Alexandre B. Favretto
Doutor em Teologia pela Dogmática pela Pontificia Università Gregoriana de Roma. Professor da Faculdade de Teologia da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas). Contato: alexandre.favretto@puc-campinas.edu.br
Resumo: O presente artigo apresenta a relevância da utilização das referências patrísticas, durante o Concílio Vaticano II, para uma concepção doutrinária positiva sobre as religiões. O que oferece, ainda, contribuições para o pensamento teológico sobre o significado das religiões. Tal feito foi possível pela ênfase cristocêntrica destinada ao tema das religiões na reflexão conciliar sobre as tradições religiosas no Decreto Ad gentes, fundamentada da concepção de Logos protreptikós de Clemente, que traz a dimensão da vasta economia do Logos que atinge a origem das religiões. Em decorrência desta abordagem cristocêntrica, o significado das religiões do mundo, em termos de preparação à promulgação do Evangelho, finda por ser entendida menos em termos de substituição das mesmas e mais como uma participação das religiões, a seu modo, no desígnio salvífica de Deus em Cristo. Isso posto, o artigo divide-se em duas partes. A primeira delas apresenta, na teologia patrística de Clemente, o caráter processual e a presença fundamental do Logos-Cristo nas religiões do mundo, atribuindo-lhes importância na história da salvação. A segunda, o uso da teologia de Clemente associada à de Eusébio de Cesaréia no Decreto Ad gentes n. 3 e a possibilidade de uma releitura do significado da formulação preparação evangélica, aplicado às religiões.
Palavras-chave: teologia das religiões; preparação evangélica; Clemente de Alexandria
Abstract: This article presents the relevance of the use of patristic references, during the Second Vatican Council, for a positive doctrinal conception about religions. This also offers contributions to theological thinking about the meaning of religions. This achievement was made possible by the Christocentric emphasis on the theme of religions in the conciliar reflection on religions in the Decree Ad gentes, deriving from Clement's conception of Logos protreptikós, which brings the dimension of the vast economy of Logos that reaches the origin of religions. As a result of this Christocentric approach, the meaning of the world’s religions, in terms of preparation for the promulgation of the Gospel, ends up being understood less in terms of their replacement, and more as a participation of religions, in their own way, in the saving design of God in Christ. That said, the article is divided into two parts. The first of these presents, in Clement's patristic theology, the procedural character and fundamental presence of the Logos-Christ in the religions of the world, attributing importance to them in the history of salvation. The second, the use of Clement's theology associated with that of Eusebius of Caesarea in the Decree Ad Gentes n. 3 and the possibility of a rereading of the meaning of the formulation evangelical preparation, applied to religions.
Keywords: theology of religions; evangelical preparation; Clement of Alexandria
O Decreto Ad gentes (AG) apresenta a formulação de Eusébio de Cesaréia, praeparatio evangelica, para se referir às tradições religiosas e, ao fazê-lo, resgata esta fundamentação patrística já utilizada na Constituição Dogmática Lumen gentium (LG), que havia sido aplicada tendo por referência a teologia do Logos de Justino e Irineu. Contudo, realizou-se um acréscimo.
Articulada à noção de preparação evangélica, foi utilizada a reflexão teológica de Clemente de Alexandria, sobre a vasta economia do Verbo na história da salvação, na qual estão situadas as religiões. Esse acréscimo é um desenvolvimento na própria doutrina do Concílio sobre as religiões, e que precisa ser estudado por ocasionar uma concepção positiva sobre as religiões em perspectiva teológico-cristã.
Em termos interrogativos, a questão é em que medida o incremento cristológico da teologia patrística de Clemente, utilizada na AG 3, favorece a compreensão positiva sobre as religiões apresentada pelo Concílio Vaticano II? Para desenvolver esta questão neste artigo, utilizam-se as Atas do Concílio, em sua versão original, buscando desvelar a intencionalidade dos padres conciliares no uso da reflexão teológica de Clemente sobre as Religiões.
Feito isso, dá-se o enfoque ao produto deste processo, que está em AG 3, com a associação entre a noção de preparação evangélica, de Eusébio de Cesaréia, e a amplitude da cristologia do Logos de Clemente, que insere as religiões na história da salvação e atribui-lhes positivo significado. O conteúdo do AG possibilita compreender a preparação das religiões à promulgação do Evangelho não em termos de substituição das mesmas, mas em termos de uma função fundamental no desígnio divino de salvação.
O princípio fundamental da teologia do Logos de Clemente de Alexandria é a mesma de Justino e Irineu, nas quais a revelação manifestativa de Deus somente acontece por intermédio do Logos, identificado com o Cristo. Ao homem somente é possível conhecer o Deus inefável pela graça divina e mediante o Logos (Clément, 1981, n. 12). No entanto, há uma significativa diferença entre a cristologia desses dois primeiros Padres da Igreja com relação à de Clemente.
