Educando a criança anormal

O tratamento da idiotia segundo Fernandes Figueira e Bourneville. Um estudo sobre o intercâmbio franco-brasileiro

Autores

DOI:

https://doi.org/10.23925/2176-2767.2022v75p120-147

Palavras-chave:

Fernandes Figueira, Désiré-Magloire Bourneville, Idiotia, Pavilhão Bourneville, tratamento médico-pedagógico

Resumo

O presente artigo discorre sobre o intercâmbio franco-brasileira acerca da educação da criança idiota e foca em duas figuras chaves desta rede: Désiré-Magloire Bourneville, chefe da seção infantil do hospital francês de Bicêtre, e o Antônio Fernandes Figueira, diretor da primeira ala dedicada ao tratamento psiquiátrico infantil no Brasil, o Pavilhão Bourneville. O artigo busca entender a mudança na interpretação da idiotia encabeçada por psiquiatras franceses, que passaram a compreender a doença como recuperável através da educação. Em seguida, analisamos a apropriação desta tese no Brasil a partir das convergências e divergências entre Figueira e Bourneville quanto ao tratamento da idiotia. Por fim, almeja-se compreender a agência dos médicos brasileiros no reordenamento do conhecimento francês, demonstrando em que medida a resposta social à doença foi única no Brasil. Diferentemente do caso francês, no Brasil republicano o tratamento da idiotia se associou ao projeto de redenção nacional através do sanitarismo e higienismo.  

Referências

ARIÈS, P. História Social da criança e da família. Rio de Janeiro: Editora LTC, 2006. [2ª Ed.].

ANDERSON, B. Imperialismo e nacionalismo oficial. In: ANDERSON, B (Org.). Comunidades Imaginadas: Reflexões sobre a origem e a difusão do nacionalismo. Trad. Denise Bottman. São Paulo: Companhia das Letras, 2008, pp. 127-162

ANDERSON, N.; LANGA, A. The development of institutional care for 'idiots and imbeciles' in Scotland. History of Psychiatry, vol.8, nº 30, 1997. pp. 243-266.

BAUTHENEY, K. Transtornos de aprendizagem: quando “ir mal na escola” torna-se um problema médico e/ou psicológico. Doutorado, FEUSP, São Paulo, Brasil, 2011.

BENCHIMOL, J. L. Dos micróbios aos mosquitos: febre amarela e a revolução pasteuriana no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 1999.

BILAC, O. No Hospício Nacional. Kosmos: Revista Artística, Scientifica e Litteraria. Rio de Janeiro, ano 2, n. 2, 1905.[s/p].

BOURNEVILLE, D. M. De l'assistance des Enfants Dits Incurables. Paris: Progrès médical, 1889 [1ªEd.].

BOURNEVILLE, D. M. Histoire de la section des enfants de Bicêtre. Paris: Progrès médical, 1892 [1ªEd.].

BOURNEVILLE, D. M. Hospice de Bicêtre: histoire, organisation, budget, statistique etc. Paris: Progrès médical, 1893 [1ªEd.].

BOURNEVILLE, D. M. Assistance, traitement et éducation des enfants idiots et dégénérés: rapport fait au Congrès national d'assistance publique (session de Lyon, juin 1894). Paris: Progrès médical, 1895 [1ªEd.].

BRASIL. Ministério da Justiça e Negócios Interiores: Relatório Apresentado ao Presidente da República dos Estados Unidos do Brazil pelo Dr. J.J Seabra Ministro da Justiça e Negócios Interiores em Março de 1903. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1903. [1ªEd.].

CLAPER, J. R. Colônia Agrícola para Alienados no Rio de Janeiro (1890-1924): Discursos, projetos e práticas na Assistência ao Alienado. Doutorado, COC/Fiocruz, Rio de Janeiro, Brasil, 2020.

DIAS, A. Entre el pabellón y el hospicio: problemas y conflictos en la asistencia psiquiátrica en Rio de Janeiro de principios del siglo XX. Revista Frenia, v. 11, n. 1, 2011, p. 109-127.

DORON, C. O. Félix Voisin and the genesis of abnormals. History of Psychiatry, v. 26, nº 4, 2015, pp. 387-403.

EDLER, F. Esquadrinhando o Hospício de Pedro II: Danação da Norma e a virada historiográfica (pré-print). In VENÂNCIO, A. T; DIAS, A. (Org.). O Hospício da Praia Vermelha: do Império à República (Rio de Janeiro, 1852-1944). São Paulo: Editora Unifesp, 2022 (no prelo).

ENGEL, M. G. Os delírios da razão: médicos, loucos e hospícios (Rio de Janeiro 1830-1930). Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2001.[1ª ed].

