As ciências naturais e a fé cristã face às grandes questões do Cosmos e da Criação

The Natural Sciences and Christian Faith in the face of the great questions of the Cosmos and Creation

Alexandre Freire Duarte

Doutor em Teologia pela Universidad Pontificia Comillas (Madrid- Esp). Professor na Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa, no Centro de Cultura Católica do Porto e no Instituto Católico de Viana do Castelo. Contato: afduarte@ucp.pt


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Resumo: No diálogo (mais ou menos anguloso ou rombudo e com resultados divulgados popularmente de forma assaz descuidada) entre a fé cristã e as ciências naturais há um conjunto de temáticas, relacionadas com a Criação e o Cosmos, que, versando aparentemente sobre realidades idênticas, têm mantido incompreensões injustificadas. Este estudo dá atenção, sucintamente, em cinco dessas temáticas – que percorrem o arco do existente (passado, presente e futuro) – e tenta mostrar o que um crente cristão pode pensar e, se a ocasião se proporcionar, afirmar sustentadamente sobre elas.

Palavras-chave: ciências naturais; fé cristã; criação; evolução; leis da natureza; escatologia.

Abstract: In the dialogue (more or less angular or blunt and with results popularly disseminated in a rather careless way) between the Christian faith and the natural sciences there is a set of themes related to Creation and the Cosmos, which, apparently dealing with identical realities, has maintained unjustified misunderstandings. This study pays a briefly attention to five of those themes – that run through the arc of the existing (past, present and future) – and tries to show what a Christian believer can think and, if the occasion provides itself, sustainably affirm about them.

Keywords: natural sciences; Christian faith; creation; evolution; laws of nature; eschatology.

Considerações inaugurais

Há já algum tempo tivemos a alegre possibilidade de publicar um texto sobre uma releitura das relações entre a fé cristã e as ciências naturais. Algo foi dito, muito insinuado, muitíssimo ficou por dizer. As circunstâncias inerentes ao equilíbrio entre o desejado e o possível obrigaram a que assim fosse. Agora, com este texto, que pode (ou não) ser tido como uma continuação desse trabalho, a nossa atenção vai-se focar no que pode ser dito – desde uma teologia atenta aos desenvolvimentos das mencionadas ciências – a respeito de alguns dos grandes eventos cósmicos, sobre os quais, quer as ciências naturais, quer a fé têm algo a dizer e, além do mais, dizem-no, de modo frequente e num registo fascinante.

Não se entrará, na busca de tal objetivo antes exposto, em debates, nem propriamente em diálogos ultra-apurados, mas, isso sim, numa simples exposição do entrecruzar dos dados provenientes da sobreposição, enriquecedora e quase santa, de “mapas de sentido” (PETERSON, 1999). Mapas. Sim. Mapas. As ciências naturais podem ser estimadas como um mapa da rede hidrográfica de um país e, por seu lado, a fé como um mapa topográfico desse mesmo país. Nenhum desses dois mapas, quando bem feito, contradiz o outro, antes enriquece, com pistas cruciais, o conhecimento sobre esse país (McGRATH, 2020, p. 180).

Enfim, note-se que a arquitetura deste estudo segue o feliz princípio escolástico de que a ordem da execução é contrária à ordem da intenção. Ou seja: a ordem da execução (criação → Incarnação → união) é oposta à sequência da intenção (união → Incarnação → criação). Para se abarcar melhor o começo, não há senão como olhar em primeiro lugar para a meta, pois é esta que, de algum modo, define o próprio começo. Claro que o contrário também tem o seu quê de verdade, mas não permite uma compreensão tão ampla. É precisamente por isto que abordaremos as sobreditas questões segundo a ordem hermenêutica da intenção.

1.- O fim do Universo e a meta da Criação

A primeira de tais questões tem a ver com, por um lado, o que se diz, a partir das ciências naturais, acerca do fim do Universo, e, por outro lado, o que é crido, fruto do discurso crente cristão, como sendo a meta da Criação – sendo que aqui (note-se com cuidado) fim e meta não são sinónimos, nem mascarados, nem renitentes (POLKINGHORN, 2002).

Pois bem, acerca de tal fim, há uma grande divergência de opiniões que oscilam entre dois extremos que passaremos a referir. Num desses extremos, temos as hipóteses mais pessimistas, que estimam que a inteligência e a consciência são fenómenos passageiros e irrelevantes (WEINBERG, 1993, p. 196) num Universo que irá tornar-se numa espécie de cemitério cósmico. Um cemitério frio, que poderá continuar a expandir-se até consumir toda a energia num estado em que esta ficará reduzida virtualmente a zero (ADAMS; LAUGHLIN, 1997), ou, então e em função da matéria negra existente, extremamente quente, que se comprimirá espacialmente e condensar tal energia num ponto único (HAWKING, 1993, p. 13s) – naquilo que poderia dar início a um novo Universo (PENROSE, 2011). Ou seja: assevera-se, de modo degenerativo, uma fragmentação final e um sem-sentido de tudo.

 No outro extremo, estão as conjeturas mais otimistas. Estas aduzem que, face às leis que regem o próprio Universo, a consciência e a inteligência seriam muitíssimo improváveis, mas que tendo surgido, poderão expandir-se ainda mais numa espécie de noosfera cósmica teilhardiana (TEILHARD, 1956, p. 321). Neste caso, defende-se a eventualidade de as consciências inteligentes poderem ser aquilo para que o Universo existe (CARTER, 1973, p. 291). Mais: e que, afora de como e quando o Universo findar, aquelas poderão, de alguma forma, sobreviver a tal fim (WARD, 2008, p. 43). E isto, independentemente do modo concreto da sua relação com o seu suporte material – o qual está sempre em transformação, pelo simples facto de ser atualmente uma parte inconsútil de um Cosmos em evolução.

Entre estes extremos, há diversas posições mais ou menos matizadas. Todavia, o facto é que não há forma alguma das ciências naturais conceberem cabalmente os estádios últimos no Universo (VAGUINE, 2012, p. 76). E assim é, sobretudo quando a estes estão associadas realidades sobre as quais tais ciências nada ou pouco podem opinar dentro do seu âmbito próprio de competência. Realidades como, por exemplo, os “valores ecológicos, estéticos ou morais” (AYALA, 2016, p. 296), que são apreendidos e estimados pelas, já por nós aduzidas, consciências inteligentes e, particularmente, querentes. Isto é, consciências capazes de refletir e querer e, dessa forma, “conhecerem e amarem” (LAWRENCE, 2017, p. 399).

