ZACARIAS
O LIVRO PELA PESQUISA
Fabio Py Murta de Almeida
RESUMO Com este artigo se pretende passar pelas leituras feitas sobre o texto do profeta Zacarias. Não há a intenção de se fazer uma abordagem exegética, mas antes, apenas um histórico da pesquisa do profeta - tão pouco lido no Brasil e na América Latina. Sua relevância conduz ao conhecimento das posições e propostas mais clássicas e as mais inovadoras da interpretação deste texto profético. Como também reconhecendo as últimas dificuldades encontradas na sua interpretação. |
ABSTRACT This text intends to pass for the readings made on the text of Zechariah prophet. There is no intention to make an exegetical boarding, but before, only a description of the research of the prophet, so little read in Brazil and Latin America. Its relevance leads to the knowledge of the positions and most innovative the more classic proposals and of the interpretation of this predictive text. |
A pretensão na construção do texto é fazer uma introdução ao livro de Zacarias pelas leituras que viciaram sua profecia. Com ela, buscamos apresentar os autores e suas linhas hermenêuticas compreendidas diante do fenômeno textual.
No caso a finalidade dessa introdução, é, portanto demonstrativa. Digo isso, por que buscamos reconhecer os autores que se puseram a ler o texto zacariano informando ao público uma descrição das escolas aderidas por seus pesquisadores desde o início da crítica humanista até hoje. Com isso, o desejo é que este esforço não se torne apenas um conglomerado de palavras, mas antes, sirva de referencial para a pesquisa profética do filho de Ildo, Zacarias. Então, passamos abaixo ao reconhecimento dos interpretes, das interpretações e seus movimentos interpretativos. Para, por fim apontar as questões da atual pesquisa sobre tal profecia.
Até hoje, Zacarias é admitido como um texto controvertido. Para aferir esta opinião utilizamos descrições de três autores distintos sobre o texto, coletando as percepções de autores que pouco das pesquisas têm em comum, a não ser o fato de que, todos trabalham no livro de Zacarias. Então, em relação á obra, esses autores apresentaram posições semelhantes, embora entre eles existe um lapso temporal grande.
O primeiro escolhido é São Jerônimo. Ele em seu projeto oficial de tradução dos escritos não da Septuaginta (LXX), mas do texto em hebraico, denota que o texto de Zacarias apresenta difícil interpretação. Chega a dizer que tal literatura é obscura. Acompanhando São Jerônimo, Robert Lowth, importante estudioso da poesia hebraica, responsável pelo paralelismo poético, faz coro afirmando que a literatura de Zacarias era problemática, chegando a declarar: "who of all is perharps the most obscure".[1]
As indicações de São Jerônimo e de Robert Lowth permaneceram até início do século passado. Quando o exegeta da Universidade de Compenhagen, Aage Bentzen[2], comentou que a literatura de Zacarias seria dependente de outros materiais do Antigo Testamento como o caso de Is 10,5-12,6. Aage Bentzen acrescenta elementos aos ditos de Jerônimo e Robert Lowth, dizendo que além do texto ter um vocabulário ruim, seria dependente de outros escritos vetero-testamentários.
Traçando as três posições coletadas acima, de acordo com esses autores, indicamos que a leitura de Zacarias fomenta um histórico de dependência, principalmente com as vozes proféticas de Oséias[3], Ezequiel[4] e de Jeremias[5]. Zacarias ao longo dos tempos, fora caracterizado como ora um dos discípulos de Oséias, ora de Ezequiel, chegando a ser para alguns pesquisadores o caráter de extra-escrito feito pela figura do profeta Jeremias. Fator justificável seja pela dificuldade de leitura, ou até mesmo, pela relação terminológica com outros livros.
Junto aos estudiosos Aage Bentzen e Werner Schmidt comprendemos que por muito tempo predominou a idéia de que tal escrito fosse apenas uma voz dependente, e não autônoma, em relação à literatura profética pré-exílica.
Creio que, com essas duas características de possíveis dependências de Zacarias em relação às outras figuras proféticas, e pela própria dificuldade de abordagem do texto, abre-se precedentes para que tal literatura não fosse aspirada pelos especialistas.