FAURE, O. Olhar dos médicos. In: CORBAIN, A; COURTINE, J.J; VIGARELLO, G. História do Corpo. Da Revolução à Grande Guerra. Rio de Janeiro:Vozes, 2008, pp. 13-55.

FERREIRA, L. O.; SANGLARD, G. Médicos e filantropos: a institucionalização do ensino da pediatria e da assistência à infância no Rio de Janeiro da Primeira República. Varia Historia, v. 26, n. 44, 2010, pp. 437-459.

FIGUEIRA, A. F. Educação das Crianças Idiotas. Século XX: Revista de Letras, Artes e Ciências, ano 1, n. 1, out. 1905, pp.21-28.

FIGUEIRA, A. F. Educação médico-pedagógica dos atrazados. Archivos Brasileiros de Psiquiatria, neurologia e Medicina Legal, ano 6, n. 3-4, 1910, pp. 320-331.

FIGUEIRA, F. Desenvolvimento mental da primeira infância. O Brazil-Médico: Revista semanal de medicina e cirurgia, ano XXXII, nº 3, 1918, pp. 22-23.

FIGUEREDO, C. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. Lisboa: Livraria Clássica Editora, 1913. [2ª Ed.], p.2036.

FOUCAULT, M. Os anormais: curso no Collège de France (1974-1975). São Paulo: Martins Fontes, 2002. [1ª Ed.].

FOUCAULT, M. O Poder Psiquiátrico (1973-1974). São Paulo: Martins Fontes, 2006. [1ª Ed.].

FOUCAULT, M. Segurança, Território e População: curso no Collège de France (1977-1978). São Paulo: Martins Fontes, 2008a. [1ª Ed.].

FOUCAULT, M. Nascimento da Biopolítica: curso no Collège de France (1978-1979). São Paulo: Martins Fontes, 2008b. [1ª Ed.].

GAVROGLU, K. The STEP (Science and Technology in the European Periphery) Initiative: Attempting to Historicize the Notion of European Science. Centaurus, v. 54, nº 4, 2012, pp. 311–327.

GATEAUX-MENNECIER, J. L'oeuvre médico-sociale de Bourneville. Historie de Sciences Médicales, Tomo XXXVII, nº1, 2003, pp.13-30.

HICKISH et al. Translators’ Preface. In: PINEL, P. Medico-Philosophical Treatise on Mental Alienation. Trad: Gordon Hickish; David Healy; Louis C. Charland. Oxford: Wiley-Blackwell Publication, 2008, pp. xiii-xviii

IRIYE, A.; SAUNIER, P (Ed.). The palgrave dictionary of transnational history: from the mid-19th century to the present day. Londres: McMillan Publishers, 2009. [1ª Ed.] p.XX.

KOSELLECK, R. Futuro Passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Trad: Wilma Patrícia Maas; Carlos Almeida Pereira. Rio de Janeiro: Contraponto/Editora PUCRio, 2006.

LIMA, N.; HOCHMAN, G. Condenado pela raça, absolvido pela medicina: o Brasil descoberto pelo movimento sanitarista da Primeira República. In: MAIO, M.; SANTOS, R. (Org.). Raça, ciência e sociedade. Rio de Janeiro: Fiocruz/Centro Cultural Banco do Brasil, 1996, pp.23-40. [1ª Ed.]

LIMA, R. C. Psiquiatria infantil, medicalização e a Síndrome da Criança Normal. In: CRP05 (Org.); Conversações em Psicologia e Educação. Rio de Janeiro: Conselho Regional de Psicologia 5ª Região, 2016, pp.61-76

LOBO, L. F. O acontecimento Victor de Aveyron: esboço de uma genealogia da psiquiatrização da infância. Revista Educação Especial, [S. l.], v. 29, n. 56, 2016, pp. 537–550.

MAIA E. Relatório Apresentado ao Exmo. J.J Seabra, ministro da Justiça e Negócios Interiores pelo Dr. Afrânio Peixoto, diretor interno do Hospital Nacional de Alienados, 1904 - 1905. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1905. [1ªEd.].

MCDONAGH, P. Idiocy: A cultural history. Liverpool: Liverpool University Press, 2008. [1ª Ed.]. p.23.

MUÑOZ, P. F. Clínica, Laboratório e Eugenia: uma história transnacional das relações Brasil-Alemanha. Rio de Janeiro: Editora PUC-Rio/FIOCRUZ, 2018. [1ª Ed.].

MUÑOZ, P. F. Degeneração. In: DA SILVA, F.C.T.; MEDEIROS, S.; SCHURSTER, K.; VIANA, A. Dicionário de História das Direitas. Recife/Rio de Janeiro: EDUPE/Autografia. 2022. No prelo.

PETITJEAN, P. Dimension culturelle, influences idéologiques et images scientifiques dans l’histoire des relations scientifiques franco-brésiliennes, 1850-1940. In: Parvaux, S.; REVEL-MOUROZ, J.R. (Org). Images réciproques du Brésil et de la France, Paris : IHEAL, 1991. [s/p].

