Pessoas sem religião com crença
A urbanização e a fragilização da herança religiosa
DOI:
https://doi.org/10.23925/1677-1222.2023vol23i2a20Palavras-chave:
Fenômeno dos sem religião, Urbanização, Fragilização da herança religiosa, Memória e Identidade, Individualização e Desinstitucionalização, Sem religião com crençaResumo
O fenômeno dos sem religião, representado pela designação sem religião, ocupa o terceiro maior percentual de identificação religiosa no Brasil. No Censo 2010 as pessoas sem religião representavam 8,04%, correspondente a mais de 15 milhões de indivíduos. O escopo deste artigo são as pessoas sem religião sem religião, os quais designamos por sem religião com crença. O nosso objetivo é abalizar alguns indícios de fragilização da herança religiosa que repercutem no fenômeno dos sem religião. Para tanto, abordamos a urbanização como um aspecto que contribuiu para a fragilização da herança religiosa, porque favoreceu a recomposição da memória coletiva e dinamizou a reconfiguração das identidades por meio das mobilidades e deslocamentos. Outrossim, despontamos a precarização da transmissão da tradição, cooperando com a recomposição da memória religiosa, com a reconfiguração da identificação religiosa. Por fim, apresentamos alguns dados e análises da pesquisa de campo realizada com discentes da graduação e discentes da Pós-Graduação em Ciências da Religião da PUC Minas, mostrando os indícios de fragilização da herança religiosa e a recomposição da memória naquelas pessoas sem religião com crença. A metodologia utilizada foi mista, composta por referencial teórico e pesquisa de campo, mediante questionário estruturado digital. Concluímos, de acordo com os dados da pesquisa de campo, que a urbanização contribuiu para a fragilização da herança religiosa, que houve precarização da transmissão e recomposição da memória religiosa. Destarte, evidenciamos a ocorrência de remodelações nos vínculos sociais e religiosos, os quais se manifestam na identificação religiosa que aduz a ausência da religião e a conservação de crença, na individualização da crença e na desinstitucionalização, como traços identificados nas pessoas sem religião com crença.
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