Márcia Maria de Oliveira*
Emerson Sbardelot**
*Doutora em sociedade e Cultura na Amazônia; professora da Universidade Federal de Roraima; assessora da Rede Eclesial Pan-Amazônica – REPAM; perita do Sínodo Especial para a Amazônia (2018-2019). Contato: marcia.oliveira@ufrr.br
**Doutorando e Mestre em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Membro do Grupo de Pesquisa Literatura, Religião e Teologia - LERTE Contato: sbardelotti@gmail.com
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O presente artigo foi inspirado pela comemoração de 25 anos da publicação de dois livros importantes: 1. Ecologia: Grito da Terra, Grito dos Pobres – Dignidade e direitos da Mãe Terra2 , de Leonardo Boff; 2. Teologia e Literatura: Reflexão teológica a partir da Antropologia contida nos romances de Jorge Amado3 , de Antonio Manzatto. Nestas obras encontramos o diálogo frutífero entre Teologia da Libertação e Ecologia, e o diálogo salutar entre Teologia da Libertação e Literatura. O objetivo do artigo é mostrar, a partir destes diálogos, as canções que abordam a questão ecológica, que ressurgem e, ou germinam, com um novo ar primaveril, amazônico, samaritano, numa Igreja que procura estar em saída, toda ministerial e sinodal, no seguimento a Jesus de Nazaré. São três canções: de artistas da Música Popular Brasileira e das Músicas da Caminhada que, ajudam-nos a refletir o papel da poesia em diálogo com a ecoteologia, e como tais canções fazem perceber as raízes éticas e espirituais dos problemas ambientais, convidando-nos a uma mudança de comportamento, a uma mudança profunda enquanto seres humanos. A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica e vídeos do YouTube com as canções.
Palavras-chave: Ecoteologia da Libertação; Poesia; Canções
This article was inspired by the celebration of 25 years of the publication of two important books: 1. Ecology: Cry of the Earth, Cry of the Poor – Dignity and rights of Mother Earth, by Leonardo Boff; 2. Theology and Literature: Theological reflection from the Anthropology contained in the novels of Jorge Amado, by Antonio Manzatto. In these works we find the fruitful dialogue between Liberation Theology and Ecology, and the healthy dialogue between Liberation Theology and Literature.The objective of the article is to show, from these dialogues, the songs that approach the ecological question, which reappear and, or germinate, with a new spring air, Amazonian, Samaritan, in a Church that seeks to be on the way, all ministerial and synodal, following Jesus of Nazareth. There are three songs: from Brazilian Popular Music artists and the Songs of the Walk, which help us to reflect on the role of poetry in dialogue with ecotheology, and how such songs make us understand the ethical and spiritual roots of environmental problems, inviting us to a change of behavior, a profound change as human beings. The methodology used was bibliographic research and You Tube videos with the songs.
Keywords: Liberation Ecotheology; Poetry; Songs
Poucas foram as vezes que canções populares ou canções religiosas abordaram, fora de um contexto específico, a questão ecológica. Pretende-se apresentar uma reflexão que dialogue com letras de canções, compostas em épocas diferentes, de vivências diferentes, que ressurgem ou germinam no chão e no cotidiano de uma Igreja que pretende estar sempre em saída, ser toda ela ministerial e sinodal, amazônica e samaritana. Levando-nos a questionar o papel da poesia no encontro que faz com a denúncia dos problemas ambientais que enfrentamos no Brasil, problemas que afetam todo o planeta Terra.
A análise das letras das canções que escolhemos, anunciam um novo tempo e denunciam a devastação causada pelo ser humano contra a natureza; leva-nos a entender que antes mesmo da palavra ecologia estar na moda, ser divulgada como hoje, já havia uma intuição, um alerta de que algo poderia dar errado no presente e no futuro. De certa forma, se tornou profecia esteticamente hodierna; contudo, o grito da Terra e o grito dos pobres já ecoam por elas.
A reflexão que germina da letra de uma canção jamais é neutra. Remete a um processo de escuta da criação e de educação para a liberdade:
MEU LIVRE GRITO HUMANO
Quero plantar nesta
Amazônia o meu grito humano,
a minha protestante fé libertadora,
a derramada tocha do meu sangue.
Eu sei que a semente será um dia colheita convocada (CASALDÁLIGA apud GUERRERO, 2016, p.136).
É preciso atender o convite urgente do Papa Francisco para renovar o diálogo sobre a maneira como estamos construindo o futuro do planeta: “lanço um convite urgente a renovar o diálogo sobre a maneira como estamos construindo o futuro do planeta. Precisamos de uma solidariedade universal” (LS n. 14). O nosso futuro está conectado ao cuidado e ao respeito; a uma nova forma de dialogar com a natureza, um novo modo de experimentar Deus. É o novo paradigma: “tudo está interligado, como se fôssemos um. Tudo está interligado, nesta Casa Comum” (LS, n. 16)4 . Somos uma única entidade sagrada: humanidade e terra!
Até quando ficaremos sobre a natureza e não com a natureza? Até quando consideraremos a Terra como algo inerte e sem propósito? Porque é tão difícil enxergar a Terra como Mãe, cheia de vitalidade? De esperança em esperança, poderemos garantir um futuro bom para a Terra e para nós. O futuro está em nossas mãos!
Este artigo se concentra no diálogo entre a Ecoteologia e Poesia, Ecoteologia e Canções, onde objetivamos encontrar um terreno fértil para analisar e refletir teologicamente algumas letras de canções que explicam a urgente defesa da vida na Terra, a defesa do planeta Terra. Por volta de 33 canções5 , de artistas populares e religiosos foram escutadas, apenas três, entraram neste artigo por conta de seu valor histórico e de seu locus theologicus.
“A humanidade tentou de tudo, exceto amar”.
