“Da cerveja, cês não quer tirar a validade não?”

mulheres idosas alfabetizandas na EJA apropriando-se de práticas matemáticas hegemônicas

Autores

  • Flávia Cristina Duarte Pôssas Grossi Instituto Federal de Minas Gerais Campus Ouro Preto
  • Maria da Conceição Ferreira Reis Fonseca Universidade Federal de Minas Gerais

DOI:

https://doi.org/10.23925/1983-3156.2023v25i4p390-412

Palavras-chave:

Mulheres idosas, Escolarização de pessoas idosas, Apropriação de práticas de numeramento escolare, Práticas matemáticas como práticas discursivas, Leitura e escrita de prazos de validade

Resumo

O objetivo deste artigo é focalizar mulheres idosas alfabetizandas na Educação de Pessoas Jovens Adultas e Idosas (EJA), apropriando-se de práticas matemáticas hegemônicas, a que chamamos práticas de numeramento para destacar sua natureza discursiva. Analisamos a participação dessas mulheres nas interações discursivas durante uma atividade escolar proposta pela professora e desenvolvida dentro de um supermercado, que incluía fazer a leitura de prazos de validade de produtos industrializados. Essas interações, por sua dimensão histórica e por envolverem práticas matemáticas, são identificadas como eventos de numeramento. A atividade foi registrada em áudio, vídeo e apontamentos em diário de campo, e as interações foram cuidadosamente transcritas a partir desses registros. Nossa reflexão assume as contribuições teóricas dos estudos sobre envelhecimento, letramento e numeramento, apropriação de práticas sociais e constituição do sujeito e implica uma análise social do discurso. Nesta análise, tensionamos perspectivas sobre os processos de envelhecimento feminino e a produção de significados nas ações sociais que as alfabetizandas protagonizam quando se posicionam discursivamente e elaboram uma compreensão de como funciona o sistema de datação e dos significados semânticos e pragmáticos do registro de prazos de validade nas embalagens de produtos postos à venda. Assim, consideramos essa apropriação como instância de expressão dessas mulheres – e de sua continuada constituição – como sujeitos de aprendizagens e conhecimentos; de vivências e culturas; de memórias e esquecimentos; de direitos e expectativas.

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Biografia do Autor

Flávia Cristina Duarte Pôssas Grossi, Instituto Federal de Minas Gerais Campus Ouro Preto

Doutora em Educação

Maria da Conceição Ferreira Reis Fonseca, Universidade Federal de Minas Gerais

Doutora em Educação

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Publicado

2023-12-23

Edição

Seção

Educação Matemática de pessoas historicamente marginalizadas no contexto escolar