Seja como for, as antes apresentadas hipóteses acerca do fim do Universo devem ser respeitadas pelo seu valor intrínseco e, tanto quanto possível, levadas em consideração na reflexão crente sobre a meta da Criação. Na realidade, e como já dissemos, embora esta meta não se confunda com tal fim, não pode haver um discurso crente sobre tal meta que “seja indiferente ao que as ciências contribuem acerca da questão da identidade humana” (HAUGHT, 2015, p. 159) ou, então, opte por desprezar o que poderá ser a condição final do Universo. E isto, até porque o “pensar nessa condição, ou imaginando pensar nela, desperta-nos para uma perceção que nos confronta e faz pensar e orar” (CLARK, 2002, p. 193). Mais: os sucessivos estádios da Criação – a qual não é senão o Universo enquanto visto como um sistema aberto à ação (primigénia, contínua, providente, sinergética e consumadora) de Deus no mesmo – não são, anómala e totalmente, indiferentes para a realização íntima dessa meta.

É um facto que a meta da Criação já foi, desde uma certa perspectiva, atingida: Jesus Cristo, perfeitamente Deus e perfeitamente Homem, é essa tal meta (MALDAMÉ, 1998). Deus, já vimos, cria, por amor, para a Incarnação, e incarna-Se, por amor, para unir a Si, numa perene união de amor, o que é distinto de Si – toda a Criação através da natureza humana assumida por Si e glorificada aquando da Ressurreição-Ascensão do Senhor. Mas também é um facto que, pelo que já referimos a partir de uma outra perspectiva, tal Criação é, com todas as suas salutares texturas cronológicas e históricas, indissociável, de modo nada impróprio, do Senhor glorificado (MURRAY, 2015, 192).

Para que tal união de amor pudesse ser lograda, era necessário que, por processos evolutivos pelos quais o próprio Criador pudesse intervir sem ferir as leis cósmicas por Si elegidas, pudessem surgir, no Universo, “estados cada vez mais complexos, e cada vez mais improváveis, de consciência” (TRESMONTANT, 1962, p. 32). Estados estes que capacitassem o eclodir de seres com a capacidade de conhecerem e amarem, notavelmente a Deus, e que, desse modo, fossem imagem semelhante Sua (Gn 1,26). Seres que, por seu lado e de um jeito cheio de alusões amorosas, seriam capazes de se fazerem cada vez mais transparentes a Este e à Sua bondade. E isto, por um processo de progressiva purificação do seu egoísmo – também derivado do instinto de preservação (BOUSFIELD, 1999, p. 289) – e sempre em colaboração crescentemente amorosa com Deus. 

Quando tal máximo de transparência ocorreu, Deus, que nunca esteve ausente à, e da, Sua Criação, pôde unir-Se à mesma num progressivo, mas indissolúvel, matrimónio consumado em Cristo Jesus (VILLENEUVE, 2021). Este matrimónio, tendo a sua vanguarda no ser humano, não tem, não obstante, neste mesmo o seu único participante criatural. Todo o restante da Criação cósmica está, pelo ser humano (LACHMAN, 2013), chamado a comungar, de acordo com a sua própria natureza, nessa celebração da participação na natureza e vida (1Pd 2,4) do Deus que não é senão Amor (1Jo 4,8). Eis o que, apontando para uma transformação (mas não uma substituição) da Criação, pode ser entendido como uma expressão da afirmação paulina de que Deus será Deus em toda a realidade (1Cor 15,28) e que, sendo o mal autodestrutor (Ap 13,10), a bondade do amor será definitiva.

Pois bem, para acabarmos esta secção deste trabalho, gostaríamos de tentar clarificar, e vincar, algo referido há momentos. A saber: que a meta total (Jesus e nós, com a Criação, em Ele) da Criação não é alheia ao que foi, é e será o Universo: este está entrecruzado com ela.

Acreditando a fé cristã num Criador pessoal inteligente que transcende a Sua Criação, o advir, também pela ação d’Aquele, de seres conscientes capazes, pela sua inteligência e vontade, de apreciarem a bondade, a beleza, a verdade e o amor com os demais (WARD, 2009, p. 60) não é o ponto final para estes seres. Tal Criador não descartará tais seres. Ele, antes, possibilitará – e sendo Amor, será que poderia não fazê-lo? – que os mesmos não desapareçam, nem o restante da Criação, como poeiras espalhadas ao vento (SÁNCHEZ MIELGO, 2004, p. 334). Eles, e as condições para a sua existência basilar, permanecerão graças à sua união amorosa com Cristo Jesus, o Qual os insere, transfigurados e divinizados (amorizados) num burilar paciente, no próprio Coração de Deus (O’HARA, 2013, p. 30). 

O que quer isto dizer e o que é que implica? Por um lado, quer aludir que tais seres – pelo menos nós, os seres humanos da espécie homo sapiens – não serão cópias daquilo que são presentemente neste Universo, mas que também não serão totalmente diferentes (NOVELLO, 2011, p. 156). Por outro lado, sugere que aqueles serão em Deus-Amor – e inerentemente na Criação transfigurada, na qual Aquele regerá definitiva e plenamente pelo amor – parcialmente em função do que tiverem feito de si (LEWIS, 2015), pois num Deus que é Amor “nem um átomo, nem um grão de egoísmo pode entrar, pois o egoísmo é o oposto de Deus, e, portanto, o oposto do amor, e só o amor é assumido pelo amor” (VARILLON, 1981, p. 203; Ap 21,27). Poesia? Não. A mais límpida realidade, que fere por raramente ser dita.

Destarte, aquilo que as criaturas capazes de conhecerem e amarem, sobretudo a Deus, fizerem em si, e também no Universo presente até ao fim temporal do mesmo (Rm 8,21), terá efeitos para aquela Criação Nova (Ap. 21,1). O que tiver sido criado e edificado pelo amor – bem como o que tiver sido amado (e assim marcado, em tons de amor, as memórias daquelas criaturas) durante o tempo da existência do Cosmos –, estará presente em tal Criação, embora transformado pela glória divina. Já o que tiver sido descriado e destruído pelo desamor – seja em tais criaturas, seja na corrente Criação – não estará presente naqueloutra Criação pleromatizada, pelo menos do modo que poderia ter estado (WARD, 2008, p. 132).

Mais uma vez constatamos que não é somente tudo aquilo que é deveras humano que deve ser valorizado pelo ser humano – e mais ainda por nós, cristãos. Não. Do mesmo modo, nada do que, no presente Universo, estiver relacionado com o ser humano pode ser alheio a este e ao seu empenho de o humanizar “segundo os critérios da missão única, mas inclusiva, de Jesus” (CASEY, 2012, p. 246). Absolutamente nada. Se se pode afirmar que é verdade que o Universo existe para o ser humano (poder surgir), não é menos verdade que o ser humano existe para (cuidar com bondade de) tal Universo, e, dessa forma, levá-lo até ao Senhor (GREGÓRIO DE NAZIANZO, 2006, p. 122 = XXXVIII, 11).