Théodore Monod
Os seres humanos fazem parte da natureza. Sua sobrevivência está atrelada diretamente à natureza. Portanto, não basta apenas defender os biomas e os animais, é preciso também defender a melhoria concreta da qualidade de vida das populações. Defender a natureza não se resume apenas em buscar um novo relacionamento de nossa espécie com o planeta, mas principalmente em buscar um novo relacionamento entre os próprios seres humanos.
Nesta mesma perspectiva, em seus Manuscritos econômicofilosóficos, escritos em 1844, Karl Marx afirmava que “o ser humano é parte da natureza”. E dizia ainda, “o ser humano vive da natureza. Isto significa que a natureza é seu corpo, com o qual ele precisa estar em processo contínuo para não morrer” (MARX, 2015, p. 116). Nesta direção, Leonardo Boff argumenta que somos obrigados a tomar a história em nossas mãos e decidir se queremos prolongá-la sobre este planeta ou se a encerraremos dramaticamente (BOFF, 2022, p. 22).
Contudo, Luiz Carlos Susin, apresenta-nos o significado da palavra ecologia, que não abarca apenas a natureza, mas também a sociedade e a cultura:
A palavra ecologia foi criada em 1866 por Ernst Haeckel, biólogo alemão, discípulo de Charles Darwin. Naquela época, ele definiu assim a ecologia: estudo dos relacionamentos de todos os seres vivos e não vivos entre si e com seu entorno. Todos moram juntos na Casa Comum que é a Terra e juntos se entreajudam para se alimentar, se reproduzir e coevoluir. Ecologia é uma palavra composta de duas palavras gregas: oikos, que significa casa; e logos, que quer dizer estudo. Portanto, ecologia quer dizer o estudo que se faz acerca das condições e relações que formam o habitat (casa) do conjunto e de cada um dos seres da natureza. Hoje, enquanto conceito, ecologia representa a relação, a interação e o diálogo que todos os seres (vivos e não vivos) guardam entre si e com tudo o mais que existe. A natureza (o conjunto de todos os seres), desde as partículas elementares e as energias primordiais, até as formas mais complexas de vida, é dinâmica; ela constitui um tecido intricadíssimo, com conexões por todos os lados. A ecologia não abarca apenas a natureza (ecologia natural), mas também a cultura e a sociedade (ecologia humana, social etc.). O certo é que da primeira definição até hoje são muitas as variações no conceito de ecologia e, portanto, da interpretação que ela oferece à realidade. Esta variação se baseia em três eixos: o reconhecimento e vinculação do ser humano na rede de relações dos organismos vivos, o que gerou um diálogo entre ciências naturais e ciências sociais; o surgimento do conceito de ecossistema (Tansley, 1935); e a dimensão de escala do oikos, porque não se trata mais só do âmbito vital de uma espécie, e sim do caráter planetário e cósmico da vida (SUSIN & SANTOS, 2011, p. 50).
Até o presente momento, pensou-se o futuro do planeta e do Brasil a partir do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), com o aumento constante e sem limite da máquina industrial em todas as frentes, inclusive, com a intensificação do agronegócio. Vem à tona a consciência de que caminhamos para situações inviáveis, já não só para nosso povo, mas para toda a humanidade.
Três desafios se impõem: o desequilíbrio mundial no que se refere às condições de vida dos continentes e países; a instabilidade climática e a impossibilidade de manter os recursos imprescindíveis da terra. Assim:
A ecologia integral e a Teologia da Libertação possuem algo em comum: ambas partem de um grito. A ecologia do grito da Terra, dos seres vivos, das florestas, das águas, dos solos e dos ares agredidos pelo tipo de crescimento material ilimitado da cosmovisão predominante, especialmente o grito da Terra, planeta já velho e com baixa imunidade. A Teologia da Libertação nasceu ao escutar o grito dos pobres econômicos, das classes exploradas, das culturas humilhadas, dos negros discriminados, das mulheres oprimidas pela cultura patriarcal, dos LGBTI e dos portadores de necessidades especiais. Todos são explorados e gritam. Gritam por libertação. Dessa preocupação nasceram várias tendências da ecologia: uma Teologia da Libertação sociopolítica, feminina, indígena, negra, cultural, pastoral, integral, entre outras. Em todas elas, é sempre o respectivo oprimido o sujeito e protagonista principal de sua correspondente libertação. Importa lembrar que já nos anos de 1980 ficou claro para alguns teólogos e teólogas da libertação que a mesma lógica que explora os oprimidos e as classes empobrecidas também explora a natureza e a Terra. é sabido e cabe ressaltar que a marca registrada da Teologia da Libertação é a opção pelos pobres, contra a pobreza e em favor da justiça social e de sua libertação. Dentro da categoria pobre deve ser incluído o Grande Pobre, que é a Terra, nossa Mãe, Terra que é torturada e crucificada. Temos que baixá-la da cruz (BOFF, 2018, p. 115-116).
A terra já não consegue se refazer em grau suficiente para garantir a vida humana. Está em fase de esgotamento, com risco para toda vida. Acrescente-se aí as mudanças climáticas com o aumento de temperatura, fruto também desse mesmo movimento de destruição da natureza e dos crescentes tipos de poluição, principalmente o industrial. É necessário um processo de conversão ecológica.