Enquanto para Justino e Irineu, não obstante os distintos meios utilizados pelo Logos para revelar o Pai e a verdade divina, todo conhecimento de Deus é atribuído à ação do Verbo divino (DUPUIS, 1999, p. 100-102); ao invés disto, Clemente distingue em uma economia paralela dois planos oriundos do mesmo desígnio divino que, em sua providência, quer possibilitar a todos a salvação (DANIÉLOU, 2010, p. 62-69).
Um deles é a possibilidade de um conhecimento elementar sobre Deus, acessível a todo ser humano mediante a simples operação racional. Trata-se de um conhecimento racional comum, devido ao Logos, e que é dom de Deus (DANIÉLOU, 2010, p. 66; Clément, 1997, n. 8.63). A esta atitude natural da inteligência que busca conhecer Deus se atribui a conceituação de conhecimento natural de Deus: “uma intuição do Deus único e todo-poderoso de fato existiu em todos os homens de mente reta, em todos os momentos”[1].
O que não significa afirmar uma realidade puramente natural, isenta do dado sobrenatural da graça, uma vez que também a inteligência é de origem divina e, com efeito, a capacidade de escolha dos homens obedece, sobretudo, a vontade de Deus (Clément, 1997, n. 17.157.3). Deste modo, Clemente explica a possibilidade de um conhecimento parcial de Deus mesmo entre os pagãos (Clément, 1981, n. 14.134.1), conhecimento imperfeito, mas real (DANIÉLOU, 2010, p. 63-64). Isto porque no homem, desde o momento de sua criação, foi incutida a ideia de Deus (Clément, 1997, n. 2.8.2). Trata-se do exercício do pensamento que tateia de algum modo a verdade, ainda que de forma vaga e parcial (Clément, 1951, n. 16.80.5).
Há outro tipo de conhecimento, de ordem sobrenatural. Não se trata mais de um conhecimento comum sobre Deus, mas de um conhecimento elevado, acessível a algumas pessoas através da ação do Logos. Trata-se de uma assistência especial a alguns homens eminentes, chamada por Clemente de inspiração particular de Deus (Clément, 1997, n. 17.157.4), em vista de uma missão. “São os líderes e educadores através dos quais a atividade da Providência se mostra com grande clareza, sempre que Deus deseja fazer o bem aos homens pela educação ou por algum cargo de comando e governo”[2].
Estes homens eminentes são os filósofos gregos, nos quais agiu o Logos. Este concedeu uma assistência especial de Deus para que eles pudessem profetizar em meio ao mundo pagão (DANIÉLOU, 2010, p. 66-67). “Os pensamentos dos homens virtuosos nascem da inspiração divina, quando a alma está numa certa disposição e a vontade divina é comunicada às almas humanas, graças à assistência dos ministros divinos respectivamente encarregados de tal serviço”[3].
A filosofia se constituiu, para os gregos e povos pagãos, em uma economia paralela à Lei (Clément, 1997, n. 5.42.1). Isto, em vista do desígnio salvífico de Deus, cuja providência possibilita a justificação destes povos (Clément, 1951, n. 5.28.1). Citando São Paulo, Clemente recorda que Deus era conhecido pelos gregos de modo pagão, pelos judeus de modo judaico e pelos cristãos, de modo espiritual (Clément, 1999, n. 5.41.1-7). E ainda, “pois Deus, que desejava salvar os judeus, deu-lhes profetas; da mesma forma, fez nascer dos gregos os mais célebres dentre eles, para fazer deles profetas que falassem a sua língua, na medida em que pudessem receber as bênçãos divinas”[4].
Isto posto, em Clemente a filosofia constitui uma Aliança, porque é parte da divina providência que estende a salvação a todos (Moreschini, 2013, p. 321-323). Portanto, o Logos é protreptikós (Clément, 1997, n. 8.67.1). Sua influência se estende para além dos confins da tradição judaico-cristã, estendendo-se ao mundo pagão, suscitando entre eles profetas que, sob a ação do Logos, tem uma missão divina entre as nações (DUPUIS, 1999, p. 100-101).
Estas salutares revoluções distinguem-se, segundo a ordem de mutação, por tempos, lugares, honras, conhecimentos, heranças e ofícios, cada um por sua vez, até à posição, supereminente e próxima do Senhor, de contemplação na eternidade. Agora o próprio ser amado atrai à contemplação todo o ser que se tenha dedicado completamente à contemplação através do amor próprio ao conhecimento. É por isso que o Senhor deu os mandamentos, o primeiro e o segundo, extraindo-os de uma única fonte, sem deixar os homens anteriores a Lei privados da lei, nem ceder as rédeas à relutância daqueles que não ouviram a filosofia bárbara. Ao fornecer a uns mandamentos, a outros a filosofia, ele encerrou a descrença até ao momento da sua presença, quando todo o homem que não acreditou é indesculpável. Ele conduz, de facto, tanto dos gregos como dos bárbaros à perfeição que é obtida pela fé[5].