Tal problema ganhara tamanhos contornos, que a dificuldade estendeu-se até figura do profeta. A ela percebeu-se que mesmo com as indicações de outros textos bíblicos, pouco se acrescentava sobre a sua pessoa.[6] Assim, tanto na questão da autoria, quanto nas palavras tidas no livro a tradição de textos relacionados a Zacarias se tornaram uma incógnita que tanto impregnam os especialistas. Tentativas se sucedem buscando uma sistematização dos textos, mas, mesmo com as tentativas, sempre sobram questionamentos.
Tratando mais concretamente como foi entendido o texto até hoje, e, sendo mais fieis aos períodos históricos, passaremos por algumas leituras mais esclarecedoras da problemática zacariana. Mesmo com as dificuldades já indicadas acima, este é o momento de pontuar os lugares, os autores, os destinatários, e os porquês de ocorrerem às transformações no modo de ler esse profeta da Judéia.
Este momento se faz valioso ao meio científico, pois a partir dele poderemos entender as leituras e proposições admitidas das palavras do profeta. Buscamos com ele, uma espécie de censo comum entre os especialistas, para assim, nesta parte se delimitará os limites dos trabalhos posteriores de Zacarias coletados do ramo bíblico-exegético.
Passamos à discussão do modo e do desenvolvimento histórico dos blocos de Zacarias, assim, como se disse anteriormente, o ponto que parece sustentável às vistas dos autores é que a literatura se cerca de incertezas. Mesmo assim, autores[7] não têm dificuldades em considerar o bloco de Zacarias 1-8, como autógrafo da figura de Zacarias, do tempo da reconstrução do Templo de Jerusalém – como um contemporâneo de Ageu.
Desta forma, primeiro se descreverá aquilo que a pesquisa ratificou sobre o bloco de Zacarias 9-14, para depois tratar da sua história de composição nas partes de Zacarias 9-11 e de Zacarias 12-14. Para ai sim, venhamos a perceber se hoje em dia, pesquisadores entendem Zacarias 1-8 como um profeta originário dos primeiros tempos do domínio persa na Judéia. Faremos um exercício ao inverso, que começa no fim para terminar no começo nos primeiros capítulos deste livro.
Ao fim de todo o processo queremos perceber como os autores e suas linhas teóricas seguem compreendendo a memória profética em relação ao corpus profético[8]. Contudo, metodologicamente compreendemos que as hipóteses, para que sejam relevantes, devem ligar Zacarias ao livro dos Doze Profetas, postulando traços entre o livro de Zacarias e o livro dos Doze Profetas.
Passamos, agora, às primeiras correntes de interpretação.
As afirmações de Jerônimo sobre Zacarias ressoaram nos tempos. Isso ocorre de tal modo que até o século XVII d.C. muito pouco havia lido e compartilhado sobre o livro. Assim, as primeiras propostas feitas, ocorreram mediante a chamada "Escola de Cambridge". Um grupo ligado aos ideais liberais da Inglaterra e que iniciara seu ônus hermenêutico junto à figura de Josef de Mede.
Justamente, a hermenêutica do livro começa a ser modificada quando o estudioso inglês dono da cátedra de Cambridge, Josef de Mede (em 1653), começa a estudar o livro. Ele logo percebeu um paralelo da profecia zacariana de Zacarias 11 com um texto de Mateus (Mateus 27,2; 9,10), do Novo Testamento[9]. Foi quando passou a ligar o bloco de Zacarias 9-11 a autoria de Jeremias - tempo do pré-exílio judaíta.
Aí, formara a escola iniciada por Josef de Mede, que nos anos seguintes teve procedimento com Richard Kidder. Kidder que salientou que Zacarias 12-14 também fosse do profeta Jeremias[10]. Agora, o detalhe histórico da proposta de Josef de Mede, é que ele acreditava que desde o capítulo 9 até o 11, compreendiam o exato período da destruição de Jerusalém por Nabucodonozor. Seus textos então estão na iminência da deportação babilônica, logo relacionados ao pré-exilico. Agora, voltamos a destacar, que a Escola de Cambrigde, foi a primeira tentativa mais expressiva de buscar uma proposta de leitura frente ao texto zacariano. Mesmo não podendo dizer que Josef de Mede foi a pessoa que fundou defendendo a homogeneidade do bloco de Zacarias 9-14, ele dera um passo para a concepção.
