ARTIGO  
Presídios acreanos: remição de pena pela leitura  
como perspectiva para uma cidadania desejável  
Acre prisons: remission of penalty for reading as a perspective for a  
desirable citizenship  
FLUXO DA SUBMISSÃO  
Universidade Federal do Acre, Rio Branco, Acre, Brasil.  
Submissão do trabalho: 12/03/2023  
Aprovação do trabalho: 22/03/2023  
Publicação do trabalho: 07/04/2023  
Universidade Federal do Acre, Rio Branco, Acre, Brasil.  
Resumo  
As discussões relacionadas à privação de liberdade merecem atenção, uma  
vez que as ciências humanas e as das linguagens ocupam lugar de  
destaque ao enfatizarem o lugar do sujeito no centro da sociedade. O  
objetivo deste texto é compreender como a educação em presídios no  
Acre contribui para uma perspectiva de cidadania desejável. Como  
fundamentação teórica aportamo-nos em Foucault (1979, 1987), Zilberman  
e Lajolo (2011) com a concepção de leitura e, Petit (2010) e Goffman (2004)  
com discussões sobre educação e leitura em espaços de crise, além de  
outros autores que tratam dessas temáticas. Por ser um estudo  
bibliográfico, baseamo-nos em notícias publicadas em sites virtuais  
acreanos, exclusivamente, Agazeta.net, com o intuito de investigar como  
a leitura é compreendida em um contexto de privação de liberdade. Os  
resultados indicam que a educação e a leitura podem contribuir para a  
formação do sujeito na busca futura de uma cidadania desejável.  
Palavras-chave: Leitura Literária; Desigualdade Social; Privação de  
Liberdade.  
Abstract  
Discussions related to the deprivation of liberty deserve attention, since the  
humanities and language sciences occupy a prominent place by emphasizing  
the place of the subject at the center of society. The purpose of this text is to  
understand how education in prisons in Acre contributes to a desirable  
citizenship perspective. As a theoretical foundation, we use Foucault (1979,  
Distribuído sob Licença Creative Commons  
1
(
987), Zilberman and Lajolo (2011) with the concept of reading, and Petit  
2010) and Goffman (2004) with discussions about education and reading in  
crisis spaces, in addition to other authors who deal with these themes. As it is  
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a bibliographical study, we are based on news published on Acrean virtual sites, exclusively,  
Agazeta.net, to investigate how reading is understood in a context of deprivation of liberty. The  
results indicate that education and reading can contribute to the formation of the subject in the  
future search for a desirable citizenship.  
Keywords: Literary Reading; Social inequality; Deprivation of Liberty.  
1.  
Introdução  
A educação colabora para a constituição cidadã por proporcionar ao sujeito mecanismos  
para que possa atuar, de forma ativa e agentiva, na sociedade. Ela contribui para a formação  
cultural, social, linguística, econômica do ser humano, afinal, é pela educação, em contato com as  
diferentes áreas do conhecimento e, em interação social, que o educando desenvolve outras  
habilidades para conhecer-se e reconhecer-se na sociedade em que está inserido.  
É inegável, conforme bem apresentado por Bakhtin (2016), que todas as esferas da  
comunicação humana, por mais variadas que se apresentem, estão ligadas com os usos da  
língua/linguagem. A língua se manifesta por meio de enunciados (orais, escritos, multimodais)  
concretos e únicos, que fazem parte dos sujeitos em dada esfera da atividade humana. Por esse  
entendimento, o sujeito em privação de liberdade reflete e refrata, através dos enunciados  
concretos, as condições específicas da esfera em que se encontra.  
Nesse contexto em específico, ao considerarmos a importância da educação como  
medida socioeducativa, é preciso propiciar mecanismos de ensino-aprendizagem que levem o  
sujeito em cárcere privado a refletir sobre suas ações e, posteriormente, transformar a sua própria  
realidade. Com essa perspectiva, a educação voltada para este contexto está preocupada em  
oferecer mecanismos para que os sujeitos reflitam sobre seus atos, reconheçam o mundo que o  
espera e acreditem que suas futuras ações podem estar engajadas com o mundo real, em  
perspectiva de transformação social.  
Importante considerar e não podemos esquecer que o sistema prisional, ao privar o  
sujeito da liberdade pode, segundo Foucault (1979), criar indivíduos que entram no sistema  
carcerário por pequenos delitos e acabam, muitas vezes, tornando-se presos perigosos. Faz-se  
necessário rever a questão da ociosidade desses sujeitos para não aguçar ainda mais os vícios que  
os levaram à prisão. Foucault (1987) destaca que habitualmente acreditava-se (e ainda se acredita)  
que as prisões funcionam como depósitos de criminosos, ou seja, “[...] desde 1820 se constata que  
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a prisão, longe de transformar os criminosos em gente honesta, serve apenas para fabricar novos  
criminosos ou para afund-los ainda mais na criminalidade.” (FOUCAULT, 1979, p.131-132).  
De modo semelhante, Goffman ([1963] 2004) destaca que enquanto o estranho e, neste  
caso, o sujeito em privação de liberdade está à nossa frente, surgem atributos que o colocam em  
uma categoria de uma espécie menos desejável e, em casos extremos, de uma pessoa  
completamente má, perigosa ou fraca. Esse estigma, leva-nos a reduzir esse sujeito a uma pessoa  
sem valor, desacreditada, de forma que podemos (e muitos desejam) mantê-los no cárcere  
privado.  