Não há dúvidas de que Deus é a fonte de todos os bens. “É dele que a Providência procede, tanto para o indivíduo, como para a comunidade e para o universo (...) Por isso o Senhor de todos os seres persuade aqueles que estão dispostos, entre gregos e bárbaros”[6]. A filosofia tem sua origem em Deus e constitui para os Gregos o que a Lei é para os hebreus, uma preparação para Cristo e para recepção do Kerygma (DANIÉLOU, 2010, 84).
Interessante é que, para Clemente, a inspiração divina não estava destinada aos filósofos que lhe eram contemporâneos, mas aos antigos filósofos (DANIÉLOU, 2010, 68-70). O que é significativo porque, deste modo, este Padre apologista estabelece uma relação de dependência da filosofia grega para com a chamada filosofia bárbara, dos povos não gregos da antiguidade[7]. E conclui:
A filosofia, esta coisa útil, floresceu em tempos antigos entre os bárbaros, manifestando-se de acordo com as raças; e foi mais tarde que veio para os gregos. Os profetas do Egito, os caldeus da Assíria, os druidas da Gália, os filósofos dos Celtas, os Magos dos Persas e os Ginosofistas da Índia, e outros filósofos bárbaros que formam duas famílias, os Sarmanianos e os Branmanianos. Há também entre os índios aqueles que obedecem aos preceitos de Buda[8].
Conforme o excerto citado acima, em Clemente a filosofia foi para os gregos um instrumento de salvação concedido por Deus (DUPUIS, 1999, p. 100-105). Sendo os verdadeiros mestres da filosofia não apenas os antigos gregos, mas também os denominados bárbaros, pessoas fora do mundo grego e que lhes precederam (Moreschini, 2013, p. 315-319). Portanto, chega-se aqui a uma conclusão importante. Faz-se possível afirmar um papel positivo destas tradições religiosas, citadas acima, na história da salvação, em função da prévia presença e ação do Logos em todas elas, constituindo-se o seu fundamento mais original e causa daquilo que nelas se evidencia como verdade, ainda que parcial, já que em termos cristãos a plenitude da verdade se dá em Cristo e no cristianismo (FÉDOU, 2013, p. 178).
Em suma, o Logos é a luz mediante a qual todo homem pode ver a Deus (Clément, 1949, n. 84.6). Nas palavras de Clemente:
Se, de fato, os gregos reuniram, melhor do que os outros, algumas centelhas do Logos divino e fizeram ouvir algumas verdades raras, então testemunham que o poder da verdade não estava oculto; mas eles se acusam de fraqueza, uma vez que não alcançaram a meta. Todos agora veem com evidência, creio eu, que fazer ou dizer algo sem o Logos da verdade é como ser forçado a andar sem pés[9].
Esse caráter processual e heurístico da ação do Logos protreptikós, apresentado acima, de Clemente, quando relacionado ao uso da formulação praeparatio evangelica de Eusébio pelo Concílio Vaticano II na AG 3[10], oferece novas luzes para uma reflexão sobre o significado teológico das religiões e seu papel na economia divina, sem abrir mão da unicidade mediacional do Logos-Cristo, o que será apresentado no tópico seguinte.
Na AG 3 a concepção do Logos presente nas diversas religiões, de Clemente, e a noção de preparação evangélica, atribuída à religião judaica, de Eusébio, são utilizados conjuntamente. Qual o motivo disto? Qual a intencionalidade dos padres conciliares? Como este conteúdo contribuiu para uma reflexão teológica sobre o significado das religiões? É o que estudaremos a seguir.
No que se refere à teologia do Logos em Clemente, precisou-se a presença e atuação universal do Logos imanente de Deus durante toda a história humana, sem abdicar do evento culminante da Encarnação. De fato, estes Padres apologistas compreenderam que a atuação do Logos no período pré-cristão possuía um caráter propedêutico à completa compreensão do Kerygma, o que seria possível apenas com a Encarnação do Logos em Jesus Cristo (Clément, 1951, n. 28).
Trata-se da processualidade histórica da pedagogia divina que encaminha toda humanidade para a salvação, conceituada por Eusébio de Cesaréia como praeparatio evangélica (Eusébio, 1986, n. 1.11). Clemente expôs com especial clareza esta dinâmica histórico-soteriológica cristã ao afirmar que a filosofia foi, de fato, necessária aos gregos antes da vinda – parusía – do Senhor, a fim de fazê-los atingir a prática da justiça. Com efeito, a filosofia foi para os gregos um bem primordial, na medida em que os educava – epaidagóghei – para Cristo, como o fazia a lei para os judeus (Clément, 1951, n. 5.3).
