O Nabo Vermelho: o Haicai Japonês e a Mística Literária das coisas  
The Red Turnip: Japanese Haiku and the Literary Mystic of things 

Vinicius Tobias*
*Doutorando em Ciência da Religião pela Universidade Federal de Juiz de Fora. É mestre em Ciência da Religião e possui PósGraduação Especialização em Ciência da Religião pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Pesquisa temas relacionados às religiosidades pós-tradicionais na música e na poesia de contracultura. Contato: vinitobias00@yahoo.com.br

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Resumo:

O haicai japonês é uma forma poética que tem como temática principal a experiência com as coisas. O apontar das coisas no haicai está relacionado ao contexto zen em que teve origem, sendo uma representação da experiência de satori, iluminação súbita. Roland Barthes sistematiza no haicai três importantes operações semióticas: isso foi, é isso! e o apenas isso. Cada uma dessas operações apontam as coisas, sendo a primeira uma operação de autoridade, a segunda de insight e a terceira de naturalidade. Este artigo parte dessas reflexões em torno do haicai em busca de termos que permitam abordar poemas que expressam essa experiência religiosa e que se dão no contato com as coisas, no que proponho chamar de mística literária das coisas. Uma expressão que pretende reunir impulsos religiosos dentro da literatura que tenham semelhanças eletivas com aquilo que é expresso no haicai e que tenha autoridade, insight e que busque naturalidade nas coisas. 

Palavras chave: Mística literária das coisas; Haicai; Zen; Satori; Espanto 

Abstract

Japanese haiku is a poetic form whose main theme is experience with things. The pointing of things in haiku is related to the Zen context in which it originated, being a representation of the experience of satori, sudden enlightenment. Roland Barthes systematizes in haiku three important semiotic operations: that was it, that is it! and just that.Each of these operations points out things, the first being an operation for authority, the second for insight and the third for naturalness. This article, part of those reflections around haiku in search of terms that allow approach of poems that express religious experience that occur in contact with things, in what I propose to call the literary mystic of things. An expression that intends to gather religious impulses within literature that have elective similarities with what is expressed in haiku and that has authority, insight and search naturalness in things. 

Keywords: Literary mystic of things; Haiku; Zen; Satori; Amezement 

Introdução  

De origem japonesa, sob forte signo zen-budista, que é amplamente praticado no Brasil, o haicai é um poema de três versos e aproximadamente 5-7-5 sílabas tônicas. A forma foi criada por Basho no séc XVII, a partir da renga haicai, poema popular Japonês que começava com um mote de três versos. Lendo Basho (2008), é observável que o haicai era a celebração de um instante de iluminação e de contato sensitivo com o mundo ao redor, encenando o preceito de atenção plena, um dos pilares da meditação budista. 

Pretendo nesta reflexão alcançar o impulso simbólico do qual surge o haicai, impulso esse que o haicai enquanto símbolo ajuda a criar e a gestar. Para só então, em um momento posterior, utilizar essas operações simbólicas como termos de comparação em prol da identificação de algo que chamamos de mística literária das coisas para fim de estudo comparado desta experiência religiosa. O termo mística é escolhido aqui por se referir a certo tipo de postura religiosa extática que será identificado, que privilegia a experiência às formulações intelectuais, ou seja, algo sobre o qual é inútil explicar, falar; literária porque a literatura é o meio pelo qual ela se expressa, podendo ou não ser parte de uma tradição religiosa; e das coisas porque o contato com o que se encontra ao redor é o motivador da experiência extática. Assim, o haicai japonês, por ser literatura inserida em uma tradição pode fornecer os parâmetros centrais para a comparação com os quais poderemos medir as obras literárias no futuro e encontrar, nesse momento posterior, a mística literária das coisas sem o apoio de uma tradição religiosa, nesse caso, o zen-budismo. 

Por isso que afirmamos que estamos atrás do que o haicai japonês é enquanto símbolo, e, enquanto símbolo, eleger maneiras de acompanhar seus diálogos e mutações em outras manifestações literárias. 

Para o teólogo Paul Tillich (1985, p. 30-39) símbolos são algo mais do que sinais arbitrários. Os símbolos não só representam um conteúdo discursivo, como participam daquilo que representam. Os símbolos são, em certa medida, aquilo que representam. O símbolo institui, instaura e, em alguma medida é, uma contingência de sentido que forma e move toda a mentalidade de um povo. Um símbolo não muda de forma arbitrária, e se um símbolo muda ou morre, é com ele e por ele que o sentido social que representa muda ou morre. É por isso que dizemos que o haicai é símbolo de certa visão de mundo: ele representa, indica e é a expressão de uma consciência existencial. 

O que é proposto nesse artigo é extrair categorias para perceber as semelhanças de temas entre as poesias ocidentais e as japonesas da fase de desenvolvimento do haicai no futuro. E o tema em comum são as coisas, os contatos com elas. Enquanto esse tema é quase que universal no haicai, compondo uma doutrina poética clara, na cultura ocidental proporemos dizer que ela é evocada em uma mística que atravessa a literatura de maneira pouco perceptível e não sistematizada. De forma que uma sistematização e comparação podem trazer à luz certas características imperceptíveis de uma religiosidade poética quando ela se aproxima do tema das coisas em outras obras literárias na tradição literária ocidental. 