Sim, por que, em 1700, seu discípulo de Cambridge, Richard Kidder, conhecido por Bispo Kidder, proclamou tal unidade, indicando por ela o autografo do profeta Jeremias. No caso, na leitura desse especialista é o momento em que surge do termo Dêutero-Zacarias, que era compreendido como o bloco de Zacarias 9-14. 7
Outro momento fundamental para a história da interpretação de Zacarias, ainda nos ídolos do ano 1785, fora á contribuição de outro professor de Cambridge, chamado de Willian Whiston. Ele concluiu que o até então o Dêutero-Zacarias, quer dizer, o bloco de Zacarias 9-14, não seria um bloco, mas formado de dois pedaços.
Willian Whiston foi a pessoa que apontou pela primeira vez que o bloco de Zacarias 9-14, seria o resultado de dois momentos distintos: primeiro; á parte de Zacarias 9-11, originária da Samaria, fruto do tempo de Oséias, e uma outra parte, isto é, de Zacarias 12-14 se formara a partir do reinado de Josías e da destruição de Jerusalém - como Edward Young descreve na sua Introdução ao Antigo Testamento[11].
Agora, de certa forma, o que se percebe até aqui, é que os estudiosos consideravam o texto de Zacarias apresentava, sobretudo redação final no pós-exílio, no período do rei Dario. O texto seria iniciado com o bloco de Zacarias 1-8, no tempo persa, e a parte mais antiga do livro, Zacarias 9-14, formada por textos pré-exílicos.[12]
Quase um século depois, em 1824, na quarta edição de sua introdução ao Antigo Testamento, o teólogo protestante Eichhorn[13] afirma que á parte de Zacarias 9,1-10,12 seria um texto que relatava a invasão de Alexandre, o Grande, na Judéia. Outro detalhe aferido por Eichhorn foi que o texto de Zacarias 13,7-14,21, era para ele, um preâmbulo histórico das intrigas sacerdotais da época de Judas Macabeu, no ano de 161a.C.
Daí surge á preocupação de separar o bloco tido entre os capítulos 9 a 14, admitindo agora o formato de Zacarias 9-11, como um Deutero-Zacarias e de Zacarias 12-14 como um Trito-Zacarias. De fato, passa-se a dividir o que antes era o todo de Zacarias 9-14. Assim, a corrente literária de Eichhorn caíra no gosto dos estudiosos sendo assimilada por importantes estudiosos como: De Wette, Otto Eissfeld e outros.
Um desenvolvimento da linha de pesquisa de Eichhorn hoje seria o grupo de pesquisa que considera a parte final de Zacarias (principalmente o Trito-Zacarias) como um apocalipse. Pensamento que é levado á frente por estudiosos como Davies Baron[14] e Robert H. Pfeiffer[15] eles influenciados, sobretudo pela antropologia inglesa.
Agora, didaticamente, no tópico abaixo, buscaremos sistematizar as correntes expressas acima.
Com alguma facilidade podemos dizer que desde que lê o texto de Zacarias se percebe nele conotações apocalípticas, como Talbot Chambers introduz no seu texto de 1874. É que inicialmente, este imaginário recaía principalmente sobre o bloco de Zacarias 1-8 – um conjunto de textos que apresenta um todo de oito (ou sete) visões.[16] Contudo, a partir da pesquisa de Eichhorn, o dado apocalíptico de Zacarias ganhara indexações históricas, principalmente por que, para ele parte do texto pode ter sido construído no tempo helênico marcado pelas guerras na palestina.
Agora, depois de noticiar as certas nuanças da leitura de Zacarias até o século XIX, assumimos que desde estes tempos aventura-se a questionar propondo diferenças temporais nas palavras do profeta. Assim, segue abaixo, o que acreditamos ser a forma como o livro de Zacarias foi lido pelos interpretes até então.