Contudo, em época contemporânea, e portanto, após o evento da Encarnação e em meio a realidade fenomênica da pluralidade de religiões, urge um questionamento. A vinda do Senhor se restringe ao evento cronológico de Sua Encarnação? De modo que a preparação evangélica se esgotaria com o evento histórico Jesus Cristo. Ou, o caráter de unicidade e universalidade do evento da Encarnação amplia-se para além do aspecto cronológico e estende-se ao aspecto kairológico do tempo, de modo que a preparação evangélica permanece uma realidade providencial que se mantém até a devida promulgação do Evangelho a todas as pessoas; ainda que isto venha a ocorrer, plenamente, somente no schaton da eternidade?
A segunda consideração, acima, apresenta-se como a mais correta (Saldanha, 1984, p. 169-170; DUPUIS, 1999, p. 83-114). Em termos interrogativos, seria possível afirmar, a partir destes Padres da Igreja, que com a vinda do Logos na Carne, a sabedoria antiga dos filósofos e a lei mosaica teriam perdido seu papel na economia da salvação? De forma alguma, já que a filosofia dos bárbaros, bem como a grega, são fragmentos da verdade eterna e, portanto, da teologia do Logos disseminadas em toda parte, sobretudo, nas religiões (Clément, 1951, n. 57.4; Moreschini, 2013, 315-319)[11].
Esta consideração de Clemente evidencia seu pensamento universalista. Em qualquer cultura humana, na medida em que haja fragmentos da verdade, estes preparam à perfeição alcançada por Cristo. Isto porque, esse Padre considera que os dons concedidos por Deus a cada geração são oportunos na medida em que são uma educação preparatória para a definitiva Palavra de Deus (Clément, 1951, n. 29).
Clemente expressa a consciência de que o kerygma cristão ainda não havia sido promulgado a todos: “a promulgação do Evangelho ainda estava em curso. Enquanto o chamado não tivesse sido escutado, no sentido mais amplo da palavra, a filosofia e, analogamente (...) as outras religiões continuariam a desempenhar, entre os homens, seu papel divino de educação” (Saldanha, 1984, p. 169-170). Deste modo, sua função providencial duraria até que o Evangelho fosse devidamente promulgado a todas as pessoas (DUPUIS, 1999, p. 110-111; Eusébio, 1991, n. 14).
Eusébio de Cesaréia inaugura um gênero particular de interpretação da historiografia com sua obra Storia ecclesiastica. Deus e o Logos manifestam-se na história da humanidade, são os seus protagonistas. Tem-se aqui uma autêntica teologia da história. Nesta, Eusébio distintamente da historiografia grega que se utiliza dos termos fato e sorte, para designar os acontecimentos históricos, conceitua-os como providência. Tal feito não é mera cristianização dos antigos conceitos gregos, mas uma nova compreensão da relação entre a livre ação humana e o desígnio providencial sobrenatural divina (Prinzivalli; Simonetti, 2012, p. 309-313)[12].
A natureza divina é definida por Eusébio como sendo a de um Deus que é salvador e benfeitor, que providencialmente cuida dos seres (Eusébio, 1986, n. 6.23; Moreschini, 2013, p. 466-471). Deus, em sua bondade, governa o universo e é o dispensador da graça. Graça aqui compreendida como “aquele amor bom e salvador dos homens por Deus que o Verbo, enviada do céu pelo Deus mais benigno como um raio da luz infinita, proclama como boa nova para a humanidade”[13]. Esta irradiação da bondade divina, que é graça manifesta-se, sobretudo, nos profetas e legisladores hebraicos, alcançando o cume com a vinda do Salvador (Moreschini, 2013, 465-471). Com as palavras de Eusébio, o Logos encarnado:
(...) exortando-os, não só deste ou daquele lugar, aqui ou em outro lugar, mas de todos os lugares e de todas as nações, a irem ao Deus do Universo, a se apressar, a acolher o presente com todo impulso de sua alma, sejam eles gregos ou bárbaros, homens, mulheres ou crianças, todos ao mesmo tempo, pobres e ricos, educados ou não, sem nem mesmo excluir o povo de escravos de sua vocação. Isso porque seu Pai, tendo moldado todos eles a partir de uma única substância e natureza, naturalmente os considerou dignos de um mesmo favor, fazendo, a todos aqueles que querem ouvir e se abrir facilmente para receber sua graça, o dom do conhecimento e do amor de Deus[14].
Clemente confirma a função proeminente da sabedoria hebraica, seja pela sua antiguidade, seja pela excelência de sua doutrina (DANIÉLOU, 2010, 62-83). De fato, “a filosofia dos hebreus é a mais antiga de todas as sabedorias”[15]. Este Padre da Igreja demonstra a antiguidade de Moisés e da Bíblia judaica com relação aos sábios e poetas gregos (Clément, 1951, n. 21.107.7). Categoriza, assim, aqueles como os mestres destes (Clément, 1951, n. 22.150.1-3).
