ARTIGO  
Ler-escrever gêneros discursivos acadêmicos  
como processo formativo de uma turma de  
licenciatura em pedagogia vinculada ao PARFOR  
Reading-writing academic discursive genres as a formative process of  
a teaching degree class to PARFOR  
Universidade Federal Fluminense, Niterói, RJ, Brasil.  
FLUXO DA SUBMISSÃO  
Submissão do trabalho: 11/05/2023  
Aprovação do trabalho: 11/07/2023  
Publicação do trabalho: 15/09/2023  
Faculdade de Educação Tecnológica do Estado do Rio de Janeiro,  
Santo Antônio de Pádua, RJ, Brasil.  
Resumo  
Esta pesquisa qualitativo-interpretativista focaliza as apreciações  
valorativas (BAKHTIN, 2011) de estudantes, já professores, de um curso  
de Pedagogia vinculado ao PARFOR, acerca das dificuldades de  
vivência nas práticas cotidianas de escrita universitária e do trabalho  
desenvolvido pelo professor universitário no ensino de gêneros da  
esfera acadêmica no decurso das disciplinas. Em termos  
metodológicos, aplicou-se um questionário respondido oralmente em  
videogravação por três estudantes em 2018. Entendendo que as  
práticas de escrita são práticas sociais situadas em esferas discursivas  
não isentas de relações hierárquicas, ideológicas e de poder (STREET,  
10.23925/2318-7115.2023v44i2e62001  
2
014), ancora-se esse debate nos Estudos do Letramento (LEA;  
STREET, 1998; LILLIS, 1999; STREET, 2010, 2014 etc.), na Filosofia da  
Linguagem (BAKHTIN, 2011) e em pesquisas que imbricam formação  
docente e letramento acadêmico (VIANNA et al, 2016; RODRIGUES;  
RANGEL, 2018 etc.). As apreciações valorativas produzidas refletem-  
refratam “dimensões escondidas” entre a solicitação e a produção de  
gêneros acadêmicos, cuja escrita é demandada sistematicamente  
pelos professores. Embora as apreciações valorativas indiquem a  
aquisição de mais experiência nessa modalidade, a pressuposição de  
que os estudantes não só devem conhecer como ainda dominar de  
antemão tais gêneros é um fator dificultador de vivências significativas  
de escrita, porque minimiza-se o espaço do ensinar na esfera  
acadêmica.  
Distribuído sob Licença Creative Commons  
Palavras-chave: Apreciações valorativas; Letramento acadêmico;  
Gêneros discursivos acadêmicos.  
Jéssica do Nascimento RODRIGUES; Marcela Tavares de MELLO  
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Abstract  
This qualitative-interpretationist research has focused on students’ – already teachers of a Parfor  
associated class pursuing a degree in education value appreciation (BAKHTIN, 2011) of the  
difficulties associated with the daily experiences in academic writing and of the work performed by  
the university-level teacher while teaching genres related to the academic sphere in the course of  
each subject. As for the methodology, three students responded verbally to a survey which was  
recorded in a video in 2018. Whilst understanding writing as a social practice which is situated in  
discursive scopes that are not exempt from hierarchical, ideological and power relations (STREET,  
2014), this debate is anchored in Literacy Studies (LEA; STREET, 1998; LILLIS, 1999; STREET, 2010, 2014  
etc.), Philosophy of Language (BAKHTIN, 2011) and in researches that interweave teacher education  
and academic literacy (VIANNA et al, 2016; RODRIGUES; RANGEL, 2018 etc.). The produced value  
appreciations denote “hidden dimensions” between the request and the production of academic  
genres which are related to a type of writing that is constantly required by professors. Even though  
value appreciation indicates the need for more experience aquisition in this category, the assumption  
that students must not only get to know but also to master such genres in advance makes the  
significant writing experiences more difficult because it reduces the teaching space in the academic  
sphere.  
Keywords: Value appreciation; Academic Literacy; Academic discursive genres.  
1.  
Introdução  
O projeto O ler-escrever gêneros acadêmicos na formação docente, do qual decorre este  
artigo, reúne as investigações do Grupo de Estudos e Pesquisa em Leitura e Escrita Acadêmica  
(GEPLEA), da Universidade Federal Fluminense (UFF), em diálogo com as experiências do  
Programa de Ensino e Extensão Laboratório de Letramentos Acadêmicos (LabLA), da mesma  
instituição. As atividades desenvolvidas pelo grupo, embora incipientes, trazem à baila um  
conjunto de problemas atinentes às práticas escriturais subjacentes à vivência acadêmica nos  
cursos de formação de professores, como esfera discursiva, por docentes em formação inicial e  
contínua. Dentre os temas pesquisados, os desafios enfrentados por estudantes de licenciatura  
nas práticas de escrita confirmam resultados e ampliam um debate ainda acanhado no Brasil.  
