Semioses do Minhocão

cinquenta anos em busca de um lugar no Centro de São Paulo

Resumo

Este artigo analisa as transformações de sentido do Elevado João Goulart (Minhocão), no centro de São Paulo, a partir de um recorte de reportagens da Folha de S.Paulo em três momentos: inauguração (1971), intermediário (1996) e cinquentenário (2021). Com base na semiótica discursiva e tensiva, articulada a Marc Augé, Michel Lussault e Bruno Latour, argumenta-se que o dispositivo urbano, estruturalmente idêntico, sofre profundas mutações semióticas: de não-lugar euforizado pelo imaginário da alta modernidade carro-cêntrica, passa a anti-lugar pejorado, índice de degradação, violência e perda territorial, até ser reinscrito como hiper-lugar “moderninho”, polo de lazer, retrofit e produção de bens simbólicos. Propõe-se uma correlação entre as categorias latourianas globalização-mais/globalização-menos, localização-mais/localização-menos e as figuras de não-lugar, anti-lugar, hiper-lugar e lugar, projetadas em um quadrante tensivo. Mostra-se, por fim, como o jornal passa a insinuar o Minhocão como lugar de convivência diversificada, em “razão proléptica”, antecipando um possível pertencimento plural em disputa no texto urbano. O estudo contribui para compreender como discursos midiáticos territorializam ideologias urbanas, ambientais e de classe no Antropoceno.