Mediante essas considerações, a educação pode promover a conscientização do papel  
social do sujeito em privação de liberdade, desde que se considere o contexto em que se encontra.  
Assim, em sintonia com Freire (2016b), acreditamos ser por meio da reflexão e da ação que  
podemos rever nossos hꢀbitos, costumes, valores e crenças de modo a “transformar o mundo, o  
que é próprio dos homens” (FREIRE, 2016b, p. 56-57). Com essa ação-reflexão, espera-se  
responder ao seguinte questionamento: Como o projeto de remição de pena desenvolvido no  
Acre pode contribuir para uma perspectiva de cidadania desejável?  
Para isso, esse trabalho se divide em cinco seções. A primeira, de modo breve, faremos  
um breve histórico sobre as prisões no Brasil, as Leis e a Constituição. A segunda seção trata da  
educação e da leitura em prisões: navegar é preciso. Em seguida, tratamos dos presídios acreanos:  
conhecendo o contexto e as propostas educativas, uma subseção refletindo sobre a remição de  
pena no Acre: um projeto em desenvolvimento. A quarta seção as “vozes” sobre a remição de  
pena no site agazeta.net, do Acre. Por fim, apresentamos nossas considerações finais.  
2
. As prisões no Brasil: um olhar necessário nas Leis e na Constituição  
Antes de tratarmos sobre as prisões no Brasil, consideramos relevante fazer um breve  
percurso histórico sobre os sistemas de punição, a fim de refletirmos como as formas de punição,  
por mais críticas e mudanças ocorridas ao longo dos séculos, a que perdura não é apenas a do  
controle do corpo, e sim da alma, conforme discutido por Foucault (1987). Os sistemas de  
punições sempre estiveram presentes na humanidade e, ao longo do tempo, transformou-se até  
chegar ao modelo de cárcere privado que atua como um modelo de punição coercitivo.  
Ao delinearmos um olhar sobre o sistema prisional, Galli (2022) apresenta que o sistema  
prisional, no período da Idade Média, teve seu início em mosteiros, cujo objetivo era punir os  
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monges e os clérigos que faltavam com as suas obrigações eclesiásticas. De acordo com a autora,  
essa forma de punir inspirou ingleses a construírem, entre 1550 e 1552, a primeira prisão destinada  
ao recolhimento de criminosos, a “House of Correction”. Carvalho Filho (2002), por sua vez,  
destaca que as punições no período medieval eram severas, tinha-se desde a amputação dos  
braços, a degola, a forca, queimaduras a ferro em brasa até a guilhotina, formas estas causadoras  
de extrema dor e serviam de espetáculos para a população.  
Na virada para a Idade Moderna e, consoante o artigo publicado pela Escola de Formação  
e Aperfeiçoamento Penitenciário Espen, em 2021, este período foi marcado pela representação  
da monarquia absoluta. Neste cenário, o monarca comandava com poder absoluto e desconhecia  
limites, infringindo aos súditos uma barbárie repressiva, desprovida de quaisquer direitos. Não  
havia sequer, a necessidade de justificar as punições empregadas aos encarcerados e as  
condutivas punitivas. Se alguém questionasse, era como interrogasse a soberania do monarca.  
No século XVIII, duas passagens históricas foram significativas e contribuíram para a  
História das Prisões e os sistemas de punição. Primeiro, o nascimento do Iluminismo e, segundo,  
as dificuldades econômicas que afetaram sobremaneira a população, provocando mudanças no  
sistema de punição. Ou seja, a miséria e o aumento da pobreza do povo fizeram com que os crimes  
aumentassem e a pena de morte e o suplício não respondiam mais aos anseios da justiça. Por esses  
aspectos, surgiram os presídios, com a pena privativa de liberdade como a grande invenção que  
se mostrou a mais eficaz de controle social e perdura até os dias atuais, em pleno século XXI.  
Galli (2022) argumenta que no Brasil Colônia, entre o século XVI ao XVIII, surgiu o “presídio  
de degredados” instituído pelo Código de Leis Portuguesas. Nesse sistema, as penas eram  
destinadas a cafetões, assassinos, vândalos e contrabandistas e, a primeira prisão oficial é  
mencionada na Carta Régia de 1769, estabelecida como uma casa de correção, no Rio de Janeiro.  
A autora destaca que apenas no século XIX se deu o início ao surgimento de prisões com celas  
individuais e oficinas de trabalho, bem como uma arquitetura própria para esses espaços. Em  
1
890, cria-se o primeiro Código Penal que, dentre algumas das medidas, considera que as penas  
restritivas de liberdade individual não devem exceder os trinta anos, culminando com a extinção  
das penas perpétuas e coletivas. Para Galli (2022, p. 2)  
Gradualmente, o sistema prisional brasileiro passou por diversas alterações conceituais,  
estruturais e legislativas até os dias atuais. Entre essas mudanças, destacam-se o Código  
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Penitenciário da República de 1935, Código Penal Brasileiro de 1940, Lei de Execução Penal  
Lei N° 7.210/1984) e a própria Constituição Federal de 1988, que incorporou aspectos  
(
ligados aos direitos humanos. As legislações acerca do tema foram alteradas  
continuamente, sempre se adequando a ideologia preponderante da época (ênfase  
adicionada).  
