Anjos e demônios estão em guerra”: o fantástico e o religioso na literatura para jovens adultos.
“Angels and demons are at war”: the fantastic and the religious beliefs in the young adult literature

Juliana de Souza Topan*
*Doutoranda em Teoria Literária no IEL/ UNICAMP. Principais áreas de pesquisa: literatura e mitologias, literatura e religião, ensino de literatura, literatura infantil e juvenil, interfaces entre literatura e outras artes. Contato: juliana.topan@ifsp.edu.br
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Resumo
A produção de livros direcionada para jovens no mercado editorial brasileiro, atualmente, tem como um dos seus gêneros principais a chamada “literatura de fantasia”, que, de fato, identifica-se tanto com o gênero fantástico quanto com o maravilhoso, se considerarmos sua representação do mitológico e do sobrenatural (TODOROV, 2010). Tais produções e seus respectivos autores não apresentam, em sua maioria, um intuito religioso, no sentido de que seus livros teriam uma função de entretenimento, e não de catequese, conversão ou transcendência espiritual. Entretanto, esse artigo pretende, com a análise da obra O senhor da chuva, de André Vianco (2001), demonstrar que tal produção, apesar do contexto de leitura e produção teoricamente secularizados, apresenta um sistema de crenças e valores que podemos identificar como religioso, através de seus enredos e personagens. Conclui-se que tal sistema influencia no sucesso dessas obras, já que grande parte dos leitores brasileiros compartilham desses valores cristãos, ainda que não se autodeclarem religiosos.

Palavras chave:André Vianco; Gênero fantástico; Literatura e religião; Cristianismo e literatura; Sobrenatural e literatura. Mistagogia.

 

Abstract
Nowadays, book production for young adults in the Brazilian publishing market presents the “fantasy literature” as one of its main genres, which, indeed, is related both to the “fantastic genre” and “the marvelous genre” (TODOROV, 2010). Most of this kind of production and its authors do not have a religious goal; these books are entertainment and do not have a catechetical, spiritual conversion or trancendent purpose. However, analysing O senhor da chuva [The lord of the rain], by André Vianco (2001), this article seeks to highlight that this production, despite a secularized writing and reading context, presents a belief system and values which can be identified as religious, through its plot and characters. We concluded that this belief system influences the success of this novel, since most part of the Brazilian readers share Christian values, even if they do not declare themselves as being religious.

Keywords:André Vianco; Fantastic genre; Literature and religion; Christianity and literature; Supernatural and Literature.

Introdução

No final do século XX e início do século XXI, especialmente a partir da década de 1990, observou-se, em nível nacional e internacional, um crescimento expressivo do segmento editorial voltado para jovens leitores. Tal crescimento se evidenciou no sucesso global de sagas como Harry Potter, de J. K. Rowling (publicada em 7 volumes entre 1997 e 2007), considerada um divisor de águas no mercado editorial juvenil: a partir do “fenômeno Harry Potter”, grandes lançamentos de séries juvenis atraíram milhares de jovens a livrarias, que hoje destinam um lugar de destaque à seção de livros para adolescentes; e as famosas “listas de mais vendidos” ganharam uma subseção para a literatura juvenil. Especificamente, no mercado editorial brasileiro, o crescimento desse nicho nas últimas décadas, em comparação à estagnação de outros, também chama a atenção. Segundo dados da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil (AMORIM, 2009, apud LUFT, 2010) e da Associação Nacional de Livrarias, crianças e adolescentes constituíam, em 2007, 40% do total de leitores; em 2009, o segmento da literatura juvenil firmou-se como o mais relevante, economicamente, com um incremento de 41% em obras editadas e 13,39% de novos títulos lançados (em relação ao ano anterior), com um acréscimo de 9,26% nas tiragens de livros juvenis.

Um dado notável é que o boom da literatura para jovens adultos (young adult literature), identificado a partir do lançamento da série Harry Potter, deu-se com a publicação de livros que são geralmente classificados, pelas editoras brasileiras, como “literatura de fantasia”, a qual denomino, nesse artigo, de literatura de temática mitológica ou sobrenatural. Na pesquisa Retratos da Leitura no Brasil publicada em 2012, essa produção, representada pelas séries Harry Potter e Crepúsculo, de Stephenie Meyer (publicada em quatro volumes entre 2005 e 2008), apareceu entre os 10 títulos mais vendidos e lidos pelos brasileiros (SANT’ANNA, 2012, p. 4). Além da expressiva vendagem em nível internacional1 , tais obras motivaram a criação de outras narrativas que recontam mitos e contos maravilhosos (que influenciaram também a produção cinematográfica e televisiva, sobretudo nos Estados Unidos), bem como a republicação e difusão de narrativas anteriores, como as sagas O senhor dos anéis, de Tolkien (publicada em três volumes, inicialmente para o público geral, e não especificamente juvenil, entre 1954 e 1955) e As crônicas de Nárnia, de C. S. Lewis (publicada em 7 volumes, originalmente, entre 1950 e 1956).