2.- O fim da vida e a Vida após a vida

Passaremos a abordar, presente e brevemente, o tema fim da vida biológica, analisável pelas ciências naturais, e a Vida após tal fim, afirmada pela fé cristã. Resumindo isso a uma pergunta assaz elementar: será que o que tais ciências afirmam desde as suas áreas nega, ou permite (ainda que descodificada), a admissão da possibilidade de uma tal Vida?

Pois bem, desde há algumas décadas que há, no âmbito das ciências naturais (e não só), um grande debate sobre se a consciência individual de uma pessoa é, ou não, meramente uma consequência dos processos mentais do nosso cérebro material (BLACKMORE, 2007). Tal debate tem-se prolongado pois, infelizmente, não tem sido desprovido de preconceitos. Na realidade, a análise ponderada e séria dos dados que se têm avolumado, revela claramente que o cérebro não é senão uma matriz para que a consciência comunique com o restante do corpo e, por este, com tal Universo espácio-temporal e, (JEEVES, 2013; GABRIEL, 2017).

Há dois bons exemplos ilustrativos daquilo que acabei de referir. Um é o denominado efeito placebo: a convicção consciente de que dado produto (que, na realidade, não é mais do que um elemento neutro) possui dados efeitos, faz com que tais efeitos sejam produzidos pelo organismo (KIRSH, 2009). O outro é o dos taxistas de Londres: tendo estes que memorizar todos os nomes e sentidos das ruas desta cidade, para nela poderem exercer o seu ofício, partes do seu cérebro mudam (MAGUIRE et al., 2000). Ou seja: o cérebro e o corpo humano experimentam transformações plásticas, fruto da ação da consciência inteligente, algo que, em derradeira análise, não seria possível se houvesse uma simples identificação entre o cérebro e a consciência, como se esta fosse uma mera soma de elementos materiais ou energéticos.

Ou seja: há indícios, recolhidos pelas ciências naturais, que as perceções, os sentimentos e os pensamentos, especialmente quando carregados de atenção e apreciação, causam um processo de mudança no organismo. Por outras palavras: as próprias ciências naturais parecem apontar para algo que a fé cristã denomina de espírito (TRAVIS, 2018, p. 197).

Aqui é necessário considerar, ainda que de passagem, a perspectiva cristã do que é o ser humano comum. Segundo a teologia bíblico-cristã, tal ser é uma pessoa humana unida a uma natureza igualmente humana, fazendo com que aquele, não tenha três partes, mas seja (de) três dimensões distintas (CASTELAO, 2010). A saber: o corpo, a alma e o espírito (Dt 6,5; 1Ts 5,23). O corpo (meōḏe; sôma) pode ser descrito como sendo a exterioridade relacional da pessoa, a qual, neste presente Universo espácio-temporal, requere um suporte material. A alma (nép̄eš; psiquê), por seu lado, é como a interioridade vital que permite que a pessoa esteja viva. Por fim, o espírito (lēḇāḇ; pneûma) é a intimidade amorosa ou como que o centro essencial da mesma, decorrendo, de algum modo (e não se podendo, aqui, usar uma linguagem que escapa à retidão absoluta), da presença do Espírito Santo na união corpo-alma. União esta já em si inseparável desde a conceção, sempre admirável, de cada ser humano. 

É um facto que, ao longo da história do Cristianismo ocidental (mas não no Oriental) se passou – também por receio que, ao se falar em espírito e numa alma (espiritual), se pudesse pensar que o ser humano possuía duas almas – a identificar estas duas realidades. E fazê-lo, dizendo que alma é o elemento e o espírito aquilo de que este elemento é composto (em oposição à matéria). Que pensar desta identificação, também tributária de influxos filosóficos não-cristãos, nomeadamente através Agostinho de Hipona (KUIPER, 2010, p. 263), na antropologia cristã? Deixamos aqui apenas uma observação. Em concreto: do mesmo modo que não se deve confundir o corpo (sôma) com a matéria (sárx) – e é por isso que nunca se sepulta o corpo, mas apenas os restos materiais –, o rigor (que a teologia contemporânea mais séria tem tentado re-assumir) convida-nos a re-reconhecer, na linha dos Padres da Igreja (LARCHET, 2000, p. 17-48), que alma e espírito são realidades distintas (CdIC, §367).

Ora bem, com tudo o afirmado precedentemente, não é totalmente inconcebível – nem para as ciências naturais (que olham para esta realidade, por exemplo, a partir da possibilidade da transferência de memórias), nem para a fé cristã (que olha para isto sobretudo desde a ressurreição do Senhor) – afirmar-se a possibilidade da continuidade da consciência humana mais além da preservação do suporte material do corpo humano.

Vimos, há momentos, que há uma real distinção, entre, por um lado, a consciência (algo análogo ao que descrevemos ser o espírito humano) e o cérebro e, por outro lado, o corpo e a matéria. Esta distinção permite que se diga, na linha de algo já apontado, que a consciência opera, pelo cérebro (conquanto o mesmo seja saudável), um corpo que, neste Universo em que vivemos, possui um sustentáculo material para (quando este suporte tem saúde) operar as suas relações identitário-processuais (WARD, 2010, p. 124; BAUMEISTER, 2002, p. 5).

Face a isto, não é apenas a fé cristã que tem diante de si a certeza de que o fim da vida biológica do suporte material do corpo não implica o fim da pessoa (CdIC, §1012). As próprias ciências naturais têm abertas a admissão da grande probabilidade de que isso também venha a ser uma realidade. De facto, já se está a caminhar para uma admissão da possibilidade de se conseguir descarregar memórias (JACQUETTE, 2009, p. 67) e, inclusive, mentes informáticas inteligentes em outras formas materiais que sobrevivam a suportes prévios – o que não quer dizer, ao contrário de algumas posições cognitivistas de meados do séc. XX (PAUL, 2021, p. 6s), que as mentes sejam meros computadores materiais mais elaborados, “tal como o olho não é ‘como’ uma câmara” (TIETGE, 2008, p. 162), mas que estoutros poderão vir a sustentar mentes na linha de um, potencialmente assustador, niilismo ateu, prometaico e auto-endeusante (HUBERMAN, 2021, p. 56).

