Ser natureza

como conduzir a si mesmo para o cultivo da vida na prática filosófica de Emerson e do Zhuang-zi

Resumo

Muitos estudos comparativos entre Emerson e Zhuangzi analisaram quais conceitos daoístas foram importados para o movimento intelectual transcendentalista. Neste artigo, seguirei uma metodologia diferente: por meio de uma abordagem teórica, procurarei definir o núcleo ético-cósmico comum aos dois autores. Para ambos, a ética não é um conjunto de dogmas, mas antes um modo de atenção ao mundo. “How shall I live?” (Emerson 1983, p. 943), pergunta Emerson ao abrir The Conduct of Life e, como também veremos em Zhuangzi, a investigação filosófica é orientada por uma urgência existencial em que a agulha da bússola é a Eudaimonia (εὐδαιμονία), ou a vida boa. Esse conceito está presente desde os primórdios da disciplina filosófica ocidental e foi especialmente crucial para Aristóteles, para quem existe um fim teleológico predefinido a ser seguido. Emerson e Zhuangzi propõem um caminho alternativo: o do cultivo (nurture), um exercício cotidiano livre de objetivos específicos, que visa a cultivar a si mesmo em relação constante com a Natureza. Por que, então, é essencial para ambos os autores que os seres humanos se imerjam na Natureza para alcançar uma vida boa? Para responder a essa questão, partirei da metáfora da atitude pastoral, delineada por ambos: em Emerson, representada pela figura de Proteu associada à natura naturans; em Zhuangzi, presente no conceito de yang-sheng (养). A metáfora metafísica emersoniana é também arquetípica de um modelo ético explicitamente proposto em Zhuangzi. Assim como o pastor deixa o rebanho vagar sem impor uma direção, atentando apenas para aqueles que ficam para trás, o ser humano deveria conduzir a vida perguntando a si mesmo: o que permanece ou se arrasta em mim? Em seguida, discutirei como, a partir desse arquétipo comum, emergem diferenças metafísicas substanciais entre as concepções de Natureza em Emerson e em Zhuangzi, particularmente entre natura naturans e ziran (自然), bem como na consequente relação de autotranscendência, nos conceitos de alma e xing (性). Desse quadro resultarão dois tipos distintos de espiritualidade que, no entanto, compartilham uma disposição comum de escuta e de acordo com a Natureza e o Universo. Essa postura existencial não é apenas ética, mas também cosmológica, pois atravessa as fronteiras de separação entre o ser humano e a Natureza, colocando-os em harmonia. O resultado é uma investigação filosófica que nos convida a nutrir a vida sem aspirar à felicidade, cultivando um olhar atento ao presente e não orientado para um fim futuro. Vivemos em uma sociedade ainda presa ao conceito de felicidade como indicador fundamental do bem-estar individual e constantemente ancorada a um universo teleologicamente orientado em uma única direção, no qual a natureza se tornou técnica e o desenvolvimento se tornou progresso. Emerson e Zhuangzi, com suas respectivas disposições, mostram-nos uma urgência mais atual do que nunca: acolher o fluxo do devir respeitando e escutando o ritmo da Natureza, tornando-nos pastores de nós mesmos.