Apresentação: América Latina

Autores

  • Lúcio Flávio Rodrigues de Almeida Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

DOI:

https://doi.org/10.23925/ls.v26i48.62261

Resumo

Este número de Lutas Sociais percorre um leque de temas dotados de grande importância teórica e política.

No primeiro artigo, Jair Pinheiro aborda uma questão crucial que, em outras épocas, foi examinada mais de perto. No fundo, se trata da inserção dos trabalhadores nas relações de produção que passam a ser revolucionadas já durante a transição para o socialismo e, na sequência, para uma sociedade sem classes. É dispensável acentuar a importância da questão quando os movimentos de trabalhadoras e trabalhadores avançam no interior de formações sociais dominadas pelo modo de produção capitalista; e também nos processos de transição para o socialismo; e, mais ainda, embora a questão praticamente tenha desaparecido, na transição do socialismo para uma sociedade sem classes. A quase desaparição deste debate se deve, em grande parte, à extrema fragilidade em que se encontram as forças proletárias a um ponto em que as questões somem da agenda d@s que lutam por transformar o mundo. Mas a classe proletária, ao se desenvolver, terá de se
debruçar sobre estas questões.

Egeu Gomez Esteves e Jéssica Ravênia Ferreira Rocha examinam uma situação próxima do grau zero da organização do povo pobre: um reassentamento no município de São Paulo sem que os principais interessados, os moradores, tivessem qualquer capacidade de intervir neste processo. E Claudio Katz analisa derrotas recentes do imperialismo sem que as forças progressistas saiam vitoriosas. É impossível subestimar a importância desta análise, pois, como o autor observa, situações desse tipo, embora passem despercebidas, têm sido frequentes.

A entrevista de Caio Antunes, realizada por Edvânia Ângela de Souza, lança
um olhar sobre novas configurações do trabalho. Afinal, qual é a inserção de uma categoria que, quando muitos ideólogos a consideravam resquícios de épocas distantes, agora se instalam por uma grande diversidade de nichos sociais, desde os trabalhadores “de aplicativo” até segmentos dos que atuam nas linhas de ponta da produção do valor. Quem serão esses novos personagens? Quais fazem parte dos contingentes dos novos proletários? Ou não mais haverá proletários? A importância dessas questões é imensa até porque, sem aprofundá-las, a tendência é a dispersão de amplos segmentos das forças que podem se voltar para a luta anticapitalista.

Por falar em luta, o dossiê aborda a América Latina sob várias dimensões: lutas práticas; teóricas que avançam quando se vinculam a práticas; lutas que logram vitórias, mas não existem vacinas contra futuras derrotas; e certas derrotas semeiam o caminho rumo a vitórias. A América Latina é muito isso. O que é contemplado de diversos ângulos no dossiê.

Aldo Duran Gil examina o processo histórico boliviano desde a Revolução de 1952 com vistas a, por meio da análise das relações de classes, dos diferentes regimes políticos e da inserção dependente da formação social boliviana, fundamentar a hipótese de que, nela, a reforma agrária seguiu um padrão junker. Martha Raquel Rodrigues, Raíssa Gouveia Lazarini, Letícia Lacerda Madeira e Gustavo Menon examinam a importância da ALBA-TCP para a formulação de um projeto de integração que se contraponha ao imperialismo, ao capitalismo e ao neoliberalismo na América Latina. Ana Cristina Sousa Santos e Celia Regina Congilio abordam o processo dinâmico e contraditório das lutas pela terra no sudeste paraense, ao longo das quais se constitui um campesinato, parte do qual se converte em trabalhadores inseridos em relações capitalistas.

Enfim, a dimensão predominantemente teórica é trabalhada por Andrés Tzeman. Com linguagem clara e precisa, este autor aborda a complexa relação entre a obra de Louis Althusser e as de três importantíssimos intelectuais sul-americanos, aliás pouco conhecidos no Brasil: o argentino José Aricó, o boliviano René Zavaleta Mercado e o equatoriano Agustin Cueva. Longe de expor uma espécie de influência de mão única que partiria do filósofo franco-argelino, Tzeman examina estas relações em processo, atento ao percurso teórico do próprio Althusser, embora não conhecido no todo pelos três sul-americanos. Reciprocamente, estes são apresentados no contexto de relações com um marxismo que, sob o forte impacto de derrotas políticas, se envolveu em capitulações e esforços de avanço teórico, neste segundo caso, com importante participação dos três sulistas mencionados. Seria importante se este tipo de análise fosse adotado mais amplamente, inclusive no que se refere ao Brasil.

Duas resenhas fecham este número. Ricardo Gaspar expõe as linhas principais do livro Brasil, uma economia que não aprende, de Paulo Gala e André Roncaglia, sobre os impasses da economia brasileira. E Tiago Santos Salgado apresenta Contra a miséria neoliberal, de Rubens Casara.

Nesses tempos difíceis, Lutas Sociais não vende ilusões nem estimula derrotismos. Seu papel é apresentar análises bem fundamentadas teórica e empiricamente que contribuam para produção de sociedades em que tod@s caibam e possam desenvolver cada vez mais suas potencialidades em um mundo fraterno e sustentável.

Como de costume, aguardamos suas críticas.

Lúcio Flávio Rodrigues de Almeida
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Publicado

2022-06-30

Como Citar

Rodrigues de Almeida , L. F. . (2022). Apresentação: América Latina. Lutas Sociais, 26(48), 07–08. https://doi.org/10.23925/ls.v26i48.62261

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