Isso, obviamente, é objetivo para um conjunto de artigos não sendo possível esgotar essa comparação no espaço que dispomos. Neste primeiro esforço, entretanto, proponho percorrer o caminho proposto por Roland Barthes (2005). Em seu curso chamado Preparação para o romance, cuja anotação está publicada, o autor dedica-se ao haicai japonês ao compará-lo à arte romanesca de Proust. O que nos interessa nessa exposição é quando ele elenca operações semióticas que chama de isso foi, é isso! e apenas isso. Operações semióticas essas que mimetizam a experiência de iluminação súbita zen (satori) como contato extático com as coisas ao redor. E a partir dos estudos desses haicais e de suas operações semióticas poderemos reter modelos para pensar sobre a temática das coisas na poesia ocidental, quando aborda o tema apresentando contornos místicos. 

1. O nabo vermelho e o espanto

Talvez um dos maiores exemplos do tema das coisas no haicai Japonês seja aquele que costumo chamar de “o poema do nabo vermelho”: 

no rio Hibernal 
arrancado e depois jogado ali 
um nabo vermelho (BUSON in BARTHES, 2005, p. 170)

Um poema que não diz nada mais do que aquilo dito. Costumamos apreciar poemas pela permanência de diversos sentidos e interpretações possíveis, apreciamos sua abertura. Não diria que esse é um poema fechado, mas é um poema que não se abre a quaisquer divagações. 

Há algo além ao nabo vermelho? Há o rio Hibernal, onde o nabo vermelho está. Só? Não, sabemos que ele foi arrancado e depois jogado ali. Como sabemos? Isto é, o que indica isso? Eu, particularmente, imagino suas raízes, seu despedaçamento, sua completa falta de propósito. Que ele se mostre em um estado de vida cujo apenas o arrancar e o jogar possa gerar. Mas isso é posto: arrancado, jogado. Ele permanece. Ainda podemos imaginar, ele boia sobre o rio? Eu o vejo sempre nas margens, entre a água rasa e a areia, um lugar com água parada, sujo, qualquer. Então ele não é fechado à imaginação, ele a provoca. Esse provocar vem da forma curta, da baixa quantidade de detalhes que é possível delinearem-se em três versos. Necessário para a formação de uma imagem mental (um nabo vermelho, arrancado e depois jogado ali, no rio hibernal) todo e qualquer detalhe a mais vem a reter a imaginação, a fechar as dúvidas sobre o estado exato, que atiça a imaginação. A experiência de cada leitor com algo arrancado e jogado vem à tona na impressão que se forma ao ler esse poema. Ele (o nabo vermelho) pode estar fora da água, flutuando, nas margens, na lama, no meio do mato ou das pedras. Então, sim, ele é aberto ao leitor, não é um texto que tenha apenas um sentido, que tenha recursos de extração do ruído. São abertos como poemas de forma geral o são. 

Entretanto a pergunta “o que você entendeu do poema?” tão comum às aulas básicas de literatura não se aplica. É que na nossa concepção de poesia, de texto, de mundo, a poesia é algo para ser interpretado. Qual ideia há por traz das palavras, das imagens? Nesse poema as palavras são um acender de fósforo para uma imagem, ela não tem sentido, é uma imagem, entretanto, que não quer dizer nada além de que havia no rio Hibernal, arrancado e depois jogado ali, um nabo vermelho.

Quando falo de haicai para alguém, pessoalmente ou academicamente, costumo recitar ou mostrar o poema do nabo vermelho. É muito interessante notar que a reação da maioria das pessoas seja a de dizer “não entendi” e tomar o poema por “obscuro”. Isso diz muito sobre nossa educação de leitura, em que outro mundo de sentido deve ser buscado através da comunicação. John Cage (in COX, 1975, p. 42) costumava a se referir a essa educação dos sentidos como hipotecária. Hipoteca-se o ouvir, o ler, e nesse caso a imagem poética a uma ideia que subsidiaria a mensagem, algo que deveria ser descoberto e guardado, como a verdade daquelas palavras. E assim o é com o mundo, em um mundo composto por objetos mortos, cuja vida emana do espírito e da criação, os presentes sensitivos são hipotecados em troca de um sentido único. 

Apenas o nabo vermelho. Mas, por que a dignidade de um poema ao nabo vermelho? Milhares de vezes nós vimos algo jogado por aí, atravessado no meio do caminho, repousando em seus sem-propósitos. Entretanto, embora as coisas aconteçam corriqueiramente, nunca é a mesma coisa. “(…) Never / never the same leaf turn again / the same leaves burn (…)” vai dizer o poeta beat Lawrence Ferlinghetti (s/d, p. 09). O fato das coisas sempre virem-a-ser de maneira semelhante, conjugada com a percepção de sua característica única, emula um tipo de sentimento próprio do perceber da coisa viva. Não a surpresa, que é o sentimento que vêm na descoberta do sentido de um discurso ou de um objeto, mas o espanto1 que é a percepção de se estar o tempo todo frente à eterna e constante criação do mundo. Frente ao modo de ser que as coisas sempre têm, mas que se organizam e acontecem o tempo todo, são também infinitas e sempre únicas. 