Esta pesquisa, numa abordagem qualitativo-interpretativista, desenvolvida mediante  
acompanhamento de uma turma ao longo de seu percurso acadêmico (2016 a 2019), analisou os  
desafios enfrentados por licenciandos de uma turma de Pedagogia vinculada ao Plano Nacional  
de Formação de Professores da Educação Básica (PARFOR) de uma universidade federal. O  
objetivo foi examinar as práticas de escrita experienciadas no curso, com base em suas  
apreciações valorativas, considerando o trabalho desenvolvido pelo professor universitário.  
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Para tornar exequível a investigação em tela, o escopo teórico dos Estudos do Letramento  
LEA; STREET, 1998; LILLIS, 1999; STREET, 2010, 2014 etc.) e da Filosofia da Linguagem (BAKHTIN,  
011) sedimentou-a como caminho coerente e possível para que se pudesse produzir sentido,  
(
2
dialética e dialogicamente, sobre as práticas de escrita vivenciadas, até aquele tempo, pelos  
estudantes-professores. Para tanto, lançou-se mão de dispositivos enunciativos como o grupo  
focal e a entrevista. Neste artigo, porém, o foco será a vídeo-gravação dos depoimentos desses  
estudantes-professores no primeiro semestre de 2018, como enunciados vivos, sociais e  
ideológicos, elos na cadeia de comunicação discursiva.  
Tendo em vista o objetivo proposto, na primeira parte deste artigo, abordamos os  
pressupostos teóricos fundamentais em que a pesquisa se alicerça. Na segunda parte, focalizamos  
a metodologia de registros, seleção e aproximação dos dados analisados. Na terceira parte,  
ocupamo-nos das análises das apreciações valorativas - numa perspectiva bakhtiniana - produzida  
pelos estudantes acerca dos desafios vivenciados na escrita dos gêneros acadêmicos. Por fim,  
apresentamos algumas considerações que as análises dos dados permitiram e que nos levam a  
mais perguntas e, nessa esteira, à necessidade de mais pesquisas sobre o tema.  
2
. Fundamentação teórica  
Entendendo que as práticas de escrita são práticas sociais situadas em esferas discursivas não  
isentas de relações hierárquicas, ideológicas e de poder (STREET, 2014), este debate se ancora nos  
Estudos do Letramento, na Teoria da Enunciação e em pesquisas que imbricam a formação  
docente e o letramento acadêmico, partindo da seguinte questão de estudo: O que os  
licenciandos de uma turma de Pedagogia discursivizam, como apreciações valorativas, sobre os  
desafios enfrentados nas práticas de escrita experienciadas no curso, considerando o trabalho  
desenvolvido pelo professor universitário?  
Algumas pesquisas já evidenciaram que a escrita de gêneros discursivos acadêmicos é um  
desafio para os estudantes de cursos de licenciatura (MARINHO, 2010; VIANNA et al, 2016;  
RODRIGUES; RANGEL, 2018; etc.). No entanto, o lugar dessa problemática tem sido minorado  
nessa esfera, sobretudo porque, ao ingressar no ensino superior, o estudante passa a ler e a  
escrever gêneros que desconhecia e a ter de lidar com a necessidade de produção/ transformação  
do conhecimento, muito mais do que reprodução, mediante uso de linguagem mais monitorada.  
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Mesmo que surjam grupos de pesquisa e laboratórios (centros de escrita) em instituições de  
ensino superior brasileiras nos últimos anos, o problema persiste, já que são ainda ações muito  
pontuais. Há necessidade, no mínimo, de amplos debates sobre as práticas letradas acadêmicas  
atrelando-as a outras questões materiais, como é o caso das condições de permanência e vivência  
dos estudantes nos cursos, sobretudo quando são trabalhadores.  
As convenções específicas que regem o ensino superior acrescidas às histórias de letramento  
oriundas da educação básica relacionadas à produção textual, apresentadas por grande parte dos  
estudantes, acarretam inúmeros conflitos e tensões (GEE, 1999). Há tensões tanto por parte dos  
estudantes quanto por parte dos professores: estes, por sua vez, acreditam que aqueles devem  
chegar “prontos” à universidade, e, por isso, não se sentem responsáveis por auxiliá-los no  
processo de inserção no contexto acadêmico (LEA; STREET, 1998). É o que temos entendido como  
a naturalização da leitura e da escrita na esfera acadêmica.  