A esse respeito, neste ano a Constituição Brasileira completa 35 anos desde a sua  
promulgação e, o atual Sistema Penal Brasileiro pouco avançou em políticas públicas eficazes no  
tocante ao sistema carcerário, e a violência é uma constante em diferentes níveis. Macedo (2015)  
argumenta que as normatizações de natureza penal, processual penal e de execução penal  
revelam um discurso autoritário, desigual, marcado essencialmente pela pena privativa de  
liberdade como matriz preventivo positiva, a qual penaliza os “excluídos” e absorvem os  
“favorecidos”, a exemplo dos inúmeros desvios de dinheiro causados por políticos eleitos pelo  
povo.  
Outro aspecto relevante, segundo o banco de dados “World Prison Brief”, publicado em  
022, diz respeito ao Brasil ter a terceira maior população prisional do mundo, com os índices  
2
superados apenas pelos Estados Unidos e a China. Nas penitenciárias brasileiras, cerca de 54,9%  
se encontram acima da sua capacidade e o percentual de detentos sem julgamento é, de  
aproximadamente, 31,9%, ou seja, ainda há muito a ser feito para resolver os problemas existentes  
no sistema carcerário do Brasil.  
Para Foucault (1987), as revoltas em prisões tinham por objetivo revelar toda uma miséria  
física que perdura há séculos, o frio, os sufocamentos, o excesso de população, as paredes velhas,  
o isolamento, a fome e os golpes. Essas revoltas ocorriam e ainda ocorrem, diga-se de passagem,  
ao nível dos corpos e contra os próprios corpos da prisão. Para Foucault (1987) o que estava em  
jogo por trás desses discursos é a materialidade no sentido de que é instrumento e vetor de poder.  
Poder sobre os corpos, a alma a dos educadores, psicólogos, psiquiatras os quais também não  
passam de um dos instrumentos de quem tem o poder.  
Mesmo cientes de que a educação é um aparelho ideológico e representa o poder do  
Estado sobre os corpos e a mente, é fundamental pensá-la como um dos caminhos que pode servir  
para a reabilitação do indivíduo privado de liberdade, atuando como resgate social e como  
reconstrução de um futuro melhor. Assim, a Constituição Federal, de 1988, garante a todos o  
direito à educação e, associada à Lei de Execução Penal (LEP)  Lei nº 7.210/1984, garantem a  
assistência educacional e profissional. Em 2010, a Lei nº 12.245 de 24, de maio de 2010, altera o Art.  
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83 da Lei no 7.210, de 11 de julho de 1984 Lei de Execução Penal, autorizando a instalação de salas  
de aulas nos presídios (BRASIL, 1984).  
Retomando à Constituição Federal de 1988, o direito à educação está assegurado no artigo  
6
º, do índice dos Direitos Sociais. Por essa razão, tem particular relevância quando se trata dos  
direitos da pessoa privada de liberdade, já que a educação é um direito de todos e dever do estado  
artigo 205, da CF/88). Entretanto, essa prescrição, na realidade, enfrenta inúmeros obstáculos  
(
para se tornar realidade, dentre elas, a questão de um formador qualificado para atuar em  
contextos de crise.  
Ao afirmar que a Constituição Federal de 1988 estabelece o direito a todos os cidadãos  
brasileiros à educação de qualidade, faz-se necessário compreender que em uma sociedade  
caracterizada por tantas disparidades sociais e pela pobreza em massa, a educação no sistema  
prisional é uma questão delicada a ser resolvida e que precisa de ações afirmativas e propositivas  
para colocar o cidadão em cárcere privado rumo a uma cidadania desejável, pois sabe-se que há  
tanto educandos informalizados (sem escolarização ou ensino fundamental incompleto) quanto  
formalizados (ensino médio e superior).  
Em razão dessa realidade, os documentos oficiais ajudam no intuito de refletir, organizar,  
planejar e executar - considerando as realidades presentes em um país continental como o Brasil  
-
propostas para que os educandos, inclusive os de privação de liberdade, tenham a capacidade  
para aprender e agir no mundo. Por esse princípio, a Declaração Universal dos Direitos Humanos,  
afirma que: “Toda pessoa tem direito à instrução [...]. A instrução serꢀ orientada no sentido do  
pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos  
humanos e pelas liberdades fundamentais.” (Declaração Universal dos Direitos Humanos – Artigo  
2
6). Nessa perspectiva, apesar de os direitos dos presos serem garantidos por documentos  
nacionais e internacionais, ainda há grandes dificuldades para que sejam respeitados. Dito isso,  
concordamos com Petit (2009) ao argumentar que a leitura é aliada poderosa em tempos difíceis  
em que o mundo inteiro vive espaços de crises, dentro os quais, desenvolvem-se violências  
permanentes e generalizadas, que tornam inoperantes os modos de regulamentação sociais e  
psíquicos praticados. Nas palavras da autora,  
Ora, a aceleração das transformações, o crescimento das desigualdades, das disparidades,  
a extensão das migrações alteraram ou fizeram desaparecer os parâmetros nos quais a  
vida se desenvolvia, vulnerabilizando homens, mulheres e crianças, de maneira  
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obviamente bastante distinta, de acordo com os recursos materiais, culturais, afetivos de  
que dispõem e segundo o lugar onde vivem. (PETIT, 2009, p. 10)  
Esses espaços de crises são vividos por todos de diferentes modos, todavia, para alguns,  
tais crises se manifestam com rupturas, acompanhadas de separação dos próximos, das perdas  
físicas e emocionais daqueles que são confinados por determinado período, “sem projeto, sem  
futuro, em um espaço sem linha de fuga” (PETIT, 2009, p. 11). Importante enfatizar, nesse sentido,  
que o direito à educação é um exercício que envolve garantias ao longo da vida, independente do  
contexto ou do ambiente em que o cidadão esteja e isso envolve a todos, inclusive àqueles que  
estão privados de liberdade.  
