A recriação dos Evangelhos
em Boa Nova, de Humberto
de Campos (Espírito)
The Recreation of the Gospels in Boa
Nova, by Humberto de Campos (Spirit)
Ana Claudia da Silva*
* Professora Associada
da Universidade de
Brasília, Instituto de Letras,
Departamento de Teoria
Literária e Literaturas. Líder
do Grupo de Pesquisa
Literatura e Espiritualidade.
Doutora em Estudos
Literários pela Universidade
Estadual Paulista Júlio
de Mesquita Filho, realiza
atualmente estágio pósdoutoral na Universidade
Estadual Paulista Júlio de
Mesquita Filho, câmpus de
Franca, com pesquisa sobre
a relação entre a literatura
e a educação espíritas.
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Resumo
No romance episódico Boa Nova, o autor extrafísico Humberto de Campos (2015)
reconta, pela psicografia de Chico Xavier, em
trinta capítulos, episódios da vida de Jesus,
nos quais ficcionaliza a matéria bíblica para
formar relatos que agregam à fonte originária pensamentos, sentimentos e emoções
das personagens principais. A linguagem de
Campos, neste romance, difere da empregada em outras obras do mesmo autor espiritual; o autor quer migrar do universo terreno dos
“Espíritos esclarecidos” para aquele celestial,
dos “Espíritos evangelizados”. Neste artigo,
queremos abordar algumas particularidades
desse romance, refletindo antes, a partir da
metodologia proposta por Luigi Giussani, sobre a postura adequada para considerar o fenômeno da literatura espírita.
Palavras chave:Literatura espírita; Espiritismo; Literatura e espiritualidade; Humberto de Campos (Espírito).
Abstract
In the episodic novel Boa Nova, the extraphysical author Humberto de
Campos (2015) recounts, through Chico Xavier’s psychography, thirty chapters, episodes of the life of Jesus, in which he fictionalizes the biblical matter to
form reports that add thoughts, feelings and emotions of the main characters.
Campos’s language in this novel differs from that used in other works by the
same spiritual author; the author wants to migrate from the earthly universe of
the “enlightened spirits” to the celestial one, of the “evangelized spirits”. In this
article, we address some particularities of this novel, reflecting first, from the
methodology proposed by Luigi Giussani, about the proper posture for consider
the phenomenon of mediumistic spiritist literature.
Keywords:Spiritist Literature; Spiritism; Literature and spirituality; Humberto de Campos (Spirit).
Introdução
Escrever sobre a literatura espírita brasileira é um desafio que nos preme por muitas razões. A primeira é que para encontrar um ponto de partida, foi necessário antes definir quem é nosso “leitor virtual”, isto é, aquele para quem estamos escrevendo1 . Seria bem fácil escrever para leitores espíritas, os quais, infelizmente, são minoria no universo acadêmico, que sistematicamente fecha as portas para qualquer forma de conhecimento que tenha a fé como método, como é o caso da matéria que nos traz aqui. Além disso, não obstante o sem número de romances espíritas já publicados; não obstante seja a literatura espírita o objeto preferencial de muitos leitores brasileiros; não obstante, ainda, a existência de bibliotecas em todas as casas espíritas do país, o número de investigações literárias realizadas estritamente sobre ela é ainda bastante reduzido.
Escolhemos como objeto deste estudo o romance mediúnico Boa nova (2015), do autor extrafísico Humberto de Campos, com psicografia de Francisco Candido Xavier, cuja edição princeps data de 1941 2 . Trata-se de um romance episódico, com trinta capítulos que trazem como matéria o que Campos chamou de “folclore do Céu”: “Dos milhares de episódios desse folclore do Céu, consegui reunir trinta e trazer ao conhecimento do amigo generoso que me concede a sua atenção.” (CAMPOS, 2015, p. 8). A matéria do romance é a vida terrena de Jesus, cujos depoimentos não se restringem à matéria relatada nos quatro evangelhos canônicos, abrangendo, ainda, os “feitos heroicos e abençoados, muitas vezes anônimos no mundo, praticados por seres desconhecidos” (CAMPOS, 2015, p. 8), os quais encerram lições condizentes com a mensagem evangélica cristã, trazendo alento e encorajamento para as almas terrenas.