1ª Hipótese: A mais antiga leitura do texto fora proposta inicialmente por Josef de Mede. Ele indicou a autoria do capítulo 9-14 como um autor de pré-exilico; provavelmente Jeremias. O caminho escriturístico que coloca a última parte do texto a ser composto seria o bloco de Zacarias 1-8, no tempo persa. Dizendo então a parte mais recente seria Zacarias 1-8, e a parte mais antiga, seria o bloco de Zacarias 9-14.
CONFECÇÃO: (tempo) |
Zacarias 9-14 -> (pré-exílico) |
Zacarias 1-8. (persa) |
2ª Hipótese: Esta hipótese é fruto de um trabalho mais recente. Levantada por aqueles que aderem à proposta de Willian Whiston, em 1785, que em suma, compreendem o texto não tem duas partes, mas sim, três. Zacarias 1-8 seria a primeira parte, típica do tempo persa. A segunda parte pertenceria, ao pré-exílio, digamos, Zacarias 9-11. A sua última parte, isto é, Zacarias 12-14, seria fruto do tempo posterior ao cativeiro babilônico. A impressão que dá é que mesmo com a formulação diferenciada da primeira hipótese, a segunda teoria destaca ainda um esquema próximo da confecção de Zacarias. Que vai do pré-exílio com Zacarias 12-14, passando com Zacarias 9-11 no pós-exílio, e, por fim, a primeira parte, no tempo do rei persa Dário, Zacarias 1-8.
CONFECÇÃO: (tempo) |
Zacarias 12-14 -> (pré-exílio) |
Zacarias 9-11 -> (pós-exílio) |
Zacarias 1-8. (persa) |
3ª Hipótese: Agora, a última hipótese. Aquela que aparenta ser a mais tradicional sobre a confecção do texto Zacarias, tendo mais adesões na academia, seu investidor é Eichhorn. Por tudo, se as hipóteses anteriores dão certeza de que o texto teria tido o último autógrafo no período de Dário, para estes pesquisadores esta idéia começa a ruir. Sugerem que o bloco do Dêutero-Zacarias (Zacarias 9-11) seria do tempo inicial grego, época de Alexandre. Já o Trito-Zacarias (Zacarias 12-14) seria do tempo da Revolta dos Macabeus. Então, desde 1824, o fim do texto de Zacarias não pertenceria ao tempo persa, mas sim, do tempo violento grego sobre a Judéia, próximo ao fechamento do cânon dos doze profetas. Uma mudança epistemológica, onde em termos de confecção do texto, a questão se inverte, como segue escrito abaixo:
CONFECÇÃO: (tempo) |
Zacarias 1-8 -> (persa) |
Zacarias 9-11 -> (grego) |
Zacarias 12-14. (grego posterior) |
Vide o gráfico abaixo que demonstra o que foi antes dito sobre as três hipóteses:
Quadro
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Agora gostaríamos de pensar tais hipóteses em conjunto, digamos comparando-as. Pensando possível relação entre elas podemos dizer que existem diferenciações persistentes, quanto à ideologia da primeira para a segunda hipótese. A segunda hipótese exigiu uma maior fragmentação do texto, sobretudo por conta de uma maior preocupação com o Antigo Testamento. Já na primeira hipótese, havia maiores preocupações com o enredo do Novo Testamento.[17]
Na relação entre as duas hipóteses se compreende que seus defensores buscaram relacionar certos temas gerais (ou "credos") entre os testamentos cristãos. Ao que parece, com isso, desejava-se certo dogmatismo inter-testamentário, fator que é desprezado por alguns setores da exegese da América Latina.[18]
Enfim, na terceira hipótese articula-se um outro tipo de paradigma. Se as duas hipóteses anteriores pensam o produto final do texto no tempo persa, a terceira rompe com a literalidade do texto. O início da confecção do texto bíblico passa a ser o tempo persa, concluindo com a parte final do texto (isto é, Zacarias 11-14) na guerra do Segundo Templo – nos tempos macabaicos. No caso, percebemos que esta hipótese seja a mais atenta aos elementos críticos, sobretudo ao desenvolvimento dos métodos histórico-críticos no século XIX, bem como também, ela inicia (ajuda) o diálogo da leitura sociológica bíblica envolvida que alicerça principalmente a exegese da Americana-Latina.