Lamentavelmente há um déficit de cultura ecológica e da consciência da gravidade da situação global. Ou despertamos desse sono letárgico ou inconscientemente construiremos o abismo no qual todos seremos precipitados (BOFF, 2022, p. 23)
O Papa Francisco nos assegura que a conversão ecológica, que se requer para criar um dinamismo de mudança duradoura, é também uma conversão comunitária:
Esta conversão comporta várias atitudes que se conjugam para ativar um cuidado generoso e cheio de ternura. Em primeiro lugar, implica gratidão e gratuidade, ou seja, um reconhecimento do mundo como dom recebido do amor do Pai, que consequentemente provoca disposições gratuitas de renúncias e gestos generosos, mesmo que ninguém os veja nem agradeça. “Que a tua mão esquerda não saiba o que faz a tua direita [...]; e teu Pai, que vê o oculto, há de premiar-te” (Mt 6,3-4). Implica ainda a consciência amorosa de não estar separado das outras criaturas, mas de formar com os outros seres do universo uma estupenda comunhão universal. O crente contempla o mundo, não como alguém que está fora dele, mas dentro, reconhecendo os laços com que o Pai nos uniu a todos os seres. Além disso, a conversão ecológica, fazendo crescer as peculiares capacidades que Deus deu a cada crente, leva-o a desenvolver a sua criatividade e entusiasmo para resolver os dramas do mundo, oferecendo-se a Deus “como sacrifício vivo, santo e agradável” (Rm 12,1). Não vê sua superioridade como motivo de glória pessoal nem de domínio irresponsável, mas como uma capacidade diferente que, por sua vez, lhe impõe uma grave responsabilidade derivada da sua fé (LS, n. 220).
No Documento Final do Sínodo para a Amazônia somos convidados a ouvir o clamor da terra e o clamor dos pobres e do povo da Amazônia com quem caminhamos, pois, nos chama a uma verdadeira conversão integral, com uma vida simples e sóbria, alimentada por uma espiritualidade mística no estilo de São Francisco de Assis, um exemplo de conversão integral vivida com alegria e graça cristã (SÍNODO DOS BISPOS, 2019, p. 18).
O Papa Francisco recorda-nos que não haverá uma ecologia sã e sustentável, capaz de transformar seja o que for, se não mudarem as pessoas, se não forem incentivadas a adotar outro estilo de vida, menos voraz, mais sereno, mais respeitador, menos ansioso, mais fraterno (QA, n. 58).
A ecologia enquanto grito dos pobres e da Terra coloca uma pergunta de fundo: todos os seres vivos terão futuro na medida em que a Terra e a humanidade sejam libertadas? E a única resposta, em princípio, que pode ser dada é: ou mudamos ou morremos, não haverá uma nova arca de Noé! Ainda há tempo para defender todas as vidas; de nossa união em torno da nossa única Casa Comum, surja iniciativas de encontro ao bem viver, em torno do bem comum, que haja a consciência de um outro mundo necessário.
As palavras finais da Carta da Terra nos impulsionam neste sentido: Que o nosso tempo seja lembrado pelo despertar de uma nova reverência face à vida, por um compromisso firme de alcançar a sustentabilidade, pela rápida luta pela justiça, pela paz e pela alegre celebração da vida (CARTA DA TERRA apud BOFF, 2022, p.4).
“Eu não sou contra o progresso, mas apelo pro bom senso, um erro não conserta o outro, isso é o que eu penso”
Roberto Carlos & Erasmo Carlos
Teologia, do grego teologia: ciência dos deuses. É o estudo das questões referentes ao conhecimento da divindade, de seus atributos e relações com o mundo e com os seres humanos e com a verdade religiosa. É o estudo racional dos textos sagrados, dos dogmas e das tradições do cristianismo. É uma linguagem posterior à Revelação e a Fé:
A poesia é a ponte que nos aproxima do sagrado, quando todas as outras pontes estão interditadas. A poesia não possui fronteiras. A poesia nos ensina a voar quando nossos pés não conseguem mais experimentar o chão. A poesia nos indica o chão de nossa realidade, onde tudo é mais difícil e, mesmo assim, nos mostra o quanto é belo por ele passar. Poesia é aquilo tudo que comove e sensibiliza, que desperta inúmeros sentimentos, tudo aquilo que aos sentidos se torna sublime e belo. É a manifestação da estética e da beleza retratada pelo poeta em forma de palavras que encanta e inspira (SBARDELOTTI, 2018, p.21).
Poesia é arte verbal. Toda canção é arte verbal. Se expressa por meio da palavra em contraste com os sinais visuais da pintura, da escultura, do cinema, das histórias em quadrinhos, etc.
Antonio Manzatto diz que a arte é muito mais que um simples meio de comunicação, mas ela também comunica. Assim sendo, ela exige um emissor (autor), um receptor (leitor), um código (escrita), uma mensagem e um meio de comunicação (obra, que é ao mesmo tempo meio e mensagem) (MANZATTO, 1994, p. 16-17).
Antes mesmo que se discutisse sobre ecologia no Brasil, a Música Popular Brasileira já fazia claras denúncias, a contragosto das gravadoras que diziam que tais músicas não dariam o lucro que esperavam, todavia, os compositores ao olharem para o horizonte apontavam para uma mudança de rota, que infelizmente, até hoje, não se fez.
Pelo lado da Música Religiosa, nas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) as canções ocuparam e ocupam um lugar de destaque.