Diante de tal sucesso das obras de temática mitológica ou sobrenatural na literatura para jovens, deparo-me com as seguintes questões: apesar de seu contexto laico de produção e fruição, essas obras veiculariam uma visão de mundo religiosa? Em caso afirmativo, isso influenciaria em sua recepção pelo público e seu sucesso comercial?

Religião para além das igrejas

Formular tais questões não deixa de ser incômodo em uma tradição acadêmica que não apenas se declara laica, mas costuma analisar a questão religiosa mormente pelo viés institucional no que ele tem de pior, isto é, o uso dos discursos e do lugar social da religião como forma de manipulação, coerção e controle. Entretanto, meu intuito, neste artigo, é analisar a presença de ideias provenientes de tradições e discursos religiosos em O senhor da chuva, de André Vianco, uma narrativa voltada para jovens adultos – presença esta não planejada por instituições religiosas, que além de não terem controle sobre a maioria dos filmes e livros voltados a adolescentes, possivelmente não fazem parte de um sistema de referências quando estes acessam tais obras. Em outras palavras, parte significativa dos leitores das sagas Harry Potter, Crepúsculo ou Os sete (na qual se integra O senhor da chuva) não vão associar seu enredo, seus personagens ou seus temas, diretamente, a uma instituição religiosa; nem isso se faz necessário à sua compreensão porque os sistemas de crenças neles presentes já se tornaram algo compartilhado amplamente na cultura, até mesmo por aqueles que não se declaram filiados a ou participantes de uma religião específica. Portanto, minha hipótese da veiculação de valores religiosos por estas obras considera a religião como

uma língua, ou seja, ao mesmo tempo enquanto um instrumento de comunicação e enquanto um instrumento de conhecimento, ou melhor, enquanto um veículo simbólico a um tempo estruturado (...) e estruturante, (...) enquanto condição de possibilidade desta forma primordial de consenso que constitui o acordo quanto ao sentido dos signos e quanto ao sentido do mundo que os primeiros permitem construir. (BOURDIEU, 2015, p. 28).

Em outras palavras, valores religiosos, assim como a linguagem, seriam fundantes e integrantes da cultura, constituindo-se em elementos estruturantes na medida em que possibilitam consensos que vão estruturar um conjunto de hábitos, narrativas e visões de mundo que embasa escolhas e ações, feitas mais por um senso comum de como elas devem ser feitas do que por suas finalidades ou objetivos racionais (CLARK, 2005, p. 10).

Na composição desse senso comum (no sentido do que é compartilhado pelos indivíduos de uma cultura) estão ideias e narrativas de origem religiosa, que desenvolvem um papel na construção das identidades coletivas e individuais, através de experiências que podem ou não ser institucionalizadas (em rituais e tradições). Isso significa que não há uma obrigatória relação entre identidade religiosa e filiação a uma religião institucional, especialmente na contemporaneidade, em que tal identidade se torna uma busca pessoal, uma escolha autônoma do que se vai acreditar e quais práticas se vai ou não adotar (diferentemente do que ocorria até meados do século XX, quando essa filiação era comumente “herdada” da família ou do grupo étnico-racial).

Portanto, a aparente incoerência entre o aumento de narrativas míticas e sobrenaturais em um contexto de “crescente processo de secularização ou de desencantamento do mundo” explica-se pela expansão de valores religiosos para além das esferas institucionais e das profissões de fé convencionais, na medida em que “nesse novo contexto, a intervenção do sagrado sobre a vida cotidiana vai se tornando algo muito mais subjetivado do que institucionalizado” (CAMPOS, 2008, p. 45).

Podemos considerar alguns dados da Pesquisa Datafolha 2007 (apud CAMPOS, 2008) sobre a distribuição das religiões no Brasil como um exemplo da mencionada expansão e manutenção de valores religiosos para além da religião institucional. Tal pesquisa apontou um declínio no número de católicos (64% dos entrevistados) em relação aos dados do IBGE em 2000 (73,9%), o que, “contudo, observam os jornalistas, não significa que haja um aumento no número de materialistas e ateus, pois, 97% declaram crer em Deus; 93% que Jesus morreu e ressuscitou e, 86% que Maria deu à luz Jesus enquanto virgem” (CAMPOS, 2008, p. 37-38). Ou seja, o declínio do número de católicos não significa, na primeira década do século XXI, um declínio equivalente na crença em seus principais dogmas, o que evidencia que eles excedem sua religião institucional de origem e se mantém em um sistema de crenças amplamente aceito na cultura brasileira.

Considerando a importância das narrativas na constituição da cultura e das identidades, inclusive religiosas, no sentido amplo dessa concepção acima esboçado, é possível supor que a narrativa de temática mitológica ou sobrenatural analisada neste artigo seja amplamente aceita pelos leitores por remeter a narrativas religiosas públicas, provenientes de religiões institucionais, porém representadas em uma produção cultural profana, como fatos ou personagens ficcionais – pertencentes à “literatura de fantasia”.