Entendemos que um romance episódico é aquele em que seus capítulos ou partes podem ser tomados por narrativas completas, mesmo que integrem um conjunto. Carlos Reis define o episódio da seguinte forma:
Incidente que é parte integrante de uma história, possui uma unidade própria e pode ser isolado ou incluído numa série lógica de acções. Normalmente, uma história ou uma intriga de um romance ou de um conto, por exemplo, apresenta um conjunto de vários episódios ligados entre si ou não, por relações de espaço e de tempo, e que possuem alguma autonomia em relação à acção principal. [...] Uma grande narrativa não raro recorre à composição episódica para amenizar o relato dos acontecimentos principais ou para os completar com informações suplementares. (REIS, 2009, p. 1)
Suplemento, no sentido vulgar, é algo apresentado para suprir uma falta; Campos nos traz, assim, episódios da vida de Jesus que completam, à sua maneira e da perspectiva da Doutrina dos Espíritos, os relatos evangélicos, dando a conhecer outros diálogos de Jesus com seus apóstolos e com pessoas cujas existências, embora verossímeis, não estão testemunhadas nos evangelhos canônicos. Informa-nos Faria (2019, p. 178):
Para preencher a lacuna de informações sobre os apóstolos deixada por Atos dos Apóstolos, a tradição escreveu outras histórias apostólicas que foram classificadas como literatura apócrifa, não inspirada. Composta de atos, evangelhos, cartas, apocalipses, os apócrifos do Segundo Testamento (ST)3 recolhem visões diferenciadas da fé.
Contudo, não podemos considerar os relatos apresentados por Campos em Boa Nova (2015) como apócrifos, visto que a literatura espírita é considerada igualmente inspirada – não diretamente por Deus, mas pelos Espíritos Superiores, que estão mais perto da perfeição e da comunhão com Deus às quais tendem todas as criaturas. De resto, a classificação dos chamados textos apócrifos baseia-se na distinção entre verdade e inverdade, a qual depende da perspectiva. É também Freitas quem nos esclarece:
Postulamos que os apócrifos podem ser classificados em três categorias, a saber: aberrantes, complementares e alternativos. Por aberrantes se entendem aqueles que falsearam ou exageram ao descrever os fatos [...]. Já os complementares apresentam dados que complementam os textos canônicos [...]. Os alternativos são os que trazem novidades, seja no conteúdo, seja na expressão de um pensamento rejeitado e condenado ao esquecimento pelo pensamento hegemônico da época. (FARIA, 2019, p. 178-179)
Ampliando o conceito de “verdade” para abranger a perspectiva da chamada terceira revelação ou Doutrina dos Espíritos, Boa nova (CAMPOS, 2015) pode ser entendido como um texto alternativo, pois as regras da narrativa – do que é verossímil e do que não é – obedecem ao que se entende por real no universo doutrinário da obra. Confiamos, assim, que a única forma justa de estudar um fenômeno religioso é observando-o a partir do que ele diz de si mesmo, segundo a base metodológica que passamos a apresentar.
Premissa metodológica4
Por sorte e por graça, antes de conhecermos a Doutrina dos Espíritos, fizemos longo percurso existencial pelo catolicismo e, particularmente nos últimos oito anos de católica, tivemos a felicidade de experimentar intensamente a vida cristã dentro do movimento Comunhão e Libertação (CL), a cujo fundador, o padre, educador, filósofo e teólogo italiano Luigi Giussani, nos voltamos agora com gratidão. Sua maior contribuição ao pensamento cristão é a proposição de um método de conhecimento da realidade que se firma em um conceito de razão que não se coloca como oposto à fé, à revelação, mas que a abraça como parte da experiência humana integral.
O chamado “PerCurso” de padre Giussani é uma trilogia de estudos que começa com O senso religioso, obra de 1966 5 ; nela, D. Giussani desenvolve o conceito que lhe dá nome. Para ele, a pessoa nasce marcada, em seu coração, por uma exigência de felicidade, de completude, de infinitude que constituem uma experiência primordialmente humana, independente de cultura, raça ou religião. Giussani define o senso religioso, cerne da experiência religiosa, como “[...] a capacidade que a razão tem de exprimir a própria natureza profunda na interrogação última, é o locus da consciência que o homem tem da existência.” (GIUSSANI, 2017, posição 1531) O senso religioso se manifesta nas perguntas sobre o sentido da vida e da morte, o significado da dor, a finalidade das coisas que existem etc.
Em busca dessa resposta criaram-se todas as religiões ao longo da história humana, todas superadas, segundo Giussani (2015), por um acontecimento extraordinário: o nascimento de Jesus. É essa a matéria do segundo volume do “PerCurso”, Na origem da pretensão cristã, originalmente publicado em 1988.6 Giussani aborda esse fenômeno como a resposta de Deus às indagações profundas, existenciais, da pessoa humana: compadecido da incapacidade humana de encontrá-lo, o próprio Deus teria vindo à Terra, feito homem, para mostrar-nos o caminho para a salvação, pela via ascética da santidade, da perfeição. Neste ponto – a consideração de Jesus como ser de natureza divina –, o espiritismo se distancia do catolicismo7 . O sociólogo Reginaldo Prandi explica o ponto de vista da doutrina dos espíritos:
Jesus Cristo, o mais iluminado dos espíritos reencarnados na Terra, não ocupa no espiritismo o lugar de Deus filho, como no catolicismo e no protestantismo. Não faz parte da Santíssima Trindade, que é completamente estranha ao kardecismo.8 Por isso, católicos e evangélicos, das diferentes igrejas, não reconhecem o espiritismo como religião cristã. Historiadores e sociólogos da religião preferem incluir o espiritismo em um ramo diferente do cristianismo, entre as chamadas religiões mediúnicas. Mas a maioria dos espíritas se diz cristã, assim como os umbandistas, que veneram Jesus Cristo, identificado em Oxalá. (PRANDI, 2012, p. 108).