Compreendendo o(s) letramento(s) como práticas sociais e seu modelo ideológico como  
reconhecedor de que essas práticas letradas são produtos culturais, históricos e discursivos,  
conforme Street (2014), os Estudos do Letramento consideram os usos da leitura e da escrita  
acadêmica em esferas discursivas específicas, obviamente situadas, e seu processo de  
escolarização:  
[
...] as implicações dos Novos Estudos do Letramento para a Pedagogia estão na  
necessidade que temos de ir além de ensinar às crianças os aspectos técnicos das  
funções da linguagem para, bem mais, ajudá-las a adquirir consciência da natureza  
social e ideologicamente construída das formas específicas que habitamos e que  
usamos em determinados momentos (STREET, 2014, p. 23).  
Ao assumir a perspectiva sócio-histórica e cultural das práticas de escrita, o conceito de  
esfera e de gênero discursivos contemplam as premissas que movem este esforço intelectual de  
pesquisa. Os gêneros discursivos orais ou escritos, nessa perspectiva, traduzem formas concretas  
de enunciados, por meio dos quais os falantes interagem. Sendo assim, toda ação de linguagem  
ocorre por meio de algum gênero discursivo. Em outras palavras, o mundo social é mediado  
textualmente, dialogicamente, sendo os gêneros distintos utilizados em diferentes esferas  
discursivas.  
Os gêneros discursivos, segundo Bakhtin (2016), são enunciados, concretos e dinâmicos  
que, embora estejam em movimento perpétuo, podem ser caracterizados por três traços  
determinantes, a saber, conteúdo temático, construção composicional (relativamente estável) e  
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estilo. Tais características, obviamente, são influenciadas pelo contexto sociocultural e histórico,  
porque se realizam a serviço de uma dada situação comunicativa. Por isso mesmo, são discursivos,  
porque dependem e são influenciados pelo contexto imediato em que se materializam. Sendo  
assim, pode-se inferir que os gêneros contemplam marcas textuais e enunciativas: estas dizem  
respeito ao contexto de produção, tais como intencionalidade discursiva, endereçamento etc.;  
aquelas tratam da estrutura composicional, seleção lexical etc.  
Segundo Bakhtin (2016), em função da situação da enunciação, da posição social ocupada  
e das relações de reciprocidade entre co-enunciadores, os gêneros se diversificam, ainda que  
existam formas oficiais mais estáveis (ainda que não cristalizadas), como é a maioria dos textos  
acadêmicos. A depender da esfera discursiva, no que estão os campos disciplinares, há variação,  
afinal as linguagens são sociais. Ademais, a enunciação contempla sempre uma orientação  
apreciativa, sem separá-la da significação, marcando seu lugar na evolução social viva e  
confirmando seu caráter organicamente histórico (BAKHTIN, 2017).  
Cada esfera discursiva (re)elabora e/ou seleciona, numa relação bidirecional, os gêneros  
discursivos que serão utilizados como meio ou forma de interação entre seus pares. Por essa  
razão, pode-se dizer que os gêneros discursivos organizam as ações de linguagem, uma vez que  
validam as atividades de comunicação das esferas discursivas. Isso significa que existe uma  
imbricação entre as esferas discursivas e os gêneros discursivos, como se estes se costurassem às  
relações humanas naquelas, como espaço-tempo de produção de enunciados situados.  
Assim como em outras esferas discursivas, as comunidades acadêmicas, como  
"organizações dos sujeitos, em seus tempos e espaços, objetivando criar situações para ir além  
do que está demandado externamente para seu trabalho" (FERREIRA, 2017, p. 105) - compartilham  
um discurso próprio por meio dos gêneros discursivos que produzem, na relação com outras  
comunidades. A utilização desses gêneros leva ao diálogo entre vozes sociais, consideradas  
experiências e subjetividades, nas comunidades acadêmicas, as quais, segundo Ferreira (2017), são  
movimentos políticos cujo fim é a produção do conhecimento mediante trabalho coletivo.  
A respeito da compreensão das dimensões textual e discursiva das ações de linguagem,  
Street (2014) discorre sobre dois conceitos, a saber, eventos de letramento e práticas de  
letramento. O primeiro, evento de letramento, refere-se a “qualquer ocasião em que um  
fragmento de escrita integra a natureza das interações dos participantes e seus processos  
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interpretativos” (STREET, 2014, p. 146). Isso significa que os eventos de letramento ocorrem de  
variadas formas em quaisquer contextos  escolares ou não  onde as interações são mediadas  
pelo texto escrito. Já a concepção de práticas de letramento refere-se “a comportamentos e  
conceitualizações relacionadas ao uso da leitura e/ou da escrita”. O autor afirma que “as práticas  
letradas incorporam não só os eventos de letramento, mas também as concepções ideológicas  
que os sustentam” (STREET, 2014, p. 147). Percebe-se, então, que a noção de prática de  
letramento associa e amplia a concepção de evento de letramento, posto que engloba também  
as convenções culturais valores, relações sociais, atitudes que determinam os eventos.  