Há uma diferença aqui entre ser surpreendido pelas coisas e ser espantado por elas. A surpresa é a moeda de especialistas que comerciam planos e previsões. Somos surpreendidos quando as coisas não saem como previstas, ou quando seus valores – como especialistas são inclinados a dizer – afastam-se “do que se pensava anteriormente”. Somente quando um resulta do é surpreendente, ou talvez, contraintuitivo, supostamente nos damos conta. O que não é surpreendente é considerado desprovido de interesse ou importância histórica. Assim, a própria história torna-se um registro de falhas de previsão. Em um mundo em devir, no entanto, até mesmo o comum, o mundano, ou o intuitivo causam espanto – o tipo de espanto que advém a valorização de cada momento, como se, naquele momento, estivéssemos encontrando o mundo pela primeira vez, sentindo seu pulso, maravilhando-se com a sua beleza e nos perguntando como um mundo assim é possível. (INGOLD, 2015, p.112)

O tema das coisas, que impera no haicai japonês, parece caber bem nessa noção de espanto. Para Ingold (2015, p. 62), o espanto se dá em mentalidades que ele chama anímicas, que considera as coisas como vivas. Isso não seria um relativismo antropológico, e sim a maneira de ser das coisas. O tema de Ingold não é cultura e sim ontologia. A nossa cultura que considera as coisas inertes, apenas sujeitas às forças externas e carentes de espírito (mente ou alma) para viver, opera em uma lógica da inversão segundo o autor. Ingold (2015, p. 116-119) as coisas não são vivas porque alguma coisa as anima e sim porque estão mergulhadas em malhas de relações. Nenhum ser pode ser descolado de seu entorno, a isso que se refere a palavra ser, não há vida fora de algum contexto. A pergunta sobre o que é alguma coisa não pode ser respondida por uma definição suspensa, mas apenas pela descrição de suas relações e seus modos de ser. Assim, as coisas passam a ser entendidas como suas histórias, com o que aconteceu com elas. 

Nesse sentido, o autor argumenta que esse novo sentido para animismo é diferente do que os povos animistas afirmam, mas que é um pensamento em consonância com as preocupações desses povos. Para entender isso precisaremos de uma breve abordagem de Tim Ingold, apenas deixando um trecho em que define animismo ao qual se pode notar uma forte dialogia com o que esses poemas sugerem em relação às coisas. Tim Ingold é um antropólogo inglês que, à imagem do que fazem os teólogos cristãos propondo novas interpretações da tradição em diálogo com os novos tempos, propõe um novo conceito de animismo que possa inaugurar outro modo de relação entre o ser humano e o mundo. Segundo o autor (INGOLD, 2015, p. 62), animismo, é “trazer as coisas à vida”, reconhecê-las como parte integrante dos fluxos de materiais que caracterizam a vida. Assim, a vida é um contexto, não uma ânima interna, a vida está em toda parte, as coisas brotam da vida e a ela retornam. E é nesse sentido que se diz que as coisas têm “espírito”, pois são varridas pelo vento de seu eterno movimento: 

Trazer coisas à vida, portanto, não é uma questão de acrescentar a elas uma pitada de agência, mas de restaurá-las aos fluxos geradores do mundo de materiais no qual elas vieram à existência e continuam a subsistir. Essa visão de que as coisas estão na vida ao invés de a vida nas coisas, é diametralmente oposta à compreensão antropológica convencional de animismo (...) segundo a qual implica a atribuição de vida, espírito ou agência a objetos que são realmente inertes. É, no entanto, totalmente coerente com os compromissos ontológicos reais de povos muitas vezes creditados na literatura com uma cosmologia animista. No seu mundo não há objetos como tais. As coisas estão vivas e ativas, não porque estão possuídas de espírito – seja na ou da matéria – mas porque as substâncias de que são compostas continuam a ser varridas em circulações dos meios circundantes que alternadamente anunciam a sua dissolução ou – caracteristicamente com seres animados – garantem sua regeneração. O espírito é o poder de regeneração desses fluxos circulatórios que, em organismos vivos, estão ligados em feixes ou tramas firmemente tecidos de extraordinária complexidade. Todos os organismos são feixes desse tipo. Despojados do verniz de materialidade eles se revelam não como objetos quiescentes, mas como colméias de atividade, pulsando com os fluxos de materiais que os mantêm vivos. E a este respeito os seres humanos não são exceção. Eles são, em primeiro lugar, organismos, não bolhas de matéria sólida com uma lufada adicional de mentalidade ou agência para animá-los. Como tais, eles nascem e crescem dentro da corrente de materiais, e participam desde dentro na sua posterior transformação. (INGOLD, 2015, p. 62)  

Encontrando essa definição de espanto e sua relação com a noção anímica de ‘coisa’ podemos seguir para apreender de forma mais completa como se dá a operação de sentido a partir da coisa dentro do haicai e buscar as relações dessa atitude de espanto com o sentimento cultural-religioso no qual está imerso. 