Em razão dessa realidade, a Unesco, juntamente com alguns órgãos do governo, reforçou  
a oferta da educação como direito fundamental. Ao construírem o conceito de cultura da paz  
como um dos princípios fundamentais para criar meios para que a violência urbana fosse reduzida  
por meio da educação, voltam-se para a inclusão social da população prisional, ou seja, a educação  
teria como um dos objetivos, o de incluir e de reconduzir esses indivíduos de volta à sociedade  
para que se tornem capazes de viver harmonicamente.  
Nesse sentido, a garantia da educação é um dos instrumentos fundamentais do direito  
internacional assegurados pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, pela Convenção  
Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e, especificamente, no caso da  
população prisional, pelas Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Reclusos, as  
quais determinam que “todos os presos devem ter o direito a participar em atividades culturais e  
educacionais” (Princípio 6º). Saliente-se, que esse documento sugere que o sistema prisional  
apresente professores e instrutores técnicos que desempenhem sua função de forma  
permanente, podendo recorrer à ajuda de profissionais em tempo parcial ou de voluntários. Além  
do mais, o documento internacional sugere que as penitenciárias têm o dever de tomar medidas  
que garantam a melhoria da educação para todas as pessoas privadas de liberdade (UNESCO,  
2
006).  
Portanto, é possível perceber que o sistema educacional dentro das unidades prisionais  
sofreram diversas mudanças ao longo do tempo, entretanto, as organizações governamentais  
nacionais e internacionais, que discutem/defendem os direitos da pessoa privada de liberdade,  
defendem ir além, na busca da ressocialização desses sujeitos, garantindo seus direitos durante a  
prisão e, quando colocados em liberdade, possam ter as condições mínimas para voltarem a  
trabalhar.  
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3. Educação e Leitura nas prisões: navegar é preciso  
Pelo que foi discutido na seção anterior e, em sintonia com Silva (2010), a sociedade  
organiza-se em sindicatos, igrejas, associações, comissões de direitos humanos, ONGs, dentre  
outras que, juntas, veem a educação como processo de reconstituição da experiência e, por isso,  
tem que ser comum a todos, incluindo as pessoas em privação de liberdade. Para a autora, o  
Estado é um dos grandes responsꢀveis pela deformação da pessoa que “desꢀgua no crime”  
(SILVA, 2010, p. 28).  
É fato que tratar sobre educação no Brasil não é algo fácil e fica ainda mais complexo  
quando se trata de educação nas prisões. Todavia, navegar em mares desconhecidos é preciso e  
fundamental. Rangel (2006) argumenta que ao se abordar sobre o sistema educativo nas prisões  
há muito a se evidenciar, isso porque faz-se necessário conhecer os diferentes contextos pelos  
quais se desenvolvem as práticas educativas, a fim de entender como funcionam as políticas e as  
incidências dos internos e evitar as generalizações, assim como as superficialidades.  
Regis (2006) destaca que a violência é um marco significativo para entender o contexto  
prisional. Os índices de homicídios são altíssimos, os grupos de tráficos de drogas têm forte  
domínio e poder nesse ambiente, além de que a maior parte da população carcerária é formada  
por pretos e pardos, que viviam em situação de pobreza. Diante de um contexto perturbador, a  
educação é, mais do que nunca, necessꢀria e fundamental para “formar grupos, redes de internos  
que rompam o domínio e o medo que os grupos delinquentes impõem. preciso criar alternativas  
de organização” (REGIS, 2006, p. 66).  
Como as desigualdades sociais são um marco presente na sociedade brasileira, inúmeros  
são os desafios presentes sobre a educação nos presídios como forma de garantir acesso,  
permanência, conclusão e qualidade de ensino compatível com a demanda para este público. Silva  
(2006) apresenta a necessidade de reconhecer a falta de profissionais habilitados e concursados  
em quantidade suficiente para formação inicial e continuada, não apenas para educadores, como  
também para todos que, de forma direta e/ou indireta, atuam com sujeitos em privação de  
liberdade. Adicione-se que discutir a educação nas prisões exige, também, rever recursos  
orçamentários e financeiros para desenvolver ações que contribuam para o cumprimento do  
direito à educação de qualidade.  
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De Maeyer (2006) questiona o que se aprende nas prisões e por quê? A seu ver, o que  
esses sujeitos aprendem não são programas detalhados, módulos estruturados ou mesmo  
currículos pensados por especialistas em educação para o contexto prisional. Destaca que nas  
prisões, assim como em outros lugares, há necessidades e urgências a serem vistas no universo  
carcerário. Para a autora,  
[...] necessidade e urgência de conhecer as redes de influência, necessidade e urgência de  
integrar as atitudes que serão positivamente tomadas em consideração para uma saída  
mais rápida da prisão, necessidade e urgência de saber como melhorar seu cotidiano,  
necessidade e urgência de guardar um mínimo de intimidade, necessidade e urgência de  
simplesmente existir. Nessas condições, aprende-se rápido e vai-se direto ao essencial. (DE  
MAEYER, 2006, p 44).  