De certa forma, com estas três hipóteses se tem o grosso de como fora interpretado o texto de Zacarias até hoje. Claro, que existam outras propostas, mas elas se deram sempre se relacionando com estas primeiras. Um exemplo disso seria a linha assumida pelos especialistas Peter Lamarche[19] e Edward Hastings[20], que caracterizam Zacarias como tendo duas divisões; a primeira do pré-exílio (Zacarias 9-14) e a outra mais recente, na era de Dario - Zacarias 1-8.
Estes pesquisadores que podemos dizer se aproximam da antiga hipótese De Mede, indicando que o texto teria sido fechado no tempo dos persas na Judéia. Hipótese, que pensamos tenha espaço, mas que, destoa do fechamento do cânon dos doze profetas, no século II a.C.
Agora, à segunda hipótese na qual Willian Whiston fora seu articulador, pouco se encontra na literatura especializada do Antigo Testamento, mas, assim, aquele que mais se aproxima do seu paradigma é W. H. Lowe[21]. Interessante que Lowe pondera a divisão do livro em três partes, mas articula-o no exílio e pouco depois do pós-exílio. Muito embora, se mostre uma possível divisão do texto em três partes, sua pesquisa não relaciona o texto de Zacarias com o fechamento do cânon dos profetas no período dos Macabeus – parecendo nesse ponto com a pesquisa de Lamarche e Hastings.[22]
A última hipótese é a que passa pelo consentimento de grande parte dos biblistas. Prontamente pensam[23] num vínculo do livro dos Doze Profetas com o fim da pregação do profeta Zacarias, isto é, colocam o Trito-Zacarias como sendo construído em decorrência do período dos Macabeus. Ora, de fato, esta última hipótese, aparenta articular de forma mais homogenia o texto de Zacarias junto ao livro dos Doze Profetas, no século II a.C. Une historicamente Zacarias a passagem do gênero profético para o gênero apocalíptico, como especifica Hermut Gese[24].
Um dos fatores que mais impressiona na órbita das leituras sobre Zacarias é a assimilação da hipótese de Eichhorn pela crítica do Antigo Testamento, parece fazer jus ao ímpeto dos pesquisadores se voltaram quase que exclusivamente a primeira parte do livro. Assim, em relação aos primeiros oito capítulos, certas contendas são desafios na atualidade, principalmente, aquela que busca reconhecer o grupo profético-apocalítico destes capítulos.
A fim de resolver a questão, duas saídas vem merecendo uma análise cuidadosa frente a cada perícope de Zacarias. Cuidado esse, que passa por: temas, conteúdos e pela literalidade; tudo para pensar no grupo profético-apocalíptico estruturador deste.
A primeira linha é baseada quase estritamente aos temas e conteúdos do texto. Opção tida na exegese de América Latina, como fora feita por Gilberto Gorgulho, em um comentário[25]. Gorgulho que reconhece Zacarias como membro do povo de terra judaico, grupo com tendências deuteronomistas[26]. Para ele seriam os mesmos que desde a invasão babilônica teriam reescrito as histórias passadas em Israel e em Judá. Então, em seus trabalhos historiográficos carregavam emblemas como a defesa da terra, a defesa da Lei,e eram influenciados permanentemente pelas tendências messiânicas.
Já a segunda linha, que aparece praticamente em 1967, num trabalho de um teólogo escandinavo, chamado de W. A. M. Beuken[27]. Ele que pensa as partes do Proto-Zacarias teriam passado pelo crivo da historiografia cronista – mão posterior do tempo grego, ligada ao Segundo Templo. Assim, para Beuken, os grupos de tendências sacerdotais acrescentaram discursos à pessoa de Zacarias.
Agora, partindo da sua pesquisa pondera-se que o texto do Proto-Zacarias poderia ter sido acrescentado até o tempo dos conflitos dos Macabeus. Uma época que antes não poderia se imaginar como período de confecção do texto, pois colocava em cheque a pessoa de Zacarias tida nos tempos de Dario. Mas que por tudo, pode ser uma proposta relevante já que este livro profético entre os do Antigo Testamento recebera tantos incrementos do pensamento apocalíptico.
Desde quando se iniciou a escrita do presente trabalho o mérito ao se fazer ele permanece junto ao fato de apresentar ao público da América Latina algo sobre Zacarias. Sim, por que, quase nada se têm escrito acerca dele.