2. O ruído da chuva de verão, isso foi

A autoridade do haicai encontra-se na operação semiótica que Barthes chama de isso foi. O “isso” nesta elocução do autor refere-se a uma atitude demonstrativa, e se repete nas duas definições subsequentes. Quando diz então que a autoridade do haicai reside na demonstração de algo, diz que a razão de ser de um haicai é a existência de algo que foi visto. Em uma conjugação de banal e glorioso, a experiência do ver (mais comum), mas também do viver, sentir, tatear, ou cheirar é celebrada como epifânica. Assim ele dá os seguintes exemplos comentados: 

O gatinho 
Fareja 
O caracol 
(Saimaro, Coyaud) 
Vimos isso mil vezes: o espanto de um gatinho diante de um objeto que ele não conhece  Mesmo movimento dúplice: reconhecimento, repetição = signo + sensação viva, irrecusável, de que aquilo se refere a determinada vez (o Semelfativo). Haicai: signo (já que é reconhecido) e, no entanto, “espantoso”; talvez seja a definição da escritura: algo de divino (esse Signo), epifania. 
Nenhum outro ruído 
Salvo a chuva de verão 
Na noite 
(Issa, Munier) 
Mesmo efeito: é reconhecido como tendo acontecido muitas vezes, mas, ao mesmo tempo, na “Glória” do “Isso aconteceu uma vez”, tal (repito: “Glória” = manifestação do ser). Percebe-se o estar ali daquela chuva, ausência de sentido, de interpretabilidade  Haicai: signo não tem sentido. (...) Haicai e Fotografia são autoridades puras, que não precisam buscar autorização em nada, salvo nisto: isso foi  Talvez esse poder venha da forma breve (BARTHES, 2005, p. 149-150)

Sem sentido: qual é o sentido do nabo vermelho, do gatinho brincando, do ruído da chuva de verão? Eles representam aquilo que são. Entretanto essas coisas vêm ao leitor pelo haicai em sua glória do “uma vez acontecido”. O haicai não espera partilhar um sentido e sim uma celebração de uma epifania. De uma manifestação do ser, como aponta o autor. 

Quando a autoridade de um haicai reside no isso foi, o que justifica o poema é a existência do contato do poeta com as coisas. Como na fotografia, apenas o sugerir de uma imagem. A diferença entre haicai e fotografia é a gradação de informações. Enquanto a fotografia não pode se furtar de nenhum detalhe captado pela luz em seu corte (embora selecione o que do contexto quer mostrar e sob qual perspectiva, e por qual regulação de abertura do diafragma, tempo de exposição, etc), o haicai é evasivo em detalhes. Essa evasão revela para a questão celebrativa do haicai, como um apontar de dedo de uma criança que vê e exclama: -uma vaca! Não está em jogo o que é uma coisa, sua característica, seu ser, sua definição, mas o fato dela compor o contexto, manifestar-se como realidade diante do olhar, do sentir: apesar de tudo, fruto de tudo.   

3. O som da água, é isso!

Embora o isso foi seja onde resida a autoridade do haicai, é no é isso! que podemos encontrar seu substrato religioso mais fundamental: a iluminação súbita. 

O Zen é o nome japonês da escola budista Chan, nascida na china. O nome deriva da palavra sânscrita dhyâna, que designa o momento de preparação para prajna (sabedoria), dhyâna corresponderia à prática e aos exercícios de meditação e concentração. O Zen japonês foi todo gestado filosoficamente na China, desenvolvendo no Japão um refinado sistema cultural, constituído por um leque de práticas e artes que levou essa escola a ser conhecida no mundo inteiro. Entre elas, o haikku, o budô, a arte marcial da espada, a arte cavalheiresca do arco e flecha, a cerimônia do chá e o ikebana, arte dos arranjos florais. Embora florescendo na questão cultural e no desenvolvimento de práticas, o corpo doutrinário (se é que se pode chamar assim2 ) persiste o mesmo desenvolvido na China. Bashô, fundador da forma poética haicai, era monge Zen e seu mito de iluminação, que veremos adiante, se dá a partir da agudeza de percepção que desenvolveu e expressou com o haicai.

A principal contribuição do Zen3 para o Budismo é a ideia de iluminação súbita, (chamada de satori no Japão). Essa ideia parte de uma linha de interpretação de um texto sagrado que se tornou central na china budista: o Sutra de Lótus.  