Ir direto ao essencial pode significar, para esses sujeitos que se encontram encarcerados  
no seu presente vislumbrando um possível futuro de liberdade, propor uma educação que  
considere a experiência positiva com o aprendizado, que estimule o querer saber, o registro do  
conhecimento e o partilhar os saberes com os demais colegas de estudo. E como a leitura pode  
contribuir para desenvolver essa rede de saberes e de compartilhamento de aprendizagens? Julião  
e Paiva (2014) argumentam que, no Brasil, o número de pessoas sem escolarização nos diferentes  
níveis da educação básica soma-se, de modo perverso, a mais de 100 milhões de brasileiros que  
não chegam à conclusão do ensino médio e, ao transpor para a realidade do cárcere privado, esse  
dado é ainda mais acentuado. Nesse sentido, projetos de leitura são bem-vindos, seja de forma  
isolado ou associados a programas de escolarização como o projeto de remição de pena pela  
leitura, como meio de propor condições para o sujeito em privação de liberdade de aprender. Vai-  
se além,  
[...] se nem a leitura, nem a educação, podem ser vistas como projeto salvacionista,  
entretanto, afirma-se que a primeira pode, sim, libertar pela capacidade imaginativa que  
possibilita e pelo poder de criar situações imaginadas, transportar cada sujeito para novos  
voos, pela densidade de narrativas e prosas que bons autores produzem, no conjunto de  
obras literárias à disposição de bons acervos e boas bibliotecas. (JULIÃO; PAIVA, 2014, p.  
1
22).  
A leitura da palavra é sempre precedida da leitura do mundo, conforme bem afirma Freire  
1989) e isso indica que aprender a ler e a escrever é aprender a ler o mundo, a compreender o  
(
contexto. Não é manipulação da palavra, não é relação mecanicista, mas é diálogo, é dinamicidade  
que mantém o vínculo entre linguagem e realidade, com a vida que se vive porque educação é um  
ato político e transformador. Lessa e Oliveira (2020) destacam que o ato de educar envolve  
considerar o outro em todas as suas singularidades, como sujeito partícipe que ressignificam o  
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mundo e, assim, a leitura (e a escrita) no contexto de privação de liberdade considera-se o  
estímulo e a valorização do conhecimento dos envolvidos para promover novas conexões de  
aprendizagens que sejam significativas para os encarcerados.  
Lessa e Oliveira (2020) argumentam, também, que o ambiente de privação de liberdade  
produz uma espécie de pedagogia do encarceramento que, ao mesmo tempo em que os sujeitos  
encarcerados são privados do estímulo de perguntar, de saber sobre o objeto de estudo, é o  
espaço da contradição, já que ao manter-se as normas, as regras, abre-se outras possibilidades de  
interação, de diálogo, de mudança rumo a uma cidadania desejável. Desse modo, concordamos  
com Freire (1989) ao enfatizar que leitura é conhecimento, e conhecer é algo, de fato,  
transformador, inclusive para os sujeitos em cárcere privado de liberdade.  
4. Presídios acreanos: conhecendo o contexto e as propostas educativas  
De acordo com os últimos dados divulgados em novembro de 2022, pelo Instituto de  
Administração Penitenciária do Acre, doravante IAPEN/AC sobre a população carcerária, o Acre  
tinha um total de 8.065 presos, incluindo os monitorados. Destes, cerca de 5.548 se encontram  
nas 15 unidades prisionais do Estado. O IAPEN/AC possui uma unidade central, localizada em Rio  
Branco e quatro unidades distribuídas no Estado. De acordo com dados fornecidos pelo site da  
instituição, o déficit de vagas chega a 33, 02%, como se pode observar no gráfico abaixo.  
Gráfico 1: Encarceramento no Acre  
Fonte: IAPEN/AC. Disponível em: <http://iapen.acre.gov.br>.  
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É interessante, observar que a taxa de aprisionamento no estado é de 610 pessoas a cada  
00 mil habitantes, mas há um fato que se sobrepõe é que, desde 2011, o número de presos tem  
1
aumentado significativamente, praticamente esse número multiplica para 3.850 presos. É sinal de  
que são necessárias políticas públicas que se voltem para a prevenção e na transformação do  
sistema para que o condenado seja reformado ou reeducado por meio de instrumentos como a  
educação e o trabalho.  
No tocante às ações de educação formal e não formal desenvolvidas no IAPEN/AC são,  
prioritariamente, de competência da Secretaria de Estado de Educação, Cultura e Esporte do Acre  
-
SEE-AC e do Instituto de Administração Penitenciária - IAPEN, em conformidade com a Resolução  
nº 2, de 19 de maio de 2010, da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, a  
qual dispõe sobre as diretrizes nacionais para a oferta de educação para jovens e adultos em  
situação de privação de liberdade nos estabelecimentos penais, e na resolução do Conselho  
Estadual de Educação, CEE/AC nº 135, de 13 se setembro de 2013, a qual Fixa normas para a  
Educação de Jovens e Adultos  EJA, para pessoas em situação de privação de liberdade no  
Sistema prisional do Estado do Acre1.  
Quanto à educação não formal, o IAPEN/AC e a Secretaria de Estado de Educação, Cultura  
e Esporte do Acre - SEE-AC desenvolvem projetos de incentivo à leitura, que podem ser ofertados,  
assim como outros propostos, na modalidade presencial, a distância ou ainda no formato híbrido,  
desde que aprovados pelos órgãos responsáveis pela validação da oferta.  