Não é nosso objetivo discutir, com Prandi, o reconhecimento do espiritismo como religião cristã. Nossa metodologia nos leva a tomar o estudo dessa doutrina a partir da experiência subjetiva da pessoa espírita, por isso consideramos, com ela, que o ensinamento cristão, na vivência espírita, supera em valor e em importância os fenômenos mediúnicos descritos nos compêndios doutrinários. O espiritismo se autodefine não como religião, mas como doutrina cristã, cujos ensinamentos morais, desenvolvidos no Evangelho segundo o Espiritismo (KARDEC, 2013), são baseados nos de Jesus – com especial destaque para o Sermão do Monte.
O terceiro livro do “PerCurso” de padre Giussani, Por que a Igreja – publicado inicialmente em dois tomos entre 1990 e 1992, reunidos depois em um único volume em 2003 9 – trata da Igreja Católica, que se autodefine como o corpo vivo que perpetua a presença de Deus entre os homens. Para verificar racionalmente essa proposição, Giussani (2015, posição 95), propõe um “caminho para a inteligência da Igreja” ou seja, um método, que, a despeito de ter como objeto o estudo da Igreja Católica, nos inspirou a postura adequada para o estudo da doutrina espírita e, por desdobramento, da literatura espírita, o qual passamos a explicar.
Para compreender a realidade profunda da Igreja (católica), Giussani apresenta um pressuposto fundamental, que é o de que a Igreja é uma vida, não um conjunto de ensinamentos e ideias abstratas sem incidência sobre a experiência humana. Diz ele: “Quem se propuser a verificar uma opinião própria sobre a Igreja deve considerar que, para a inteligência real de uma vida como a Igreja, é necessária uma convivência adequada.” (2015, pos. 95, grifo meu) Esta me parece a novidade metodológica proposta por Giussani: para estudar um fenômeno humano e religioso, é preciso conhecê-lo de dentro, ouvir antes o que ele diz de si mesmo do que o que sobre ele dizem os especialistas que o veem a partir do lugar ilusório do conhecimento objetivo. O que a Igreja diz de si mesma? O que a Doutrina dos Espíritos diz de si mesma? Como elas se autodefinem? Esse é o ponto de partida razoável para estudar uma realidade inscrita na experiência religiosa da pessoa humana.
Sublinhamos, ainda, que Giussani se refere a uma convivência “adequada” com o fenômeno estudado e não meramente informativa com o objeto que se quer conhecer. Ou seja: para conhecer uma igreja, você deve fazer parte dela, tomando por verdadeiros seus pressupostos; daqui depreendemos o juízo de que qualquer outra forma de conhecê-la seria, portanto, artificiosa.
Da mesma forma, para bem entender e avaliar a expressão literária que nasce da relação com a espiritualidade superior vivenciada no âmbito da Doutrina dos Espíritos, é preciso estar em sintonia com seus ensinamentos: uma leitura justa dessa produção deve ser feita dentro dessa chave vivencial, isto é, considerando como válidos os pressupostos fundamentais do Espiritismo, que são: a existência de Deus, entendido como inteligência suprema do universo e causa primária de todas as coisas, a qual é definida como eterna, infinita, imutável, imaterial, única, toda-poderosa, soberanamente justa e boa; a imortalidade da alma, que é o nome dado ao espírito enquanto encarnado; como filhos de Deus somos imortais: a morte aniquila somente o corpo, mas o espírito que o anima vive antes e depois da existência corporal; a pluralidade das existências, dada por sucessivas reencarnações, nas quais o espírito tem renovadas oportunidades de desenvolver-se em moralidade e inteligência, até alcançar a classe dos espíritos puros ou crísticos, os únicos seres que têm contato direto com Deus, dos quais Jesus é o único representante que conhecemos; a pluralidade dos mundos habitados, que se organizam de acordo com o grau de evolução dos espíritos que neles residem; e, por fim, a comunicabilidade dos espíritos ou seres humanos desencarnados, que guardam, no mundo invisível, as mesmas características de inteligência e moralidade que adquiriram quando encarnados; tais espíritos são capazes de influenciar as almas, incitando-as ao bom ou mau proceder.10
Essa influência se dá por diversos meios ou modos, que incluem intuição, vidência, audiência, cura, pintura, olfato, xenoglossia e outras, entre as quais destacamos a psicografia, que é a capacidade que alguns médiuns têm de escrever sob a ação dos espíritos. Este é, prioritariamente, o método pelo qual são compostas as obras literárias mediúnicas.
