. Nestes casos, a força determinante do desastre não é o Evangelho. Essa força perversa e oculta é a religião. Por isso Jesus bateu de frente com ela, com a religião e seus dirigentes. Algo assim está acontecendo ao Papa Francisco. Seguramente porque a este bispo de Roma lhe atrai mais o Evangelho do que a religião (CASTILLO, 2017, p. 78).

De forma alguma, aqui, se põe em dúvida a importância da religião para o ser humano. Não é isso. A questão é olhar o cristianismo na sua essência, como uma realidade muito mais profunda do que esta, o que fará, sem dúvidas, com que, ao menos em tese, os cristãos encontrem algumas respostas para a séria crise humanitária que hoje se enfrenta em diversas esferas do mundo.

Considerações

É muito próprio do humano precisar de “algo” que funcione como uma espécie de fonte que lhe dê sentido e força; algo que considere, ainda que implicitamente, como o poder supremo. Desta premissa, é possível inferir que, sim, o ser humano precisa da religião – e, por isso, é essencialmente religiosus. Entretanto, não se pode esquecer que os cristãos católicos não são fruto de uma “religião revelada”, mas sim de uma religião de revelação; ou seja, é a revelação que norteia o que se chama de “religião cristã” e, naturalmente, a Igreja. O ápice da revelação divina se deu na encarnação de Jesus, o Filho (Hb 1,1-2). Por isso, hoje é urgente hoje voltar a Jesus, que por sua práxis e sua palavra, mudou radicalmente o conteúdo da palavra “Deus”, o maior dos mistérios. Se os seguidores de Jesus não permitirem que Ele próprio mude sua imagem de Deus, nunca serão capazes de reconhecê-Lo como seu Senhor e seu Deus, e se continuará a viver a religião única e simplesmente como submissão

Em outras palavras, ter a Jesus como Deus significa fazer Dele a fonte de toda informação sobre a divindade e, claro, contemplá-lo como um modo concreto de vida e, especialmente na sua conduta com os mais pobres, pautar a existência. 

Nesse sentido, se a Igreja, hoje, talvez vive fraturada, é justamente por coexistirem, nela, imagens de Deus que não se enquadram e nem se encaixam; ou seja, que não podem ser coincidentes – basta se recordar do velho axioma diga-me tua cristologia que te digo tua eclesiologia. Um projeto é o que brota de um Deus que quer salvar o ser humano das misérias e pecados desta vida para levá-lo ao céu, alcançável mediante a observância do acontecimento salvador por excelência: a morte de Cristo na cruz, atualizada no ritual do sacrifício, com aquilo que tudo isso supõe e exige de obediência, submissão e morte. O outro projeto brota da vida e da história de um humilde camponês da Galileia do primeiro século. É o projeto dedutível da forma de vida, do projeto de vida, que levou Jesus de Nazaré. Neste caso, o acontecimento salvador por excelência não se concentra num ritual religioso e sagradomas num projeto de vida centrada na integridade ética, pois “Jesus viu que o ser humano se encontra com Deus quando se encontra com os outros, sobretudo com quem mais sofre na vida” (CASTILLO, 2017, p. 106). 

Esta realidade também deriva de um outro fato:

[...] a redescoberta, em teologia, da dimensão escatológica levou a perceber o papel central da práxis histórica. Se a história humana é, antes de tudo, aberta ao futuro, ela aparece como tarefa, como que-fazer político; construindo-a, o homem orienta-se, abre-se ao dom que dá sentido último à história: o encontro definitivo e pleno com o Senhor e com os demais. “Fazer a verdade”, como diz o Evangelho, adquire assim significação precisa e concreta: a importância do agir na existência cristã. A fé num Deus que nos ama e nos chama ao dom da comunhão plena com ele e da fraternidade entre os homens não é alheia à transformação do mundo e leva necessariamente à construção dessa fraternidade e dessa comunhão na história. Ainda mais: apenas realizando essa verdade se verificará, literalmente falando, nossa fé. Daí o uso recente do termo ortopráxis, que não deixa de chocar algumas sensibilidades. Não se pretende com ele negar o sentido que pode ter uma ortodoxia entendida como proclamação e reflexão sobre afirmações consideradas verdadeiras. O que se procura é equilibrar, e mesmo repelir, o primado e a quase exclusividade do doutrinal na vida cristã, sobretudo o empenho – muitas vezes obsessivo – de procurar uma ortodoxia que amiúde não passa de fidelidade a uma tradição caduca ou a uma interpretação discutível (GUTIÉRREZ, 2000, p. 66).       