De acordo com esse sutra, que se tornou um dos textos religiosos mais populares de toda a Ásia Central, o Buda não veio a este mundo senão para trazer a salvação, ou seja, uma iluminação igual à sua destinada a todos os viventes sem discriminação. Todo homem, e mesmo todo ser animado, possuindo a natureza-de-Buda (em chinês foxing) pode tornar-se Buda. O universo inteiro torna-se assim Buda em potência, e tudo quanto acontece nada mais é senão a manifestação dessa natureza-de-Buda (tathâgata-garba). A escola (Tiantai, predecessora do Zen) está tão dominada pelo espírito de inclusão que com o nono patriarca, Zhanran (711- 782), ela será levada a reconhecer que a natureza-deBuda não está presente apenas em todo ser vivo, mas também nas coisas inanimadas, como montanhas, rios e até no menor grão e poeira. (CHENG, 2008, p. 447- 448)

Enquanto a ideia de iluminação súbita caracteriza o Zen, a noção de natureza búdica fornece a terra sobre a qual essa ideia nasce. O próprio mito de geração da escola (não atestado nos textos canônicos) exemplifica essa noção. Conta a tradição (CHENG, 2008, p. 458) que Buda reuniu seus discípulos no monte dos Abutres para dar seu ensinamento final, nele, senta-se diante a plateia e segura uma flor. Os discípulos ficam consternados, embora não se manifestem por respeito à autoridade do Iluminado. Em dado momento Kâsyapa ri emocionadamente, entendendo subitamente o que Buda queria apontar, e se ilumina. Dessa maneira ele comove Kâsyapa, sem palavras, diretamente, fora das escrituras, ensinando assim o Olho da Verdadeira Lei. Essa seria a origem da escola Lanka que teria supostamente sido levada para a China pelo fundador mítico do Zen, Bodhidarma. 

Além da iluminação súbita, da reivindicação das origens indianas em contexto de Buda vivo com essa suposta origem com um discípulo direto. Além do ensinamento intuitivo e não pelas vias intelectuais (falas, textos), a partir do provocar a experiência pura. Além de tudo isso há um fato quero destacar: Kâsyapa encontra sua iluminação ao olhar para uma flor. 

Ao contemplar a flor, Kâsyapa extingue-se em favor à natureza-búdica, que também pode ser chamada de vazio. Como absoluto, um vazio que permeia todas as coisas, que são todas as coisas em sua manifestação e condição de possibilidade para novas realidades. 

Gary Snider, mestre zen, poeta beat e acadêmico da área de literatura, resume como essa perspectiva religiosa dita uma pedagogia do olhar e uma relação toda própria com a linguagem:  

Dogen, filósofo Zen budista do século XII, expressou isso do seguinte modo: “Impor sua própria experiência sobre o mundo dos fenômenos é ilusão. Quando o mundo dos fenômenos aparece e experimenta a si mesmo é iluminação”. Ver uma corruíra num arbusto, chamá-la de “corruíra” e continuar caminhando é (conferindo-se auto-importância) não ter visto nada. Ver um pássaro e parar, observar, sentir, esquecer de si por um momento, permanecer nas sombras do arbusto, talvez então sentir-se “corruíra” – isso é ter se fundido, num momento mais amplo, com o mundo. (SNIDER, 2005, p. 275)

De forma similar ao mito de Kâsyapa e da reflexão de Dogen comentada por Snider dá-se a exemplificação da iluminação de Basho, o inventor da forma poética haicai como a conhecemos hoje. O mestre do poeta em suas atividades monásticas chamava-se Bucchô. Leminski (2013), na biografia que escreveu de Basho, conta que Bucchô o reeprendia por dedicar-se demasiadamente ao haicai, forma poética que até a formulação de Basho, era apenas uma diversão frívola. 

Basho então dizia ao seu mestre: ‘o haicai é apenas o que está acontecendo agora’. O mestre aceitava, mas via aquilo como um empecilho ao seu desenvolvimento. Certo dia, a caminho de uma visita ao monge- -poeta, em que o acompanhava uma pessoa chamada Rakusô Gohei, o estado mental de Basho os atingiu como um raio. Gohei ao entrar no quintal e avistar Basho grita:  

-Como vai a Lei de Buda neste jardim quieto com suas árvores e ervas? 
Bashô respondeu: -Folhas grandes são folhas grandes, folhas pequenas são folhas pequenas. 
Bucchô, então, aparecendo disse: -De uns tempos pra cá, qual tem sido seu empenho? 
Bashô: -A chuva em cima, a grama verde está fresca. 
Então, Bucchô perguntou: -O que é esta lei de Buda, antes que a grama verde começasse a crescer? 
Neste momento, ouvindo o som de um sapo que pulava a água, Basho exclamou: 
O som do sapo saltando na água. 
Bucchô ficou cheio de admiração a esta resposta, considerando-a uma evidência do estado de iluminação atingido por Bashô. 
Deste momento data esta microilíada zen, o mais célebre haikai, o mais lembrado poema da literatura japonesa, isto de Bashô: 
   velha lagoa 
o sapo   salta 
   o som da água 
(LEMINSKI, 2013, p. 92) 

Pelo diálogo, vemos que Basho permanecia em um estado amplamente suspenso de julgamentos sobre a realidade cotidiana. As perguntas e respostas, antes do salto do sapo, soam como algo comum dentro de uma perspectiva de forma (coisas) sendo elas manifestações do vazio. Entretanto, quando a pergunta é feita sobre a Lei de Buda antes de a grama crescer, abre-se um suspenso. Antes de uma pergunta causar a reação em Basho, não havia grama na consciência, da mesma maneira que não havia Lei de Buda. E o que há antes da grama enquanto Lei de Buda a aparecer como percepção de fenômeno aos presentes a partir da pergunta de Gohei? O som do sapo pulando na lagoa. 