Literatura espírita
Queremos, agora, distinguir literatura mediúnica – composta, como sabemos, pela influência de um autor extrafísico ou desencarnado sobre um médium encarnado – de literatura espírita. Chamamos de espírita toda produção literária, mediúnica ou não, que funciona intra e extratextualmente em concordância com a Doutrina dos Espíritos. Os fatores internos que precisam estar de acordo com o espiritismo são os temas, conteúdos, enredos, espaços literários, desfechos.
Além disso, para ser considerada uma obra espírita, no sentido profundo do termo, há que considerar também os fatores externos à obra, originados, por exemplo, na conduta moral de médiuns e editores. Isso inclui o direito autoral das obras psicografadas, que, via de regra, são cedidos à editora, como ocorreu com a maior parte das obras psicografadas por Chico Xavier, ou destinados a obras sociais e de caridade – como é o caso das obras psicografadas por Divaldo Franco.11
Creditamos, no caso da literatura espírita mediúnica, a autoria da obra ao espírito ou aos espíritos de cujas inteligências se originaram os textos – e não ao médium que as materializou para nossa leitura. Entendemos que o trabalho do médium se aproxima, como categoria, daquele do tradutor, pois é ele que (de modo mais ou menos consciente e, por isso, também mais ou menos influente na organização do texto, que é um fator imponderável12), de certa forma, “traduz” a linguagem do espírito para o texto escrito. Em O Evangelho segundo o espiritismo, Kardec, na tradução de Guillon Ribeiro, afirmava ser a mediunidade “apenas uma aptidão para servir de instrumento mais ou menos dúctil aos Espíritos” (apud ROCHA, 2016, posição 3548), evocando a imagem do ducto, canal, instrumento que favorece a passagem de substâncias líquidas. É nesse sentido que tratamos o médium como um tradutor: aquele que favorece a comunicação entre as inteligências extrafísicas e as almas, ou espíritos encarnados, como um “tubo”, na feliz expressão de Luigi Giussani13
Por fim, queremos nos valer de uma definição de literatura que possa incluir também a produção espírita – e a tomamos de Antonio Candido que, no texto “O direito à literatura”, propõe:
Chamarei de literatura, da maneira mais ampla possível, todas as criações de toque poético, ficcional ou dramático em todos os níveis de uma sociedade, em todos os tipos de cultura, desde o que chamamos folclore, lenda, chiste, até as formas mais complexas e difíceis da produção escrita das grandes civilizações. (CANDIDO, 1995, p. 242)
A literatura espírita, pela sua natureza, está, pois, entre “as formas mais complexas e difíceis da produção escrita das grandes civilizações”, pois nela atuam com realismo elementos que em outros sistemas literários chamaríamos de fantásticos, tais como a existência de vida em outros orbes, a reencarnação, a influência dos espíritos sobre as almas, a existência do chamado Mundo Maior como espaço possível da ação literária e outros.
A literatura espírita canônica – por canônica entendemos as chamadas obras clássicas, lidas e relidas pelos leitores espíritas, em cujo conjunto se inserem as obras de Humberto de Campos Redivivo - não difere, em qualidade estética, do que se convencionou chamar de “alta literatura”, ou seja, são textos escritos em linguagem apurada, elegantes, marcados por figuras de linguagem, ritmos e tramas que surpreendem o leitor, conservando um tom sublime, que tende para a transcendência do humano. Não é nosso objetivo, aqui, discutir a literariedade dessas obras, até mesmo porque, segundo José Luiz Jobim (2009), essa é uma discussão equivocada, de vez que o conteúdo do que se considera literário na arte verbal varia bastante ao longo da história literária. Não obstante ser essa uma objeção frequente ao estudo da literatura espírita – a de que sua “literariedade” não está comprovada – basta, para justificar nossas investigações, que ela seja objeto de leitura de uma parte não diminuta da população leitora; de vez que há brasileiros lendo obras de diferentes gêneros (romances, poesias, narrativas, obras infantis e juvenis) que recebem reedições contínuas durante décadas, julgamo-nas apropriadas como objetos de investigação não apenas próprios, mas necessários do estudo literário.
Boa nova
Chegamos, assim, ao romance que nos trouxe aqui: Boa Nova (2015), do espírito Humberto de Campos, pela psicografia de Chico Xavier. A obra, publicada pela primeira vez em 1941, foi o décimo quarto livro psicografado por Chico Xavier e a quarta da autoria de Campos enquanto autor extrafísico. Em seus trinta capítulos, relata episódios da vida de Jesus que, segundo ele, abundam nos arquivos celestes.