Antonio Manzatto afirma:
Claro que palestras, painéis, subsídios, textos e estudos são elementos importantes na formação da consciência, e assim aconteceu de verdade no que se refere às CEBs. Mas as canções se impuseram como maneira de ajudar a consciência e a se formar porque, além de ensinar, as canções também permitem convivência, dança, espaço lúdico e maneira concreta de fazer o que é essencial na vida de uma comunidade: fazer comunhão. Ao mesmo tempo em que as canções ajudavam a formar a consciência participativa, também ocasionaram a possibilidade de uma afirmação de pertença e de reconhecimento de sua própria identidade. Passaram a ser, então, canções de CEBs, que animavam a vida dessas comunidades e cuja entoação lembrava sua maneira de ser e seus compromissos socioeclesiais. Isso foi tão forte que, no momento em que as CEBs deixaram de ser hegemônicas, aquelas canções praticamente desapareceram do cenário eclesial, fazendo aparecer outro gênero musical que fundamenta outro modelo de Igreja. As canções das CEBs afirmam e espalham no ar a mentalidade que permite a formação de CEBs, celebram a vida das comunidades e professam sua fé. São, assim, canções de celebração, de devoção religiosa e de compromisso social. Uma coisa não se separa da outra porque elas estão juntas na vida das pessoas. Evidentemente, elas refletem uma Teologia, aquela onde as CEBs têm possibilidade de existência, mas elas também possibilitam uma Teologia a partir daquilo que afirmam como leitura da realidade, da sociedade e do humano. Por isso encontramos, sim, nessas canções traços bem límpidos de Teologia da Libertação, o que explica que, em outros ambientes e cenários, elas não sejam repetidas ou executadas (MANZATTO apud BINGEMER & VILLAS BOAS, 2020, p. 339).
As músicas que animaram e animam as CEBs são conhecidas como Músicas da Caminhada. Músicas que possuem uma mensagem religiosa, mas com um compromisso social e em defesa de todas as vidas muito forte, elas estão no caminho e são companheiras de travessia, ajudando a rezar, ajudando a meditar e a entender as coisas que acontecem ao nosso redor. São baseadas numa leitura popular da Bíblia, com destaque para a pedagogia e a prática libertadora de Jesus de Nazaré, para assim lerem a realidade e a partir do cotidiano, evangelizarem. Duas delas se destacam neste artigo.
A palavra ecologia irá aparecer pela primeira vez na Música Popular Brasileira, em 1979, pelas mãos da dupla de compositores Roberto Carlos e Erasmo Carlos7 onde alertavam:
O ouro no ano passado subiu sem parar os gritos na bolsa falaram de outros valores corpos estranhos no ar silenciosos voadores quem sabe olhando o futuro do ano passado o mar quase morre de sede no ano passado os rios ficaram doentes com tanto veneno diante da economia quem pensa em ecologia se o dólar é verde, é mais forte que o verde que havia o que será o futuro que hoje se faz a natureza, as crianças e os animais quantas baleias queriam nadar como antes quem inventou o fuzil pra matar elefantes quem padeceu de insônia com a sorte da Amazônia na lei do machado mais forte do ano passado não adianta soprar a fumaça do ar as chaminés do progresso não podem parar quem sabe um museu no futuro vai guardar em lugar seguro um pouco de ar puro, relíquia do ano passado o que será o futuro que hoje se faz a natureza, as crianças e os animais os campos risonhos um dia tiveram mais flores e os bosques tiveram mais vida e até mais amores quem briga com a natureza envenena a própria mesa contra a força de Deus não existe defesa o que será o futuro que hoje se faz a natureza, as crianças e os animais (CARLOS & CARLOS, 1979).
Muitos anos depois de lançada, a atualidade da canção é evidente e assustadora, pois a Terra continua gritando e seus direitos estão sendo violados sem escrúpulos.
“Diante da economia / quem pensa em ecologia / se o dólar é verde, é mais forte que o verde que havia”: a economia brasileira está baseada no lucro desenfreado; uma economia que não respeita e que não valoriza a vida; daí a indagação incrédula dos compositores ao constatarem que frente à economia, não há vez para a ecologia, pois a moeda de giro é mais forte que a natureza.
E resta a grande questão: “o que será o futuro que hoje se faz / a natureza, as crianças e os animais”?
E continuam os questionamentos sobre a postura que a sociedade toma ou deixa de tomar em relação à defesa da vida na Terra. Ao final, uma afirmação apocalíptica: “quem briga com a natureza / envenena a própria mesa / contra a força de Deus não existe defesa”.
A grande batalha do século XXI é travada na ecologia.
Portanto, o cuidado é necessário como nunca na história da humanidade e da vida do planeta.
Cuidado é a vivência da relação entre a necessidade de ser cuidado e a vontade e a predisposição de cuidar, criando um conjunto de apoios e proteções que torna possível esta relação indissociável, em nível pessoal, social e com todos os seres viventes.
O cuidado está ligado a questões vitais que podem significar a destruição de nosso futuro ou a manutenção de nossa vida sobre este pequeno e belo planeta.
Em preparação para o Sínodo para a Amazônia, em outubro de 2019, Antônio Cardoso9 , que mora em Ribeirão Preto, São Paulo, cantador e missionário católico leigo compôs uma cantiga com elementos da cultura amazônica e em sintonia com as reflexões que estavam sendo colocadas em debate. A canção caiu no gosto popular e foi eleita o “Hino do Sínodo” extraoficialmente; por outro lado, foi criticada por setores conservadores, que não entenderam sua mensagem sintonizada com o cotidiano dos povos da Amazônia. A letra é de uma leveza e beleza poética pois desenha o percurso do rio Amazonas e de seus afluentes, e dos seres vivos que dele dependem, ligando este cotidiano plural ao nosso cotidiano. Antônio Cardoso conseguiu aproximar o Sínodo do povo. E o povo cantou com muita alegria, com muita emoção. Algo raro, num cenário de Igreja com canções uniformizadas e engessadas, muitas vezes, distantes da realidade atual.
Na vazante do Rio
Todos se põem ao plantio
Pois, quando as águas subirem
Eis o maior desafio que é viver
A colheita há de ser
Antes das águas revoltas
Pois, quando a vazante inundar
Sei onde vou aportar o meu barco
Ribeirinhos guardiões
Da nossa casa comum
Laudato si’
É Francisco chamando um a um 10 mil anos de história
Pan-Amazônia ancestral
Pão de uma eucaristia
Cosmo da “ecologia integral”
Nem uma folha cai
Sem a vontade do PAI
Pois na vazante da vida
CRISTO é semente de LUTA e de PAZ
Ribeirinhos guardiões
Da nossa casa comum
Laudato si’
É Francisco chamando um a um Igreja samaritana
Contra-cultura da grana
Tantas feridas abertas
No seio da floresta e a ganância
Irmão sol, irmão lua Irmão de todos os povos
É deus Tupã que reclama
Deus que nunca abandona a sua OBRA.