A fé cristã assevera que a sobrevivência da pessoa é garantida por um Deus que, sendo Amor, não deixará que ninguém que O tenha podido conhecer e amar pereça aquando do momento em que ocorrer a sua morte biológica. Deus pode garantir que, após tal morte, continuaremos a ter uma relação com Ele (CdIC, §265). Mais: Ele disse-nos que o quer fazer e que o fará (Jo 11,25ss), sendo que a própria ressurreição (da natureza humana) de Jesus é a certeza disso (Rm 6,4; 8,11), dependendo em muito de nós a qualidade de tal relação (CdIC, §1022). “No final existirão apenas dois tipos de pessoas: aqueles que dirão a Deus: ‘Seja feita a Tua vontade’, e aqueles a quem Deus dirá: ‘Seja feita a tua vontade’” (LEWIS, 2015, p. 75). Uns optam pelo amor, outros pelo desamor; hoje e, fruto da inércia deste, escatologicamente.

Mas como será tal existência nova em Deus? Pouco sabemos sobre isso, mas algo podemos dizer. Desde logo, ela não será totalmente igual à que existe neste presente Universo, mas será uma continuação desta enquanto “não tirada, mas transformada” (CdIC, §1012) em tons de amorização, pois, como já foi referido, em Deus só entra o que em cada um de nós for amor ou compatível com este. Pode até conceber-se que o nosso corpo não terá a absoluta necessidade de ter um suporte material igual ao atual; algo, portanto, à semelhança da matéria do corpo glorioso do Senhor ressuscitado – a qual impedia familiarmente o Seu reconhecimento imediato até um sinal gemido e repleto de amor (Jo 20,15; Lc 24,13-35).

Dito isto, e conforme advirá com as demais dimensões do ser humano, o nosso corpo cristificado será inseparável do que tal suporte experienciou. Desde logo, uma identidade pessoal reconhecível. Assim, não perderemos as nossas faculdades espirituais (por exemplo a memória) nem os sentidos, embora não saibamos como atuarão. Mas, sobretudo e mais importante, amaremos mais e melhor do que nunca, pois pela graça seremos Amor dentro dos limites da nossa condição criatural (MÁXIMO O CONFESSOR, 2014, p. 111-113 = VII, 27).

De modo muito lesto, diga-se apenas que a supradita continuidade numa existência para além deste Universo, é motivo mais do que suficiente para que a reencarnação neste último seja, pela descontinuidade que supõe, um contrassenso, por “mais sedutora que seja devido às suas respostas fáceis […] mas sem responderem a uma realização plena, integral e definitiva” (PINTO, 2001, p. 299 e 305). E esse contrassenso, é irreconciliável com a fé cristã (KASPER, 2001, p. 146-149), com sã razão (ONFROY, 2001, p. 162) e até a com ética proposta por filosofias de vida que postulam essa mesma reincarnação – conforme admite, num rasar de incómodo só superado pela seriedade, um especialista no hinduísmo (FLOOD, 1996, p. 252s).

3.- As leis da natureza e a ação divina

Um dos temas mais candentes da relação entre a crença cristã e as ciências humanas, deriva da tentativa de se negar a validade de todo um conjunto de comportamentos religiosos, alegando que os mesmos só seriam reais e eficazes, e não somente cridos como tal, se não existissem leis naturais tidas como imutáveis. Negação essa que, no fundo e como veremos em breve, alega ser impossível toda e qualquer ação de Deus no Universo. Na base desta argumentação, que iremos desmontar, está uma linha de ideias que, acabando por negar a existência de “causas espirituais” (WARD, 2008, p. 85), se forma e consolida entre finais do séc. XVI e inícios do séc. XVIII. E isso, graças às reflexões de Francis Bacon, Descartes e Newton – todos eles, por sinal, cristãos mais ou menos convictos (WARD, 2008, p. 85-87).

Tal pensamento será depois usado, em meados de setecentos, por David Hume no texto “An Enquiry Concerning Human Understanding” (HUME, 1993). Focando-se no caso particular do milagre, tratado no décimo capítulo daquela obra, este aduz que Deus só poderia intervir no Universo, por ele tido como um instrumento com mecanismos inquebráveis, se agisse arbitrária e ilogicamente no mesmo, rompendo com os princípios que Ele mesmo teria instituído para o seu funcionamento. Algo que revelaria que Deus era, ou incompetente – para ter que andar a fazer remendos –, ou hesitante – não sabendo bem o que queria ou devia fazer –, ou, até mesmo, desrespeitoso para com o Universo – desconsiderando o valor deste, mormente iludindo as expectativas dos seres racionais (HUME, 1993, p. 72-90). Pannenberg, de modo mais cauteloso, mas igualmente contundente, ainda apelou, há cerca de duas décadas e num tropo trôpego, ao fim do discurso sobre os milagres por irem contra “o nosso conhecimento ‘do decurso da natureza’” (PANNENBERG, 2002, p. 860)

Acontece, contudo, que tais objeções baseiam-se em dois pressupostos que são falsos e que não se sustentam, nem isoladamente, nem em conjunto. Por um lado, o milagre, enquanto forma específica e mais patente da ação divina na Criação, não é senão o testemunho de um poder espiritual, decorrente da bondade de Deus, dotado de um sentido espiritual (LEWIS, 2012). Por outro lado, e não se negando as leis da natureza, há, desde os inícios do séc. XX (com Einstein, Werner Heisenberg e Edward Lorenz), a certeza de que, embora se observem inegáveis regularidades a nível macro, tais leis não são, nas suas constituições mais básicas, deterministas, mas, pelo contrário, abertas a imponderabilidades, decorrentes de condições que só são descritíveis de modo “probabilístico e estatístico” (FRASER, 2007, p. 70).

Ou seja: nada na reta noção de milagre, nem na da ação espiritual mais comum de Deus no Cosmos, implica uma rutura com as leis da natureza, nem estas leis regem de modo absolutamente rígido o que ocorre no Universo. Se assim é, sendo Deus absolutamente real e Amor – como nós (e só nós) cristãos professamos –, é natural acreditar que o Mesmo pode agir, e deveras age, na Sua Criação, também, no dizer comum, por causas segundas (GRUNING, 2000, p. 4). E isto, tendo em vista a condução da mesma para Si (CdIC, §321) de um modo infinitamente respeitador das leis da natureza, por si “elevadas à sua consumação” (LOHFINK, 2012, p. 141) e do livre-arbítrio humano que com Ele co(m)-labora no seio de “propriedades emergentes” (MURPHY, 1996, p. 139).