A linguagem de Campos, neste romance, difere da empregada em outras obras de sua lavra. Ele mesmo adverte seus leitores: “[...] sou o primeiro a reconhecer que os meus temas não são os mesmos. Os que se preocupam com a expressão fenomênica da forma não encontrarão, talvez, o mesmo estilo.” (2015, p. 7) Campos atribui a transformação do estilo à sua conversão, que se deu após a desencarnação. Ele mesmo relata:
Jesus vê que no vaso imundo de meu Espírito penetrou uma gota de seu amor desvelado e compassivo. O homem perverso, que chegava da Terra, encontrou o raio de luz destinado à purificação de seu santuário. Ele ampara os meus pensamentos com a sua bondade sem limites. A ganga terrena ainda abafa, em meu coração, o ouro que me deu da sua misericórdia; mas [...] já possuo o bom ânimo para enfrentar os inimigos de minha paz, que se abrigam em mim mesmo. Tenho a alegria do Evangelho, porque reconheço que o seu amor não me desampara. Confiado nessa proteção amiga e generosa, meu Espírito trabalha e descansa. (CAMPOS,2015, p. 8-9)
A mudança no estilo literário que se verifica entre os escritos de Campos enquanto encarnado e seus textos compostos pela psicografia de Chico Xavier é justificada pelo autor com a ideia de que “o gosto literário sempre refletiu as condições da vida do Espírito.” (CAMPOS, 2015, p. 7) O espírito convertido terá, pois, outras preocupações a guiar- -lhe a composição: o autor declara, ainda, o desejo de migrar do universo terreno dos “Espíritos esclarecidos” para aquele celestial, dos “Espíritos evangelizados” (2015, p. 9). Sua consciência autoral sabe que, enquanto Espírito, produz obra sensivelmente distinta daquela construída em sua última reencarnação e reputa o fato como natural, de vez que, ao chegar à espiritualidade, logo pôs-se a estudar, ampliando seus conhecimentos.14
O narrador de Boa Nova (CAMPOS, 2015) é tradicional – onisciente e intruso, sabe muito mais que as personagens. A personagem principal é Jesus, que age sempre com brandura e enorme superioridade moral em relação aos discípulos; estes são seduzidos pelo magnetismo que dele emanava e, ao encontrá-lo, experimentam por ele profunda simpatia, pois reconhecem, inconscientemente, o amigo espiritual com cujo projeto de revelação das verdades divinas estiveram comprometidos muito antes de reencarnarem na Galileia.
Relata Campos que também o planeta Terra fora preparado pelos espíritos celestes antes da vinda de Jesus, que encarna num momento em que o Império Romano gozava de um raro período de pacificação e progresso; Caio Júlio César Otávio, o imperador, creditava isso ao seu poder de liderança. Ao leitor, contudo, o narrador revela que boas energias já estavam preparando a vinda do espírito mais puro que a Terra já conhecera.
Os capítulos circundam os relatos bíblicos dos evangelhos canônicos, ampliando-os com palavras e explicações de Jesus a respeito das situações narrativas, nas quais convive o Mestre com Maria, Tadeu, Pedro, Bartolomeu, João, Levi, João Batista, Zebedeu, André, Tiago, Nicodemos, Isabel, Maria de Magdala e Joana de Cusa. A obra passa a ideia de que Jesus entrega aos discípulos um conhecimento muito superior ao que oferece ao povo; eles seriam iniciados na prática cristã, cuja preparação se dá na intimidade com o Mestre.
Escolhemos ressaltar, aqui, duas lições que, ao longo dos episódios, são sempre repetidas por Jesus. A primeira diz respeito à exortação: “Tende bom ânimo”. Presente em João 16, 33, a exortação bíblica diz o seguinte: “Tenho-vos dito isto, para que em mim tenhais paz; no mundo tereis aflições, mas tenham bom ânimo, eu venci o mundo.” Jesus pronuncia estas palavras logo depois de profetizar a dispersão dos apóstolos, não obstantes suas manifestações de amor e fidelidade, durante os padecimentos porvindouros do Calvário. Temerosos de serem presos e de, identificados como seguidores de Jesus, receberem a mesma condenação, seus amigos o abandonam. Antes, porém, disso ocorrer, Jesus, que já o sabia, exorta-os a que vençam o medo e “tenham bom ânimo”, tenham coragem, pois há mais vida além dos padecimentos terrenos, vencidos por Jesus. É uma exortação de fé, cujo caráter consolador a escritora Leda Ebner bem explica:
O Evangelho, a Boa Nova trazida por Jesus, deve proporcionar a quem buscaconhecê-lo, o estímulo ao bem, à alegria de viver, ao bom ânimo em tudo. Por quê? Pela confiança nas revelações da imortalidade, da perfectibilidade dos seres, da origem e destinação comuns a todos, pela valorização das experiências diversas que exercitamos no decorrer de uma existência; pela valorização das inúmeras existências já vividas e a viver, através das quais todos experenciamos as mesmas lutas de superação de obstáculos, de resolução de problemas, os mesmos desafios de pobreza, de riqueza, de ignorância, de saber, e, todos conseguindo evoluir pouco a pouco para a perfeição e felicidade.” (EBNER, 2015)
Tal exortação aparece nove vezes na narrativa, iniciando com a lição que o Mestre ensinara a Bartolomeu. Este, velho e cansado, abre a Jesus seu coração, e confessa não ter mais a energia que percebe ser necessária à tarefa da pregação do Evangelho. Jesus, sabiamente, persuade-o que a sua força está em sua sabedoria e não nas aptidões físicas, e encoraja-o a, diante das próprias dificuldades, desenvolver o bom ânimo.