Quando Clemente, portanto, fala de preparação providencial para Cristo (DANIÉLOU, 2010, p. 82-83), não se refere à filosofia grega que lhe é contemporânea, mas à filosofia bárbara[16] mais antiga (DANIÉLOU, 2010, p. 70), que serve de fundamento a toda verdade. Com isso, pode-se afirmar que “a filosofia é um dom de Deus enquanto foi comunicada aos sábios antigos”[17]. Deste modo, Clemente alega que a filosofia grega é dependente dos profetas hebreus, dos quais se apropriou da verdade. O problema é que os filósofos, tolhendo a autoridade divina que fundamenta a verdade, falsificam-na e a reduzem à mera construção da opinião humana (DANIÉLOU, 2010, p. 83-90).
Inclusive, acusa os sistemas filosóficos gregos de furto e plágio, pois o que afirmam como verdade, na realidade, foi apropriado do hebraísmo antigo (CLÉMENT, 1951, n. 17.87.2). Isto porque “podemos também encontrar outro testemunho para estabelecer com certeza que os seus melhores filósofos, tendo-nos emprestado a mais bela das suas doutrinas, se vangloriaram de terem vindo deles”[18].
Sua crítica ao plágio dos filósofos gregos permite concluir que a doutrina hebraica e, portanto, os escritos sagrados dos hebreus são realidade ontológica de todo sistema filosófico e religioso que busca descobrir a verdade. Ainda que esta verdade seja parcial, pois a verdade total somente se dá em Cristo, não se pode excluir o dado apriorístico da assistência divina que nunca abandonou nenhum povo, enviando-lhes sempre um guia espiritual, que para os judeus, foram Moisés e os profetas e, para os diversos outros povos, os sábios antigos que são os filósofos por excelência (DANIÉLOU, 2010, p. 83).
A partir do exposto, chega-se a uma importante conclusão. Faz-se possível teorizar a compreensão do porquê o conceito de praeparatio evangelica de Eusébio de Cesaréia tenha sido apropriado pelos padres conciliares no Concílio Vaticano II (LG 16, AG 3) como elemento para compreensão do significado teológico das religiões. A LG 16 é categórica em manter o valor teológico do povo hebraico como referência à gradação pela qual os seguidores das diferentes religiões estão ordenados ao povo de Deus (Canobbio, 2007, p. 27-28). Ainda que Eusébio atribua à religião hebraica o conceito de preparação evangélica, os Padres conciliares ao utilizarem-se deste conceito na AG, 3 articulam-no à teologia do Logos de Clemente. O que autoriza a ampliação de seu significado, estendendo-o às outras tradições religiosas do mundo.
Isto porque, conforme Clemente, toda filosofia dos gregos depende do hebraísmo, que a antecede e lhe é superior em doutrina, constituindo-se, portanto, em fundamento ontológico de toda verdade pronunciada. Sendo a doutrina hebraica, que é preparação evangélica, uma base influente nos demais sistemas filosóficos e religiosos; nesta perspectiva, o conceito de preparação evangélica pode estender-se também a estes.
Importante notar que, não se pode confundir o que está afirmado acima e, portanto, o que de bom e verdadeiro é desenvolvido pelas tradições filosóficas e religiosas pela ação do Logos divino que distribui suas semina verbi, com aquilo que é criação da especulação lógica e opinativa, em que o orgulho humano, desviado pelos mitos ou idolatria, busca por suas próprias forças conhecer a Deus e a verdade (RATZINGER, 1992, p. 413-415; Canobbio, 2007, p. 23-28).
Isto posto, deve-se reconhecer que também nos ritos e culturas próprios de cada povo, e não somente no coração e na mente dos homens, pode-se encontrar o bem (LG 17)[19]. Destarte, o caráter missionário da Igreja precisa considerar o que de bom já existe nas religiões e fazer com que “não só não pereça, mas antes seja sanado, elevado e aperfeiçoado, para glória de Deus, confusão do demónio e felicidade do homem” (LG 17).
Na LG 16, que desenvolve a relação da Igreja com os não cristãos, tem-se que: “tudo o que de bom e verdadeiro neles há, é considerado pela Igreja como preparação para receberem o Evangelho dado por aquele que ilumina todos os homens, para que possuam finalmente a vida” (LG 16). Este excerto relaciona-se com o Decreto AG 3, que inclusive o cita em suas notas, e faz ressaltar o caráter de provisoriedade cronológico temporal desta preparação (RATZINGER, 1992, p. 413-415). Conforme a providência divina, que em seu desígnio quer salvar todo o gênero humano, as religiões do mundo constituem-se “como pedagogia ou preparação evangélica para o Deus verdadeiro” (AG 3).
O que não constitui uma realidade estática e autônoma, mas dinâmica e relativa à promulgação do Evangelho. O trecho citado acima, do Decreto AG 3, expressa a continuidade com a doutrina desenvolvida pelo Concílio, ao fazer referência em nota à LG 16 e, além disso, situa a formulação praeparatio evangelica no horizonte amplo da teologia do Filho-Logos, ao apresentar como fundamentação o texto de Clemente sobre o tema. A unicidade do Logos utiliza-se de meios diversos para revelar a salvação divina, através dos quais, pode o homem pelo seu esforço religioso, responder ao Deus que o interpela.