Considerando as reflexões expostas, podemos afirmar que para cada esfera social em que  
circula, o indivíduo desenvolve um letramento específico, construído coletiva e historicamente,  
ancorado em relações sociais diversas e desiguais. No bojo dos Estudos do Letramento,  
encontram-se as pesquisas desenvolvidas na área do letramento acadêmico que visam a  
compreender questões sociais e textuais da esfera acadêmica. Dito de outra forma, buscam  
apreender “as formas de ser, ouvir, escrever, ler, agir, interagir, acreditar, valorizar, sentir, usar  
recursos, ferramentas, tecnologias capazes de ativar identidades relevantes” específicas dessa  
esfera (FISCHER, 2007, p. 45).  
Decorrente dessa visão, acreditamos que uma investigação sobre as orientações  
apreciativas de professores em formação vai ao encontro da discussão sobre por que cursam  
Pedagogia ou outra licenciatura e sobre como foram e são as suas histórias de letramento dentro  
e fora da universidade para, desse modo, focalizar “não só o que falta aos docentes em formação,  
mas tomando por base as práticas que já fazem parte de seu letramento, para que se apropriem  
das novas práticas acadêmicas que lhes são exigidas nos contextos de formação” (VIANNA et al.,  
2
016, p. 53). Dito de outro modo, é fundamental conhecer as práticas letradas já experienciadas  
pelos estudantes-professores - seu conhecimento prévio - a fim de que, a partir destas, construam  
condições que oportunizem o desenvolvimento de seu engajamento naquelas situadas nas  
comunidades acadêmicas de determinadas culturas disciplinares, de determinados campos de  
investigação, e de determinadas áreas do conhecimento.  
3. Encaminhamentos teórico-metodológicos  
Sem acento apreciativo, não há palavra(BAKHTIN, 2010, p. 137)  
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Esta pesquisa, qualitativo-interpretativista, focaliza as apreciações valorativas de estudantes  
1
do curso de Pedagogia, já professores formados no curso normal (Ensino Médio) , acerca das  
dificuldades de vivência das práticas acadêmicas de escrita e do trabalho desenvolvido pelo  
professor universitário no ensino de gêneros dessa esfera. O convite aos participantes incluiu o  
envio do projeto de pesquisa e de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), com o  
qual os participantes consentiram ao preencherem o formulário. A referida turma é vinculada ao  
PARFOR, que viabiliza o curso de licenciatura a docentes da rede pública de educação básica que  
não possuem formação superior.  
Em termos metodológicos, aplicamos, como dispositivos enunciativos, um questionário  
semiestruturado (respondido por escrito pelos 10 estudantes do curso em 2016), realizamos dois  
focais com base em um roteiro elaborado previamente (o primeiro com 7 estudantes, em 2016, e  
o segundo com 4, em 2017) e, por fim, empregamos outro questionário semiestruturado  
(respondido oralmente em videogravação por apenas 3 estudantes em 2018, os únicos que nos  
enviaram a gravação solicitada), como apresentado no Quadro 1. Aqui, neste artigo, apresentamos  
a análise apenas desse último dispositivo enunciativo, como um incentivo à enunciação, prevendo-  
se, como se trata de pesquisa longitudinal, a realização de outros encontros com tais estudantes,  
que já concluíram o curso no final de 2019.  
Quadro 1. Quantidade de sujeitos participantes no decorrer do estudo  
Questionário  
semiestruturado  
Grupo focal 1  
(2016)  
Grupo focal 2  
(2017)  
Vídeo-gravação  
(2018)  
(
2016)  
Estudantes  
1
0
7
4
3
respondentes  
(
Fonte: Dados produzidos pelas autoras)  
Escolhemos esses sujeitos para participação neste estudo porque são todos professores da  
educação básica pública no Estado do Rio de Janeiro. Ainda que tenham cursado a formação de  
professores no Ensino Médio, retornaram à universidade para realizar o curso de Pedagogia, na  
1
Garantido pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB 9394/96), o curso Normal, que ocorre no ensino médio, é a  
formação mínima para professoras e professores que pretendem atuar na educação infantil e nos anos iniciais do ensino  
fundamental.  
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modalidade presencial, pelo Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica  
PARFOR), cujo objetivo era: induzir e fomentar a oferta de educação superior, gratuita e de  
(
qualidade, para professores em exercício na rede pública de educação básica, para que estes  
profissionais possam obter a formação exigida pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional  
LDB e contribuam para a melhoria da qualidade da educação básica no País” (CAPES, 2020).  
Como entendemos que os letramentos acadêmicos são inerentes à formação de professores,  
em especial porque estes são também agentes de letramento na escola, o convite para  
participação nesta pesquisa foi enviado à turma de Pedagogia que iniciava o curso em 2016.  