Mais do que uma desconversa, mais do que uma fuga à ausência de sentido das coisas, mais além ainda da Lei de Buda, além da própria ideia de além, encontra-se o sapo pulando na água. 

Segundo Barthes, essa experiência de iluminação súbita seria mimetizada pela própria forma do haicai. A descrição da forma do poema contém em si mesma esse princípio. O poema, no formato clássico, começaria com o kigô, uma expressão que remetesse à estação do ano, gerando uma liga contextual para a imagem a seguir. No segundo verso encontrar-se-ia o fato único, aquilo que chamaria a atenção a partir do contexto como descortinador, e após, o terceiro verso retoma a ordem do espanto vivido. Nem todo haicai obedece a essa organização, mas o momento do espanto, do tilt, como diz Barthes, permanece. 

Desta maneira, a partir da operação semiótica do tilt o haicai mantém o horizonte de sentido do Zen de iluminação súbita, apontados a partir de acontecidos e visualizações. É essa operação semiológica que Barthes vai chamar de é isso! 

Na jarra de água flutua 
Uma formiga 
Sem sombra 
(Seishi, Coyaud)(...) 
“Isto, Isto” 
Foi tudo o que eu pude dizer 
Diante das flores do monte Yoshino 
(Teishitsu, Coyaud) 

O “É isso” (o tilt) do haicai, tem uma relação evidente com o Zen: a começar pelo satori (= tilt), mas também por uma noção do Zen que é o Wu-shi: “Nada de especial”; as coisas são reduzidas em sua naturalidade, sem comentário = é a visão sono-mana = “Tal como é” (vimos, por uma citação de Michelet, que Tal é a palavra que designa bem o espírito do haicai), ou “Precisamente assim”  Evidentemente o contrário do realismo que é, sob pretexto de exatidão, atribuição desvairada de sentido. O Wu-shi: uma maneira de frustrar o desejo de interpretação, isto é, de “dissertar seriamente sobre o sentido das coisas”. Exemplo: um monge perguntou, um dia a Feng Hsüeh: “Quando a palavra e o silêncio são ambos inadmissíveis, como se pode evitar cair no erro?” O mestre respondeu com dois versos: Sempre me lembro de Kiangsu em março / O pio da perdiz, todas aquelas flores perfumadas! (BARTHES, p. 165-167, 2005) 

Esta definição de Barthes que relaciona o espanto construído pelo haicai com o satori já traz, com a noção de wu-shi, a última operação de sentido que o autor elenca no hacai, o apenas isso. 

4. Ao ver um raio, apenas isso

O pensamento Budista Zen sobre o vazio tende a um monismo holista. Todas as coisas são vazias, há a natureza-de-Buda em tudo que existe, essas são afirmações de um tipo de mentalidade anímica que foi gestada dentro de certas correntes do budismo e que prevalecia na china, principalmente entre os daoístas. O Zen, e as demais correntes do budismo que enfatizam a natureza búdica desse mundo, poderiam encaixar-se nesse tipo de racionalização se não fosse pelo fato de que no avançar da iniciação haja uma série de práticas de desaprendizado dessas premissas. Quando o satori é alcançado, imediatamente o constructo intelectual sobre a natureza-de-Buda (entendido como necessário para o caminhar do ainda não-iluminado) é abandonada em favor da experiência pura com a existência. Por isso, a maioria dos mondos e koans4 destaca o contato com as coisas ao redor. 

Essa tendência, já existia na gênese indiana do conceito. Buda, já nos primeiros textos da tradição (ANDRADE, 2013) alertava para o perigo de tomar o conceito de vacuidade de maneira substancializada. Mas a defesa mais veemente do caráter utilitário da vacuidade vem de Nagãrjuna, no século II da era comum. T

Todavia, o próprio Nagãrjuna lembra a importância de se relativizar o próprio conceito de vacuidade, admoestando os budistas a se acautelarem com o conceito. Um fragmento tibetano do Boddhicittavivarana aponta o problema: uma “coisa” é simplesmente uma fabricação mental; vacuidade é a ausência de fabricações mentais. Onde fabricações mentais surgem, como pode haver vacuidade? A própria vacuidade é, ela mesma, vazia e interdependente, um mero constructo mental que serve a uma finalidade metodológica específica. “Pobre daquele que se apega à vacuidade!” é um refrão constante de Nagãrjuna. Uma vez corretamente utilizada, a própria vacuidade deve ser também superada e descartada, como um hermético que é expelido do corpo junto com o resultado. (ANDRADE, 2013, p. 143)

O Zen tenta desvencilhar-se desta premissa conceitual, como vimos, de forma diretiva e sensória e, mais importante para nós, voltando-se para as coisas.