Com efeito, as tradições religiosas da humanidade, embora tenha um significado diferente na história da salvação, conforme sua relação com o evento da Encarnação de Jesus Cristo; todas podem ser consideradas autênticas preparações evangélicas (DUPUIS, 1989, p. 162-163). Isso, porque as religiões, como parte da história da salvação, são realidades que conservam elementos do patrimônio universal da fé e proporcionam um conhecimento salvífico de Deus aos seus membros. Em toda a história da salvação, portanto anterior e posterior ao evento Cristo, as religiões mantêm-se no exercício da função de praeparatio evangelica, não em termos cronológicos pré-Cristo, mas pró-Cristo, ou seja, até a promulgação de seu Evangelho. Já não se trata de uma preparação como estágio anterior a um evento cronologicamente constatável na história, mas a uma preparação que é já participação neste Mistério Pascal de Cristo, ao qual todos são associados participativamente através do Espírito de Cristo (RATZINGER, 1992, 391-434).
Definido isto, surge outra questão: saber até quando estas religiões mantêm este papel fundamental no desígnio divino de salvação? O Magistério da Igreja esclarece esta pergunta já mesmo antes do Concílio, com a Bulla Cantate Domino. Este documento afirma que a Lei mosaica, que conforme os Padres apologistas é anterior e fontal à sabedoria filosófica, constitui-se em meio através do qual o Logos manifesta o projeto divino de salvação a toda a humanidade, permanecendo até que Evangelho de Cristo seja promulgado (EUGÊNIO IV, 1441, n. 1330-1353).
Disto decorre uma última questão. Se as religiões são, no projeto divino de salvação, preparações evangélicas, o que dura até a promulgação do Evangelho, quando se dá esta promulgação? Certamente esta realidade não pode ser compreendida em termos cronológicos, estabelecendo um momento determinado na história em que a promulgação do Evangelho estaria completamente realizada a todos em todos os povos. Ao invés, trata-se aqui de defini-la em dimensão existencial e escatológica, que aborde a dimensão concreta de cada consciência humana e de cada religião.
A visão unitária da história da humanidade de Clemente, em que a Encarnação é o centro e cume, não leva necessariamente a afirmação de que com a Encarnação a função das religiões, em termos de praeparatio evangelica, teria terminado. Ao contrário, conforme demonstrado, a concepção de Logos protreptikós de Clemente relacionado à praeparatio evangelica de Eusébio, em AG 3, implica na compreensão da não restrição da ação do Logos-Cristo a um evento cronologicamente datado, mas é o ponto inicial de sua nova e permanente inserção na história.
Deste modo, há uma redefinição da compreensão sobre o próprio conceito de preparação evangélica aplicada às religiões. Nesta lógica, com o advento do evento Cristo, as religiões não se tornariam obsoletes e ilegítimas e, Israel, resguardada a uma mera fase prévia. Para Clemente, com o advento de Cristo na carne, a função da filosofia em relação ao cristianismo, como paedagogia divina que prepara para o Evangelho, não desapareceu. Com a vinda do Senhor, filosofia grega e religiões não cristãs mantiveram seu papel (SALDANHA, 1984, p. 147-148).
Destarte, a relação entre a filosofia grega com o Cristo é predicado para admissão da mesma relação com as religiões não cristãs. Para Clemente, o valor e significado das religiões não cristãs estão relacionados ao lugar e ao papel que elas ocupam na economia da salvação como uma “pedagogia para Cristo” (SALDANHA, 1984, p. 170), e não imediatamente à possibilidade de salvação para seus membros, como se nota, muitas vezes, na teologia moderna (CONGAR, 1973, p. 167-181). Função esta constatada já antes do evento Cristo e que se estende cronologicamente para além dele, abarcando as religiões do mundo das diferentes épocas.
Concluindo, faz-se possível afirmar um papel positivo destas tradições religiosas na história da salvação, uma vez que nelas há a ação do Logos e a consequente presença de uma verdade cristã, ainda que parcial (FÉDOU, 2013, 178). Conforme Clemente, poder-se-ia afirmar que as religiões possuem uma espécie de “equivalente em modo menor” de Revelação e de fé (THILS, 1965, 676-677). Segundo G. Thils, esta é a realidade transcendente e sobrenatural presente nas religiões e reconhecida pelo Concílio Vaticano II, ainda pouco explorada e difícil de formular.
O caminho que está sendo feito pelo Concílio é o de equilíbrio entre o caráter preparatório das religiões e a transcendência do cristianismo, ao considerar as religiões como participantes de uma única economia da salvação, cujo centro é o Mistério de Cristo, conforme a teologia de Clemente no AG 3.