Aduzimos anteriormente que Deus, na Sua ação espiritual no Universo, não necessita de romper com as leis da natureza. Nem sequer nos casos mais extraordinários dessa ação – aquilo a que podemos denominar de milagres – precisamos de supor que tais leis são quebradas. Portanto, um milagre até pode ser estimado (embora não forçosamente) como uma ação que, suscitada por Deus e tendo uma natureza causal espiritual (e não física), potencia a ocorrência de algo que, embora estatisticamente improvabilíssimo, não é impossível face a tais mesmas leis (DAVIS, 1997, p. 163-178), quando não vistas numa clausura estética. 

É um facto que Deus, sendo Deus (e, assim, lógico, sobretudo no Amor que Ele é), não pode realizar algo que seja uma contradição, como, por exemplo, fazer com que uma pessoa com um cancro em fase terminal recupere totalmente e, ao mesmo tempo e sob o mesmo aspeto, fique naqueloutra condição enferma. Mas isso não seria nunca o caso da, bem compreendida, ação espiritual de Deus na Sua criação, quer tal ação fosse incomum (como operar aquela cura), quer fosse discreta e indetetável. Tal ação só seria um contrassenso se se cresse que o Universo fé suscitado por Deus como um sistema isolado à Sua intervenção. O que não é o caso: “a Criação é aberta a Deus” (VICKERS, 2011, p. 38). 

Deveras, crendo-se num tal Deus-Amor, o virtualmente impossível seria que Ele suscitasse uma Criação que O impedisse de nela agir ou, então, que Ele Se afastasse e desinteressasse dela, na linha de uma qualquer “divindade deísta, qual relojoeiro indiferente e sem interferir ‘no melhor dos Mundos’ que suscitou” (OLSON, 2013, p. 60). Mas isso não é a realidade. E não o é, não só porque a Criação não foi criada há milhões de milhões de anos, antes está a ser criada ontologicamente a cada momento (CdIC, §321; GAGLIARDI, 2020, p. 209), mas também porque há evidências, de índole pessoal (WARD, 2020, p. 99), para, ao acreditarmos em Deus, admitirmos que Deus suscitou um Universo com leis tais que garantam que a Sua intervenção é possível e que, em alguns casos, até chega a ser requerida.

É evidente que as ciências naturais, para também poderem funcionar na base de regularidades e predições – decorrentes e descritas pelas próprias leis naturais que as precedem e, a par, sucedem às da matemática (cf. MITTELSTAEDT; WEINGARTNER, 2005, p. 49-62) –, não podem quantificar causas espirituais que interfiram nos processos por si estudados. Seja. Todavia, isso não significa que tais causas (como seria qualquer ação de Deus) não existam (WARD, 2006, p. 125ss). Elas existem, sim, por mais que as mesmas não possam ser totalmente explicadas mediante tais regularidades. 

De facto, basta olhar para nós, seres humanos, para as constatarmos. Nós, com as nossas decisões pessoais, estamos sempre a atuar naquilo que seria regular e previsível, mas sem que isso negue a realidade das leis da natureza, nem sequer as rompa. Creio que bastará um exemplo para ilustrar esta afirmação: qualquer um de nós ficaria com a cabeça molhada se, estando a chover e andasse num descampado, não protegesse, de alguma forma, a dita cabeça. Mas protegendo-a, e desse jeito não ficando com ela encharcada, não estará nem a negar, nem a despedaçar, as leis naturais. Acerca disto, o exemplo das moedas avançado por C. S. Lewis também é de uma clareza pristina (LEWIS, 2012, p. 92).

Peguemos novamente no exemplo que expusemos acerca da pessoa que, ao proteger a cabeça da chuva, impede que ela fique molhada. É inegável que tal ação espiritualmente definida, embora não rompa as leis da natureza, admite o surgir de um elemento que modifica o que era esperado pela lei natural que diz que a chuva a cair numa cabeça destapada, molha-a. Esta mudança “suplementa a causalidade somente física” (WARD, 2008, p. 262).

No caso das ações espirituais do Deus-Amor na Sua Criação (também a partir de dentro das leis que Ele terá voluntariamente elegido para que naquele pudessem surgir seres capazes de partilharem a Sua felicidade no amor), as mesmas não são arbitrárias. Elas comportam uma modificação que implementa um novo ímpeto em direção ao desígnio derradeiro da Criação, minorando as consequências do desamor e, por outro lado, incrementando as do amor. Um desígnio que, como temos vindo a ver, passa por uma plena e consciente comunhão de vida com o Criador. Um propósito divino que tem o seu primeiro passo na Sua primeira – bondosa, mas não necessária (DH 3002 e 3025) – ação espiritual. A saber: o suscitar, de fora do espaço e do tempo (CdIC, §381; RUSSELL, 1997, p. 10), aquele que foi o primeiro momento de um Universo originado também de modo a permitir aquelas ações, as quais, e se necessário for reforçar as paisagens da instável e cambiante memória, não são interferências.

Tudo isto deve ser visto sempre dentro da matriz desejada por Deus de uma colaboração humana, que faz da história das ações de Deus na Criação – desde as inspirações amorosas mais subtis às maiores ações fora do comum – a narração de como Ele procura levar-nos a ser “criaturas co(m)-criadoras” (MARTELET, 2005, p. 85) e a estados de “beleza (experiência), bondade (ação) e verdade (doutrina)” (WARD, 2019, p. 201) que capacitem o Universo a, um dia, poder aceitar ser abraçado pelo Amor. Deus não tem, assim, «projetos para o homem; o homem, ultimamente vivo em Cristo, é o projeto de Deus» (VARILLON, 1981, p. 103).

4.- A criação e a evolução

Já se passaram cerca de 150 anos desde que Darwin, baseado em autores precedentes, postulou a sua teoria da evolução das espécies. Os debates acalorados que, na altura, tal teoria suscitou, já estão ultrapassados e, afora alguns movimentos mais biblicistas do que cristãos (MORRIS, 2021), a teoria científica da evolução é assaz aceite no âmbito do Cristianismo (JOÃO PAULO II, 1996, p. 188). E isto, embora se recuse geralmente a ideologia materialista do evolucionismo, também porque implica uma seleção natural grandemente belicosa e inescrupulosa (PLANTINGA; THOMPSON; LUNDBERG, p. 182).

Para muitos observadores, a mencionada aceitação parece comportar duas realidades tidas por eles como inegáveis. Em primeiro lugar, a admissão de que a fé cristã deixou de ter algo a dizer a respeito do surgir quer da vida, quer do ser humano. Em segundo lugar, um certo baixar de braços na tentativa de falar de uma ação criadora divina. Infelizmente, para tais observadores, isso não é verdade, tal como tentaremos deixar claro nesta secção.

