Os ventos do norte não movem os moinhos? Racismo epistêmico
a matemática é branca, masculina e europeia
DOI:
https://doi.org/10.23925/1983-3156.2023v25i2p238-257Palavras-chave:
Currículos de matemática, Livros didáticos de matemática, Ensino médio, Interseccionalidade, Análise do discursoResumo
Este artigo aborda o tema interseccionalidade na educação matemática para explicitar o racismo epistêmico existente. Por intermédio da apresentação de trechos de livros didáticos de matemática do ensino médio brasileiro, mais especificamente as páginas que tratam da história da matemática, argumenta-se que, nesses livros analisados, a matemática é europeia, masculina e branca, pois a narrativa construída pelos elaboradores desses livros reproduz a lógica eurocêntrica do conhecimento matemático, apagando outras histórias da matemática e criando uma narrativa muito específica sobre a construção do conhecimento humano. As análises foram feitas tendo a interseccionalidade como conceito fundamental, pois levou-se em consideração múltiplos aspectos, como gênero, etnia, raça e nacionalidade. A análise do discurso foi a ferramenta analítica que possibilitou olhar para os livros didáticos de matemática e descrever como ocorre a materialização dos discursos sobre o ensino e a aprendizagem, produzindo uma história sobre o ensino da matemática do nosso tempo, sobre o que é idealizado e o que é invisibilizado. Foram analisadas as oito coleções aprovadas no PNLD 2018, totalizando 24 volumes. Utilizando-se o software Atlas TI, foram investigadas seis características: (i) o conteúdo abordado; (ii) o continente de origem daquele personagem; (iii) se era uma citação em forma de texto ou se, além do texto (nome do personagem), havia também uma figura ou foto; (iv) gênero; (v) raça; (vi) nome. Foram encontradas 554 menções à cientistas e matemáticos, mostrando que, nos livros analisados, a matemática é construída por homens, brancos e europeus.
Metrics
Referências
Ballestrin, L. (2013). América Latina e o giro decolonial. Revista Brasileira de Ciência Política, 11, 89117. https://doi.org/10.1590/S0103-33522013000200004
Berto, L. F. (2017). Enunciados sobre Interdisciplinaridade em Livros Didáticos de Matemática do Ensino Médio [Dissertação (Mestrado em Educação Matemática)]. Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
Collins, P. H., & Bilge, S. (2016). Intersectionality (Interseccionalidade). Polity Press.
Coradetti, C. A. L. M. (2017). Um Olhar Contemporâneo para a Matemática Financeira presente nos Livros Didáticos do Ensino Médio [Dissertação (Mestrado em Educação Matemática)]. Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
Coradetti, C. A. L. M., & Silva, M. A. (2017). A Tomada de Decisão: tensionamentos de uma instrução dada pela matemática financeira dos livros didáticos de matemática do ensino médio. Perspectivas Da Educação Matemática, 10(22), 65-86.
Coradetti Manoel, C. A. L., & Silva, M. A. da. (2019). Famílias felizes e saudáveis! Livros didáticos de matemática e a produção de sujeitos. Reflexão e Ação, 27(2), 219-235. https://doi.org/10.17058/rea.v27i2.11740
Costa, M. V. (2010). Poder, discurso e política cultural: contribuições dos Estudos Culturais ao campo do currículo. In A. C. Lopes & E. Macedo (Eds.), Currículo: debates contemporâneos (3ª ed.). Cortez.
Crenshaw, K. (1989). Demarginalizing the Intersection of Race and Sex: A Black Feminist Critique of Antidiscrimination Doctrine, Feminist Theory and Antiracist Politics [Uma crítica feminista negra à doutrina anti-discriminação, à teoria feminista e à política anti-racista]. University of Chicago Legal Forum, 1, 139-167.
Crenshaw, K. (1991). Mapping the Margins: Intersectionality, Identity Politics, and Violence against Women of Color. Stanford Law Review, 43(6), 1241-1299.
Crenshaw, K. (2002). Documento para o encontro de especialistas em aspectos da discriminação racial relativos ao género. Revista Estudos Feministas, 10(1), 171-188. https://doi.org/10.1590/S0104026X2002000100011
Dante, L. R. (2016). Matemática: contexto & aplicações (Vol. 1). Ática.
Degenszajn, D., Iezzi, G., Almeida, N. de, Dolce, O., & Périgo, R. (2016). Matemática: ciências e aplicações (9ª ed., Vol. 1). Saraiva.
Foucault, M. (1972). A arqueologia do saber e o discurso sobre a linguagem. Em A. M. S. Smith (Trans.), 1971. Pantheon Books.
