No dia 13 de maio de 2013, aconteceu a eleição do Papa Francisco. Desde o seu gesto inicial de se inclinar para pedir a bênção ao povo, em frente à Praça de São Pedro, em Roma, antes de dirigir a sua mensagem, já se desenha e percebe a perspectiva do Projeto de Francisco. A sua insistente perspicácia e dinâmica na condução da Igreja Católica cresce exponencialmente a cada dia. De modo que apresenta um projeto em fluxo contínuo num profundo esforço para colocar em prática, nos tempos de hoje, o espírito daquilo que foi sonhado no Concílio Vaticano II. A acolhida e/ou resistências ao Projeto de Francisco em vista de um ser humano integral, - isto é, aquele humano que se coloca cada vez mais em abertura ao Espírito de Jesus para um crescimento contínuo na construção do Reino -, se encontra igualmente em pé de igualdade: há aqueles que com ele abraçam o mesmo entusiasmo, e aqueles que tentam desqualificar o seu projeto. É o dinamismo da história seguindo o seu curso. O presente número da Revista de Cultura Teológica tem a oportunidade de nos brindar com textos que procuram nos ajudar na direção de um favorecimento para que o Projeto de Francisco possa cada vez mais ganhar apoio, visibilidade, compreensão e continuar avançando. Entendemos que quanto mais refletirmos sobre os esforços do Papa Franciso, tanto maiores serão as chances de os processos por ele iniciados serem assimilados e, portanto, acolhidos. Nesse sentido, destacamos o que cada autor pondera na construção do presente dossiê. Em seguida, teremos acesso aos artigos.
Normalmente estamos bastante acostumados a nos referir à importância do diálogo para que os seres humanos possam, cada vez melhor, serem verdadeiramente humanos e assertivos nas suas ações. O Papa Francisco, de certo modo, provoca-nos a darmos um passo a mais na direção do encontro. Entendemos que, enquanto o diálogo acontece entre realidades impermeáveis, o encontro se dá entre realidades porosas, de modo que, no encontro, podemos oferecer as nossas riquezas, absorver as riquezas dos outros, sem, no entanto, perdermos a nossa identidade. Nesse sentido, o texto do professor Marcial Marçaneiro e Maycon Renan S. S. Boni, intitulado “Diálogo e Encontro para uma humanidade integral: aproximações entre Buber e Papa Francisco a partir da Laudato Si’’”, nos insere na dinâmica proposta da importância da categoria do encontro. Segundo os autores, a cultura do encontro possibilita-nos um caminho de realização humana integral alicerçado no diálogo e na paz. Ao aproximar Buber e Francisco, Maçaneiro e Boni argumentam que as esferas da natureza, do humano e do divino, refletidas por Buber, estão em intrínseca relação com as reflexões possibilitadas por Francisco na Lautado Si’. Ao destacar a urgente necessidade de uma relação do ser humano com a Terra, com os outros humanos e com Deus, como um caminho seguro para a dinâmica da realização integral, Marcial e Maycon fomentam uma profunda reflexão para o tempo presente.
Nesta mesma direção, temos o texto do professor Elizeu da Conceição, intitulado “Ecoteologia e Juventude no projeto do humanismo integral do Papa Francisco”. A urgência de uma reflexão que seja capaz de estabelecer uma interlocução sobre as questões ambientais com a juventude, coloca o texto do Elizeu em um patamar de relevância. A reflexão do autor nos faz ver que, a partir de uma perspectiva humana integral, somos desafiados a superar uma visão superficial e utilitarista da realidade. A pesquisa do professor Elizeu aponta que, junto à juventude, será possível reajustarmos o olhar da humanidade para que ela seja capaz de perceber a verdade e a beleza inerentes à vida.