Em Clemente, a mesma ação do único Logos comporta uma pluralidade de formas de conhecimento e acesso a Deus: conhecimento parcial e imperfeito, mas real, entre os pagãos; conhecimento elevado e inspirado nos filósofos gregos. Tudo, parte da providência divina que a todos quer tornar acessível a salvação. Tal reflexão prospecta um papel positivo das tradições religiosas da humanidade, já que independentemente do nível de compreensão que apresentam sobre Deus, sempre é o Logos-Cristo que nelas age, presentificando, ainda que de forma parcial, a verdade.
Agora, se Clemente concentrou-se nas religiões anteriores à Encarnação do Verbo-Logos, quando relacionada à processualidade inerente à formulação praeparatio evangelica, de Eusébio, em AG 3, fornece ao Concílio os elementos para aplicar a mesma valoração positiva das religiões anteriores a Cristo àquelas posteriores ao evento encarnatório, estendendo-se até hoje. Ulterior desenvolvimento da teologia do Concílio sobre o significado teológico das religiões é sua participação no mistério de Cristo, que a todos quer Salvar. Mas este é assunto para outro artigo.
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[1] “une intuition du Dieu unique et tout-puissant existait en effect chez tous les hommes de sens droit, de tout temps” (tradução nossa). Clément D’Alexandrie, Stromate V, n. 13.87.2.
[2] “Ce sont eux les chefs et les éducateurs par lesquels l'activité de la Providence se montre avec une grande clarté, chaque fois que Dieu veut fair du bien aux hommes par l'éducation ou par quelque charge de commandement et de gouvernement” (tradução nossa). Clément D’Alexandrie, Stromate VI, n. 17.158.2.
[3] “Les pensées des hommes vertueux naissent d'une inspiration divine, quando l'âme se trouve dans une disposition déterminée et que la volonté divine se communique aux âmes humaines, grâce au concours des ministres divins respectivement chargés de pareils service” (tradução nossa). Clément D’Alexandrie, Stromate VI, n. 17.157.4.
[4] “En effet, Dieu, qui voulait sauver les Juifs, leur donnait les prophètes; de même, il a fait surgir chez les Grecs les plus réputés d'entre eux, pour en faire des prophètes qui parleraient leur langue, dans la mesure où ils seraient capables de recevoir les bienfaits divins” (tradução nossa). Clément D’Alexandrie, Stromate VI, n. 5.42.3.
[5] “Ces révolutions salutaires sont distinguées, selon l'ordre de la mutation, par des temps, des lieux, des honneurs, des connaissances, des héritages et des offices, chacune à son tour, jusqu'à la position, suréminente et proche du Seigneur, de la contemplation dans l'éternité. Or l'être aimé antraîne lui-même à le contempler tout être qui s'est voué complètement à la contemplation par l'amour propre à la connaissance. C'est pourquoi le Signeur a donné les commandements, les premiers et les seconds, en les puisant à une seule source, sans laisser les hommes antérieurs à la Loi privés de loi, ni non plus lâcher les rênes à la rétivité de ceux qui n'entendaient pas la philosophie barbare. En fournissant aux uns les commandements, aux autres la philosophie, il a enfermé l'incroyance jusqu'aux temps de sa présence, où tout homme qui n'a pas cru est inexcusable. Il conduit en effet à partir de l'une et l'autre progressions, grecque et barbare, vers la perfection qui s'obtient par la foi” (tradução nossa). Clément D’Alexandrie, Stromate VII, n. 2.10-11.
[6] “C’est de lui que procède la Providence, à la fois pour l'individu, pour la communauté et pour l'univers (...) Aussi le Seigneur de tous les êtres persuade-t-il ceux qui veulent bien, parmi les Grecs et les Barbares” (tradução nossa). Clément D’Alexandrie, Stromate VII, n. 2.6.3.
[7] “Lo scrittore, quindi, mette in evidenza la sapienza di quei barbari che sono diversi dagli Ebrei, e, alle’elenco tradizionale dei popoli non greci (Egiziani, Persiani, Caldei) (...) i Druidi della Gallia, i Samanei della Battriana, i Celti che sono filosofi, gli Sciti, gli Iperborei e i Germani”. C. Moreschini, Storia del pensiero Cristiano tardo-antico, p. 318. Sua estima por estes povos pode ser encontrada em Stromate, IV, 8, 57, 2.
[8] “La filosofia, questa cosa cosí utile, è dunque fiorita nei tempi antichi preso i barbari, manifestandosi secondo le razze; ed è piú tardi che essa è venuta presso i Greci. Coloro che vi prosiedono sono i profeti d’Egitto, i Caldei d’Assira, i Drudi della Gallia, i Filosofi dei Celti, i Magi dei Persi e i Gimnosofisti dell’India; e ancora altri filosofi barbari che formano due famiglie, i Sarmani e i Branmani. Vi sono pure presso gli Indiani coloro che ubbidiscono ai precetti di Budda” (tradução nossa). Clément D’Alexandrie, Stromate I, n. 15.71.3-6.