Embora este texto se reporte principalmente à última fase da pesquisa de campo (a vídeo-  
gravação), a nossa análise é feita em conjunto com as fases anteriores (questionário e grupos  
focais), as quais geraram algumas publicações.  
Às três estudantes com quem aqui dialogamos, todas professoras de escolas públicas  
localizadas na Baixada Fluminense, Rio de Janeiro, foram atribuídos pseudônimos (Betina, Dalva  
e Luara) a fim de se manter seu anonimato. As estudantes-professoras receberam, por e-mail, um  
roteiro com 8 questões (disponibilizadas na próxima seção do artigo) e com a proposta de  
gravação de um vídeo apresentando suas respostas, suas palavras, suas apreciações valorativas.  
4
.Análise dos dados gerados  
A primeira questão: Neste semestre, que gêneros você mais escreveu no curso? Cite três deles,  
foi uma oportunidade de mapear os gêneros mais recorrentes no curso. Seguido da resenha e do  
resumo, citados reiteradamente em outras fases da pesquisa, o gênero projeto ganha  
centralidade, como já era uma hipótese das pesquisadoras. As vídeo-gravações permitiram uma  
análise verbal e extraverbal da enunciação das três estudantes-professoras, as quais começam a  
ler e escrever com maior intensidade, mas não com mais segurança, para a produção do trabalho  
de conclusão de curso: a monografia.  
A segunda pergunta: Houve alguma mudança em relação aos semestres anteriores? Comente,  
reafirma a anterior, porque Betina, Dalva e Luara expressam preocupação ao afirmarem haver,  
nesta etapa do curso, a necessidade de escrita do projeto de pesquisa, para além das solicitações  
cotidianas de leituras e escritas no decurso das disciplinas. Mas foi na terceira, Quais as três  
principais dificuldades que você encontrou na escrita desses gêneros neste semestre?, que elas  
esboçaram as “dimensões escondidas” de que trata Street (2010) e, em vozes produzidas  
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coletivamente, em diálogo com os dispositivos enunciativos de encontros anteriores,  
comungaram. Para Dalva, “as professoras que pediram o projeto, elas orientaram como que seria,  
mas mesmo assim a gente teve uma certa dificuldade de montar também”. Luara complementa:  
“Eu acredito que muitos professores imaginavam que nós sabíamos já escrever esses gêneros de  
escrita, por isso que eles passavam, entendeu?! Não explicavam”. Tais apreciações, reiteradas em  
outros momentos, em tom de desabafo e reclamo, exprimem contrapalavras latentes nas  
relações de poder inerentes à esfera acadêmica e asseveram a perspectiva da naturalização das  
práticas de leitura e escrita na universidade.  
Tendo em vista que os estudantes, ao ingressarem no ensino superior, passam a circular por  
uma esfera discursiva distinta, e, por isso mesmo, têm de consumir gêneros discursivos específicos  
que, em geral, também não fazem parte de seus respectivos repertórios. Pode-se dizer, com base  
nas experiências das autoras enquanto pesquisadoras e professoras do ensino superior, que as  
dificuldades enunciadas pelas estudantes são comuns e fazem parte do processo, ainda que elas  
sejam competentes leitoras e produtoras de textos.  
Ao questionarmos, você considera que tais dificuldades são as mesmas em relação aos  
semestres anteriores? Por quê? Betina esclarece: “Eu acho que a dificuldade diminuiu, né, no todo,  
porém a gente ainda se esbarra naquela situação: professor pede uma coisa, mas nem ele mesmo  
sabe o que ele está pedindo”. E Dalva, mediante citação da voz do professor em discurso direto,  
reproduz: “‘Ah, é fácil, vocês vão conseguir’, mas não dá as devidas orientações de como tem que  
ser feito realmente em escrita”. Essas orientações apreciativas de desagrado carregam a  
constatação de que professores e professoras universitárias defendem a autonomia nas práticas  
escriturais acadêmicas dessas estudantes desde o início do curso, mas desconsideram, em termos,  
suas histórias de letramento e, nelas, por óbvio, os seus conhecimentos prévios textuais e  
enunciativos.  
Ao reproduzir o enunciado da docente “mas não dá as devidas orientações de como tem que  
ser feito realmente em escrita”, a estudante ratifica a prática do mistério, apontada por Lillis  
(1999). É perceptível a ausência do ensino sistematizado dos gêneros discursivos acadêmicos.  