O senhor da chuva: entre o fantástico e o maravilhoso

No Brasil, grande parte desses livros, classificados pelo mercado editorial no gênero “fantasia”, são traduções de autores estrangeiros; por isso mesmo, a obra de André Vianco, autor paulista que iniciou sua carreira com narrativas sobre vampiros, chamou minha atenção. Além de se dedicar a um gênero pouco cultivado na literatura brasileira, esse autor conquistou expressivas vendagens (em 2011, estimadas em mais de 500 mil exemplares) desde a publicação de Os sete, seu romance de estreia, a princípio, em edição independente; depois pela editora Novo Século, passando por outras casas de renome como Rocco e Aleph. Entre 2001 e 2007, o autor publicou pela Novo Século os 6 romances que constituem a saga Os sete: além do romance homônimo, Sétimo, O senhor da chuva, O turno da noite I – Os filhos de Sétimo, O turno da noite II – Revelações e O turno da noite III – Os filhos de Jó.

Entre eles, O senhor da chuva me interessou particularmente por se diferenciar dos demais romances: não é propriamente uma narrativa vampiresca (embora haja nela um vampiro); é um romance que não apenas apresenta um mundo em que anjos e demônios se manifestam no plano terreno e interferem na vida humana, mas no qual humanos também interferem nos eventos protagonizados por estes seres sobrenaturais. Assim, Thal, um anjo-general muito reconhecido no plano divino, interfere na vida de Gregório, ao salvar a vida deste traficante quando ele é descoberto na tentativa de dar um golpe em um fornecedor de drogas. Mas Gregório também interfere no destino de Thal, pois este estava em desvantagem em uma luta com demônios, chefiados por Khel, um cão-demônio, seu maior inimigo; e, caso perdesse, seria transformado também em um demônio.

Ao invadir o corpo de Gregório, Thal (um ser incorpóreo, do plano divino) salva-lhe a vida, e, ao mesmo tempo, passa para o plano físico e não pode ser derrotado por Khel. Assim, o destino de Thal e de Gregório estão ligados; o anjo está aprisionado no corpo do humano, e este só sobrevive por incorporar o poder daquele. Mas Thal viola “a Lei”: na luta entre anjos e demônios, não era permitido que esses seres sobrenaturais fugissem para o plano físico (VIANCO, 2008, p.94). Essa transgressão daria aos demônios o direito à Batalha Negra, uma guerra entre anjos e demônios na qual os anjos derrotados seriam transformados em novos demônios. Embora não se explicite claramente no romance quem teria estabelecido “a Lei”, a visão cristã evangélica subjacente à narrativa sugere que se trata de uma lei divina (referente às lutas entre anjos e demônios, ao domínio da terra e dos homens). Isso se explicita na cena em que Thal encontra-se com Jesus:

Thal eriçou-se ao sentir a presença d’Ele. Era muita energia no mesmo ser ao mesmo tempo. Nunca estivera ali, nunca havia sentido aquilo, tampouco que os olhos iriam queimar e o peito, explodir. A sensação era indescritível. Quando Ele entrou, através da luz, as sensações se multiplicaram. Ele tinha o mesmo tamanho de Thal, mas no resto era diferente. Parecia um homem comum. Parecia. - Senhor... – balbuciou o anjo. – Preciso lhe falar. O Homem encarou-o com paz nos olhos, enviando amor para Thal, que quase queimava. A luz tomou conta da sala, e Thal pode ver o futuro. Percebeu que o medo e a aflição que o perturbavam era algo egoísta, que o futuro reservava a Batalha Negra e ele seria um dos generais. Sentiu o futuro, e seu coração foi lançado à boca de um demônio. Thal sentiu o horror de Antigas Profecias perfurando a face, sangrando os olhos. Ouviu um nome que fez explodir seus tímpanos. Viu quatro criaturas cobertas por olhos, por dentro e por fora, caladas; era o Terror. Um exército de demônios cobriu o céu, transformando o dia em noite e a noite, em Noite Eterna. Não era o fim dos dias, era algo mais sutil e suave, apenas um toque, uma guerra ligeira para lembrar aos anjos e aos demônios que eles eram inimigos. Para lembrar aos homens que eles eram carne. Para lembrar aos homens que eles eram fracos e precisavam retomar a fé com fervor. (...) O Homem tocou o anjo na testa, acalmando-o. (...) A voz ribombou na sala sem que Ele movesse o lábio (...): - Aquele filho lhe deu a vida de novo. Agora, a Lei permite uma chance aos exércitos de Satanás. O mais poderoso dos anjos das trevas enviará generais. (VIANCO, 2008, p. 96)

No trecho, a Batalha Negra se evidencia como algo inevitável, tanto no transe de Thal que o leva à visão do futuro, quanto na fala de Jesus, que coloca explicitamente a permissão aos exércitos demoníacos, que teriam “uma chance” de “interferir brutalmente no plano dos homens” e de aumentar o “exército satânico”, já que, durante esta Batalha, todos os anjos mortos se converteriam em “anjos negros”, ou seja, anjos a serviço de Satanás, e os humanos, em vampiros (VIANCO, 2008, p. 178-193).