Gostaríamos, desde logo, que ficasse bem assente que “não há uma contradição insuperável entre, de um lado, a evolução do cosmos e da vida, e, de outro lado, a ação divina de criação de tudo o que existe” (VISALA, 2021, p. 411). De facto, Deus também poderá estar a agir, embora não unicamente, através das leis naturais que, em parte, regem o processo evolutivo na senda do surgir de seres cada vez mais capazes de partilharem, livremente e apesar de quão exigente é o amor, da Sua amorosa felicidade e alegria (MALDAMÉ, 2011).

Por esta razão, a evolução pode mesmo ser considerada como uma, mas não a única, das formas pelas quais Deus está a criar continuamente todas as coisas existentes. Na verdade – e não se querendo aqui sugerir que a interpretação que será dada às duas próximas passagens bíblicas é a única possível, nem desejando sequer enveredar pelo concordismo –, a própria Escritura insinua o que mencionámos. Senão vejamos: por um lado, a Bíblia não diz que Deus criou cada espécie de modo hermeticamente separado, antes que o Criador disse: «que a terra produza seres vivos» (Gn 1,24). Por outro lado, Jesus, de acordo com o que refere o “Evangelho de João”, disse que “o meu Pai trabalha até agora, e Eu também” (Jo 5,17).

 A ser assim, os cristãos podem aceitar, sem problema algum, o que já apontámos: a articulação entre a evolução científica e a criação teológica. Eis algo que nos permite continuar a afirmar, com confiança, que o existente: não é aleatório, antes ordenado e, assim, inteligível e cognoscível, também como via de conhecimento do Criador (Sab 11,21; Sir 42,21; Rm 1,20); é belo, bom e amado pelo Criador (Gn 1,31; Jo 3,16); e, contra o que sustentam algumas filosofias orientais e alguns teóricos oníricos atuais, é real e não uma ilusão, pois Deus, sendo o criador de todas as criaturas (At 14,15), não nos engana (Hb 6,18).

Pois bem, depois de termos mostrado que não há qualquer contradição insuperável entre o intricado e elegante processo da evolução, e a mais bela e complexa ação criadora divina – tendo-se mesmo afiançado que Deus também estará a criar por aqueloutro procedimento –, convém presentemente deixar claro que o Mesmo não cria apenas pela evolução (JOÃO PAULO II, 1996, p. 189s). E isto, até porque, desde logo, a noção cristã de criar remete para o facto de que Deus está a suscitar e a sustentar, em cada instante e ao nível mais profundo do ser de todas as coisas, a totalidade do que existe a partir “do nada” (2Mac 7,28), ou seja, desde a plenitude do Seu Amor (CRAIG, 2001, p. 241).

Mas podemos ir mais longe. Olhemos, por exemplo, para o ser humano: o suporte material do nosso corpo é uma forma de vida orgânica que até pode ter evoluído, a partir de condições mais simples, ao longo de milhões de anos, acarretando consigo a sua história evolutiva. Eis o que também poderá ajudar a explicar que, devido à sua associação com o nosso corpo (inseparável das demais dimensões constitutivas do nosso ser), tenhamos acabado por herdar certas tendências, que carecem de ser evangelizadas desde as suas raízes (ZUNDEL, 1990, p. 22), para sermos mais do que ecos, sinuosos ou diretos, dos nossos instintos. Tendências para, por exemplo: a colaboração; a agressão; a busca da beleza; a atração sexual; e, entre outras, a competição (WARD, 2008, p. 65).

Malgrado, o ser humano não se reduz a tal suporte material. Nós somos igualmente seres espirituais, e tudo o que possui uma natureza espiritual – capaz de pensar, estimar e ser (auto-)consciente – não pode evoluir linearmente da matéria (SAYÉS BERMEJO, 2002, p. 254). Ou seja, a consciência que possuímos da matéria não se reduz a uma parte dessa mesma matéria, do mesmo modo que o conhecimento de algo não pode, de todo, ser uma parte desse algo (KREEFT, TACELLI, 2009, p. 255s). Eis, não um pormenor, mas um pormaior.

Se assim é, há que entender que a ação de Deus a nível do Seu ato criador, não é nem um interferir na autonomia dos processos de transformação biológicos, nem da mesma ordem destes. Ela, como já dissemos, é de uma outra espécie de influência propriamente espiritual. Uma que, sem desvirtuar aquele movimento transformador, opera de tal forma que, entre outras coisas, garante aos seres, que por esse movimento evoluem, as próprias naturezas dos mesmos. Ao mesmo tempo, dá a tais seres a capacidade de agirem de acordo com tais naturezas prenhes de Deus (MALDAMÉ, 2011, p. 248s) conferindo-lhes um sentido que eles, por si mesmos, “não possuíam, nem poderiam atribuir” (ROBERTSON, 2004, p. 11).

Este divino conferir de sentido ao que, de outro modo, seria como que um mero mecanismo simplesmente arbitrário e quase niilista “que provocaria aversão pela vida” (URE, 2020, p. 136ss), não elimina o empenho que nós devemos colocar nas nossas vidas e no Mundo ao nosso redor, como se o crente fosse “abandonar o mundo à sua miséria e ir refugiar-se numa salvação eterna puramente privada” (BENTO XVI, 2007, p. 997). Pelo contrário: ele motiva o nosso desejo de vivermos de acordo com a nossa natureza de “criaturas divinizáveis por Cristo” (VARILLON, 1997, p. 21) – pautada sobretudo pela liberdade, o conhecimento e a vontade que permite querer (e, assim, amar) –, de modo a lograrmos alcançar a já aludida meta global de tal sentido: Deus-Comunhão e tudo comunitariamente n’Ele. Observe-se que o alcançar essa meta não será o continuar da referida procura, mas o próprio remate desta numa dinâmica sempre em crescendo (PETCU, 2017).

Abordaremos, agora, duas breves consequências sobre a relação entre a evolução e a criação a partir do que já afiançámos precedentemente.

· Em primeiro lugar, gostaríamos de avançar que a possibilidade de se articular a evolução com a criação, poderá lançar alguma luz sobre os acidentes naturais que existem no Universo em geral, e no planeta Terra em particular. Tais como: choques de planetas com asteroides, terramotos, mutações genéticas suscitadoras de doenças, etc. Estes talvez sejam, de certo modo, parcialmente inevitáveis para que possam surgir, justamente e dentro do já nosso conhecido cenário do respeito divino pelas leis que regem tal Universo, criaturas livres, capazes de gizarem estratégias para se evitar tais situações (WARD, 1998, p. 194s). Deveras, “não são os tremores de terra que matam as pessoas, mas as construções ainda não suficientemente adaptadas a eles” (WHITE, 2014, p. 47). E inevitáveis, mesmo para um Deus que, enquanto Amor que ama em expansão, nem pode deixar de amar, nem impedir que O possamos amar – o que ocorreria se Ele interferisse no nosso livre-arbítrio (PLANTINGA, 1989, p. 30), que, baseado na imponderabilidade basilar daquelas leis, permite a nossa liberdade que se consuma, justamente e sejam quais forem os nossos repertórios, no amor.