Destaque-se que a Universidade Federal do Acre - UFAC também desempenha projetos  
voltados para a educação dos presos, a exemplo do projeto Decolonização do Olhar de  
Adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa no Centro Socioeducativo Mocinha  
Magalhães, Acre, desenvolvido pela Profa. Dra. Salete Peixoto, que busca de modo  
transdisciplinar, envolvendo outros cursos da UFAC, desenvolver, capacitar e potencializar o olhar  
humanístico para que os corpos e mentes encarcerados possam, quando em liberdade, caminhar  
rumo à cidadania desejável.  
Importante enfatizar que há critérios, normas e seleção para que os presos participem das  
atividades educacionais, a saber:  
Quadro 1 Dos requisitos  
1
2
.
Para a matrícula na educação formal é necessário:  
. Ser sentenciado;  
1
Esses informes se encontram no site do IAPEN/AC, disponível em: http://iapen.acre.gov.br/dep/. Acesso: 10 mar. 2023.  
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4
. Com pena mínima de um ano e meio a cumprir, em regime fechado;  
. Bom comportamento nos últimos 6 meses;  
5
. Ter documentos necessários para a matrícula (RG, CPF e comprovante de escolaridade).  
Para participação no projeto de remição pela leitura é necessário:  
Ser sentenciado;  
Ter ensino médio completo ou incompleto, ou em caso de existência de vagas, ter  
escolaridade que o possibilite apresentar a resenha escrita ao final da leitura de cada obra  
literária;  
Bom comportamento nos últimos 6 meses.  
Para participação nos exames externos de certificação (ENCCEJA e ENEM):  
Ser sentenciado;  
Estar cumprindo Regime Fechado;  
Ter documentos necessários para a inscrição (RG, CPF).  
Para participação em cursos profissionalizantes:  
Ser sentenciado;  
Bom comportamento nos últimos 6 meses;  
Ter documentos necessários para a matrícula (RG, CPF e comprovante de escolaridade).  
Fonte: IAPEN/AC. Disponível em: <http://iapen.acre.gov.br>.  
É preciso considerar que mesmo a educação sendo um direito de todos, no sistema  
carcerário não se apresenta da mesma forma. Para ter acesso à educação formal e não formal, as  
unidades prisionais dos Estados trabalham com lista de espera de vagas e, mesmo assim, para que  
os presos entrem nessa lista, é necessário estarem no cadastro de reserva e que as famílias  
apresentem a documentação necessária para a matrícula no caso da educação formal e, para a  
não formal, que preencham outros requisitos, como bom comportamento, por exemplo.  
O sistema penal cresce exponencialmente no Brasil e no Acre não é diferente. Novo (2018)  
destaca que a população prisional e o déficit de vagas presentes em todos os presídios do país,  
revelam que a construção de novas unidades é apenas um componente a ser observado, dentro  
de um mosaico bem mais amplo e complexo. Segundo o autor, o sistema penitenciário tal como  
existe na sociedade capitalista como a do Brasil, é cruel, não apenas por confinar fisicamente o  
sujeito, como também por destruir a subjetividade do sujeito, no sentido de não lhe oferecer  
mecanismos para que compreenda a situação em que se encontra. A fim de mudar essa lógica  
cruel e desumana. Para o autor, faz-se necessário reorganizar a vida carcerária do sujeito em  
privação de liberdade. É preciso motivá-lo, inseri-lo em atividades que permitam a remição de  
pena, programas que lhes atribuem a qualidade da boa conduta como a educação, cursos em  
geral, cultura, esportes, grupos terapêuticos, como também na forma deles procederem e  
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relacionarem-se com outros presos, funcionários, técnicos e dirigentes. Tratamos a seguir, da  
remição de pena pela leitura no Acre.  
4.1 Remição de pena no Acre: um projeto em desenvolvimento  
Discutimos até o momento sobre educação em contexto de privação de liberdade como  
possibilidade de transformação do status quo e a leitura como caminho para compreender a  
palavramundo” (FREIRE, 1989), a palavra como vida, as experiências de ser, de ler, de ver, de  
criar o mundo e a si mesmo. De acordo com Julião (2007, p. 4), qualquer parte do mundo ocidental,  
ao se tratar de programas de ressocialização para a política de execução penal, pensa em  
“atividades de cunho profissionalizante, em atividades educacionais, culturais, religiosas e  
esportivas”. Para o autor, as políticas públicas voltadas para a ressocialização do jovem devem  
vislumbrar em como esse indivíduo será formado e como ele será incluído na sociedade após sua  
saída da prisão para que não volte a cometer crimes e venha a tornar-se um cidadão apto para  
estar na sociedade e exercer seus direitos e deveres.  
É por esse contexto que o Conselho Nacional de Justiça CNJ publica orientações técnicas  
acerca do processo de remissão de pena. De acordo com informações divulgadas no site do Poder  
Judiciário do Estado do Acre, o documento apresenta três tipos de atividades educacionais:  
educação regular (em escolas prisionais), práticas educativas e práticas de leitura. A resolução,  
sugere fluxos de trabalho de como identificar e calcular as atividades realizadas pelo aprisionado  
para que haja a remição da pena, assim, o limite são 12 livros por ano para que 48 dias sejam  
remidos.  