Pela breve apresentação do mote principal do enredo, podemos perceber claramente porque a obra de Vianco é classificada no gênero “fantasia”: anjos, demônios e, principalmente, vampiros são consideradas criaturas que só existem na fantasia humana, em um plano ficcional. Porém, no conjunto de crenças de uma parcela expressiva da população brasileira, anjos e demônios são criaturas reais. Neste ponto, convém refletir que o rótulo “literatura de fantasia” é, muitas vezes, utilizado como termo equivalente à “literatura fantástica”. Entretanto, segundo Todorov (2017, p. 30), o gênero fantástico se caracteriza pela hesitação (por parte do narrador, personagens e narratário), diante de fatos que não podem ser explicados pelo “princípio de realidade”, pela dúvida se tais fatos ocorrem ou são fruto da imaginação ou ilusão dos sentidos. Ao se escolher uma resposta, entra-se “num gênero vizinho, o estranho ou o maravilhoso” (TODOROV, 2017, p. 31). Este se daria quando a dúvida se convertesse em uma aceitação do sobrenatural, quando os “elementos sobrenaturais não provocam qualquer reação particular nem nas personagens, nem no leitor implícito. Não é uma atitude para com os acontecimentos narrados que caracteriza o maravilhoso, mas a própria natureza desses acontecimentos” (TODOROV, 2017, p. 60).

Porém, em abordagem mais recente sobre o gênero fantástico e o gênero maravilhoso, David Roas (2014) faz algumas ressalvas às teorias de Todorov, especialmente ao caráter “evanescente” que, segundo este, caracteriza o fantástico, um gênero limite entre o “sobrenatural explicado (do ‘estranho’, poderíamos dizer) (...); e o do sobrenatural aceito (ou do ‘maravilhoso’)” (TODOROV, 2017, p. 48). Assim, por ter sua essência na hesitação entre a explicação racional e a aceitação do sobrenatural, o efeito do fantástico não seria evanescente apenas dentro de narrativas que superassem a hesitação por uma dessas possibilidades, mas seria também breve na história da literatura, tendo sua plena expressão entre os séculos XVIII e XIX. Segundo o autor, a dúvida, a hesitação diante do insólito/sobrenatural inexplicável só seria possível diante da crença em uma “realidade imutável, externa”, típica do “século XIX positivista” e impossível de ser sustentada a partir do século XX (TODOROV, 2017, p. 176-177).

Roas (2014, p. 41) considera tal definição do fantástico “vaga e restritiva”, considerando que, ao invés da hesitação diante do insólito, o que caracterizaria o fantástico seria a transgressão da realidade (a qual, ainda que não seja vista como imutável ou totalmente explicável logicamente, é constituída por aquilo que conhecemos como um mundo organizado por um conjunto de conceitos e regras). Assim, a essência do fantástico seria a “irrupção do sobrenatural no mundo real e, sobretudo, a impossibilidade de explicá-lo de forma razoável” (TODOROV, 2017, p. 43), isto é, a necessidade de que os eventos sobrenaturais narrados sejam ambientados em um espaço-tempo que identificamos com “o funcionamento físico do nosso mundo” (TODOROV, 2017, p. 44). Este seria o diferencial entre o gênero fantástico e o maravilhoso: neste, os eventos sobrenaturais se dariam em “um mundo autônomo, independente” da “nossa realidade”: “O leitor do romance de Tolkien se sabe diante de um mundo absolutamente irreal, onde tudo é admissível, e onde, portanto, não existe possibilidade de transgressão” (TODOROV, 2017, p. 45).

A partir dessas teorias, considero que O senhor da chuva oscila entre os gêneros fantástico e maravilhoso: os eventos sobrenaturais narrados irrompem em um mundo que narrador e narratário podem identificar como real – há, portanto, a ideia de transgressão do “funcionamento físico” do que identificamos como realidade. Porém, embora alguns personagens expressem dúvida ou hesitação diante dos eventos sobrenaturais ocorridos na pacata cidade de Belo Verde, tal hesitação não é colocada no nível da enunciação narrativa, que coloca tais eventos no mesmo plano da realidade; além disso, há a aceitação deles por parte dos personagens, o que se explica por seu sistema de crenças: são evangélicas ou satanistas; em ambos os casos, conhecem o “Velho Código” (um conjunto de profecias que menciona a Batalha Negra). Diante disso, minha hipótese é que não apenas as personagens estão inseridas nesse sistema de crenças, mas também o narratário, e que a boa recepção das obras de Vianco e seu sucesso de vendagem, no Brasil, relaciona-se à identificação dos leitores com esse sistema de crenças.