Giroux, H. A. (1981). Ideology, culture & the process of schooling (Ideologia, cultura e o processo de escolarização). Temple University Press.
Giroux, H. A. (1983). Teoria e resistência em educação: uma pedagogia para a oposição. Bergin & Garvey. https://books.google.se/books?id=aXecAAAAMAAJ&dq=theory and resistance in education giroux&hl=pt-BR&source=gbs_book_other_versions
Guida, A. M., & Neto, V. F. (2019). O que fazem os animais nos livros didáticos de matemática para as escolas do campo? Problematizações com as lentes dos estudos animais. 6(1), 148-168.
Maldonado-Torres, N. (2019). Analítica da colonialidade e da decolonialidade: algumas dimensões básicas. In J. Bernardino-Costa, N. Maldonado-Torres, & R. Grosfoguel (Eds.), Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico (2.ª ed., pp. 27-53). Autêntica.
Martzloff, Sj.-C. (1997). Uma História da Matemática Chinesa (S. S. Wilson (trans.)). Springer. https://doi.org/10.1007/978-3-642-56680-6
Mignolo, W. D. (2008). Desobediência Epistêmica: a opção descolonial e o significado de identidade em política (Â. L. Norte, trans.). Cadernos de Letras Da UFF, 34, 287-324.
Neto, V. F. (2019). Quando aprendo matemática, também aprendo a viver no campo? Mapeando subjetividades [Tese (Doutorado em Educação Matemática)]. Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
Neto, V. F., & Guida, A. M. (2019). Processos de Subjetivação Movimentados em Livros Didáticos de Matemática para a Educação do Campo: descrevendo e analisando o habitante desejável do campo. Revista Educação Em Debate, 41(80), 185-203. https://doi.org/10.24882/eemd.v41i80.920
Neto, V. F., & Valero, P. (2018). O livro didático de matemática para a população rural no Brasil: aprendendo a ser um agricultor modernizado. In E. Bergqvist, M. Österholm, C. Granberg, & L. Sumpter (Eds.), Proceedings of the 42nd Conference of the International Group for the Psychology of Mathematics Education (No. 42; Vol. 3, pp. 411-418). PME.
Neto, V., & Guida, A. (2019). Redes discursivas: animais, campo, Matemática escolar e contribuições metodológicas da análise de redes. Educação Matemática Debate, 3(8), 194-212. https://doi.org/10.24116/emd.v3n8a05
Ocampos, J. D. G. (2016). Redes Discursivas Sobre a História da Matemática em Livros Didáticos do Ensino Médio [Dissertação (Mestrado em Educação Matemática)]. Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
Osen, L. M. (1999). Women in Mathematics (15ª ed.). The Massachusetts Institute of Technology Press.
Paiva, M. R. (2015). Matemática - Paiva (3ª ed.). Moderna.
Plofker, K. (2009). Mathematics in India. Princeton University Press. file:///C:/Users/youhe/Downloads/kdoc_o_00042_01.pdf
Popkewitz, T. S. (2004). A Alquimia do Currículo de Matemática: Inscriptions and the Fabrication of the
Child. American Educational Research Journal, 41(1), 3-34. https://doi.org/10.3102/00028312041001003
Quijano, A. (1992). Colonialidad Modernidad/Racionalidad. Perú Indígena, 13(29), 11-20.
Quijano, A. (2000). Colonialidad del poder, eurocentrismo y América Latina. In E. Lander (Ed.), A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais - Perspectivas latino-americanas (pp. 193238). CLACSO, Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales.
Santos, B. de S. (2016). Epistemologias do Sul. In Epistemologias do Sul: justiça contra o Epistemicídio. Routledge. https://doi.org/10.4324/9781315634876
Santos, B. de S. (2019a). O fim do império cognitivo: a afirmação das epistemologias do Sul (1ª ed.). Autêntica.
Santos, B. de S. (2019b). O fim do império cognitivo: o amadurecimento das epistemologias do Sul (Duke Unive). https://doi.org/10.32992/erlacs.10570
Setati, M., & Bangura, A. K. (2011). Matemática africana: From Bones to Computers. University Press of America.
Silva, M. A. da, Valero, P., Coradetti Manoel, C. A. L., & Berto, L. F. (2018). Livros didáticos de matemática do ensino médio brasileiro e a constituição do bom aluno cidadão. Acta Scientiae, 20(6). https://doi.org/10.17648/acta.scientiae.v20iss6id4831
Silva, T. T. da. (2005). Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. In 1999 (2ª ed.). Autêntica.