Ribeirinhos guardiões
Da nossa casa comum
Laudato si’
É Francisco chamando um a um (CARDOSO, 2019).
O autor relata sua experiência em cruzar o Amazonas em uma voadeira (canoa com motor de polpa muito utilizado pelos missionários para visitarem as populações que habitam às margens do rio Amazonas e de seus afluentes), observando as pessoas plantarem no tempo certo para colherem antes das águas revoltas, antes das águas subirem.
Ribeirinhos são um dos povos guardiões da nossa casa comum, que com a ajuda da Encíclica Laudato si’ juntam forças ao chamado do Papa Francisco de cuidar com amor da Casa Comum.
A ecologia integral está desde o início de sua história de dez mil anos. Sua ancestralidade é pão e é eucaristia. É vazante da vida: semente de luta e de paz! E a luta continua contra o desmatamento diário. O mundo todo observa este extermínio amazônico.
O ideal de uma Igreja samaritana é proclamado para que as feridas sejam curadas e fechadas. Quem cuida das feridas receberá a recompensa divina.
São Francisco de Assis é relembrado em sua alcunha Irmão sol, irmão lua, agora Irmão de todos os povos.
Com efeito, São Francisco, que se sentia irmão do sol, do mar e do vento, sentia-se ainda mais unido aos que eram de sua própria carne. Semeou paz por toda parte e andou junto dos pobres, abandonados, doentes, descartados, enfim, dos últimos (FT, n. 2).
Antônio Cardoso dentro da consciência do pluralismo religioso, marca característica da Região Amazônica, dentro de uma postura de respeito, diálogo e encontro afirma que Tupã reclama e que Deus nunca abandona a sua OBRA. Nós, mulheres e homens somos juntos com a Terra, obra divina.
Manoel Nerys11, cantador, missionário católico leigo e ribeirinho de Manacapuru – AM, sempre esteve inserido no cotidiano da Amazônia, e suas canções refletem as situações que ocorrem na realidade que o circunda. Em 2016, enquanto poeta e profeta entoa um canto de denúncia em favor da defesa da vida, em sintonia com o projeto de Igreja em saída do Papa Francisco:
Nesses campos, nessas matas, nesses lagos e igarapés; Nesses rios, planaltos e serras, planícies e vales, vou anunciar; No lombo de um belo cavalo, de barco, ou canoa, de remo na proa atender Teu chamar. Sou missionário, sou povo de Deus. Sou índio, caboclo, mestiço fazendo da vida a missão; aqui nesta grande tapera da Igreja Amazônica sou mensageiro de um Deus que é irmão.(bis) ô, ô, ô, ô, ê, ê de um Deus que é irmão.(bis) Jesus Cristo, nosso guia anima o nosso caminhar; nos aponta o caminho certo e de braços abertos vem nos ensinar, que é preciso fazer opção pelo irmão peregrino que foi esquecido e por ele lutar. Sou missionário, sou povo de Deus. Sou índio, caboclo, mestiço fazendo da vida a missão; aqui nesta grande tapera da Igreja Amazônica sou mensageiro de um Deus que é irmão.(bis) ô, ô, ô, ô, ê, ê de um Deus que é irmão.(bis) A luta e os sonhos assumimos, de todo aquele que tombou E a nossa missão se alimenta fazendo memória do seu pelejar E o sangue desses missionários lateje nas veias desta Igreja viva Inunde este altar Sou missionário, sou povo de Deus. Sou índio, caboclo, mestiço fazendo da vida a missão; aqui nesta grande tapera da Igreja Amazônica sou mensageiro de um Deus que é irmão.(bis) ô, ô, ô, ô, ê, ê de um Deus que é irmão.(bis) Somos filhos da Igreja do Norte; missionários desta região. Formamos a comunidade nesta geografia que temos nas mãos; Aprendemos a ouvir a mensagem de um Deus que nos fala na brisa, nas águas nas flores no chão. Sou missionário, sou povo de Deus. Sou índio, caboclo, mestiço fazendo da vida a missão; aqui nesta grande tapera da Igreja Amazônica sou mensageiro de um Deus que é irmão.(bis) ô, ô, ô, ô, ê, ê de um Deus que é irmão.(bis) (NERYS, 2016).
Manoel Nerys inicia a canção apresentando seu objetivo de vida e também os lugares por onde passará no território amazônico levando a Palavra de Deus. É também um convite a entrarmos na grande tapera do Reino da Vida. Sua carteira de identidade: “Sou missionário, sou povo de Deus. Sou índio, caboclo, mestiço fazendo da vida a missão; aqui nesta grande tapera da Igreja Amazônica sou mensageiro de um Deus que é irmão”.
A letra é uma clara antecipação dos quatro grandes sonhos que a Amazônia inspira no Papa Francisco, em especial: Sonho com comunidades cristãs capazes de se devotar e de se encarnar na Amazônia, a tal ponto que deem à Igreja rostos novos com traços amazônicos (QA, n. 7).
A opção que o autor afirma viver é a mesma de Jesus que é guia e anima o nosso caminhar e que opta pelo irmão esquecido e peregrino. Por este é preciso lutar. A Igreja é viva pois o sangue que a mantêm é o sangue jorrado e derramado por quem tombou acreditando na utopia e nos sonhos de uma sociedade mais justa e fraterna. Este sangue mártir não deixa a Igreja dormir em paz!