Outra lição que se sublinha em Boa Nova (CAMPOS, 2015) é a de que o Reino de Deus deve ser edificado em si mesmo, antes que nos outros:
— Senhor, vossos esclarecimentos são indiscutíveis; entretanto, preciso acrescentar que alguns dos companheiros se revelaram insuportáveis nessa viagem a Nazaré; uns me acusaram de brigão e desordeiro, outros, de mau entendedor de vossos ensinamentos. Se os próprios irmãos da comunidade apresentam essas falhas, como há de ser o futuro do Evangelho? O Mestre refletiu um momento e retrucou: — Estas são perguntas que cada discípulo deve fazer a si mesmo. Todavia, com respeito à comunidade, Filipe, pelo que me compete esclarecer, cumpre-me perguntar- -te se já edificaste o Reino de Deus no íntimo do teu espírito. (CAMPOS, 2015, p. 68-69)
O ensinamento de que o evangelho deve florescer primeiro no coração do cristão, pela reforma íntima, está nas bases da ação transformadora, segundo a Doutrina dos Espíritos. No romance de Campos, Jesus a repete em várias situações, indicando que o mundo a transformar é o nosso próprio, interno, e que a sua revolução é antes de foro íntimo que social; pela primeira é que se dará, ao longo do tempo, a segunda. Com a predominância de espíritos mais evoluídos é que a Terra chegará a ser um planeta mais feliz. A lição, dada com bom humor, acaba com as fofocas e conflitos de poder entre os discípulos.
Considerações finais
Quisemos apresentar, neste breve estudo, algumas observações tanto sobre o método de estudo da literatura espírita, que nos foi inspirado por Giussani – ou seja, o olhar a partir de dentro do fenômeno a ser estudado –, quanto sobre o romance episódico Boa Nova (2015), de Humberto de Campos (Espírito).
O conjunto da obra de Campos psicografado por Chico Xavier está entre os que mais publicidade receberam ao longo da história da literatura espírita brasileira. Campos, que em vida se fizera leitor apreciado pelo grande público, começa sua produção no além-túmulo apenas quatro meses após sua desencarnação, fato que confere, desde logo, grande notoriedade a seus escritos na nova condição. Ao perceber que a obra espírita atribuída a Campos se tornava um sucesso, a família do escritor decide processar o médium e a editora da Federação Espírita Brasileira - FEB, que detinha os direitos da obra, exigindo o pagamento dos direitos autorais. O caso tornou-se célebre, pois obrigou a justiça pública a definir que o direito autoral encontra na morte seu limite final. O processo, vencido pela FEB, é relatado pelo jurista que a defendeu, Miguel Timponi, no livro A psicografia ante os tribunais (1978). A partir daí, novos estudos se fizeram sobre a obra de Campos, tais como o de Alexandre Caroli Rocha (2001), sobre a recepção da obra mediúnica de Campos pelos críticos
literários que lhe foram contemporâneos, e o de Bernardo Lewgoy, sobre como a cultura escrita, a oralidade e as narrativas inter-relacionam-se em práticas da Doutrina dos Espíritos, legitimando-a como uma doutrina cristã, racionalista e erudita.
O romance Boa Nova (CAMPOS, 2015), por sua vez, destaca-se pela matéria evangélica de seus episódios, cuja linguagem torna-se acessível a grande número de leitores sem perder, contudo, a beleza e a elegância das composições de seu autor. Com enredos lineares e cronologicamente dispostos – tanto dentro de cada episódio como na ordenação do conjunto, pois parte da cosmovisão que antecede o nascimento de Jesus, passando depois pela sua infância, batismo, início das pregações, sermão do Monte, feitos extraordinários, curas, agonia, crucificação e envio dos apóstolos, finalizando com especial destaque à figura de Maria, um dos pilares do cristianismo nascente.
As histórias se passam nas mesmas paisagens terrenas por onde Jesus pregou seus ensinamentos - Galiléia, Judéia, Samaria –, com exceção para o capítulo inicial, que nos apresenta Roma em seu apogeu glorioso.