Dito isto, e acreditando-se num Deus somente bom que ama (sem reservas) tudo o que cria, podemos ter a certeza de que Ele, conforme nos afiançou pela Sua revelação (Ap 21), garantirá, a todos os seres semelhantes a Si – pelo conhecerem e amarem reflexamente em liberdade (e em especial aos que sofrem conscientemente fruto de tais acidentes) – a doação de um “bem espiritual pessoal infinitamente superior” (WARD, 2008, p. 80) A saber: após “um consciente crescimento em criatividade, sensibilidade e comunidade” (WARD, 1998, p. 165), a já apontada vida de ventura desmedida em Si após a, feita vivível, morte biológica.

· Segundamente, a articulação entre criação e evolução pode aclarar, em parte, a matriz biológica – se assim a pudermos denominar – do que nós, cristãos, designamos de pecado original. Este, além da sua compreensão religiosa mais ou menos comum e correta (CdIC §397-404), também pode ser iluminado pelo facto de que, ao longo de milhares de anos, os primeiros homens, na sequência daqueles seres que os terão precedido, poderem ter elegido aderir a tendências para a agressão e o egoísmo, em vez de optarem por acolher e desenvolver outras disposições associadas ao altruísmo e à bondade (DOMNING; HELLWIG, 2021).

A morte biológica já existia antes de terem surgido os primeiros seres humanos – quer a pensemos, ou não, como fruto retrospectivo da ação humana (DUARTE, 2012, p. 107s) –, mas estes terão trazido até si mesmos aquela morte espiritual em desamor (1Jo 3,14), paralela a uma alienação (ciente ou não) quer de Deus, quer da perceção da Sua realidade e presença. Uma alienação que, embora não seja a última palavra na relação entre Deus e a humanidade – Jesus Cristo é-a (GRAY, 2016, p. 176) –, acaba por ser incrementada sempre que cada um de nós realiza sucessivos reforços comportamentais daquele desamor que nos mantém na morte.

5.- A origem da Criação e o começo do Universo

Resta-nos, neste texto, tratar da relação entre o começo do Universo e a origem da Criação. Principiamos esta temática recordando o que tantas vezes ouvimos ser dito: a ciência diz algo de totalmente diferente do Cristianismo acerca do princípio do Universo. Será assim? 

Desde logo, há que saber, e conseguir mostrar, a diferença entre começo e origem (SESBOÜÉ, 1999, p. 140-142). O começo é uma noção complexa, mormente porque, na prática e com todo o rigor, nada logramos deslindar a começar, mas já depois de ter começado, pois “todo o começo é indeterminado e o seu instante inicial imperceptível” (POWER, 2020, p. 331). Uma noção que remete para um ato intelectual que faz uma distinção entre um antes e um depois, tal como já sustentara Aristóteles (ARISTÓTELES, 1995, p. 367-368 = VI, 6. 237b10.). É assim que a teoria do Big Bang (ou explosão cósmica inicial) – avançada pela primeira vez pelo sacerdote católico Georges Lemaître – pode hoje ser considerada a descrição mais plausível acerca do começo do Universo; a “melhor teoria disponível” (CLEGG, 2021, p. 52).

Já a noção de origem é de outra esfera da de começo. De facto, ela é de um nível não cronológico nem físico, mas para além da física e do propriamente temporal. Um nível conceptual que aponta para a circunstância, não isolável temporalmente (nem ao nível dos eventos físicos), de uma criação total de tudo o que existe (GAGLIARDI, 2020, p. 204). Se assim é, a origem implica, na sua própria compreensão e como já vimos espalhado neste texto, a ideia de criação e a realidade de um Criador que, pelo Seu ato criador, suscita e sustém continuamente na existência, de modo intencional e consciente, toda a realidade diferente de Si. Não é mesmo este o sentido mais reto de pantokrátōr? (TEÓFILO DE ANTIOQUIA, 1970, p. 64 = I, 4)

Posto isto, é um facto que a origem da Criação é menos facilmente apreensível na ponderação do surgir do Universo, pois este é, por assim dizer, o instante em que o que existe aparece. Contudo, com isto bem patenteado e por mais estranho que possa parecer, até pode haver origem sem haver começo (CASTELAO, 2013, p. 197).

Com isto tudo bem assimilado, é de se mostrar que a visão científica do começo do Universo e a leitura cristã da origem da Criação não precisa de ser tida como oponível. Isto é, não precisa de sê-lo para os crentes cristãos (inclusive para aqueles entre estes que são cientistas e até cosmólogos), pois para quem ainda não quer crer em Deus, tal oposição é invencível, pois a origem está associada ao ato criador de Deus.

Para o cristão, a leitura crente da realidade convida-o a acreditar, com toda a razoabilidade e sensatez, que a Criação – seja esta constituída ou não apenas pelo nosso Universo (WARD, 2008, p. 233-235) – é originada num desígnio livre e auto-desinteressado de Deus-Amor que a cria repleta de bondade e de beleza. E Deus cria-a, aspirando a que nela surjam seres que possam compartilhar conscientemente com Ele a felicidade de existirem e – embora de outro modo, mas sempre no contexto de uma dinâmica de relação espiritual esponsal com Ele – partilharem o dom da vida a outros (CdIC §1652). Mais: e que tais seres, assim ditos como criados à imagem semelhante de Deus (Gn 1,26), apreciem, juntamente com Este, a beleza e a bondade que lhes são entregues para serem cuidadas e incrementadas pelas suas decisões pascais humanizantes, em que, “desprendemo-nos do útil de modo a o nosso agir seja deveras um apelo à gratuidade” (VARILLON, 1980, p. 146), se promove o amor.