[9] “Si, en effet, les Grecs ont recueilli, mieux que les autres, quelque étincelles du Logos divin et ont fait entendre quelques rares vérités, ils témoingnent ainsi que la puissance de la vérité n'était pas cachée; mais ils s'accusent eux-mêmes de faiblesse, puisqu'ils n'ont pas atteint le but. Chacun voit maintenant avec évidence, je crois, que faire ou dire quelque chose sans le Logos de vérité, c'est tout comme être obligué de marcher sans pieds” (tradução nossa). Clément D’Alexandrie, Le Protreptique VII, n. 74.7-75.1.
[10] O texto promulgado não apresenta a fundamentação Justin, Apologie I, n. 5.3 e Justin, Apologie II, n. 13, presentes no schema de 06.10.1965, cf. Acta Synodalia Sacrosancti Concilii Oecumenici Vaticani II. Volumen IV. Periudus Quarta. Pars III. Congregationes Generales CXXXVIII-CXLV, 1977, p. 689. A partir daqui: AS, 4.3. O mesmo acontece com a citação de Eusèbe de Césarée, La préparation évangélique I, n. 1, presente nos textus prior e emendatus, mas, retirado do texto promulgado do AG. Ao AG acrescentou-se a paedagogia divina de Clément D’Alexandrie, Le Protreptique, n. 112.1 e Clément D’Alexandrie, Stromate VI, n. 6.44. Cf. Acta Synodalia Sacrosancti Concilii Oecumenici Vaticani II. Volumen IV. Periudus Quarta. Pars VI. Congregationes Generales CLVI-CLXIV, 1978, p. 208. A partir daqui: AS, 4.6.
[11] É a providência divina que faz da filosofia uma propedêutica à perfeição em Cristo. C. Saldanha, Divine pedagogy: A patristic view of non-christian religions, p. 169-170.
[12] Esta pedagogia divina é de revelação e, propriamente porque pedagógica, não pode jamais ser coercitiva.
[13] “cet amour bon et salutaire des hommes pour Dieu que le Verbe, envoyé du ciel par le Dieu très ben comme un rayon de la lumière infinie, ennonce en bonne nouvelle à l'humanité” (tradução nossa). Eusébio de Cesaréria, La préparation évangélique I, n. 1.6.
[14] “(...) les exhortante, non pas seulemente de tel ou tel lieu, d'ici ou d'ailleurs, mais de partout et de toutes les nations, à aller vers le Dieu de l'Univers, à se hater, à accueillir le cadeau avec tout l'élan de leur àme, qu'ils soient Grecs ou Barbares, hommes, femmes ou enfants, tous à la fois, pauvres et riches, instruits ou non, sans exclure même le peuple des esclaves de son appel. C'est que leur père, les ayant tous façonnés d'une seule substance et nature, les a naturellement jugés dignes tous ensemble d'une seule et encore égale faveur en faisant, à tous ceux qui veulent prêter l'oreille et s'ouvrent aisémentà l'accueil de sa grâce, le don de la connaissance et de l'amour de Dieu” (tradução nossa). Eusébio de Cesaréria, La préparation évangélique I, n. 1.6-7.
[15] “la filosofia degli Ebrei è la più antica de tutte le sapienza” (tradução nossa). Clément D’Alexandrie, Stromate I, n. 21.101.1.
[16] O termo bárbaro, utilizado por Clemente, refere-se aos povos não gregos em geral, inclusive, utiliza-o para designar os hebreus.
[17] “la filosofia è um dono di Dio, i quanto è stata comunicata ai sapienti antichi” (tradução nossa). J. DANIÉLOU, Messaggio evangelico e cultura ellenistica, p. 83.
[18] “nous pourrions trouver également un autre témoignage pour établir avec certitude que leurs meilleurs philosophes, nous ayant emprunté les plus belles de leurs doctrines, se sont vantés qu'elles venaient d'eux” (tradução nossa). Clément D’Alexandrie, Stromate VI, n. 4.35.1.
[19] Ao aplicar o conceito patrístico semina Verbi o Concílio Vaticano II aplicava às religiões não cristãs, conforme já demonstrado no texto, um ensinamento relativo primeiramente aos tesouros da filosofia grega, ou bárbara. Isto posto, “não se trata, portanto, apenas de sementes de verdade, de bondade, e mesmo de santidade, que podem habitar a alma e o coração dos homens e das mulheres de boa vontade, mas de valores positivos que se reconhecem nos elementos constitutivos das religiões não cristãs, que se trate de doutrinas, de ritos, ou de atitudes morais”. Cf. C. Geffré, De Babel a Pentecostes. Ensaios de teologia inter-religiosa, p. 49-54; 137-142. O que se infere também da Declaração Nostra Aetate n. 2, do Decreto Ad gentes n. 9 e do documento Diálogo e Anúncio n. 29.