Embora haja uma expectativa por parte dos professores da “boa escrita”, como é possível  
perceber em reuniões de departamento e em diálogos estabelecidos com os pares, não há, em  
geral, um ensino sistemático sobre os gêneros discursivos na esfera acadêmica. Como  
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consequência, surgem inúmeros conflitos e tensões por parte dos alunos que, não raro, se sentem  
excluídos e chegam a evadir dos cursos, como ocorre quando a monografia é um item obrigatório  
e de que o estudante depende para a certificação final. Trata-se de conflitos e tensões entre as  
formas de escrita desses estudantes na relação com as diferentes expectativas e com as normas  
acadêmicas esperadas por muitos professores que, sendo ou não especialistas em linguagem,  
parecem não ter consciência dela e, mormente, de que as práticas leitoras e escriturais são  
situadas, promovidas por sujeitos discursivos concretos.  
Na quinta questão: Que estratégias você utilizou para tentar sanar tais dificuldades?,  
encontramos algumas pistas sobre os modos como essa autonomia se desenvolve na esfera  
acadêmica: a busca de ajuda de colegas e de modelos do gênero na internet. “Eu pesquisei muito  
na internet, em livros, e também tirava a dúvida com alguns amigos meus que já tinham se  
formado”, Luara salienta, com expressão conformada.  
A constatação de que as produções das alunas são, em geral, baseadas em modelos da internet e  
livros selecionados por elas mesmas e de que esses textos, que servem como “modelos” para  
suas escritas, merece destaque. Por um lado, porque é perceptível, ao analisar alguns textos que  
circulam na esfera acadêmica, que as diversas áreas do conhecimento organizam/ estruturam seus  
gêneros de forma particular, desde a escolha vocabular do texto escrito a ser publicado em  
periódicos especializados até os modos de comportar-se oralmente frente a seus pares nos longos  
corredores de institutos e faculdades. Ademais e por isso, os manuais não são universais. Por  
outro, porque ainda que os textos utilizados como modelo fossem de sua respectiva área e  
considerados “bem escritos”, a questão discursiva do gênero é invisível, sendo percebida apenas  
no uso concreto da língua/linguagem. A naturalização das práticas de leitura e escrita é, portanto,  
a naturalização da própria linguagem.  
Essa apreciação valorativa na direção do trabalho do professor universitário, como aquele  
que solicita a produção textual sem criar expedientes pedagógicos de ensino-aprendizagem mais  
efetivos, é retomada na questão: Os professores ensinaram/ orientaram a escrita desses  
textos/gêneros ao longo do semestre? Para Dalva, os professores “não explicaram... como, passo  
a passo de como deveria ser feito, apenas solicitaram esses trabalhos [...], a professora do artigo  
não explicou como, a gente ficou muito perdido realmente como deveria ser feito; a do projeto  
deu alguns parâmetros certinho, de como deveria ser feito, mas mesmo assim como a gente não  
tinha feito ainda teve uma certa dificuldade”. O pressuposto bakhtiniano de que é necessário  
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convívio/ experiência com o gênero para que se possa dominá-lo parece não existir na prática,  
embora a própria estudante reconheça isso. As estudantes precisariam conhecer, ler e analisar  
artigos e projetos antes de escrevê-los, considerando os gêneros como tipos relativamente  
estáveis de enunciado e percebendo a dialogia e a polifonia como orgânicos a esses tipos  
concretos.  
A partir dos enunciados produzidos pelas estudantes, percebemos que, em geral, as  
produções tinham como único fim a avaliação do professor, em outras palavras, o exercício com  
finalidade de exercício mesmo. Como pontuado anteriormente, a questão discursiva dos gêneros  
é percebida por meio das práticas. Assim, os estudantes vão ressignificando os valores, as crenças,  
os saberes e os gêneros que são mobilizados na esfera discursiva acadêmica. Todavia, a produção  
do gênero discursivo sem considerar seus usos é verificada com frequência nos expedientes  
pedagógicos adotados pelos docentes de diversos níveis de ensino, como nos faz refletir o ensaio  
de Bagno e Rangel (2005).  
Por isso, a questão fundamental é trabalhar/solicitar a leitura e a escrita de gêneros  
discursivos situados em práticas para além da realização de exercícios, a fim de que seja  
preconizado seu caráter formativo. Em outras palavras, que se entenda o texto como unidade de  
ensino e os gêneros como cristalização das práticas sociais. Tratamos aqui do texto materializado  
no discurso, tendo em vista que a experiência é um fator fundamental na aprendizagem.  
Conforme apontam Fischer e Pelandré,  
[
...] é nos eventos de letramento acadêmico que os alunos vão construindo os  
seus saberes acadêmicos/científicos e, para além disso, também os  
posicionamentos ideológicos, significados culturais e estruturas de poder que, em  
conjunto, constituem o modo cultural de usar os textos. Em consequência, esses  
eventos são responsáveis por integrarem e participarem da construção do  
letramento acadêmico (2010, p. 572).  