Silva, M. A., & Souza, D. M. X. de B. (2018). Ensinando meninas e meninos: abordando estereótipos de género no currículo de matemática. Livro de Resumos da Conferência JustEd 2018 'Promovendo a Justiça através da Educação', 79.
Silva, M., & Valero, P. (2018). Livros didáticos do ensino médio brasileiro: a matemática e a subjetividade dos alunos. In E. Bergqvist, M. Österholm, C. Granberg, & L. Sumpter (Eds.), Proceedings of the 42nd Conference of the International Group for the Psychology of Mathematics Education (No. 42; Vol. 4, pp. 187-194). PME.
Souza, D. M. X. de B., & Silva, M. A. (2017a). A Regência do Currículo de Matemática: uma racionalidade para governar modos de vida. In J. C. Morgado, H. Norberto, & J. Souza (Eds.), Currículo, Ideologia,
Teorias e Políticas Educacionais (Vol. 6, pp. 718-726). ANPAE. http://www.coloquiocurriculo.com.br/diversos/Serie6.pdf
Souza, D. M. X. de B., & Silva, M. A. (2017b). Questões de gênero no currículo de matemática: atividades do livro didático. Educação Matemática Pesquisa, 19(3), 374-392. https://doi.org/10.23925/19833156.2017v19i3p374-392
Souza, D. M. X. de B., & Silva, M. A. (2018). O dispositivo pedagógico do currículo-brinquedo de matemática, marcado pela dimensão de gênero, na produção de subjetividades. Reflexão e Ação, 26(2), 149-164. https://doi.org/10.17058/rea.v26i2.11747
Souza, R. R. (2020). Formação Cidadã: o que apontam os livros didáticos de matemática do ensino médio [Dissertação (Mestrado em Educação Matemática)]. Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
Valero, P. (2018a). Capital humano: o currículo de matemática escolar e a fabricação do homus oeconomicus neoliberal. In E. V. Godoy, M. A. Silva, & V. de M. Santos (Eds.), Currículos de matemática em debate: questões para políticas educacionais e para a pesquisa em Educação Matemática (1ª ed.). Editora Livraria da Física.
Valero, P. (2018b). Capitais Humanos: Matemática escolar e a construção do Homus Oeconomicus. Journal of Urban Mathematics Education, 11(1&2), 103-117. http://edosprey.gsu.edu/ojs/index.php/JUME/article/view/363/236
Valero, P., & Knijnik, G. (2016). A educação matemática como uma questão de política. Em M. A. Peters (Ed.), Encyclopedia of Educational Philosophy and Theory (pp. 1-6). Springer Singapore. https://doi.org/10.1007/978-981-287-532-7_523-1
Valero, P., Norén, E., Silva, M. A., & Neto, V. F. (2019). O cidadão matematicamente competente nos currículos e livros didáticos de matemática do Brasil e da Suécia. Anais da Décima Conferência Internacional de Educação Matemática e Sociedade (MES10), Artigo 10.
Valero, P., Norén, E., Silva, M. A., & Neto, V. F. (2018). Rumo à justiça social através da matemática? Política curricular e processos de in (ex) clusão. Livro de Resumos da Conferência JustEd 2018 'Promovendo a Justiça através da Educação', 88.
Valero, P., Silva, M. A., & Souza, D. M. X. de B. (2019). O brinquedo curricular, a matemática e a produção de subjetividades de género. Anais da Décima Conferência Internacional de Educação Matemática e Sociedade (MES10), Artigo 10.
Downloads
Publicado
Como Citar
Edição
Seção
Licença
Este trabalho está licenciado sob uma licença Creative Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives 4.0 International License.
Autores que publicam nesta revista concordam com os seguintes termos:- Autores mantém os direitos autorais e concedem à revista o direito de primeira publicação, com o trabalho simultaneamente licenciado sob a Licença Creative Commons Attribution que permite o compartilhamento do trabalho com reconhecimento da autoria e publicação inicial nesta revista.
- Autores têm autorização para assumir contratos adicionais separadamente, para distribuição não-exclusiva da versão do trabalho publicada nesta revista (ex.: publicar em repositório institucional ou como capítulo de livro), com reconhecimento de autoria e publicação inicial nesta revista.
- Autores têm permissão e são estimulados a publicar e distribuir seu trabalho online (ex.: em repositórios institucionais ou na sua página pessoal) a qualquer ponto antes ou durante o processo editorial, já que isso pode gerar alterações produtivas, bem como aumentar o impacto e a citação do trabalho publicado (Veja O Efeito do Acesso Livre).