PELECIER. Y.; GUY, T. Pour une historie des enfants en France (1830-1914). Revue Historique, t. 261, Fasc 1, nº 529, 1979, pp.99-130.

PINEL, P. Medico-Philosophical Treatise on Mental Alienation. Trad: Gordon Hickish; David Healy; Louis Charland. Oxford: Wiley-Blackwell Publication, 2008. [1ª Ed.].

RAJ, K. Tradução por: Juliana Freire-ALÉM DO PÓS-COLONIALISMO... E PÓS-POSITIVISMO Circulação e a História Global da Ciência. Revista Maracanan, n. 13, 2015, pp. 164-175.

RAMOS, J. de S.; MAIO, M. C. Entre a riqueza natural, a pobreza humana e os imperativos da Civilização, inventa-se a investigação do povo brasileiro. In: MAIO, M. C.; SANTOS, R. V. (Org.). Raça como Questão: História, Ciência e Identidade no Brasil. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2010. [1ª Ed.]

ROSENBERG, C. Introduction: Framing disease: Illness, society and history. In: ROSENBERG, C; GOLDEN, J (Org). Framing Disease - Studies in Cultural History. New Brunswick : Rutgers University Press, 1992, pp. xiii-xxvi

RUCHAT, M. Signes et significations du «crétin» et de l’«idiot» dans la clinique médicopédagogique et psychopédagogique en Suisse. Alter, vol. 5, n° 2, 2011, pp. 59-68.

SANGLARD, G. A Primeira República e a constituição de uma rede hospitalar do Distrito Federal. In PORTO, A. et al (Org.). História da Saúde no Rio de Janeiro: instituições e patrimônio arquitetônico (1808-1958). Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2008, pp. 59-87.

SANGLARD, G. Fernandes Figueira: ciência e infância - Rio de Janeiro, 1900-1928. Intellèctus, v.13, nº2, 2014. pp, 79-102.

SANGLARD, G. Fernandes Figueira e a Política de Assistência à Infância: Estado, filantropia e aleitamento materno. In: SANGLARD, G. (Org). Amamentação e Políticas Para a Infância No Brasil: A Atuação de Fernandes Figueira, 1902-1928. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2016, pp. 57-82.

SANGLARD, G. A mortalidade infantil no Rio de Janeiro e o projeto de assistência à infância de Antônio Fernandes Figueira (1902-1928). In: FRANCO, Sebastião; NASCIMENTO, Dilene; SILVEIRA, Anny (Org.) Uma história Brasileira das Doenças v.9. Belo Horizonte: Fino Traço, 2019, pp. 107-135.

SCHNEIDER, W.H. From Puericulture to Eugenics. In: SCHNEIDER, W.H [Ed.]. Quality and Quantity: The quest for biological Regeneration in twentieth-century France. Cambridge: Cambrige University Press, 2002, pp. 55-83.

SÉGUIN. E. Idiocy: And Its Treatment by the Physiological Method. Nova Iorque: William Wood & Co, 1866. [1ª Ed.]

SKIDMORE, T. E. O ideal do branqueamento depois do racismo científico. In: Preto no Branco: raça e nacionalidade no pensamento brasileiro. São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 244-298. [1ª Ed.].

SILVA, A. F. C. A trajetória de Henrique da Rocha Lima e as relações Brasil - Alemanha (1901-1956). Doutorado, COC/Fiocruz, Rio de Janeiro, Brasil, 2011.

SIMPSON, M. The moral government of idiots: moral treatment in the work of Seguin. History of Psychiatry, v. 10, n. 38, 1999, p. 227-243.

STEPAN, N. “A hora da eugenia”: raça, gênero e nação na América Latina. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz. 2005 [1ª Ed.].

SUPPO, H. A política cultural da França no Brasil entre 1920 e 1940: o direito e o avesso das missões universitárias. Revista de História, [S. l.], n. 142-143, 2000, pp. 309-345.

VENANCIO, A. T. Da Colônia Agrícola ao Hospital Colônia: configurações para a assistência psiquiátrica no Brasil na primeira metade do século XX. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 18, supl. 1, 2011, p. 35 -52.

Downloads

Publicado

2022-12-15

Como Citar

Roma, G., Sanglard, G. P., & Muñoz, P. F. N. de. (2022). Educando a criança anormal: O tratamento da idiotia segundo Fernandes Figueira e Bourneville. Um estudo sobre o intercâmbio franco-brasileiro. Projeto História : Revista Do Programa De Estudos Pós-Graduados De História, 75, 120–147. https://doi.org/10.23925/2176-2767.2022v75p120-147

Edição

Seção

Artigos Dossiê