Ao lhe perguntarem: “Se todos os fenômenos retornam ao UM, para onde o Um retorna?”, o mestre zen Joshu disse simplesmente: “Quando eu morava em Seiju, fiz uma túnica de cânhamo que pesava dez libras.” Este é um mondo (dito) útil e salutar para ser lembrado pelo leitor ocidental. Ele vai protegê-lo da tentação quase irresistível de pensar o zen em termos neoplatônicos. O zen não é um sistema de monismo panteísta. Não é nenhum tipo de sistema. Recusa-se a fazer qualquer afirmação sobre a estrutura metafísica do ser e da existência. Aponta, antes, diretamente para o próprio ser, sem se entregar à especulação. (Comentário meu: no entanto o mondo parece se referir que o UM retorna ao todo, como o ciclo de Tai-gi. A diferença é que a afirmação nesse caso vai para uma esfera extra-filosófica. Ele não diz isso, o mestre que parece fugir da pergunta na verdade a demonstra de uma forma potente e realista pra onde foi que o UM retornou.) (MERTON, 2006, p. 16)  

Ou seja, o Um retorna ao bastão de cânhamo. O monismo panteísta para o qual nos leva a ideia central da religião é o que o Zen luta mais incansavelmente contra a partir de suas práticas. A operação de sentido religioso é a mais sutil. Ao contrário de Nagãrjurna, não se espera contrapor um argumento com outro, mas abandonar o conceito a partir da experimentação radical do que ele aponta. Daí o foco na meditação, no esvaziamento de sentido, nos labirintos linguísticos, na infusão das coisas no líquido quente da mente fervida pela meditação. 

Concordo com o comentário que Merton faz na citação acima. Acredito que essa leitura possa se aplicar ao mondo de iluminação de Basho. Basho não torna a Lei de Buda sobre a qual é perguntada algo inútil, ele encontra a verdade que ela contém além da conceituação. Um antes imediato de Natureza-Buda manifesta. Antes do pronunciamento do termo Lei de Buda, o que havia? Natureza búdica manifesta no som do sapo, sendo a conceituação de tal coisa um fenômeno derivativo de um fenômeno sempre observável ao redor. Daí a prevalência da experiência com as coisas sobre as ideias.  

Alcançando esse estado (satori, mimetizado pelo haicai como é isso!) a necessidade de conceituações é superada, e há um entender da naturalidade da experiência (wu shi, mimetizado pelo haicai como apenas isso). 

A falta de interpretação – de “interpretabilidade” (ou o desafio à interpretação) – do haicai (ou do Wu-shi) não é uma ingenuidade, é antes uma terceira volta de parafuso dada à linguagem (linguagem sobre o fato). Eu me explico: uma parábola Zen diz, num primeiro tempo: as montanhas são montanhas; segundo momento (digamos de iniciação): as montanhas não são mais montanhas; terceiro momento: as montanhas voltam a ser montanhas  É uma volta em espiral  Poderíamos dizer: primeiro momento: o da Tolice (ela existe em todos nós), momento da tautologia arrogante, do antiintelectualismo, um vintém é um vintém, etc; segundo momento: o da interpretação; terceiro momento: o da naturalidade, do Wu-shi do haicai. –Esse processo: de certa forma, uma volta da letra: o haicai (a frase bem feita, a poesia) seria o termo de um encaminhamento, a assunção em direção à letra como dicção simples, a letra é difícil. (...) Dialética: a exatidão, a justeza, o É isso, são atingidos – mas, por isso mesmo, o limite da linguagem: o haicai vai oscilar (evita oscilar) – ou está em vias de oscilar (lembremo-nos de Utsuroi) e cair no nada do dizer: o nada a dizer  o destino do “É isso” é “É apenas isso, não há mais do que isso”. (BARTHES, p. 167-168, 170, 2005)

Embora no texto do autor o poema do nabo vermelho que analisamos de saída esteja exemplificando a operação do apenas isso, os outros dois momentos de isso foi, e de é isso! estão presentes. Com o apenas isso, o haicai faz jus aos sistemas de desnaturalização do discurso filosófico que fundamenta a prática e que poderia permear a poesia gerando devaneios sobre coisas elevadas contidas na tradição e no senso comum como, por exemplo, a impermanência, o sentido da vida, a iluminação, a natureza... 

Com essas três operações, o haicai de maneira intuitiva e enfática conjuga os vetores principais dos influxos do Zen. Pelo processual, pela glória da manifestação do ser, e finalmente pela sua naturalidade. Assim, a superação dos discursos explicativos é realizada de uma maneira simples, breve e trovoante. Impondo a coisa frente à elaboração. 

Como é admirável 
Aquele que não pensa “a vida é efêmera” 
Ao ver um raio 
(BASHO in BARTHES, 2005, p. 164)

Conclusão

Tendo isso em mente, é possível entender o haicai como um texto que se refere à experiência extática, senão como descritivo da experiência extática, com a função de celebrá-la e, em certo sentido, educar os sentidos para ela. 