O lugar ecoteológico: “Somos filhos da Igreja do Norte; missionários desta região. Formamos a comunidade nesta geografia que temos nas mãos; Aprendemos a ouvir a mensagem de um Deus que nos fala na brisa, nas águas nas flores no chão”. Da Igreja do Norte, da Igreja Amazônica vêm o antigo novo projeto de Igreja Popular, de uma Igreja Samaritana, de uma Igreja dos e com os Pobres. E poderemos enfim cantar: “ô, ô, ô, ô, ê, ê de um Deus que é irmão”.
“O ser humano, em grande parte, é feito de sonhos”.
Leonardo Bof
Diante da degradação ambiental que estamos testemunhando neste tempo sombrio, nestes dias onde a fumaça polui o ar, uma tarefa inacabada da Ecoteologia da Libertação em diálogo com a poesia e com canções que ainda serão compostas, é conjugar o verbo Amazonizar.
O verbo Amazonizar é a mais sincera e profunda contribuição do Sínodo para a Amazônia; para a Igreja Católica Apostólica Romana presente nos países12 da Região Pan-Amazônica, nos países de língua portuguesa e espanhola, enfim, para todas as pessoas de boa vontade que buscam um outro mundo novo possível, uma relação de encontro, diálogo e respeito para e com o Planeta Terra, nossa Casa Comum.
Na Laudato Si’, o Papa Francisco assegura que:
A ecologia humana é inseparável da noção de bem comum, princípio este que desempenha um papel central e unificador na ética social. (...) O bem comum pressupõe o respeito pela pessoa humana enquanto tal, com direitos fundamentais e inalienáveis orientados para o seu desenvolvimento integral. (...) Nas condições atuais da sociedade mundial, onde há tantas desigualdades e são cada vez mais numerosas as pessoas descartadas, privadas dos direitos humanos fundamentais, o princípio do bem comum torna-se imediatamente, como consequência lógica e inevitável, um apelo à solidariedade e uma opção preferencial pelos mais pobres. Esta opção implica tirar as consequências do destino comum dos bens da terra, (...) exige acima de tudo contemplar a imensa dignidade do pobre à luz das mais profundas convicções de fé. Basta observar a realidade para compreender que, hoje, esta opção é uma exigência ética fundamental para a efetiva realização do bem comum (LS n. 156-158).
Amazonizar é bem viver. Amazonizar é bem fazer.
Poeticamente, amazonizar, corresponde a vários verbos: ver, ouvir, descer, viver, lutar, servir, caminhar, conviver, partilhar, respeitar, encontrar, dialogar, nadar, navegar, esperançar, germinar, abraçar e o principal deles: amar. Dentro da palavra amazonizar estão as palavras ama e amar. Deus ama e nos convida a amar sua criação, por amar demais nos convida a cuidar e a proteger; porém, o ser humano no afã de querer ser deus, destrói esta relação de confiança. Dentro do verbo amazonizar cabe um outro verbo, quase sinônimo: reflorestar13. Naquela perspectiva de restaurar a cobertura florestal de uma área que foi destruída por meio do plantio de sementes e mudas de árvores de várias espécies:
Reflorestar a vida no planeta Reflorestar a alma e o coração A Terra é nossa Casa e uma caneta Vai escrever as notas da canção Poetas dão sabor à alegria A rima sem tristeza espanta a dor A liberdade abraça a utopia E o novo ser humano exala amor Reflorestar é estar interligado Como se fossemos um Reflorestar é estar conectado Nesta Casa Comum (SBARDELOTTI & PAPEL, 2018).
Teologicamente, amazonizar é sentir a criação como resultado da vontade de Deus, que, ao criar todas as coisas, viu que tudo era bom. amazonizaré ao mesmo tempo ser sujeito e objeto de um processo eclesial desencadeado pelo Concílio Ecumênico Vaticano II, principalmente, na busca do aggiornamento de São João XXIII, e na recepção conciliar realizada na Conferência de Medellín (Colômbia, 1968).
Seguindo esta tradição, amazonizar é transformar o modo de pensar e de viver a fé na Igreja Católica Apostólica Romana dentro do mundo hodierno em que vivemos hoje, agora mesmo. amazonizar é repensar a Igreja, o mundo e a simbiótica relação entre os dois, com tudo que os aproximam e os afastam; em suas diferenças e igualdades, compõem a realidade desta época. Não é sem confronto e conflito que surge este verbo, mas a eles convergem todas as pessoas de boa vontade que desejam uma profunda conversão, uma profunda mudança de postura. Amazonizar é colocar a Região Pan-Amazônica enquanto lugar teológico: o lugar social dos pobres e marginalizados:
Amazonizar é um verbo de ação, que indica, primeiramente, um extenso e intenso processo de estudo e conhecimento sobre a Amazônia. É preciso conhecer para amar, proteger e defender, evocam os clamores dos povos da Amazônia em praticamente todos os relatórios das Escutas Sinodais realizadas nas pequenas comunidades, nos fóruns amplos de debates nacionais e internacionais, nas assembleias territoriais realizadas em todas as dioceses e prelazias da Amazônia. Na ressignificação do verbo amazonizar, apresenta-se a palavra com muitos significados, dependendo de onde é acionada e dos objetivos a que se propõe. No campo político, é uma resposta ao disparate economicista da internacionalização da Amazônia. Ao invés de internacionalizar a Amazônia, propõe-se concretamente amazonizar o mundo. Isso significa carregar o mundo de sentido, de sensibilidade, de contemplação, de admiração e comprometimento para com a obra da criação presente na exuberância da Amazônia. Evoca respeito às identidades culturais forjadas a partir da relação de respeito e de convivência com a natureza (VIEIRA; OLIVEIRA & MATA, 2020, p.17).