Portanto, não se há dúvidas que, um caminho possível para se resgatar o humano é a vivência do cristianismo na sua raiz. A urgência de “reproduzir” o modus vivendi de Jesus é urgente. É para já.

Referências

BOFF, Leonardo. Espiritualidade. Um caminho de transformação. Rio de Janeiro: Sextante, 2006.

BOFF, Leonardo. Tempo de Transcendência. O ser humano como um Projeto Infinito. Petrópolis: Vozes, 2009.

CASTILLO, José M. A humanidade de Jesus. Trad. Francisco Morás. Petrópolis: Vozes, 2017.

FERREIRA, Reuberson Rodrigues. Interpelações pastorais à teologia e à eclesiologia no universo pós-pandemia. In: Teocomunicação. Porto Alegre, v. 52, n. 1, jan./dez. 2022, p. 1-8. Disponível em: https://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/teo/article/view/42523/27408 Acesso em: 14 set. 2022.

GOMES, Paulo Roberto. O Deus Im-Potente. O sofrimento e o mal em confronto com a cruz. São Paulo: Loyola, 2007.

GONÇALVES, Paulo Sérgio Lopes. Fazer teologia em época de pandemia: atenção aos sinais dos tempos. In: Ephata. Revista Portuguesa de Teologia, 3 (2), 2021, p. 99-126. Disponível em: https://revistas.ucp.pt/index.php/ephata/article/view/9787 Acesso em: 16 set. 2022.

GUTIÉRREZ, Gustavo. Teologia da Libertação. Perspectivas. Trad. Yvone Maria de Campos Teixeira da Silva e Marcos Marcionilo. São Paulo: Loyola, 2000.

IRINEU DE LIÃO. Contra as Heresias. Trad. Lourenço Costa. São Paulo: Paulus, 1995.

LADRIÈRE, Jean. A fé cristã e o destino da razão. Trad. Paulo Neves. São Leopoldo: Unisinos, 2007.

LOSSKY, Nicolas. Ortodoxia. In: LACOSTE, Jean-Yves. Dicionário Crítico de Teologia. São Paulo: Paulinas, Loyola, 2004, p. 1299-1300.

NOLAN, Albert. Jesus antes do cristianismo. Trad. Grupo de Tradução São Domingos. São Paulo: Paulinas, 1987.

PAPA FRANCISCO. Bênção Urbi et Orbi. Momento Extraordinário de Oração em tempo de pandemia. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/messages/urbi/documents/papa-francesco_20200327_urbi-et-orbi-epidemia.html Acesso em: 16 set. 2022.

PAPA FRANCISCO. Carta Encíclica Fratelli Tutti. Sobre a fraternidade e a amizade social. 1. ed. São Paulo: Paulinas, 2020.

STEPHANINI, Valdir; BROTTO, Julio Cezar de Paula. O desafio do fazer teológico em tempos de pandemia. In: Revista Atualidade Teológica. Rio de Janeiro, v. 25, n. 67, jan./jun. 2021, p. 23-40. Disponível em: https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/53640/53640.PDF Acesso em: 16 set. 2022.

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Notas

[1] É digno de nota o fato de, no dia 27 de março de 2020, o Papa Francisco, na Adro da Basílica de São Pedro, ter concedido a bênção urbi et orbi, no “momento extraordinário de oração em tempo de pandemia”, e aproveitar-se para comentar justamente a cena evangélica da tempestade acalmada (FRANCISCO, 2020).