“Batalha Negra” e valores cristãos

A aceitação do sobrenatural, motivada por um sistema de crenças presente na narrativa, evidencia-se na própria linguagem utilizada pelo narrador na cena transcrita acima, linguagem essa que remete não apenas a uma experiência religiosa, mas a narrativas cristãs amplamente conhecidas no Brasil. O uso de “Ele” e “O Homem” (com iniciais maiúsculas) para se referir a Deus é bastante comum nas liturgias cristãs; sua representação humanizada, pacífica e “enviando amor” remete à figura de Jesus Cristo; e a reação de Thal, cujos “olhos iriam queimar e o peito, explodir”, sugerem uma menção à experiência de Pentecostes – mais de uma vez o verbo “queimar” é usado na descrição das reações do anjo, em uma possível alusão às línguas de fogo pelas quais se manifesta o Espírito Santo em sua primeira manifestação depois da ressurreição de Cristo (Atos dos Apóstolos 2, 1-11), que leva os discípulos à glossolalia (comumente conhecido nas igrejas cristãs como “falar em línguas”, isto é, expressar-se, em um momento de epifania, em várias línguas, inclusive desconhecidas).

Em O senhor da chuva, explicita-se a filiação de várias personagens a uma igreja evangélica (VIANCO, 2008, p. 174 e 190, entre outras), embora não haja uma menção clara de a qual denominação específica (entre as muitas existentes, no Brasil contemporâneo) o narrador faz referência. Entretanto, na passagem da ida de um pastor, Elias, a uma emissora de televisão evangélica com alcance nacional (VIANCO, 2008, p. 202), a fim de pedir orações que fortaleçam os anjos em batalha, há uma sugestão de que se trata de uma denominação neopentecostal, já que, entre as igrejas protestantes, são as que se utilizam com mais frequência dos canais midiáticos, sobretudo do tele-evangelismo, para conquista e manutenção de fiéis (CAMPOS, 2005, p. 109). Porém, ao mesmo tempo em que há uma menção explícita a uma religião institucionalizada, há também a de que, dentro dela, há um grupo de “iniciados” que conhecem o “velho código” – aparentemente, um texto sagrado paralelo ao do conhecimento público, a Bíblia; uma profecia que não poderia ser compartilhada com qualquer um:

O pastor sequer mencionara o velho código, onde todas as dúvidas eram saciadas aos iniciados, onde todas as provas eram evidentes. Não tinha permissão para usar o velho código assim, de maneira tão aberta. Entretanto, a fé era tão genuína e clara, que mesmo o mais cético ficou abalado naquela noite. Muitos, que jamais tinham aberto seus corações para a palavra cristã, que apenas passeavam o controle remoto de canal em canal, que ao passar para o Canal 3 normalmente pulavam para o próximo, naquela noite, pararam. Naquela noite havia alguma coisa diferente no orador. Naquela noite as palavras soavam verdadeiras. Muitos oraram pela primeira vez na vida. Muitos tiveram fé pela primeira vez, naquela noite. Era uma sensação que consumia. Emoção, lágrimas descendo pelo rosto. Era uma necessidade que gritava. Não foram poucos os que acompanharam aquele homem em suas lágrimas sem saber o porquê. (...) Havia um apelo no ar, um apelo para os anjos que perdiam suas vidas no campo de batalha. (...) Os mais sensíveis captavam a presença de algo superior, que fazia a pele arrepiar, como se estivessem com frio. Havia uma coisa nas entrelinhas. Havia uma guerra entre o bem e o mal. Jeová e Satanás em mais uma queda de braço, mas uma importante queda de braço. A noite cheirava a sangue. (VIANCO, 2008, p. 202-203)

Entretanto, ainda que a filiação evangélica de tais personagens não fosse mencionada claramente, o trecho acima sugere um dos traços característicos das igrejas neopentecostais: o “fervor emocional” (NIEBUHR, 1992, apud CAMPOS, 2005, p. 105) ou uma “religiosidade emotiva” (NIEBUHR, 1992, apud CAMPOS, 2005, p. 109), que se expressa, conforme a descrição acima, em sensações que consomem, em necessidades gritantes, em arrepios e lágrimas. Além disso, a ideia que sustenta o próprio mote principal da narrativa – a existência de anjos e demônios capazes de intervir no plano terreno – e a de que as orações podem impedir ou modificar o rumo dos eventos2 também são identificados como traços do pentecostalismo: a crença no demônio e a convivência com rituais de exorcismo foi apontada por 80% dos evangélicos pentecostais brasileiros em pesquisa publicada em 2006 pelo The Pew Forum on Religion & Public Life (apoiada pela Templeton Foundation); a crença no recebimento de “respostas às orações” foi mencionada por 95% e nas revelações divinas, por 64% (CAMPOS, 2008, p. 42).