Isso reforça a importância de trabalhar o gênero discursivo com estudantes em formação  
universitária, levando-os a experenciar a linguagem de forma concreta, ou seja, considerando  
evento (elementos visíveis) e prática de letramento (elementos invisíveis), como assevera Street  
(2014).  
Na sétima questão: Cite dois pontos positivos, se houver, dessas práticas de escrita desses  
gêneros no contexto universitário, a prática ganha espaço nas enunciações. Para Dalva, em  
apreciações valorativas que indicam obviamente índices sociais de valor produzidos no coletivo,  
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“com a maior dificuldade a gente vai conseguindo ir aprendendo a desenvolver esses textos,  
porque nada melhor do que a prática, mas a prática precisa ser corrigida para a gente ver onde  
que a gente está errando”. Práticas escriturais embasadas em modelos da internet e em  
experiências compartilhadas por colegas de curso, sem orientação, como apenas um requisito  
para o cumprimento de uma disciplina ou do curso, não excluem a responsabilidade do professor  
de um trabalho mais acurado e de qualidade com o texto acadêmico, lembrando que “o mero  
conhecimento da ossatura não leva a redação do texto em si” (GERALDI, 2010, p. 98).  
A afirmação enunciada pela aluna “a gente vai conseguindo ir aprendendo a desenvolver  
esses textos” corrobora Fiad (2016), quando afirma que, de uma forma ou outra, os estudantes  
vão se acomodando às práticas típicas da esfera discursiva acadêmica. Todavia, é preciso pontuar  
que há uma distância entre “se acomodar” a uma prática e, de fato, apropriar-se de forma  
significativa desta com intuito de utilizá-la para satisfazer as necessidades linguageiras, ou seja,  
alcançar o propósito comunicativo pretendido de forma intencional e adequada. Ainda que não  
exista um declínio no processo letramento, quando gêneros discursivos são analisados, torna-se  
possível compreender a natureza situada, institucionalizada e ideológica das práticas de  
letramento, bem como é facilitada a identificação dos critérios definidores dos gêneros, tais como  
função, forma e situacionalidade.  
Nesse ponto, outro aspecto merece destaque, trata-se da constatação, por parte das  
estudantes, da ausência do retorno (correção, avaliação) dos textos produzidos. Tal inação é  
apontada no discurso enunciado por uma das estudantes, em tonalidades dialógicas que  
expressavam descontentamento, e vai de encontro a uma concepção de escrita compreendida  
como processo. Sob o prisma das atividades de feedback, é preciso recuperar a assertiva de  
Mendonça e Johnson (1994), que afirmam que  
[
...] a interação entre pares que é proporcionada pelas atividades de feedback  
permite que os alunos, ao se engajarem em uma conversa exploratória, construam  
o significado dentro do contexto da interação social enquanto testam e trabalham  
novas idéias, conjugando, assim, os aspectos cognitivos e sociais da linguagem  
(
MENDONÇA; JOHNSON, 1994 apud SOARES, 2008, p. 83).  
Considera-se que dar um retorno acerca das questões textuais influencia no  
desenvolvimento da consciência linguística, visto que o estudante consegue visualizar as questões  
apontadas no retorno, bem como compreender a escrita como um processo, que envolve leitura,  
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escrita e muita reescrita. Se não há retorno dos textos produzidos, como o estudante conseguirá  
verificar seu desenvolvimento na escrita? Como identificará pontos que podem ser revisados?  
Na oitava questão: Cite dois pontos negativos, se houver, dessas práticas de escrita desses  
gêneros no contexto universitário, Luara consegue resumir as vozes de suas colegas, cujas  
apreciações valorativas pendem para o desconhecimento do gênero e para a crítica ao professor  
universitário no trabalho com gêneros discursivos acadêmicos: “Eu me senti um pouco perdida às  
vezes. Às vezes eu pensava que estava escrevendo um tipo de resumo, e não era aquele, acabava  
misturando resenha com resumo, e entregava, e não tinha correção”.  
A dificuldade apresentada pelos alunos, e, às vezes, até pelo próprio professor  como  
enunciado anteriormente pelas alunas - em identificar as características dos gêneros discursivos  
pode ser relacionada à questão da metáfora dos gêneros trazida à tona por Bronkart (2006). Para  
o autor, os gêneros não são estanques e estão sempre em movimento perpétuo. O movimento  
perpétuo, referido pelo pesquisador, relaciona-se ao fato de que há sempre coerções e  
determinantes de ordem social, histórica, cultural que fazem com que, em diferentes momentos  
históricos, em diferentes culturas, alguns gêneros sejam mais relevantes, mais presentes que  
outros. Assim, entende-se também que as fronteiras desses gêneros, com esse movimento  
perpétuo, não são rígidas. Isso é importante para compreender as fronteiras, por exemplo, entre  
os gêneros resumo e resenha e, além disso, para ratificar a relevância da análise conjunta dos  
gêneros discursivos que integram as diversas áreas do conhecimento, a fim de identificar suas  
similaridades, até para, se necessário, alterá-las. Por isso, uma certa desorientação, como  
pontuado, às vezes, é comum para os próprios professores e professoras universitárias, que  
também estão em processo contínuo de formação.  