Os princípios da ecoteologia podem ser observados e reconhecidos na experiência milenar dos Povos Ameríndios que nos apresentam um itinerário teológico ou um caminho possível de convivência e interrelação com, e na casa comum. Os elementos e princípios dessa convivência são apresentados na letra da música ‘Cuidar da Terra’ do grupo Imbaúba, composição dos músicos amazonenses Celdo Braga e Candinho. Um fragmento da canção afirma que “nós somos parte da terra, a terra é parte de nós; um é a extensão do outro, nós não vivemos a sós”.
A questão central apresentada no texto musical é o desafio do cuidado. Cuidar da casa comum implica em cuidar primeiramente uns dos outros numa atitude de respeito pela vida e pela dignidade de cada um/uma e de todos/as simultaneamente. Este parece ser um princípio ancestral dos Povos Ameríndios: “Nós somos parte da terra, a terra é parte de nós”. Retoma, assim, a perspectiva de Marx (2015, p. 116) “o ser humano é parte da natureza”. Dessa forma, a consciência da convivência na interdependência é o princípio do respeito e do cuidado: “se nós cuidarmos da terra, a terra cuida de nós”. Elementos profundamente ecoteológicos.
Uma das questões centrais no princípio do cuidado, apresentado na experiência dos povos ameríndios é a atitude de respeito para com todos os seres planetários. Respeito não é sinônimo de temor como nos ensinaram nossos opressores, os colonizadores de outrora. Para os ancestrais dos povos ameríndios, não se respeita por medo, se respeita por amor. Este princípio universal do cuidado por amor, estabelece as bases da relação proporcional entre humanos e natureza, ambos criados como extensão do amor de Deus Criador. O cuidado da terra pelo homem/mulher é proporcional ao cuidado do homem/mulher pela terra. Estabelece-se então o princípio da interrelação e da interdependência que é a base da convivência na casa comum. na prática da “ecologia integral vivida com alegria e autenticidade” invocada pela Laudato Si’ (n. 10) como grande legado de São Francisco.
A interrelação entre sujeito e natureza como sujeito de direito, evoca uma relação de convivência com os biomas e seus povos de acordo com os preceitos do nhandereko-há, expressão da língua geral Nheengatu da Amazônia para referir-se ao “jeito de ser na nossa casa” (DIAS, LEMOS & OLIVEIRA, 2020). Para os Povos Tradicionais da Amazônia, a palavra nhandereko-há, serve para indicar a identidade étnica ou “jeito de ser na nossa casa”. Nessa perspectiva, a terra, a floresta e os rios simbolizam o lócus da organização social e política, lugar da produção e transmissão de práticas sustentáveis que se encontram em todos os lugares da Amazônia.
Desse modo, a terra da Amazônia não é propriedade. É lugar e espaço vivencial. Não é mercadoria que negocia no mercado imobiliário. É lócus e o território imaginado, sentido e vivenciado. Lugar da memória e do respeito aos antepassados, dever ser o lugar da agroecologia, do extrativismo responsável, da pesca sustentável, da festa, dos jogos e danças tradicionais. Todos estes elementos traduzem os princípios ecoteológicos numa experiência de convivência.
Conviver com e no bioma amazônico representa um grande desafio a ser reaprendido com os Povos Tradicionais da região, de maneira especial, os povos indígenas, camponeses, ribeirinhos e quilombolas que convivem com a floresta ou sobrevivem nas periferias das grandes cidades da Amazônia.
Sendo a ecoteologia uma orientação para a convivência baseada na reciprocidade, atualmente, muitas são as instituições preocupadas e empenhadas na busca de meios e possibilidades de uma convivência que retome e dê novos significados à construção de relações humanas, baseadas em práticas de cooperação e de participação. Estão buscando alternativas para viver na lógica da economia solidária, pautada na partilha e na solidariedade, com respeito e cuidado com a terra, as águas, os povos e as culturas que nascem da floresta (DIAS, LEMOS & OLIVEIRA, 2020). Estas experiências remontam aos princípios da Teologia da Criação que estabelece os fundamentos da reciprocidade.
Hoje, somos todos/as convidados/as a suscitar grandes sonhos: vida abundante para todos e todas, justiça, paz, fraternura, respeito, diálogo e encontro. Só assim estaremos fazendo nossa parte na manutenção de toda vida na Terra. Somos responsáveis pela construção de um mundo novo e necessário, onde ensaiaremos juntos uma linda canção de esperança e alegria.
Hoje, somos convocados/as a edificar um caminho para a fraternidade universal em prol da vida na Terra, pois formamos uma única e mesma entidade que venera, celebra, cuida, pensa, sente e ama. Só assim saberemos o real significado da frase de Friedrich Nietzsche: “Temos a arte para não morrer ou enlouquecer perante a verdade. Somente a arte pode transfigurar a desordem do mundo em beleza e fazer aceitável tudo aquilo que há de problemático e terrível na vida”.
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DIAS, Elisangela; LEMOS, Marcelo Antonio e OLIVEIRA, Márcia Maria de. Organizadores(as). Nhandereko-há: jeito de ser na nossa casa. Vol. 1: Cáritas na Amazônia - experiências e vidas amazônicas. Boa Vista: Editora da UFRR, 2020.
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PONTES JÚNIOR, Felício de Araújo; BARROS, Lucivaldo Vasconcelos. A natureza como sujeito de direitos: a proteção do rio Xingu em face da construção de Belo Monte. In: DILGER, Gerhard; LANG, Miriam; PEREIRA FILHO, Jorge (org.). Descolonizar o imaginário: debates sobre pós-extrativismo e alternativas ao desenvolvimento. Tradução Igor Ojeda. São Paulo: Fundação Rosa Luxemburgo, 2016. (427-442).