No caso, podemos dizer, que pelo assentamento da pesquisa de Eichhorn o texto de Zacarias fora formado, sobretudo pelas partes: Proto-Zacarias (Zacarias 1-8), Dêutero-Zacarias (Zacarias 9-11) e Trito-Zacarias (Zacarias 12-14). Partes que originalmente foram articuladas em momentos distintos, mas que, pela redação se uniram sobre foco da apocalíptica.[28]
Agora, uma questão que fica registrada sobre os trabalhos futuros, recai exatamente sobre a tradição do Proto-Zacarias. Sobre elas mencionamos as seguintes perguntas: quem teria assegurado á tradição dos primeiro capítulos do livro? Seria um grupo de judaitas formados por historiadores do exílio e do pós-exílio, alarmados pela catástrofe da destruição babilônica? Ou, um grupo, de historiadores do período grego, ligados ao Templo preocupados com a conversão do povo de Javé? Indagações que realçam exatamente a que época se escreveu as visões, se elas pertenceriam á historiografia deuteronomista ou a cronista.
A vontade nessa apresentação do livro é que fossemos apresentados ao impasse em que se encontra na atualidade sobre sua literatura. Assim, como o fim da reflexão se gostaria de incentivar a interpretação do livro, ao mesmo tempo em que, acreditamos ter respondido algumas questões que se encontravam obscuras aos leitores do livro. Enfim, cabe o incentivo para que cada pesquisador ou leitor busque a seu próprio modo, o acesso do livro de Zacarias, reconhecendo agora, quais são as possibilidades de leitura deste último texto do livro dos Doze Profetas. E, assim, possa apresentar interpretações de acordo (ou não) com as linhas teóricas aqui mencionadas.
Fabio Py Murta de Almeida
Mestrando em Ciências da Religião na Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), associado á Bibliografia Bíblica Latino Americana (BBLA) e membro da Associação Brasileira de Pesquisa Bíblica – ABIB.
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Notas
[1] Cf. o destaque dado por CHAMBERS, Talbot W, Book of Zechariah. in: SCHAFF, Philip (org.). Minor Prophets: exegetically, theologically, and homiletically expounded. New York: Scribner, Armstrong e Co, 1874, p.7.
[2] Cf. BENTZEN, Aage. Introdução ao Antigo Testamento: volume 2. São Paulo: ASTE, 1968. E, ainda vide professor da Universidade Bonn, Werner H. Schmidt comenta que o material teria sido acrescido tardiamente, cf. Introdução Testamento. São Leopoldo: Sinodal, 1994, p. 264.
[3] Cf. SCHULTZ, H. Alttestamentiche Theologie. Gotiggan, 1889, p. 64ss.
[4] Cf. SICRE DIAZ, José Luis. Os Profetas e a Justiça Social. São Paulo: Paulinas, 1985, p.580.
[5] HARRISON, Ronald Kenneth. Introduction to the Old Testament: with a comprehensive of Old Testament studies and a special supplement on the Apocrypha. Michigan: Willian B. Eerdmans, 1969, p.951.
[6] Num texto antigo de 1874 (CHAMBERS, Talbot W, Book of Zechariah. New York: Scribner, Armstrong, & Co, 1874, p. 5-6) já indicou o problema da pessoa do profeta. Outro texto antigo (de 1882!) o mesmo problema é citado, tendo com base os diferentes textos que citam uma pessoa Zacarias cf. LOWE, W. H. The Hebrew Students Commentary on Zachariah: Hebrew and LXX. London : Macmillian and Co, 1882, p. v-vi.
[7] Os seguintes autores colocam o bloco de Zacarias 1-8 no período persa: GORGULHO, Gilberto da Silva. Zacarias: a vinda do messias pobre, 198 6, P.12-32 e SCHWANTES, Milton. Ageu. Petrópolis: Vozes, 1986, p.17-34.
[8]Cf. CROATTO, Jose Severino. A estrutura dos Livros Proféticos: as releituras dentro do corpus profético. Revista de Interpretação Bíblica Latino Americana, nº 35/3, Petrópolis: Vozes, 2001, p. 14-21, agora para a relação entre o livro do Doze Profetas e o bloco do Proto-Zacarias (e Zacarias), vide: BOUZON, Emanuel. O livro do dodecaprofeton, 1999 (texto datilografado), 8p.