O estilo elegante da narrativa de Campos e a perspectiva do narrador convidam o leitor a adentrar o coração das personagens, tal como nesta descrição da personagem Maria de Magdala, após o encontro com Jesus:
Que novo amor era aquele apregoado aos pescadores singelos por lábios tão divinos? Até ali, caminhara ela sobre as rosas rubras do desejo, embriagando-se com o vinho de condenáveis alegrias. Contudo, seu coração estava sequioso e em desalento. Jovem e formosa, emancipara-se dos preconceitos férreos de sua raça; sua beleza lhe escravizara aos caprichos de mulher os mais ardentes admiradores; mas seu espírito tinha fome de amor. O Profeta nazareno havia plantado em sua alma novos pensamentos. Depois que lhe ouvira a palavra, observou que as facilidades da vida lhe traziam agora um tédio mortal ao espírito sensível. As músicas voluptuosas não encontravam eco em seu íntimo, os enfeites romanos de sua habitação se tornaram áridos e tristes. Maria chorou longamente, embora não compreendesse ainda o que pleiteava o profeta desconhecido. Entretanto, seu convite amoroso parecia ressoar-lhe nas fibras mais sensíveis de mulher. Jesus chamava os homens para uma vida nova.
O parágrafo resume, com metáforas que valorizam a expressão dos sentimentos, a paisagem interior de Maria de Magdala, composta mais de sentimentos que de raciocínio; é o princípio da transformação desta que se tornará uma das mais expressivas testemunhas dos ensinamentos cristãos. Sua jornada ascética será marcada pela sua extraordinária conversão; o próprio narrador trará em seu discurso as marcas ora de seu passado inglório, ora de sua transformação: no início refere-se à personagem como “a pecadora de Magdala” (CAMPOS, 2015, p. 129); depois de seu encontro com Jesus, Maria será referida como “a convertida de Magdala” (CAMPOS, 2015, p. 131), “a grande convertida” (CAMPOS, 2015, p. 133), “a mensageira do Evangelho” (CAMPOS, 2015, p. 133), “a ex-pecadora” (CAMPOS, 2015, p. 134). Maria será aquela que durante longo tempo, após a sua conversão, sofrerá o desprezo dos outros discípulos, tanto pelo seu passado quanto por sua condição de mulher: “Temiam-lhe o pretérito de pecadora, não confiavam em seu coração de mulher.” (CAMPOS, 2015, p. 132) Solitária e resignada, amparada em profundo amor por Jesus, Maria de Magdala resistirá a muitas “propostas condenáveis” (CAMPOS, 2015, p. 132) que a tentariam para o retorno à vida devassa. Além dos preconceitos de sua condição de gênero e de atividade sexual ilícita pregressa, Maria enfrentará também o exílio dos leprosos, no meio do qual encontrou almas carentes a quem pregava diariamente o Evangelho; é entre os mais infelizes de sua época que logrará abrigo e calor humano.
Ao fim de sua jornada terrena, em paisagem extrafísica do além- -túmulo, ela reencontrará, como prêmio de uma vida devotada ao amor, o Mestre bem-amado:
Em dado instante, observou-se que seu peito não mais arfava. Maria, no entanto, experimentava consoladora sensação de alívio. Sentia-se sob as árvores de Cafarnaum e esperava o Messias. As aves cantavam nos ramos próximos e as ondas sussurrantes vinham beijar-lhe os pés. Foi quando viu Jesus aproximar-se, mais belo que nunca. Seu olhar tinha o reflexo do céu e o semblante trazia um júbilo indefinível. O Mestre estendeu-lhe as mãos e ela se prosternou, exclamando, como antigamente: — Senhor!... Jesus recolheu-a brandamente nos braços e murmurou: — Maria, já passaste a porta estreita!... Amaste muito! Vem! Eu te espero aqui! (CAMPOS, 2015, p. 135)
A arquitetura narrativa permite ao leitor partilhar o universo íntimo das personagens, as quais tenderão todas à remissão dos erros pela via do sacrifício por amor de Jesus. Como toda literatura espírita, este romance se insere num projeto grandioso de levar ao leitor o conhecimento do Evangelho e dos ensinamentos sobre a vida no mundo espiritual. Isso se dá, em tese, pela adesão do leitor ao texto narrativo, que se faz por um conjunto de estratégias, que incluem a identificação com as personagens, o ritmo ágil das narrativas repletas de peripécias e, também, pela ação de narradores que julgam os atos das personagens a partir de valores da moral cristã resumidos no Sermão do Monte (benevolência, amor, resignação, humildade, mansidão, misericórdia, pureza, resiliência), em cuja conquista estará a perfeição dos Espíritos, que tendem todos, pela via de muitas experiências reencarnatórias, à angelitude. Personagens sublimes e torpes se misturam, interagem e elevam-se, tanto nas esferas terrestres quanto nas paisagens do mundo espiritual, ou pela via do amor, ou pelo concurso da dor. A exortação de Maria de Magdala aos leprosos – “[...] lhes explicava que Jesus havia exemplificado o bem até a morte, ensinando que todos os seus discípulos deviam ter bom ânimo para vencer o mundo” (CAMPOS, 2015, p. 133), ou seja, cultivar a fé, a coragem e a esperança diante das vicissitudes da vida, cujo enfrentamento contribui para edificar o Reino de Deus em nós, resume a essência do Evangelho, a Boa Nova que Humberto de Campos nos apresenta neste romance singular, que reúne em si as melhores qualidades da literatura espírita brasileira.