Considerações finais  
O acompanhamento etnográfico, de 2016 a 2019, da turma do curso de Pedagogia,  
composta por estudantes já docentes da educação básica, permitiu, numa abordagem qualitativo-  
interpretativista, identificar e analisar os desafios enfrentados por licenciandos de uma turma de  
Pedagogia vinculada ao Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica  
(PARFOR) de uma universidade federal no que se refere às práticas de escrita experienciadas no  
curso, com base em suas apreciações valorativas, considerando o trabalho desenvolvido pelo  
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professor universitário. Verificou-se que tais práticas culminaram na produção de projetos de  
pesquisa e de trabalhos monográficos na relação dialógica-dialética orientadores-orientandos.  
Ainda que acompanhadas por professores e professoras universitárias mais experientes,  
os quais transitam na esfera acadêmica produzindo leituras, escritas e comportamentos  
linguísticos típicos desse ambiente de trabalho, as estudantes demonstraram apreciações  
valorativas muito atinentes à insegurança de um não enquadramento em práticas discursivas já  
há muito sedimentadas e difíceis de transformar.  
A naturalização das práticas de leitura e escrita, como ações aprendidas na educação básica  
e transferíveis a outras esferas discursivas, assim como a naturalização da própria linguagem  
levanta um alerta sobre a necessidade de maior debate, dentro das próprias instituições de ensino  
superior, sobre o ensino do ler-escrever na formação graduada, sobretudo quando se trata de  
formação para o trabalho no letramento de crianças, jovens e adultos, trabalho de professores e  
professoras que se formam em cursos de licenciatura, como o caso da Pedagogia.  
Entender o trabalho com os gêneros discursivos nas salas de aula do ensino superior, em  
especial nos cursos de formação de professores, é compreender que: a) os textos acadêmicos têm  
centralidade nessa esfera, sim, e não dispensam a necessidade de criação de expedientes  
pedagógicos para seu ensino, o que é tarefa não só dos professores universitários, mas sim de  
toda a sua comunidade discursiva; b) os professores em formação são agentes de letramento nas  
escolas e não podem prescindir, por isso mesmo, da vivência de ler-escrever gêneros acadêmicos  
como produção/ transformação e compartilhamento do conhecimento.  
A existência de “dimensões escondidas” (STREET, 2010) entre a solicitação e a produção  
de gêneros acadêmicos, como artigos, resenhas e projetos de pesquisa, enunciada nas  
apreciações valorativas coproduzidas nas três vídeo-gravações, mesmo que indiquem a aquisição  
de mais experiência com essa modalidade, e a pressuposição de que os estudantes não só devem  
conhecer como ainda dominar de antemão tais gêneros discursivos são dificultadores de vivências  
significativas de escrita e de uma formação que vise ao desenvolvimento da autonomia docente.  
Tais questões precisam ganhar espaço no debate sobre formação de professores no ensino  
superior.  
É preciso ponderar e refletir muito sobre o tema em tela, acolhendo os estudantes, cujas  
práticas de leitura e escrita, ao ingressarem em cursos superiores, são ainda insuficientes no que  
se refere à madura produção intelectual brasileira. É preciso ainda buscar equilíbrio na análise do  
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trabalho com a linguagem desenvolvido por professoras e professores universitários, imiscuídos  
em atividades de pesquisa e gestão, e em suas decorrentes ações mais burocráticas, e em  
atividades de ensino e extensão, as quais costumam ter menos valor na concorrência a editais, em  
sentido estrito, e no status a que isso se refere.  
As relações ideológicas, hierárquicas e de poder, argumento sustentado pelos estudos do  
letramento como basilares nas práticas de ler-escrever, são elementos, sem dúvida, decisivos nas  
histórias de letramentos de estudantes em formação universitária e, em especial, em formação  
para a docência. Não é possível, portanto, negar a indispensabilidade de estudos e debates menos  
velados sobre o ensino-aprendizagem do texto como responsabilidade e compromisso da  
comunidade acadêmica e, nela, de professoras e professores universitários, os quais precisam  
ganhar espaço em sua formação e em seu trabalho para o trato com os gêneros discursivos  
acadêmicos. Afinal não há prática acadêmica sem produção textual, sem leitura, sem escrita.  
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