Além das personagens apresentarem crenças e práticas evangélicas mais comumente professadas pelos neopentecostais, o enredo de O senhor da chuva baseia-se em uma crença cristã bastante difundida inclusive no catolicismo popular: a batalha entre anjos e demônios, na qual emerge a imagem do anjo guerreiro, personificada, na mitologia católica, em São Miguel Arcanjo, sugestivamente referido entre os anjos combatentes na Batalha Negra: “Sou guerreiro! Fui feito e criado para isso! Para defender o Exército de Deus! (...) Sou anjo, filho da Luz, sou filho do Pai e nada temerei. Mesmo que eu caminhe no vale das sombras e da morte... nada temerei. Meu nome é Miguel (...)” (VIANCO, 2008, p. 182). Nota-se no trecho, além da paráfrase do Salmo 22, a ideia de que os anjos foram criados para serem guerreiros e defensores de um exército divino, o que, indiretamente, coloca a ideia de uma batalha entre anjos e demônios, ou, conforme trecho anteriormente transcrito, “uma guerra entre o bem e o mal”, como algo necessário e predestinado.

Na passagem do encontro de Thal com Jesus, anteriormente transcrita, a visão dessa guerra é descrita em uma linguagem simbólica que remete ao Apocalipse, a qual se explicita em frases como “Viu quatro criaturas cobertas por olhos, por dentro e por fora; era o Terror. Um exército de demônios cobriu o céu, transformando o dia em noite e a noite, em Noite Eterna” (VIANCO, 2008, p. 96). Nesse sentido, é importante mencionar que a narrativa de Vianco dialoga com um conjunto numeroso de romances e filmes, especialmente de origem estadunidense, que apresentam uma visão apocalíptica, isto é, a ideia de uma batalha final do Bem contra o Mal – que podem ser personificados em anjos e demônios, respectivamente, mas também em humanos e aliens, ou quaisquer outras criaturas naturais ou sobrenaturais. Lynn S. Clark (2005, p. 26) considera que o aumento do interesse em temáticas sobrenaturais, na produção cultural para jovens, “está relacionada com as preocupações crescentes sobre o mal ao longo da última década do século XX e início do século XXI”, considerando-se trágicos eventos na sociedade estadunidense como o tiroteio em Columbine (1994), seguido por outros, em várias escolas do país, e o ataque de 11 de Setembro de 2001. Além disso, Clark considera a “herança evangélica” como determinante na forma como o mal é compreendido e representado nas narrativas, tanto jornalísticas quanto ficcionais, o que demonstra como os valores dessa herança cristã são amplamente aceitos:

Cristãos evangélicos se veem como engajados em uma batalha do bem contra o mal nessa Terra; o mal é uma presença real à qual os fiéis precisam resistir a cada momento. Com sua ênfase em uma batalha contra o mal, o evangelicalismo tem um grande apelo sobre pessoas que estão alheias ou distanciadas de outras tradições de fé. Esta pode ser uma razão para seu crescimento. Isso também fornece uma razão pela qual suas categorias de mal e de “fim dos tempos” continuam a oferecer estruturas garantidas que frequentemente são encontradas no entretenimento popular ou mesmo em novas histórias. A forma como o mal é entendido nos Estados Unidos tem grande relação com a herança evangélica do país e sua contínua importância nas vidas de muitas pessoas. (...) Essa forma cristã específica de entender o mal foi frequentemente oferecida em notícias e comentários e foi presumivelmente aceita de forma ampla3 . (CLARK, 2005, p. 28/29)

Vale lembrar que a “herança evangélica” mencionada por Clark também tem influência na cultura brasileira, não apenas pelas narrativas do entretenimento popular que a veiculam, mas pela origem estadunidense das igrejas neopentecostais brasileiras, no movimento de expansão do movimento pentecostal norte-americano a partir da década de 1910 (CAMPOS, 2005, p. 113). Sabemos que o Brasil também é um país majoritariamente cristão; considerando o contexto em que O senhor da chuva foi escrito (o final dos anos 1990) e publicado (o início dos anos 2000), convém citar dados do Censo de 2000 (IBGE): nele, conforme já mencionado, 73,9% da população entrevistada se declarou católica, e 15,6%, evangélica, constituindo 89,5% dos entrevistados (CAMPOS, 2008, p. 14). Além de considerar o número majoritário de pessoas que se autodeclaram cristãs, convém ressaltar que, pela influência da Igreja Católica na formação cultural brasileira, valores cristãos ultrapassam as paredes das igrejas e templos, e são assimilados pela cultura – tornando-se uma visão de mundo internalizada inclusive por aqueles que não se identificam com a religião institucional e não seguem seus protocolos e rituais. Desta forma, além da influência de obras estadunidenses que apresentam essa “herança evangélica”, Vianco expressa também uma visão de mundo cristã bastante familiar aos leitores brasileiros, ainda que estes façam parte da pequena porcentagem que não se declara católica ou evangélica.