Referências:
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CAMPOS, Humberto de. Boa nova. Psicografia de Francisco Candido Xavier. 37. ed. Brasília: FEB, 2015.
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GIUSSANI, Luigi. O senso religioso: primeiro volume do PerCurso. Tradução de Paulo Afonso E. Oliveira. Jundiaí: Paco, 2017. Edição Kindle.
GIUSSANI, Luigi. Por que a Igreja. 3. ed. São Paulo: Companhia Ilimitada, 2015. E-book Kindle.
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KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. Tradução de Evandro Noleto Bezerra. 4. ed. Brasília: FEB, 2013a. Edição Kindle.
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TIMPONI, Miguel. A psicografia ante os tribunais. 5. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1978. — [1]Esse estudo foi apresentado no artigo “Quem lê livros espíritas” (SILVA; ABREU E SILVA,
2019). Chegamos ao perfil do leitor médio de livros espíritas: “[...] ela é do gênero feminino,
tem cerca de 50 anos, nível superior e renda entre cinco e dez mil reais; gosta de comprar
livros que depois da leitura ornam suas estantes particulares. Essa leitora lê principalmente
para obter conhecimentos, é estudiosa e praticante da Doutrina dos Espíritos, o que lhe traz
também consolação e conforto.” (SILVA; ABREU E SILVA, 2019, p. 14)
[2]Utilizamos, aqui, a 37ª. edição impressa, de 2015
[3]Faria (2019) informa que, em respeito às tradições judaicas, utiliza as denominações
Primeiro e Segundo Testamento para referir, respectivamente, a Bíblia judaica ou Antigo
Testamento da Bíblia cristã e o Novo Testamento cristão.
[4]Em que pese a necessidade de estudos que aprofundem, do ponto de vista teológico, a interlocução entre a Doutrina dos Espíritos e outras expressões religiosas da
cristandade, encontramos nos estudos de Luigi Giussani uma propo1. sta metodológica
de estudo sobre o acontecimento cristão (na perspectiva do catolicismo) que pode ser
empregada também ao estudo da literatura espírita, que é nosso objeto primeiro de investigação. Não quisemos partir dos discursos preconceituosos da academia que desqualificam como não literários os romances espíritas, imprimindo sobre eles uma visão
exótica, mas, antes, olhá-la a partir da experiência do leitor espírita, ou seja, de dentro
do fenômeno religioso, que é a forma justa, segundo Giussani, de conhecer uma dada
experiência.
[5]Utilizamos, aqui, a edição brasileira em formato de e-book (Kindle), de 2017
[6]Nossa edição, traduzida no Brasil, é a segunda, de 2003.
[7]Considerando que a obra de Giussani objetiva descrever o fenômeno do cristianismo
na história da humanidade; considerando, ainda, que o espiritismo é uma doutrina cristã,
não vemos objeção a que a abordagem metodológica do mestre católico italiano ilumine
também o estudo dessa doutrina. Não obstantes os pontos em que as cosmovisões espírita e católica entram em desacordo, em muitos pontos são elas concordantes, tendo
ambas como base educativa os ensinamentos morais do Rabi da Galileia.
[8]Kardecismo é o termo com que alguns estudiosos referem a Doutrina dos Espíritos;
por não ser de sua autoria, mas escrito por uma plêiade de Espíritos Superiores, o próprio Kardec sugere o uso de Doutrina dos Espíritos para referir esse conjunto de ensinamentos (cf. ROCHA, 2016).
[9]Fizemos uso da edição brasileira em e-book (Kindle) de 2015
[10]Na questão 459 do Livro dos Espíritos (2013a), Kardec pergunta: “Influem os Espíritos
em nossos pensamentos e em nossos atos?” (posição 12605), ao que os espíritos respondem: “Muito mais do que imaginais. Influem a tal ponto, que, de ordinário, são eles
que vos dirigem.” (id. ibid.).
[11]A atitude de dispor dos direitos autorais das obras psicografadas em favor de uma
entidade filantrópica se dá em consonância com a máxima evangélica: “De graça recebestes, de graça deveis dai” (Mateus 10, 8); sendo a mediunidade um dom divino, os
proventos oriundos de sua atividade não devem ser revertidos em benefício exclusivo e
particular do médium.
[12]. Sabe-se que Chico Xavier psicografava de forma inconsciente, ao passo que Yvonne
Pereira era transportada para outras realidades, as quais descrevia, posteriormente, em
seus romances
[13]“Eu sou um tubo por onde passa a graça de Deus”. É o que disse D. Giussani a Ana
Lydia Sawaya, referindo-se à obra que Deus, por seu intermédio, criou: o Movimento
Comunhão e Libertação (informação pessoal).
[14]Sobre a obra terrena de Humberto de Campos, ver ROCHA, 2008.
Notas