De mãos vazias perante a morte: Sobre o vazio de Deus em Vergílio Ferreira
DOI:
https://doi.org/10.23925/2236-9937.2021v23p380-393Keywords:
Filosofia, Literatura, Deus, Morte, Vergílio FerreiraAbstract
A densidade filosófica da obra de Vergílio Ferreira estabelece-se nas fronteiras do jogo entre a finitude e o transcendente. De Aparição a Estrela Polar, passando por Em Nome da Terra ou Para Sempre, o drama da existência rompe com o sentido aparente da significação do sujeito, abrindo-o à deriva ontológica e ao resgate do tempo passado como condições para a compreensão existencial. No sofrimento daquele que rememora, vemos o remorso da incompletude, da frugalidade e da efemeridade, que conduzem o sujeito a uma paradoxal procura do divino [seja enquanto entidade metafísica ou enquanto potencialidade criativa de um ser confinado às limitações e potencialidades de um corpo]. Deus é, simultaneamente, a condição para a afirmação da liberdade criadora do sujeito e a constatação agónica do absurdo de existir. Deus assoma, então, na obra de Vergílio Ferreira, como pêndulo entre a vontade de afirmação e o absurdo das possibilidades. Da ambivalência do lugar de Deus, emerge o Homem como ser lançado na existência e absorto de culpa. O Homem como potencial de criação que é capaz da mais exacerbada capacidade de olhar o Tempo, de rememorar. O Homem que se vê como um ser em processo e, portanto, que sobrevive [ilusoriamente?] à catástrofe da transitoriedade. Vergílio impõe a reflexão sobre o que permanece do sujeito em processo de ser, um sujeito que efetivamente só se descobre na memória, interpretada como espaço de recriação e de significação. Mais do que indagar sobre as possibilidades do divino, a obra de Vergílio Ferreira pode ser interpretada como a procura de uma afirmação do eterno, como conjunto de instruções sobre como morrer, que permita ver a morte como síntese e harmonia de tudo o que se concebe no reino profícuo das possibilidades [Estrela Polar]. No fundo, a fim de realçar o legado do ser, mostra-se o Homem na diáspora por Deus, o que o expõe na sua ambivalência como ser de fronteira: entre o eterno [da memória, da capacidade, do sonho] e o futuro [que esconde sempre a morte, o vazio e a solidão]References
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