O tilintar dos cálices de Cristo, Chico/Gil e Criolo: a questão da ética num brinde dialógico
Palavras-chave:
Área semântica da existência, Memória, Enunciado concreto, Ato ético, Signo ideológicoResumo
Neste artigo, o objetivo é demonstrar o impacto ético-semântico do grande tempo na reacentuação de duas reformulações da expressão “Afasta de mim este cálice.” Teoricamente, descrevemos grande tempo como áreas semânticas da existência que emolduram as possibilidades de sentido realizadas em gêneros discursivos e enunciados concretos. Metodologicamente, a canção Cálice de Chico Buarque e Gilberto Gil e o RAP Cálice de Criolo são dialogicamente dispostos em relação ao seu contexto de produção, a um e ao outro e às narrativas bíblicas Jesus no Jardim do Getsêmani e A Última Ceia, que simultaneamente conferem status de enunciado à expressão da qual cálice configura uma metonímia e fixam a expressão como um item de uma memória cultural que podemos nomear Católica Romana.[1] A discussão mostra que a transposição do enunciado de uma área semântica da existência para outra altera os processos de reflexão e refração de signos ideológicos por meio de um jogo de memórias.
[1] Neste artigo, é feita a referência aos trechos bíblicos como repertório de uma memória cultural especialmente vinculada à Igreja Católica Romana pelo valor e pela função desta instituição na colonização lusitana, desde o século XVI, decisiva para a construção da brasilidade. Entretanto, especialmente a partir do século XIX, com a organização de instituições protestantes no Brasil, esses mesmos trechos passam a ecoar, também, outra vertente do cristianismo, de modo que essa memória cultural pudesse ser mais abrangentemente nomeada como "memória bíblica." Como a história do cristianismo no Brasil foge ao escopo deste artigo, registra-se esta nota, embora mantenham-se as menções à memória católica romana.