O texto do professor Elias Wolff, intitulado “O compromisso ecológico do movimento ecumênico no Brasil”, se coloca na mesma perspectiva de enfrentamento dos desafios do presente, em relação ao cuidado com a Casa Comum. Trata-se de uma reflexão em sintonia com a crítica social abordada por Francisco na Laudato Si’, de modo que Wolff nos apresenta uma belíssima reflexão sobre a responsabilidade das igrejas e religiões. Segundo o autor, o movimento ecumênico tem grande relevância no sentido de contribuir para a realização de projetos ecológicos comuns. Elias Wolff aponta para a importância do desenvolvimento de tais projetos a fim de que possamos crescer numa sensibilidade ecumênica, de tal modo que sejamos capazes de darmos as mãos em prol da “vida em abundância” (Jo 10,10) para todas as criaturas da Casa Comum.
O texto dos professores André Luiz Rossi e Paulo Sérgio Lopes Gonçalves, intitulado “A diversidade religiosa na Fratelli Tutti”, ressalta a importante receptividade da Fratelli Tutti com o seu convite à diversidade. Segundo os autores, a importância do texto, ser lido nos diferentes ambientes fora da Igreja, possibilita um caminho plausível para o avanço na construção da fraternidade e da tão sonhada paz universal. A partir das Ciências da Religião, Rossi e Gonçalves argumentam sobre o importante destaque da Doutrina Social da Igreja Católica a partir da Fratelli Tutti, em que o Papa Francisco avança ao mostrar ao mundo que a Igreja Católica valoriza as demais religiões comprometendo-as no esforço comum para a construção de uma fraternidade universal.
O texto de Nadi Maria de Almeida, intitulado “Conversão pastoral para uma transformação missionária ad gentes nos documentos de Santo Domingo, Aparecida e Evangelli Gaudium”, traz uma excelente contribuição para os desafios dos tempos atuais, a fim de que sejamos cada vez mais eficientes na contribuição do Projeto de Francisco. A própria chamada para a conversão pastoral ressaltada pela autora, como uma condição constante de transformação missionária da Igreja, já aponta para aquilo que é próprio do Projeto de Francisco: o dinamismo e a admoestação para a conversão constante. De modo bastante direto, em plena sintonia com os três documentos analisados pela autora, é possível ver o enfoque que Nadi nos apresenta sobre a urgente necessidade estrutural da categoria da conversão que, necessariamente se dá na seara estrutural das mentalidades e atitudes, a fim de que estejamos dispostos a dotarmos um novo jeito de estarmos no mundo desafiador de hoje.
A nossa sociedade tem conhecimento suficiente das mazelas temporais presentes em nosso meio. Não obstante a isso, vê e coloca o ser humano em segundo plano, pois continua a se orientar pela eficácia e pela produtividade, por um individualismo cultural que atinge pessoas e países. Tal situação foi agravada pela pandemia, ameaçando o ser humano. A fé cristã parece vulnerável, quando confrontada com essa realidade asfixiante, e é em vista deste entendimento que percebemos o Projeto de Francisco em movimento a fim de aliviar sofrimentos e promover a formação humana integral. Em sintonia com o Projeto de Jesus Cristo, condensado na proclamação e na realização do Reino de Deus, notamos que, do mesmo modo, o Papa Francisco prossegue firme na sua missão: lançar as bases para uma nova sociedade de irmãos e de paz. Sob esta orientação, o ser humano é posto em primeiro lugar, em todos os aspectos que lhe são pertinentes. Levando-se em consideração a perspectiva da busca de um ser humano integral, observamos que o Projeto de Francisco sempre objetiva suscitar reflexões e questionamentos sobre o papel do cristianismo na atual sociedade, na expectativa da vivência de uma mística cristã autêntica.
Como organizador deste Dossiê agradeço aos autores(as), de todos os textos, bem como aos pareceristas e toda a equipe técnica da Revista de Cultura Teológica que proporcionou esta publicação oriunda das pesquisas com rigor científico.
José Aguiar Nobre