[9] YOUNG, Edward. J. An Introduction to the Old Testament. London: The Tydale Press, 1959, p.295.
[10] LOWE, W. H. The Hebrew Students Commentary on Zachariah: Hebrew and LXX. London: Macmillian and Co, 1882, p.ix-xx, HARRISON, Ronald Kenneth. Introduction to the Old Testament, 1969, p.950-2, e YOUNG, Edward. J. An Introduction to the Old Testament. London: The Tydale Press, 1959, p.294-5.
[11] YOUNG, An Introduction to the Old Testament , p.295.
[12] LOWE, The Hebrew Students, p.ix-xx, HARRISON, Introduction to the Old Testament , p.950-2, e YOUNG, An Introduction , p.294-5.
[13] HARRISON, Introduction to the Old Testament , p.952.
[14] Cf. BARON, Davies. Visions and Prophecies of Zechariah , London, 1918.
[15] Cf. PFEIFFER, Robert. H. Introduction to the Old Testament. New York: Harper e Brothers Publisher, 1948, p.234-239.
[16] Cf. ZENGER, Erich (org.), Introdução ao Antigo Testamento. São Paulo: Edições Loyola, 2003, p.245-257.
[17] Mesmo o teólogo do Novo Testamento, do início do século passado, Werner Georg Kümmel, percebe que muito da leitura construída sobre um versículo de Mateus até determinada época ocorreu pela influência do texto Zacarias frente à leitura mateana, cf. Introdução ao Novo Testamento. São Paulo: Paulinas, 1982, p. 134.
[18] Sobre isso vide todo primeiro número da chamada Revista de Interpretação Latino-Americana (RIBLA). Ela que trata das opções aderidas pela parte dos estudiosos bíblicos nos países do Cone Sul, América Central e Caribe.
[19] LAMARCHE, Pierre. Zacharie IX-XIV. Structure littéraire et messianisme . Coleção Études Bibliques. Paris: Gabalda, 1961, p.338.
[20] HASTINGS, Edward (ed.). The Speaker's Bíble. The Minor Profhets. Michigan: Baker Book House, 1962, p. 178-205.
[21] LOWE, The Hebrew Students, p.ix-xx.
[22] O fechamento do livro dos Profetas no século II a.C é afirmada pelos estudiosos mais ligados ao estudo dos textos hebraicos, cf. para isso, Trebolle Barreira, Julio. A Bíblia Hebraica e a Bíblia Cristã. Petrópolis: Vozes, 1999.
[23] STEINMUELLER, John E. Introducción Especial al Antiguo Testamento, Buenos Aires: Desclée de Brouwer, p. 278-9; PFEIFFER, Introduction to the Old Testament, 1948 , p.604-12.
[24]GESE, Hermut. "Início e o Fim do Apocalipsismo, à Base do livro de Zacarias", in: Apocalipse. São Leopoldo: Sinodal, 1983, p. 190-218.
[25] GORGULHO, Zacarias, p.12-25.
[26] Vide a defesa que Milton Sshwantes faz no texto de Ageu sobre o vínculo de profetismo de Ageu e Zacarias com a mão histórica deuteronomista, SCHWANTES, Ageu, p.11-25.
[27] Cf. BEUKEN, W. A. M. Haggai-Sacharja 1-8. Studien zur Uberlieferungschite der fruhnachexilischen Prophetie . Assen, 1967. Ele que coloca parte do texto de Zacarias sobre a mão cronista por volta dos séculos IV e III a.C. Um detalhe interessante é que Milton Schwantes em seu trabalho de doutoramento analisa o texto de Zacarias 7 sobe o prisma de Beuken como poderá ser visto por volta do no de 2008, quando a tradução de sua tese será publicada um português, mas antes, cf. SCHWANTES, Milton. Das Recht der Armen , Beiträge zur biblischen Exegese und Theologie, Frankfurt, Varlag Peter Lang, 1977, p.11-79.
[28] GESE, "Início e o Fim do Apocalipsismo", p. 190-218.