É possível também estabelecer uma relação entre o sucesso de obras como O senhor da chuva e uma visão de mundo religiosa se considerarmos outro gênero no qual as obras de Vianco são classificadas: a narrativa de terror. Tanto na história da literatura quanto na do cinema, esse gênero sempre atraiu o grande público, e, nas últimas décadas, especialmente o público juvenil, representando milhões de espectadores e de dólares nas bilheterias dos filmes hollywoodianos. Em sua maioria, as histórias de terror, tanto na literatura como no cinema, são baseadas na existência do Mal, que, se não é personificado pelo demônio, é apresentado por alguma criatura cuja única função é infligir sofrimento e espalhar a destruição. Nesse sentido, é importante mencionar que a origem desse gênero se relaciona a propósitos religiosos: os primeiros livros a representar o Mal, em suas várias facetas, com o intuito de atemorizar os leitores, foram os Teufelsbücher, literalmente, “livros do diabo”, que tiveram seu auge na Alemanha, entre 1545 e 1604. Redigidos por pastores luteranos, tais livros tinham como objetivo “fornecer ensinamentos a respeito do diabo aos cristãos em geral” e “demonstrar que o diabo não só tomava posse da alma e do corpo, como buscava controlar tudo, lançando confusão em todo o reino humano” (MUCHEMBLED, 2001, p. 149). Porém, não era apenas a intenção disciplinadora e a moral punitiva dessas obras que garantiam o interesse do público, que

se atém principalmente a uma viagem nas asas do sonho, que lhe permite ver coisas proibidas, arrepiar-se com elas, e depois juntar-se, sem problemas de consciência, ao universo dos bem-pensantes. Provar do fruto proibido, de certo modo, sem sofrer as consequências de seu ato!” (MUCHEMBLED, 2001, p. 166).

Outro exemplo eloquente, nesta mesma linha, é o de pregadores protestantes estadunidenses, no século XVII: preocupados com a presença do mal, escrevem narrativas detalhadas para reprimir práticas que consideram de bruxaria (CLARK, 2005, p. 24/26). Essas narrativas procuravam despertar o temor dos fiéis, com propósitos de encorajamento e fortalecimento moral, mas também despertavam o efeito do “arrepiar-se com as coisas proibidas” e depois voltar à realidade dos “bem-pensantes” sem grandes consequências.

Em suma, O senhor da chuva, assim como muitas das narrativas juvenis “de fantasia”, está relacionado tanto a gêneros ficcionais (o maravilhoso, a narrativa de terror) que, em sua gênese, apresentam a aceitação do sobrenatural, quanto a ideias cristãs amplamente difundidas na cultura estadunidense e brasileira – o que permite supor a veiculação de tais ideias através dessa forma de entretenimento juvenil.

Conclusão

Inicialmente, a ideia de que livros de temática mitológica ou sobrenatural (como Harry Potter, Crepúsculo ou O senhor da chuva) veiculem crenças religiosas pode parecer relacionada a uma neurose persecutória que leva padres e pastores a temerem tais leituras, desaconselhá-las a crianças e jovens, advertir pais e professores e até a queimar exemplares em praça pública4 . Entretanto, sem dar razão a atitudes autoritárias como essas (muito comuns em sistemas totalitários nos quais, como ressalta Michèle Petit (2009, p. 111-114), vigiar a palavra é o primeiro passo para se vigiar o pensamento e manter o status quo), visões de mundo religiosas perpassam essas obras; curiosamente, mais comumente valores cristãos (defendidos por seus detratores) que excedem a adesão a religiões institucionais, suas práticas e templos, para se constituir em valores culturais amplamente aceitos e arraigados ao longo de um processo histórico-social no qual a Igreja Católica e, mais recentemente, as Igrejas Evangélicas – denominação que engloba tanto as denominações de protestantes históricos quanto pentecostais e neopentecostais – teve influência decisiva (BELLOTTI, 2010, p. 56).

Portanto, creio que não apenas o suspense narrativo e a linguagem fluida e fácil para o jovem são responsáveis pelo sucesso de O senhor da chuva. Embora não tenha sido escrita com uma intenção de cateque se ou conversão, podemos identificar claramente na obra um elemento da narrativa de terror que deriva das narrativas religiosas, como a origem demoníaca do mal, e uma visão apocalíptica na batalha do Bem contra o Mal, representados, respectivamente, por anjos e demônios. Esses elementos, provenientes de um sistema de crenças cristão, são familiares a muitos dos leitores brasileiros que, se não se declaram cristãos, estão inseridos em uma cultura fortemente influenciada por seus valores – o que se configura em um fator relevante para o sucesso desse e de outros livros do autor.

Referências

BELLOTTI, Karina Kosicki. Pluralismo Protestante na América Latina, In: SILVA, Eliane Moura; BELLOTTI, Karina Kosicki; CAMPOS, Leonildo Silveira (org.). Religião e Sociedade na América Latina. São Bernardo do Campo (SP): Universidade Metodista de São Paulo, 2010, pp. 55 a 71.