SBARDELOTTI, Emerson. Teologias e Literaturas 7: A Opção pelos Pobres na poesia de Patativa do Assaré. São Paulo: Fonte Editorial, 2018. SÍNODO DOS BISPOS. Amazônia: novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral - Documento Final da Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a Região Pan-Amazônica. Documentos da Igreja 58. Brasília: Edições CNBB, 2019. SÍNODO DOS BISPOS. Amazônia: novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral. Instrumentum Laboris. São Paulo: Paulinas, 2019. SUSIN, Luiz Carlos; SANTOS, Joe Marçal G. dos (Orgs.). Nosso planeta, nossa vida: ecologia e teologia. São Paulo: Paulinas, 2011.
VIEIRA, Ima Célia Guimarães; OLIVEIRA, Márcia Maria de; MATA, Raimundo Possidônio C. da. Os Dez Mandamentos do Sínodo Especial para a Amazônia. Cadernos do CEAS: Revista Crítica de Humanidades. Salvador, v. 45, n. 249, p. 9-33, jan./abr. 2020.
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[1] Artigo apresentado originalmente com o título: Ecoteologia, Literatura e Canções como Minicurso no V Simpósio Internacional do PPG em Teologia da PUC-SP: Amazônia: oportunidades e desafios para a Teologia Latino-Americana; 20 – 22/08/2019; Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção - Campus Ipiranga – PUC-SP. Artigo revisto, atualizado e ampliado.
[2] Originalmente a obra foi publicada pela Editora Ática, em 1994. Depois republicada pela Editora Sextante em 2004. Em 2015, numa edição revista e ampliada, a Editora Vozes recoloca-a no mercado, com novos materiais, com uma visão mais ampla e crítica das várias correntes da ecologia: integral, ambiental, social e mental; a partir de pressupostos espirituais, culturais e filosóficos. Em 1994, a obra recebe o Prêmio Sergio Buarque de Holanda, da Biblioteca Nacional, como o melhor ensaio social daquele ano. Em 2001, recebe o Prêmio Nobel Alternativo da Paz pelo Parlamento Sueco.
[3] A obra foi publicada pelas Edições Loyola em 1994, não havendo até o momento outras republicações; presenteia o cenário latino-americano e caribenho com uma nova proposta no universo brasileiro da Teologia, propondo uma leitura teológica da Literatura, em sintonia com o pensamento hodierno da teologia católica, estabelecendo um diálogo através da Antropologia a partir da obra de Jorge Amado. A obra é resultado da tese doutoral apresentada na Faculdade de Teologia Católica da Universidade Católica de Louvaina, na Bélgica, em 1993.
[4] Cf.: Canção inspirada na Encíclica Laudato Si’ do Papa Francisco. Letra, Música, Instrumentação, Mixagem e Masterização de Cireneu Kuhn, svd, São Paulo: Verbo Filmes, 2015. Disponível em: . Acesso em 28 jul. 2022.
[5] Da dupla Roberto Carlos & Erasmo Carlos: O Progresso (1976); Panorama Ecológico (1978); O Ano Passado (1979); As Baleias (1981); Águia Dourada (1987) e Amazônia (1989). Da dupla Sá & Guarabyra: Sobradinho (1977). De Zé Geraldo: Olhos de Jardineiro (1998). De Luiz Gonzaga: Asa Branca (1947); Riacho do Navio (1955); Xote Ecológico (1989). Canto das Oferendas da Campanha da Fraternidade 2002: Uma só será a mesa (2002). Hino da Campanha da Fraternidade 2007: Vida e Missão neste chão (2007). Da dupla Carlos Papel & Emerson Sbardelotti: Reflorestar (2018). Da dupla Lula Barbosa & Emerson Sbardelotti: Bem Viver (2017); Mártir Indígena do Maranhão (2020). De Lula Barbosa: Mira Ira (Nação Mel) (1985). De Cireneu Kuhn: Tudo está interligado (2015). De Guilherme Arantes: Planeta Água (1981). De Chico Buarque: Passaredo (1976). De Beto Guedes: O Sal da Terra (1981). De Milton Nascimento: Benke (1990). De Tulipa Ruiz: A Ordem das Árvores (2010). De Caetano Veloso: Um Índio (1976); Terra (1978). De João Nogueira: As Forças da Natureza (1977). De Jorge Benjor: Todo dia era dia de índio (1981). De Toquinho: Herdeiros do Futuro (2002). De Chico Science: Manguetown (1996). Da dupla Chico Buarque & Milton Nascimento: Cio da Terra (1977).
[6] Cf.: Disponível em: . Acesso em 29 jul. 2022.
[7] CARLOS, Roberto; CARLOS, Erasmo. O ano passado. Intérprete: Roberto Carlos. In: ROBERTO CARLOS. Roberto Carlos. São Paulo: Sony, 1979, 1 CD, faixa 3. Grifo nosso.
[8] Cf.: Disponível em: . Acesso em: 29 jul. 2022.
[9] CARDOSO, Antonio. Pan-Amazônia Ancestral. Intérprete: Antonio Cardoso. In: ANTONIO CARDOSO – PAN-AMAZÔNIA ANCESTRAL. Antonio Cardoso. São Paulo: Verbo Filmes / Paulinas, 2019, Vídeo-clipe.
[10] Cf.: Disponível em: . Acesso em: 29 jul. 2022.
[11] NERYS, Manoel. Nossa vida é missão. Intérprete: Manoel Nerys. In: NOSSA VIDA É MISSÃO. Manoel Nerys. Manaus: Independente, 2016, 1 CD, faixa 4.
[12] A Amazônia é um grande bioma partilhado por nove países: Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname, Venezuela e Guiana Francesa.
[13] Cf.: Disponível em: . Acesso em: 29 jul. 2022.