Essa experiência a que se refere, entretanto, é a própria experiência com as coisas. É notável como o contato com as coisas como dispositivo de iluminação é comum a vários mondos, koans, na história de iluminação de Basho e na história de iluminação de Kâsyapa. Constando, portanto, na origem mítica do Zen. As coisas que se podem ver, cheirar, ouvir, tocar, saborear e apontar representam o além desse impulso religioso que quer diluir até mesmo suas próprias formulações sobre a diluição da realidade. Dessa forma, o Zen guarda suas especulações sobre o ser apenas como indutivo da experiência de iluminação súbita, tendo nessa experiência a única legitimidade possível: É isso! 

Não por acaso, o tema das coisas é quase que único no haicai. Examinar o tema das coisas no haicai permite perceber como esse reencontrar com a natureza búdica se dá além de quaisquer intermediadores. É no reencontrar com as coisas, com aquilo que sempre esteve à nossa volta suportando, mediando e compondo a existência, que acontece a iluminação. 

Dessa forma, o satori Zen pode ser um exemplo/alegoria do espanto segundo entendido por Ingold (2015, p. 112) como uma experiência de ver as coisas como se fosse primeira vez, em um momento onde elas são sentidas enquanto vivas, ao experimentar o que esse autor chamou de anímico. 

A equivalência eletiva entre satori/espanto unida à identificação do tema das coisas na poesia ocidental pode, portanto, abrir novos possíveis horizontes comparativos entre culturas que auxiliem a compreensão de místicas (experiências religiosas que levam a calar, ao apenas isso) expressadas por peças literárias ocidentais que guardem essas características, mas cujo sentido social seja mais difícil de alcançar, por não estarem inseridas em um contexto de hegemônico pensar religioso de um povo e uma época. Desejo explorar, em próximos trabalhos, esses horizontes comparativos utilizando as definições de isso foi, é isso!, e apenas isso para medir peças literárias exógenas à tradição Zen. É importante frisar que esse intuito comparativo já está presente na própria elaboração destes termos por Roland Barthes, que opera uma comparação entre o haicai japonês e o romance de Proust. 

Assim, tendo essas três características, será possível perguntar às peças literárias se 1) Ela busca legitimidade na existência de algo, no isso foi. 2) Se sua razão de ser é o espanto com as coisas, o é isso! e 3) Se ela move o discurso em função da naturalidade daquilo percebido, exaltando o corriqueiro da manifestação contínua do ser. Perguntando assim à obra de arte se ela expressa ou não a mística literária das coisas. 

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Notas

[1]  Alberto Pucheu (1998) resgata a noção de admiração ou espanto para dizer sobre o impulso originário tanto da filosofia como da poesia. Faz isso com referências aos diálogos de Sócrates e a Aristóteles (p. 24) nos quais contém a ideia de que o poeta é também filósofo, pois “ambos se espantam com o admirável descobrindo-o sem caminho, sem saída, perplexos diante da constante aporia que a vida nos impõe.” Entretanto, a esse trabalho se optou a incorporar o termo tal qual Tim Ingold o concebe e que será apresentado em seguida, pois aí há a diferenciação entre espanto e surpresa, como discriminação de dois paradigmas culturais.   

[2] .Alguns autores costumam referir-se ao Zen como algo não-religioso, pelo baixo grau de importância das noções mágicas e extra-mundanas. Encontramos isso no famoso O dossel sagrado do Berger (1985), no qual ele afirma que Zen não é religião e sim experiência pura, e no livro de consulta a esse trabalho História do Pensamento Chinês, de Anne Cheng (2008). Acredito que a afirmação de Cheng de que o zen não teria “nenhum caráter religioso” (p. 466) parte de uma visão estreita de religião que considera religião enquanto culto a divindades, desta maneira seria mais exato dizer que não se encontra no Zen nenhum caráter encantado. Em Berger isso se encontra em um contexto de religião enquanto construção social da realidade, o Zen em seu discurso de desconstruir a possibilidade de quaisquer realidades criadas socialmente fugiria a sua definição. Talvez isso seja comprar de início, e a partir do discurso, a ideia do Zen. Com olhos de cientista da religião o Zen não falta em nada com aqueles quesitos clássicos que caracterizam a religião, a saber, mitos, ritos, doutrina, coesão social gerada por uma ideia comum, estrutura monástica a formar uma elite detentora dos saberes daquele sistema de (anti) crenças, de forma que não há motivo por se demorar esse debate e considerar o zen, apesar do discurso dissolutivo, uma religião. Como de fato essa doutrina se coloca e é reconhecida socialmente.   

[3] Mesmo referindo-me à China chamarei o Chan de Zen, pois é essa a palavra usada no Brasil e em todo ocidente para essa escola, seja lá de onde venha.   

[4] Mondos são ditos sobre iluminação e sobre a relação mestre-discípulo onde a noção Zen de iluminação é abordada, durante esse texto foram arrolados muitos mondos, inclusive o da iluminação de Basho pode ser considerado um deles. Koans são perguntas/ nós feitos pelos mestres para levar o discípulo à iluminação.