Face a isto, o cristão pode fiar que a Criação: não é inimiga de Deus (nem vice-versa) como nos mitos antigos (MATHEWS, 1996, p. 119); é honrada por Deus pelo próprio valor que Ele lhe deu e é revigorado pelo homem num “nobilíssimo reverdecer” (HILDEGARDA DE BINGEN, 1998, p. 218); existe por uma razão (exposta no parágrafo anterior); possui para uma meta clara (que já vimos que foi alcançada em Cristo Jesus como matriz de vivermos n’Ele e, assim e com tudo o demais, no âmago de Deus); e, entre outras realidades – e no que até pode ser tido como um dos fundamentos incontornáveis para as ciências naturais terem surgido no âmbito cristão – pode ser apreciada e estudada, pois é inteligível e cognoscível por consciências inteligentes e querentes (CLAERBAUT, 2004, p. 108).

O cristão pode aceitar a visão científica do começo do nosso Cosmos, hoje baseada na hipótese do Big Bang. Pode, ainda – e desde a leitura que a fé convida a fazer acerca do que é a criação (o ato criador de Deus) e a Criação (o conjunto das criaturas existentes e sempre dependentes de Deus) – entender o Universo como não sendo o fruto de algo (passado e/ou presente) aleatório, caótico, caprichoso ou até ilusório (GHUGARE, 1995, p. 85), mas de um amor dotado, e dador, de sentido, dignidade, valor e liberdade (WARD, 1998, p. 198s).

Para acabarmos esta secção do nosso estudo, resta apontar um breve conjunto de ideias.

· A primeira ideia, é que se hoje há pessoas que se sentem desconfortáveis com a antes mencionada visão científica, elas não estão, geralmente, no Cristianismo genuíno, que pode estar tranquilo com qualquer explicação científica natural que se revele verdadeira, Estão, sim, em alguns cientistas naturais e nas suas ideologias às vezes politicamente mascaradas (DAWKINS, 2020). Seja nos que erradamente buscam basear-se em motivos somente científicos (STENGER, 2007); seja naqueles que, seguindo pressupostos materialistas indemonstráveis pelas ciências naturais, estimam que a teoria do Big Bang não é senão um ardil para fazer a ciência “ceder à ideia judaico-cristã de um começo do mundo” (CLARK, 2017, p. 54); seja nos que creem que a “ciência fez Deus obsoleto” (WARD, 2008, p. 216).

· A segunda, tem a ver com a natureza dos textos bíblicos que falam da criação da Criação. Estes não são tratados científicos de cosmologia, antes interpretações sagradas crentes – baseadas na fé num Deus sábio, libertador e abridor do presente a uma esperança sempre maior que se saciará apenas em Si – de como é que, olhando os seus autores humanos para o presente em que viviam, puderam ser as primeiras páginas de uma história de amor. Aquela história de amor (e de desamor, mas apenas do lado humano) entre, por um lado, Deus, e, por outro lado, a humanidade (sobretudo a enxertada em Cristo Jesus), entendida também como cuidadora das demais criaturas (JOHNSON, 2014; 2018).

· A terceira ideia (talvez a mais importante de todas), reporta-se ao papel que o Senhor Jesus tem na origem da Criação. Jesus é a Palavra de Deus – tão Deus como o Pai e o Espírito Santo – feita ser humano (sem deixar de ser Deus), sendo a sua Pessoa a mesmíssima Pessoa divina de Deus-Filho. Pela Sua morte-ressurreição, o que em Jesus não era estritamente divino (a Sua humanidade, inclusive com as marcas da paixão) é assumido plenamente na vida divina. E isto, num evento com repercussões cósmicas que se estendem para trás (DH 2803) e para a frente do mesmo, até a um Ponto Ômega pessoal identificado com Cristo Jesus glorioso numa “evolução que é santa” (TEILHARD de CHARDIN, 1961, p. 215) e no que faz “da esperança cristã algo operante em direção ao esperado” (RUIZ de la PEÑA, 1996, p. 141).

Assim sendo – havendo em Deus, que cria eternamente uma Criação que se manifesta temporalmente, uma realidade criada já glorificada (aquela humanidade de Jesus) (Lc 24,26) – Este torna-se, para todos os efeitos, o Senhor de toda a Criação (Flp 2,9-11), bem como, quer o meio divino originário dela (Col 1,16), quer o conferidor de consistência à mesma (Hb. 1,13), quer (como já sabemos) a sua meta (Col 1,16) não indiferente de nós. Eis porque, independentemente de como foi o começo do Universo (que, porém, o crente deve querer conhecer, também como meio de apreciar melhor o Criador), a meta da Criação é como que a matriz da origem desta, e, por conseguinte, a própria moldura de tal começo (OSBORN, 2001, p. 131; IRENEU DE LIÃO, 1969, p. 212-217 = V, 16, 1s).

Palavras finais

Quando se tem pouco espaço para escrever, acaba-se por escrever muito. Mas nem com muitas palavras daria para sintetizar o que escrevemos neste estudo, deixando sempre em aberto janelas para correções e aprofundamentos. Seja como for, lográmos mostrar que os grandes assuntos de fronteira entre a fé cristã e as ciências religiosas não se opõem. São, isso sim, uma forma de se ver em relevo mais rigoroso a realidade que está sob esses assuntos.

Assuntos estes, acerca dos quais os cristãos nada têm a temer sobre o que as ciências naturais têm a dizer. Eles devem, antes, ter tudo a respeitar, admirar e refletir sobre o que, por elas sendo dito, pode ter implicações para uma melhor cognição incarnada da sua fé. Algo fundamental nestes dias em que somos cada vez mais confrontados com a necessidade de darmos a conhecer as “razões da nossa esperança […] com mansidão e respeito” (1Pd 3,15s).

Desta forma – e tendo nós quase que recorrido, em sentido contrário (e com diversas reiterações clarificadoras), a gesta do Cosmos e da Criação –, estimamos que este trabalho pode ser um pequeno, mas rigoroso, contributo para duas coisas. Por um lado, mostrar que a fé cristã tem tudo para sobreviver, e de modo vibrante e alegre, a esta época híper-científica. Por outro lado, ajudar, se os proponentes desta mesma híper-cientificidade assim o desejarem, estes a verem a relevância da prática religioso-espiritual para, sem macularem as suas metodologias, serem mais conscienciosos e humanos no uso das suas descobertas.

Isto não será fácil. Nós sabemo-lo bem, inclusive devido à nossa própria experiência de docentes de disciplinas de Mundividência Cristã a futuros cientistas. Teremos, muitas vezes e por assim dizer, que viver com afogo entre as possíveis certezas da fé e as enxurradas de hipóteses das ciências naturais. Todavia, vale a pena, por mais que este fazer pontes não comporte todas as respostas aos dois contributos, sendo antes um convite humilde e amoroso para uma demanda comum pelo essencial do essencial que leva a que não “descubramos o segredo do átomo e esqueçamos o Sermão da Montanha” (BRADLEY, 1967, p. 588)

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