BOURDIEU, Pierre. Gênese e estrutura do campo religioso, In: A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 2015, pp. 27-78

CAMPOS, Leonildo Silveira. Os mapas, atores e números da diversidade religiosa cristã brasileira: católicos e evangélicos entre 1940 e 2007. REVER - Revista de Estudos da Religião, dez. 2008, pp. 9-47, disponível em www.pucsp.br/rever/rv4_2008/t_campos.pdf, acesso em 03 jul. 2019.

CAMPOS, Leonildo Silveira. As origens norte-americanas do pentecostalismo brasileiro: observações sobre uma relação ainda poucoavaliada. Revista USP. São Paulo, n. 67, set/nov 2005, pp. 100-115.

CLARK, Lynn Schofield. From angels to aliens: Teenagers, the Media and the Supernatural [E-book]. New York: Oxford University Press, 2005.

LUFT, Gabriela Fernanda Cé. Adriana Falcão, Flávio Carneiro, Rodrigo Lacerda e a literatura juvenil brasileira no início do século XXI. Dissertação (Mestrado). Porto Alegre: Instituto de Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2010.

MUCHEMBLED, Robert. Uma história do diabo: séculos XII-XX. Rio de Janeiro: Bom texto, 2001.

PETIT, Michèle. Os jovens e a leitura: uma nova perspectiva. 2ª edição. São Paulo: Editora 34, 2009.

ROAS, David. A ameaça do fantástico: aproximações teóricas. São Paulo: Editora Unesp, 2014.

SANT’ANNA, Jaime dos Reis. Entre bruxos e vampiros: ideologia e alienação no mercado editorial de literatura juvenil. Anais do III Congresso Internacional de Leitura e Literatura Infantil e Juvenil, PUC-RS, maio de 2012. Disponível em:. Acesso em 03ago. 2019.

TODOROV, Tzvetan. Introdução à literatura fantástica. São Paulo: Perspectiva, 2017.

VIANCO, André. O senhor da chuva. São Paulo: Novo Século, 2008.

Notas

[1] Estima-se que a vendagem da série Harry Potter atingiu a marca de 1 bilhão de exemplares vendidos, e a série Crepúsculo, 400 milhões, até abril de 2012 (c.f. SANT’ANNA, 2012, p. 2).z-index

[2]Outro trecho que evidencia a menção a esta crença na narrativa: “Entrariam com o apelo no início da madrugada, e, com sorte, mobilizariam um Especial, uma vigília eletrônica. Conhecedores do Código, sabiam o quanto era valioso para o Exército [celeste] cada novo humano acreditando e orando por eles, fortificando-os para a batalha. As orações eram a pedra fundamental para a luta” (VIANCO, 2008, p. 191).

[3]Tradução minha para este trabalho. No original: “Evangelical Christians see themselves as engaged in a battle of good versus evil on this Earth; evil is a real presence that must be resisted by the faithful at every turn. With its emphasis on a battle against evil, evangelicalism holds a great deal of appeal for persons who are alienated or distanced from other faith traditions. This may be one reason for its growth. It also provides a reason for why its categories of evil and the ‘End Times’ continue to provide taken-for-granted frameworks that often are found in popular enterteinment and even new stories. The way evil is understood in the United States has a great deal to do with the country’s evangelical heritage and its continuing importance in the lives of many people. (...) This specifically Christian way of understanding evil was frequently offered in News and commentary and was presumably widely accepted”.

[4]Notícias recentes atestam que tal neurose persecutória não é algo nem passado, nem isolado: no início de abril de 2019, padres poloneses queimaram exemplares das sagas Harry Poter e Crepúsculo em frente a uma Igreja, alegando sua “ligação com magia e ocultismo” (c.f. “Padres queimam livros de ‘Harry Potter’ e ‘Crepúsculo’ na frente de Igreja”, O Globo, 02/04/2019, disponível em https://extra.globo.com/noticias/page-not-found/padres- -queimam-livros-de-harry-potter-crepusculo-na-frente-de-igreja-23567185.html, acesso em 03/08/2019). No mês de julho de 2019, o assunto voltou aos jornais através da polêmica causada por um vídeo da ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, em que ela propõe a “caça” a livros que “ensinem as crianças a serem bruxos”. Em matéria recente, o Jornal Folha de São Paulo relata o reflexo desse conservadorismo entre autores e editores, que já tiveram livros que apresentam personagens e narrativas do folclore europeu e brasileiro vetadas em escolas e programas de leitura (c.f. “Damares inspira caça a bruxas e seres mágicos na literatura infantil”, Folha de São Paulo, 26/07/2019, disponível em https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2019/07/bruxas-gnomos-e-seres-magicos-de-livros-infantis-entram- -na-mira-de-religiosos.shtml, acesso em 03/08/2019).