No Acre, algumas ações são realizadas para que haja o incentivo à leitura e para que o  
jovem seja “tocado” pelas leituras que faz. Importante mencionar o Projeto ‘Presídios Leitores’,  
coordenado pelo Grupo de Pesquisa GIL- Grupo de Investigação, Leitura e Vida, da Ufac. Essa ação  
educativa acontece em parceira com as Unidades prisionais e as instituições de ensino e são  
desenvolvidas com a participação de presos da Unidade Penitenciária Manoel Neri da Silva, em  
Cruzeiro do Sul.  
O projeto desenvolvido no presídio do município acreano se consolidou e segue em plena  
atividade. O Grupo GIL realiza algumas atividades para evidenciar o trabalho desenvolvido com a  
leitura no presídio cruzeirense, a exemplo do V Encontro de Mestres de Leitura no Teatro Môa, da  
Universidade Federal do Acre (UFAC), o qual mobilizou a sociedade acreana a doar obras literárias  
para construir um acervo e disponibilizar na biblioteca da penitenciária de Cruzeiro do Sul.  
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Além dessa ação desenvolvida em Cruzeiro do Sul, há outras atividades que também são  
desenvolvidas em todas as unidades, como a III Jornada da Leitura no Cárcere. Este evento é de  
iniciativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em parceria com o Observatório do Livro e da  
Leitura, em que trazem ao debate questões referente ao direito à leitura, a aplicação das  
resoluções do CNJ, bem como promovem clubes de leitura e conversas com escritoras egressas  
no sistema prisional (TJAC, 2022, online).  
Portanto, essa proposta de remição de pena pela leitura tem aspectos muito positivos para  
aqueles que conseguem a vaga, pois contribui para o que Novo (2018) propõe sobre o fato de  
precisarmos compreender que o presidio é um sistema fechado onde o encarcerado convive,  
permanentemente, com outros indivíduos de índole igual, melhor e/ou pior e, existir um projeto  
que o motive a pensar, a ler, a refletir e a escrever pode e precisa ser utilizado para que ele se sinta  
capaz de, no futuro, quando sair do presídio, ter oportunidades de seguir com a sua vida.  
5
. As “vozes” sobre a remição de pena no site Agazeta.net  
Antes de trazermos as vozes sobre a remição de pena presentes no site de notícias online  
do Acre, torna-se necessário explicar que utilizamos da pesquisa bibliográfica para fazer este  
estudo. Gil (2002) destaca ser desenvolvida com base em material já estabelecido, elaborado e  
constituído por livros, artigos científicos e publicações periódicas como jornais e revistas. A nosso  
tempo, acrescente-se que, diante das tecnologias digitais, a informação veiculada por diferentes  
mídias constitui-se como um terreno fértil de pesquisa bibliográfica.  
Gil (2002) também apresenta que boa parte dos estudos exploratórios pode ser definida  
como pesquisas bibliográficas, bem como as que se propõem à análise das diversas posições  
acerca de um problema. Segundo o autor, publicações em jornais e revistas representam  
importantes fontes bibliográficas devido à rapidez em que são divulgadas. Ademais, a vantagem  
de se realizar uma pesquisa bibliográfica reside, dentre outros, no fato de  
o
investigador/pesquisador conseguir uma cobertura maior da gama de fenômenos do que poderia  
pesquisar diretamente. No caso deste trabalho, por exemplo, podemos verificar como o projeto  
de remição de pena pela leitura consegue ser desenvolvido em diferentes partes do Brasil, mesmo  
que o nosso objeto de estudo esteja voltado para os presídios acreanos.  
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O jornal digital Agazeta.net, em 2022, destaca a ação desenvolvida em Cruzeiro do Sul,  
Acre, pelo programa Presídios Leitores, fruto da colaboração entre a Universidade Federal do Acre  
Ufac), o Instituto de Administração Penitenciária (Iapen), o Tribunal de Justiça do Acre, a  
(
Secretaria de Estado de Educação, Cultura e Esporte (SEE), o Instituto Federal do Acre (Ifac) e a  
Academia Acreana de Letras. Pela notícia, o programa incentiva a prática de leitura por pessoas  
privadas de liberdade e salienta que o hábito da leitura é importante para o exercício da fala, para  
o conhecimento de novas histórias e realidades. Some-se que o programa realizado na  
Penitenciária Manoel Neri da Silva, em Cruzeiro do Sul, contribui para estabelecer práticas efetivas  
de leitura no ambiente de cárcere.  
Esse fato mostra-se como verdadeiro ao considerarmos o discutido pelo Instituto da  
UNESCO para a Educação (IUE), em 2009, ao enfatizar que parcerias com outras instituições  
colaboram para o incentivo e ampliação dos serviços regulares de educação ofertados aos presos,  
além de definir parâmetros que ajudem a pautar uma oferta educativa com mais qualidade,  
considerando as necessidades especiais de ensino-aprendizagem existentes para este público  
específico.  
Em continuidade, Agazeta.net informa que o programa é pioneiro na região do Juruá e  
busca ampliar o acesso à leitura como um instrumento capaz de melhorar a vida do cidadão no  
contexto prisional. Na voz de Margarete Santos, chefe da Divisão de Educação do Iapen, “O  
grande diferencial que pretendemos com a leitura no cárcere é a possibilidade de promovermos  
situações que desenvolvam as capacidades de leitura e escrita, fortalecendo, desta forma, a  
aquisição de conhecimentos”2.  
