v. 50 (2022): Temático

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EDITORIAL

Este volume 50, da Revista Intercâmbio, reúne trabalhos de pesquisadores filiados à uma vertente de estudos que tem o sintoma na fala como disparador de elaborações teóricas e teórico-clínicas consistentes e fortemente comprometidas com um pensamento linguístico. Merece ser esclarecido que a originalidade e a solidez argumentativa do que se firmou, nacional e internacionalmente, como Clínica de Linguagem, decorre de diálogos teóricos com autores seminais das esferas da Linguística e da Psicanálise. Esses dois campos encontram-se sem se cruzarem propriamente, numa construção que tem no centro interrogações e discussões derivadas da resistência imposta pela heterogeneidade e pela singularidade de ocorrências sintomáticas na fala. De fato, sintomas (ou erros na fala) resistem a projetos científicos que se apoiam na possibilidade de regularização do empírico, que garante o ideal de previsibilidade. A exigência que se coloca vem, como sublinhado por Cláudia Lemos na lida com os erros em falas de crianças no processo de aquisição de linguagem, da impossibilidade de apreendê-los a partir de aparatos descritivos, gramaticais, que são instituídos, precisamente, pela via da regularização e da homogeneização do empírico. Sintomas na fala enquadram-se, de maneira mais radical, no interior deste problema. 

A solução não alienada em relação a abordagem de erros e sintomas pode ser encontrada na “novidade saussuriana”, que suspende a descrição gramatical em favor da explicação de “toda e qualquer manifestação linguística” seja ela esperada ou inesperada, correta ou incorreta, certa ou errada (SAUSSURE, [1916], 2016, p. 37). De grande impacto são, também, as obras de Benveniste, em grande parte organizadas em Problemas de Linguística Geral. Jakobson, um linguista dedicado ao que, digamos, faz furo no imaginário da homogeneidade da linguagem, foi e é decisivo no enfrentamento de erros e sintomas na fala. Ele voltou-se para poética (1960), para falas de crianças (1974) e para as afasias (1954). Além de que Jakobson não foi indiferente a Psicanálise, como se sabe. Ele foi amigo de Lacan e várias vezes participante de seus seminários. Não se deve estranhar, portanto, o movimento da Clínica de Linguagem na direção da Psicanálise.

Freud (1900) introduz a hipótese do inconsciente como determinante do sujeito. O inconsciente representa um dos espaços topológicos da vida mental e aquele com força de determinação. As manifestações do inconsciente irrompem como perturbações inesperadas no fluxo da fala. Freud as recolhe como inevitáveis e inerentes à “Psicopatologia da vida Cotidiana” (FREUD, 1905). Neste ambiente transitam, com fluência e compromisso, psicanalistas e clínicos de linguagem, produzindo novidades consistentes tanto do ponto de vista estritamente teórico, quanto teórico-clínico, como se pode ler e retirar de artigos presentes nesta Intercâmbio.

Resta dizer que a Clínica de Linguagem, foi inaugurada, em 1997, por Maria Francisca Lier-DeVitto, no LAEL-PUC-SP, que teve, desde os primeiros tempos, ao seu lado, Lúcia Arantes, Lourdes Andrade e Suzana Carielo da Fonseca. Maria Francisca Lier-DeVitto e Lúcia Arantes, organizadoras da Intercâmbio 50, lideram, desde 2002, a linha de pesquisa LAEL-CNPq Aquisição, Patologias e Clínica de Linguagem, que tem extensão consolidada na UNICENTRO, com Juliana Marcolino-Galli e na UFBA, com Melissa Catrini e presença expressiva nas universidades nacionais e internacionais, particularmente na Universidad Nacional de Rosário e na Universidad Nacional de San Luis, na Argentina. Convidamos os leitores à leitura e apreciação dos artigos deste volume de número 50.

 

Maria Francisca Lier-DeVitto

Lúcia Arantes

Publicado: 2022-06-23

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