A falibilidade da memória nos relatos testemunhais

a implicação das falsas memórias no processo penal

Autores

Palavras-chave:

Processo Penal, Prova testemunhal, Falsas Memórias

Resumo

O presente estudo, motivado pela nítida escassez de obras e jurisprudência relativas à presença das falsas memórias no âmbito jurídico, tem por objetivo analisar a implicação das falsas memórias na reconstrução dos fatos pelas testemunhas no processo penal e a possível redução dos consequentes danos. Preliminarmente, serão apresentados conceitos sobre o tema, a busca pela “verdade real” no processo – a maneira pela qual realmente os fatos ocorreram –, e a prova testemunhal no processo penal. Desse modo, ao analisar os aspectos jurídicos e a implicação das falsas memórias – de aspecto psicológico –, tem-se claramente a fragilidade da referida prova, uma vez que depende exclusivamente da memória das testemunhas, fazendo, assim, com que a esta tenha papel preponderante para que o juiz decida a sentença. Sendo, desse modo, motivo para que se faça necessário um estudo acerca da memória humana, demonstrando seu funcionamento e a análise interdisciplinar que precisa haver dentro do processo – de modo que a prova testemunhal serve, não raras as vezes, como único elemento probatório disponível – e como se dá o fenômeno das falsas memórias, o qual vem mostrando ter implicação direta no processo penal, sobressaindo através de certos meios de prova. Destarte, a metodologia adotada neste estudo se deu através de análises bibliográficas e documentais. Por fim, analisou-se os fatores que podem contaminar a prova testemunhal e quais as técnicas possíveis de serem aplicadas para uma redução de danos ao processo, como a notável eficiência da Entrevista Cognitiva e do Reconhecimento Pessoal Sequencial, além das demais medidas que podem ser adotadas, sem exigir muito esforço, por todos os operadores do Direito.

Biografia do Autor

Christiane Heloisa Kalb, Faculdade Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina

Coordenadora e Docente do curso de Direito, da Faculdade CESUSC mantida pelo Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina – Florianópolis Pós-Doutora e Doutora em Ciências Humanas, PPGICH, UFSC (2018/2017). Mestre em Patrimônio Cultural e Sociedade, pela Univille - Joinville (2012). Advogada. Coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Direito Público e Teoria Social - Virtù, da Faculdade CESUSC

Franciny Souza, Faculdade Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina

Pós-graduanda em Direito Digital – Faculdade CERS. Bacharela em Direito, Faculdade CESUSC. Membro do Comitê Público da ANPPD® - Associação Nacional dos Profissionais de Privacidade de Dados.

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Publicado

2021-12-23

Como Citar

Kalb, C. H., & Souza, F. (2021). A falibilidade da memória nos relatos testemunhais : a implicação das falsas memórias no processo penal. Revista Fronteiras Interdisciplinares Do Direito, 1(1), 60–87. Recuperado de https://revistas.pucsp.br/index.php/fid/article/view/54098

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Artigos