Dinâmicas religiosas e políticas em Portugal

O caso da JMJ 2023

Autores

  • Jorge Botelho Moniz Universidade Lusófona

DOI:

https://doi.org/10.23925/1677-1222.2024vol24i1a6

Resumo

As relações Estado-Igreja são, em qualquer local, o reflexo de anos de história e refletem não só a complexidade das diferentes interações institucionais, bem como a pressão e procura social em torno do fenómeno religioso. A Jornada Mundial da Juventude (JMJ) 2023, em Portugal, é um local privilegiado para se proceder a uma investigação sobre os contornos contemporâneos deste fenómeno. É um laboratório vivo das relações Estado-Igreja no país, permitindo examinar as novas e velhas dinâmicas religiosas e políticas, em especial com a Igreja católica. Este artigo, por meio de uma análise diacrónica dessas relações e de uma metodologia descritiva e analítica procede ao exame do modelo de separação com cooperação vigente em Portugal. Procura-se investigar em que medida o modelo de relações Estado-Igreja estabelecido foi desafiado por um contexto, como a JMJ, onde a visibilidade pública da religião provocou interações mais frequentes e uma relação dialógica mais intensa entre o secular e o religioso. Foca-se na forma como a JMJ pressionou as fronteiras deste binómio, obrigando a constantes redefinições no espaço público, e olha para o modo como isso foi recebido pelos mais altos representantes da nação, os partidos políticos e sociedade civil. Conclui-se que, embora o modelo de separação não tenha sido verdadeiramente afetado, um sistema de cooperação com uma igreja específica foi promovido pelo Estado, garantindo-lhe um lugar de destaque durante os dias da JMJ. Isso parece assegurar a estabilidade de um modelo de secularismo positivo que, no futuro, parece longe de vir a ser afetado.

Biografia do Autor

Jorge Botelho Moniz, Universidade Lusófona

Doutorando em em Ciência Política e mestre em Direito pela Universidade Nova de Lisboa.

Bolseiro da Universidade Federal de Santa Catarina no Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política.

Investigador associado do Observatório Político. Professor convidado em SciencesPo (Poitiers, França).

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Publicado

2024-08-09