Freire (1989) enfatiza que para uma prática democrática e crítica, a leitura de mundo e da  
palavra estão juntas. O comando da leitura e da escrita ocorrem a partir de palavras e temas  
significativos à experiencia dos envolvidos na educação. Assim, a leitura do real não pode ser mera  
repetição mecanicista e memorizada do nosso modo de ler o real, temos que estar envolvidos,  
com a escuta ativa para compreendermos como podemos fortalecer o conhecimento dos sujeitos  
em privação de liberdade para que possam sentir-se como parte da sociedade quando saírem do  
sistema prisional.  
2
Trechos extraídos na íntegra e presentes no site Agazeta.net, cuja referência se encontra sob o título ASCOM.  
Programa inicia doações de livros para presídio em Cruzeiro do Sul.  
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Para o programa Presídios Leitores, um dos objetivos é dar continuidade à formação  
humana dos sujeitos envolvidos por meio da ressignificação de suas ações cotidianas, e da  
possibilidade de visualização de um percurso diferente na vida da população privada de liberdade.  
Nas palavras da Profa. Dra. Maria José Morais, líder do Grupo de Investigação Leitura e Vida (GIL),  
da Ufac, à Agazeta.net  
[...] O programa nasceu com o objetivo de dar resposta a algumas dificuldades que o Iapen  
enfrenta na formação de leitores dentro do presídio por meio de política de remissão de  
pena pela leitura. Temos algumas metas, temos um projeto, que é o banco de avaliadores  
que utiliza uma plataforma criada e disponibilizada pela Ufac e avalia as produções  
textuais dos reeducandos do presídio.  
A educação como conhecimento, como ato criador e como ato político é um esforço de  
leitura do mundo e da palavra. Para Freire (1989) não é possível texto sem considerar o contexto  
dos envolvidos no processo da educação, dos sujeitos que se encontram no processo de ensino-  
aprendizagem. O autor enfatiza articular ações em prol de se colocar em posição crítico-  
democrática da biblioteca popular, que envolve esforços no sentido da compreensão do que é a  
palavra escrita, a linguagem, as suas relações com o contexto de quem fala e de quem lê e escreve  
para a compreensão entre leitura do mundo e leitura da palavra.  
Ainda segundo a reportagem da Agazeta.net, o programa Presídios Leitores realizou a  
primeira campanha de doação de livros em todo o Estado em 2022, com ponto de doação em  
quatro municípios: Cruzeiro do Sul, Rio Branco, Mâncio Lima e Rodrigues Alves. Os exemplares  
doados vão compor a biblioteca da Unidade Penitenciária Manoel Neri da Silva, em Cruzeiro do  
Sul. Para os envolvidos no Programa, projetos serão desenvolvidos com a doação de livros de  
modo a manter e aumentar o incentivo da prática de leitura não apenas para a remição de pena,  
mas para construir o hábito da leitura.  
Figura 1: Dos envolvidos no Programa Presídios Leitores  
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No entendimento de Freire (1989) a biblioteca popular e, aqui destacamos a do presídio,  
precisa funcionar como centro cultural e não como um depósito silencioso de livros para que  
possa, de fato, aperfeiçoar e intensificar o hábito da leitura entre os sujeitos em privação de  
liberdade, articulando o texto com o contexto. O educador argumenta que, ao desenvolver a  
biblioteca popular, pode-se estimular a criação de grupos de leitura, a fim de compreender e  
analisar o que se está lendo e procurando apreender a sua significação mais profunda, propondo  
aos leitores uma experiência estética, de que a linguagem popular é intensamente rica.  
A nosso ver e, em sintonia com Novo (2018), os sujeitos em privação de liberdade que não  
ocupam o seu dia e a sua mente, podem organizar ideias que, muitas vezes, serão ruins para si  
mesmos. O presídio é um sistema fechado e o encarcerado vive o clima diário do medo e da  
angústia de não saber se continuará vivo. Ao se pensar em projetos como o de remição de pena  
pela leitura pode ser o ponto de partida para que ele acredite em um amanhã melhor e, quem  
sabe, ao sair e estar em liberdade, passe a refletir e a agir em prol de seu próprio conhecimento.  
Considerações finais  
Freire (1989) advoga que a educação liberta quando realizada com criticidade, com o  
diálogo, com o respeito pelo outro. Educar é envolver-se, é considerar as experiencias do outro,  
em qualquer contexto, principalmente em um espaço em que a mente e o corpo são,  
constantemente, privados. Conforme bem situado pelo autor, educação exige sempre atitude  
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séria e curiosa na procura de compreender as coisas e os fatos que observamos, que  
experienciamos. A leitura de texto é mais do que a simples leitura, envolve comprometimento,  
estudo, criticidade, diálogos.  
Leitura exige interpretação, atenção, curiosidade e, em muitos casos, dificuldades. Ler,  
estudar, escrever exigem cuidado. Freire (1989) destaca que estudar é criar e recriar é não repetir  
o que os outros dizem. Estudar é um dever, um ato revolucionário. E como ato revolucionário,  
exercer a prática da leitura em contexto de privação de liberdade é, acima de tudo, praticar o  
humanismo que existe em nós mesmos.  
Podemos verificar que, em sua maioria, os sujeitos em cárcere privado não tiveram as  
melhores oportunidades de vida, como a chance de estudar para garantir um futuro mais digno.  
Apoiadas em Novo (2018), acreditamos que os projetos desenvolvidos nos presídios, em especial  
o de Remição de Pena pela leitura, podem abrir algumas frestas, oportunidades para quem nunca  
teve para conhecer a si mesmo, refletir sobre seus atos e, futuramente, tentar garantir um futuro  
com oportunidades.  
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